Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0874/13
Data do Acordão:05/14/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P19004
Nº do Documento:SA2201505140874
Data de Entrada:05/17/2013
Recorrente:A...., S.A.
Recorrido 1:DIRGER DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

1. A…….., SA, identificada nos autos, apresentou acção administrativa especial no TAF de Almada, contra a Direcção-Geral dos Impostos, impugnando o despacho proferido em 16 de Novembro de 2009 pela Directora de Serviços de Reembolsos da Direcção Geral dos Impostos, com fundamento no vício de violação de lei.

2. Naquele Tribunal ficou decidido julgar improcedente a acção, por não provada, absolvendo-se a entidade demandada de todos os pedidos.

3. Não se conformando, A……., SA, veio interpor recurso para este Supremo Tribunal, formulando as seguintes conclusões das suas alegações:

A. De acordo com o nº 8 do artigo 22º do Código do IVA, na redacção à data dos factos, os “reembolsos de imposto, quando devidos, deverão ser efectuados pela Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do 3º mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43º da lei geral tributária”.
B. Não obstante, segundo o nº 9º mesmo preceito, o “Ministro das Finanças pode autorizar a Direcção-Geral dos Impostos a efectuar reembolsos em condições diferentes das estabelecidas nos números anteriores, relativamente a sectores de actividade cujo volume de negócios seja constituído essencialmente por operações previstas na alínea b) do nº 1 do artigo 20º ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente”.
C. Neste âmbito, o nº 5 do Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo nº 31-A/2008, de 12 de Junho, determina que o “IVA cujo reembolso, de valor superior a € 10 000, for solicitado por sujeitos passivos que efectuem operações [activas) isentas ou não sujeitas que conferem o direito a dedução, ou relativamente às quais a obrigação de liquidação do imposto seja da responsabilidade do adquirente e que representem, pelo menos, 75 % do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respectivo período, e que não seja o primeiro reembolso, será restituído no prazo de 30 dias a contar da data da recepção do respectivo pedido” (sublinhado nosso).
D. Já o n.° 6 do antedito Despacho Normativo condiciona a concessão de qualquer reembolso à observância de um conjunto de pressupostos, de entre os quais importa salientar a “Inexistência de quaisquer divergências entre o valor dos campos da declaração periódica e o correspondente ao somatório das respectivas parcelas dos outros elementos referidos no nº 1 do presente despacho normativo [relações de fornecedores, clientes e regularizações], incluindo o anexo a que se refere a alínea c) do n° 1 do artigo 23° do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI)”.
E. Tal como resulta dos preceitos citados, o enquadramento de dado pedido de reembolso no prazo “acelerado” de restituição de 30 dias depende unicamente da observância dos requisitos aí vertidos.
F. A Recorrente demonstrou atempadamente — quatro dias após a apresentação do pedido de reembolso — que os pressupostos em apreço se encontravam verificados, maxime que as operações isentas ou não sujeitas que conferem o direito à dedução por si realizadas, nesse período, configuravam mais de 75% do total das suas operações.
G. Nem a Fazenda Pública nem o tribunal a quo assinalaram, como motivo justificativo para a rejeição do enquadramento do pedido de reembolso de IVA solicitado pela Recorrente no regime de restituição de 30 dias, vertido no nº 5 do Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro, qualquer requisito, de natureza substantiva ou formal, mencionado nos supracitados n.°s 5 e 6 do diploma regulamentar em apreço.
H. O único motivo que é apontado pela Recorrida e pelo tribunal a quo para o efeito prende-se com a falta da menção “RC” na relação de fornecedores apresentada pela Recorrente.
I. A interpretação do nº 5 do Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro, ensaiada pelo tribunal a quo encontra-se ferida de ilegalidade, porquanto rejeita a subsunção de factos não controvertidos — v.g., que a Recorrente realizou, no período de imposto em apreço, operações activas isentas ou não sujeitas que conferem o direito à dedução que totalizam mais de 75% do total das suas operações activas — com base em argumentos extraordinários em face da lei de natureza meramente formal ou burocráticos e que não se afiguram, nos termos daquele diploma regulamentar, motivo justificativo para a não concessão do reembolso no prazo reduzido de 30 dias.
J. Segundo a sentença recorrida, sem a aposição da menção “RC” na relação de fornecedores a Autoridade Tributária e Aduaneira não tinha meios de determinar quais as operações passivas que se encontravam reflectidas na sua declaração periódica de IVA.
K. Ora, tal não corresponde à verdade, já que, como consta da alínea D) do probatório fixado pela sentença recorrida, a Recorrente endereçou, no dia 18 de Agosto — quatro dias após a apresentação da declaração periódica e vinte e seis dias antes do termo do prazo para a restituição do IVA (atendendo ao prazo de 30 dias constante do nº 5 do Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro) — uma comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira, contendo uma descrição detalhada das suas operações da qual resultava, de forma evidente, a sua inclusão no regime “acelerado” de reembolso.
L. A desconsideração da comunicação endereçada pela Recorrente à Autoridade Tributária e Aduaneira colide com o princípio de liberdade de prova consagrado no artigo 72º da LGT e artigo 50º do CPPT, em sede de procedimento tributário.
M. Se, porventura, dúvidas existissem quanto à completude ou exactidão dos dados apresentados, sempre deveria a Autoridade Tributária e Aduaneira ter notificado a Recorrente para a prestação dos elementos adicionais que se revelassem necessários à descoberta da verdade material, ao abrigo dos princípios do inquisitório e da colaboração entre a Autoridade Tributária e Aduaneira e os contribuintes, vertidos no artigo 55º, artigo 58º e nºs 1 e 4 do artigo 59º, todos da LGT.
N. Considera, assim, a Recorrente que o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, por violação de lei.
O. Como tal, e não tendo o reembolso de IVA sido pago no prazo de 30 dias previsto no nº 5 do Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro, entende a Recorrente serem devidos juros indemnizatórios, ao abrigo da alínea a) do nº 3 do artigo 43º da LGT, contados a partir do dia 14 de Setembro de 2008 até ao dia 30 de Novembro do mesmo ano, dado o inegável prejuízo em que incorreu, com o protelamento da restituição do IVA no prazo legalmente previsto para o efeito.
IV. DO PEDIDO
Nestes termos, e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, anulando-se a sentença sub judice por violar o disposto no Despacho Normativo nº 53/2005, de 15 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pelo Despacho Normativo nº 31-A/2008, de 12 de Junho, com as legais consequências, designadamente, determinação do pagamento, pela Recorrida à Recorrente, dos juros indemnizatórios, no montante de € 41.281,97 (quarenta e um mil, duzentos e oitenta e um euros, noventa e sete cêntimos).

