Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:041/22.7BCLSB
Data do Acordão:09/08/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
TRIBUNAL ARBITRAL
FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:É de admitir a revista do acórdão do TCA que manteve decisão do TAD - que havia julgado procedente, em parte, o pedido de anulação da multa aplicada pelo Conselho de Disciplina da FPF [abrigo do art. 112.º do Regulamento Disciplinar da LPFP] e imposta por causa de declarações prestadas em programa televisivo num canal de um clube capazes de descredibilizar as competições futebolísticas e/ou de ferir a honra e a consideração dos visados - porque dotada de relevância e carecer o juízo firmado no aresto recorrido de aferição da sua conformidade com a jurisprudência na matéria deste Supremo.
Nº Convencional:JSTA000P29851
Nº do Documento:SA120220908041/22
Data de Entrada:07/11/2022
Recorrente:FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL
Recorrido 1:SPORTING CLUBE DE PORTUGAL - FUTEBOL, SAD (E OUTROS)
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


1. FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL [FPF], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 19.05.2022 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 140/162 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], no segmento em que negou provimento ao recurso que a mesma havia deduzido por inconformada com a decisão arbitral do TAD [proferida no processo n.º 37/2021 e datada de 24.12.2021], na parte que tinha julgado procedente o pedido de anulação das multas aplicadas, ao abrigo dos arts. 112.º e 136.º, n.ºs 1 e 4, do Regulamento Disciplinar da LPFP [RD/LPFP], e revogado, nesse âmbito, a decisão punitiva proferida, em 06.07.2021, pelo Pleno da Secção Profissional do Conselho Disciplinar (CD) da FPF no processo disciplinar n.º 28-20/21 movido, nomeadamente contra a SPORTING CLUBE DE PORTUGAL - FUTEBOL, SAD e ……………….., pelas declarações que este proferiu, enquanto Diretor de Comunicação daquela, no programa «Raio-X» transmitido no canal Sporting TV em 07.12.2020.

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 171/197] na relevância social e jurídica objeto de litígio e, bem assim, a necessidade de «uma melhor aplicação do direito», fundada na errada interpretação e aplicação, mormente dos arts. 112.º e 136.º, n.º 1, do RD/LPFP, 26.º, n.º 1, e 37.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa [CRP] e 10.º, n.º 2, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos [CEDH - cfr. arts. 01.º e 02.º da Lei n.º 45/2019, de 27.06].

3. Os aqui recorridos produziram contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 203/215] nas quais pugnam, mormente, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAD no que releva nesta sede julgou procedente o pedido de anulação das multas aplicadas aos aqui recorridos, ao abrigo dos arts. 112.º e 136.º do RD/LPFP, pelas declarações prestadas pelo Diretor de Comunicação da recorrida no programa «Raio-X» transmitido no canal Sporting TV, revogando, nesse segmento, a decisão proferida, em 06.07.2021, pelo Pleno da Secção Profissional do Conselho Disciplinar (CD) da FPF no processo disciplinar n.º 28-20/21 [cfr. fls. 72/119].

7. O TCA/S manteve tal juízo nesse segmento.

8. A aqui recorrente para além da relevância social e jurídica do litígio, sustenta a necessidade de melhor aplicação do direito, insurgindo-se, neste segmento, contra o que entende ser a errada interpretação e aplicação feita no acórdão recorrido do quadro normativo supra enunciado.

9. Em situações envolvendo a discussão de questões similares às que constituem objeto da presente revista a Formação de Admissão Preliminar deste Supremo tem admitido vários dos recursos que lhe foram dirigidos [cfr., entre outros e nos mais recentes, os Acs. de 02.04.2020 - Proc. n.º 0154/19.2BCLSB, de 23.04.2020 - Proc. n.º 0139/19.9BCLSB, de 21.05.2020 - Proc. n.º 0156/19.9BCLSB, 09.07.2020 - Proc. n.º 038/19.4BCLSB, de 19.11.2020 - Procs. n.ºs 050/20.0BCLSB e 063/20.2BCLSB, de 14.01.2021 - Proc. n.º 053/20.5BCLSB, de 07.10.2021 - Proc. n.º 019/21.8BCLSB, todos consultáveis in: «www.dgsi.pt/jsta»].

10. Assim, e no que releva extrai-se, nomeadamente da motivação do primeiro dos acórdãos citados, que aqui se acolhe por plena valia também para o caso sub specie, respeitante a declarações prestadas por responsável da recorrida em canal do clube, que «O TAD “revogou” o ato punitivo. (…) E o TCA manteve esse “julgado anulatório”, fazendo-o por razões centradas na “liberdade de expressão”. (…) a questão colocada no recurso é relevante; pois importa saber até que ponto se pode disciplinarmente reagir - com base em normas regulamentares, aliás similares às do estrangeiro - contra declarações dos clubes que, para além de excitarem anormalmente os ânimos dos seus adeptos e assim induzirem comportamentos rudes, contribuam para o descrédito das competições desportivas e do negócio que as envolve. (…) Justifica-se, portanto, que o assunto seja reapreciado pelo Supremo».

11. E, por outro lado, importa, na situação sub specie, aferir da conformidade da decisão recorrida com a jurisprudência deste Supremo [vide, nomeadamente, os Acs. de 26.02.2019 - Proc. n.º 066/18.7BCLSB, de 04.06.2020 - Proc. n.º 0154/19.2BCLSB, de 02.07.2020 - Proc. n.º 0139/19.9BCLSB, de 10.09.2020 - Proc. n.ºs 0156/19.9BCLSB e 038/19.4BCLSB, de 04.02.2021 - Proc. n.º 063/20.2BCLSB, de 09.09.2021 - Proc. n.º 050/20.0BCLSB, de 09.12.2021 - Proc. n.º 019/21.8BCLSB], donde se segue a necessidade de recebimento do recurso, para reanálise do assunto com vista a uma mais esclarecida e aprofundada aplicação do direito.


DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em admitir a revista.
Sem custas.
D.N..
Lisboa, 08 de setembro de 2022. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.