4. Não houve contra-alegações.

Face ao valor da causa de € 41 281,97 foi por nós suscitada a excepção da incompetência do STA para conhecer do recurso, em razão da hierarquia e notificadas as partes para sobre tal questão se pronunciarem.
A recorrente veio em resposta requerer a remessa dos autos ao TCA Sul.

5. Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentos

De facto

A) A autora está enquadrada no regime de periodicidade mensal, tendo apresentado um pedido de reembolso de IVA, no montante de € 4.829.461,16 na declaração periódica relativa a Julho de 2008 e submetida 14 de Agosto de 2008, cf. fls. 6/73 do processo administrativo em apenso.
B) Da declaração periódica identificada na alínea anterior constam os seguintes valores:
Campo 90 — 54.379.428,15
Campo 10 — 7.705.204,71
Campo 7 — 30.405.950,00
Campo 8 — 3.527.639,28
cf. fls. 74 do apenso.
C) A Administração Tributária entendeu que a permilagem das operações, com base na declaração identificada em A) é de 72,7% e teve em conta o seguinte cálculo (cf. fls. 74 do apenso):
% = Campo 7 + Campo 8 da declaração periódica
Campo 90 - Campo 10 da declaração periódica
54.379.428,15-7.705.204,71 = 46.674.223,44
30.405.950,00 + 3.527.639,28 = 33.933.589,28
33.933.589,28 = 72,7%
46.674.223,44
D) A 18 de Agosto de 2008, foi elaborado um requerimento pela Autora dirigido à Direcção Geral dos Impostos onde sp refere o seguinte: “A A……. (...) vem por este meio complementar a informação disponibilizada por via do envio em 14 de Agosto de 2008, da declaração periódica de IVA do mês de Julho de 2008 (...) Tal informação é necessária para apurar correctamente o rácio de 75% do valor total das transmissões de bens e prestações de serviços do respectivo período representado pelas operações isentas ou não sujeitas (...)
Muito embora desconhecendo a metodologia de cálculo do referido rácio utilizada pelos serviços do IVA, cremos que é determinado da seguinte forma:
% = Campos 7 e 8 da Declaração do IVA
Campo 1,5,3,7 e 8 da Declaração
Ora, este critério não corresponde à letra da lei pois no campo 3 das declarações periódicas de IVA da A…… (bem como de todos os sujeitos passivos) são incluídas, para além das transmissões de bens e prestações de serviços em que a lei exige que seja feita a inversão do sujeito passivo, como:
- Aquisições de serviços de construção civil: € 739.123,83
- Aquisições intracomunitárias de outros bens: € 302.425,75
- Aquisições de serviços ao estrangeiro: € 94.744,77
E cujo total ascende a €1.136.294,35 (Documento 2), valor que deverá ser expurgado do mencionado campo 3, resultando assim um rácio do período de 75%, pelo que V. Exas. dispõem de todos os elementos necessários para procederem ao reembolso de € 4,829.461,16 no prazo de 30 dias (...)”, cf. fls. 78/79 do apenso.
E) Em 17 de Novembro de 2008, deu entrada na Direcção Geral dos Impostos, um requerimento da Autora dirigido ao “Director Geral dos Impostos” a solicitar que se processem os juros indemnizatório ao abrigo do art. 43º da LGT, tendo em conta que o prazo dos 30 dias para o reembolso, conta-se a partir da data do pedido de reembolso, que ocorreu a 14 de Agosto de 2008, e como tal, aquele prazo já tinha sido ultrapassado, cf. fls. 75/77 do apenso.
F) Em 9 de Fevereiro de 2009, foi emitido o Ofício nº 012953 da Direcção de Serviços de Reembolsos dirigido à Autora, com o seguinte teor: “Assunto: Notificação nos termos do artigo 60º da LGT (…) que anexa o seguinte “Projecto de decisão” onde se extrai o seguinte: “(...) a proposta de decisão é no sentido de deferimento parcial, conforme despacho de 2009.02.03 da Senhora Directora de Serviços de Reembolsos (…) exarado na informação n.° 6156 da Direcção de Serviços de Reembolsos, da qual se transcreve as partes que ora relevam: (...) O pedido de reembolso em causa, foi enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22º do CIVA, ou seja, com um prazo limite de pagamento até ao final do terceiro mês seguinte ao da apresentação do pedido, no caso em apreço até ao final do mês de Novembro de 2008.
(…)
Em 2008.11.27, apresentou o pedido de juros indemnizatórios agora em apreciação (…) importa referir que para efeitos de determinação da percentagem de 75% a que se refere o n.º 5 do Despacho Normativo n.º 53/2005, de 15 de Dezembro referida, é efectuado o calculo que resulta do quociente entre o somatório dos campos 7 e 8 da declaração periódica do IVA e o campo 90 expurgado do campo 10, da mesma declaração. Da consulta ao sistema informático, nomeadamente as declarações periódicas, verifica-se que a percentagem das operações em causa, para o período de 08.07, é apenas de 72% pelo que, foi aquele pedido de reembolso enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22º do CIVA. (...) Se assim for entendido, afigura-se serem devidos juros indemnizatórios no montante de € 4.234,05, relativos ao pedido de reembolso do período de 08.07, calculados sobre o valor de € 4.829.461,16, à taxa de 4%, desde 2008.12.01 até 2008.12.08, conforme demonstração da liquidação que se anexa.”, cf. fls. 83/84 do apenso.
G) Apreciação da legalidade Em 2 de Março de 2009 a Autora respondeu em sede de direito de audição, cf. fls. 86/111 do apenso.
H) Em 27 de Outubro de 2009, foi elaborada a Informação n.º 8381 da Direcção de Serviços de Reembolsos, onde foi mantido o despacho de 3 de Fevereiro de 2009 e consequentemente foi entendido que o pedido de reembolso relativo ao período de 08.07, foi correctamente enquadrado nos termos do n.º 8 do artigo 22 do CIVA, cf. fls. 209/211 do apenso.
I) Sobre informação identificada na alínea anterior, foi exarado o seguinte despacho pela Directora de Reembolsos da Direcção Geral dos Impostos, em 16 de Novembro de 2009 “Concordo. Converta-se em definitivo o despacho de deferimento parcial referente ao pedido de juros indemnizatórios do sujeito passivo em apreço, atento os fundamentos constantes da informação.” cf. fls. 209 do apenso.
J) Em 20 de Novembro de 2009, foi emitido o Ofício n.º G73411, da Direcção de Serviços de Reembolsos, registado com aviso de recepção, dirigido à ora Autora, da decisão final relativo ao pedido de juros indemnizatórios referente ao período 08.07, cf. fls. 214/215 do apenso. K) Em 25 de Novembro de 2009, foi assinado o aviso de recepção referido na alínea anterior, cf. fls. 213 do apenso.
L) Em 11 de Dezembro de 2009, deu entrada a presente Acção Administrativa Especial, neste tribunal, cf. fls. 2 dos autos.
M) No anexo de fornecedores junto com a declaração periódica submetida pela Autora relativa ao período de 08.07, não consta o prefixo “RC” em nenhuma das suas linhas, cf. fls. 23 e segs do apenso.

De direito

Questão prévia.
Da competência deste STA para conhecer do recurso.
Trata-se de um recurso interposto de decisão judicial proferida em acção administrativa especial.
A acção administrativa especial interposta nos tribunais tributários é regulada pelas normas do Código de processo Administrativo por força do disposto nos artigos 46 e segs do CPTA.

O recurso dos actos jurisdicionais praticados no processo judicial tributário em processo tributário vem regulado nos termos dos artigos 279 e segs do CPPT.
Mas o nº 2 do artigo 279 do CPPT estipula que os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.

Constituindo a acção administrativa um meio comum à jurisdição administrativa e tributária.
Há agora que conhecer do recurso que nos vem dirigido e, antes de mais, da excepção da incompetência em razão da hierarquia, por nós suscitada.
Equacionou-se esta questão tendo presente o disposto no art. 151º do CPTA, de onde conclui que não se mostram preenchidos os requisitos previstos em tal inciso legal para que possa ser admitido o presente recurso. Este entendimento tem sido sufragado pela jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal, entre outros, nos acórdãos datados de 12/02/2014 e 15/01/2014, respectivamente, recursos n.ºs 01847/13 e 01495/12.
Também agora se seguirá o mesmo entendimento e a mesma linha de raciocínio, terminando-se, a final, por concluir pela incompetência em razão da hierarquia deste Supremo Tribunal, sendo que se seguirá de muito perto o que se deixou escrito naqueles acórdãos.

A acção administrativa especial instaurada nos tribunais tributários é regulada pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos, nos termos do disposto no artigo 9772 do CPPT.

“O recurso contencioso (agora acção administrativa especial) em matéria tributária que não comportem a apreciação da legalidade do acto da liquidação da autoria da administração tributária é regulada pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos .”

O presente recurso é interposto da sentença proferida nestes autos que julgou improcedente acção administrativa especial e absolveu a Direcção Geral dos Impostos do pedido.

Ou seja, o presente recurso jurisdicional encontra-se sujeito às regras previstas no CPTA, como resulta do estatuído no n.º 2 do art. 279.º do CPPT («Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos».).
Com efeito, a acção administrativa especial constitui um meio processual comum à jurisdição administrativa e tributária e do art. 279.º do CPPT resulta inequivocamente que o regime de recursos que nele se encontra previsto só se aplica aos processos regulados nesse mesmo Código. Pelo que, na falta de indicação do regime de recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária há que aplicar o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do art. 2.º do CPPT, sendo certo, além do mais, que toda a tramitação da acção administrativa especial é regulada por este mesmo CPTA.
Neste contexto, importa ter em conta o disposto no art. 151.º, n.º 1, do CPTA, segundo o qual o recurso per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo só pode ocorrer «Quando o valor da causa seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável e as partes, nas suas alegações, suscitem apenas questões de direito (...)».
Como referem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativo, 3.ª edição, Almedina, 2010, anotação 1 ao art. 151.º, pág. 999.), este recurso per saltum só é admitido desde que se encontrem preenchidos os seguintes requisitos: «(a) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (b) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável (artigo 151.º, n.º 1); (c) incida sobre decisão de mérito; (d) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (artigo 151.º, n.º 2)».
No caso, o valor da causa é de 41.281,97€ (juros indemnizatórios), que foi o indicado na petição inicial.
Assim sendo, atento o disposto no art. 31.º, n.º 2, alínea c) do CPTA («2 - Atende-se ao valor da causa para determinar:
[…]
c) Se cabe recurso da sentença proferida em primeira instância e que tipo de recurso».) e no já citado n.º 1 do art. 151.º do mesmo código, verifica-se uma circunstância que, desde logo, exclui que o recurso possa assumir-se como uma revista a dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo e impondo-se, consequentemente, observar o disposto no n.º 3 do mesmo art. 151.º do CPTA, segundo o qual «Se, remetido o processo ao Supremo Tribunal Administrativo, o relator entender que as questões suscitadas ultrapassam o âmbito da revista, determina, mediante decisão definitiva, que o processo baixe ao Tribunal Central Administrativo, para que o recurso aí seja julgado como apelação, com aplicação do disposto no artigo 149.º».

Concluímos, portanto, pela incompetência, em razão da hierarquia, desta Secção de Supremo Tribunal Administrativo para conhecer do presente recurso, sendo competente para o seu conhecimento a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo SUL.
Nem se diga que ao caso não se aplica o disposto no art. 152.º do CPTA por a distribuição da competência entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, no que se refere ao contencioso tributário, dever ser a que resulta dos arts. 26.º e 38.º do ETAF, motivo por que sempre competiria à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito [cfr. art. 26.º, alínea b) do ETAF] e à Secção de Contencioso Tributário dos tribunais centrais administrativos conhecer dos recursos de decisões dos tribunais tributários, salvo o disposto na referida alínea b) do art. 26.º [cfr. art. 38.º, alínea a) do ETAF].
Na verdade, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica (Apesar de o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais ter sido aprovado por lei (Lei n.º 13/2002, de 15 de Fevereiro) e o Código de Procedimento e de Processo Tributário o ter sido por decreto-lei (Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro), entre a lei e o decreto-lei não existe relação de hierarquia. Para maior desenvolvimento, J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 166 e segs.), regulem de modo que conduza a resultado diverso noutras situações, como sucede, v.g., no art. 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do art. 279.º do CPPT.
Do exposto resulta que o presente recurso jurisdicional deve baixar ao Tribunal Central Administrativo SUL, para aí ser julgado como apelação.

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário acordam, em conferência, em declarar este Supremo Tribunal Administrativo incompetente para conhecer do presente recurso e ordenam a baixa dos autos ao competente Tribunal Central Administrativo Sul (Secção do Contencioso Tributário), para que o recurso aí seja julgado como apelação (n.º 3 do art. 151.º do CPTA).

Custas pela recorrente, com t. j. em 1 UC.

Lisboa, 14 de Maio de 2015. – Fonseca Carvalho (relator) – Casimiro Gonçalves – Pedro Delgado.