Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01745/10.2BELRS
Data do Acordão:07/15/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26229
Nº do Documento:SA22020071501745/10
Data de Entrada:07/09/2019
Recorrente:BANCO A............, SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 – Por Acórdão de 8 de Maio de 2020 acordaram os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em conceder parcialmente provimento ao recurso que o Banco A……….., S.A. interpusera da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que, em 6 de Março de 2019, havia julgado improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) relativo aos anos de 2006 e 2007, no montante de € 1.389.473,23, e respectivos juros compensatórios no montante de € 121.928,21. Por essa decisão foi também o Recorrente condenado em 90% do valor das custas.

2 – Por requerimento de 12 de Junho de 2020 (fls. 1868 do SITAF), veio o Recorrente, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 616.º e n.º 1 do artigo 666.º do Código de Processo Civil (CPC) ex vi da al. e) do artigo 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) requerer a reforma quanto a custas, mais concretamente, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos seguintes termos:
1. Foi proferido Acórdão por este Supremo Tribunal o qual concedeu parcial provimento ao recurso interposto pela aqui Requerente e a condenou em 90% das custas processuais.
2. Nas respectivas alegações de recurso, a Requerente havia solicitado, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP a concessão da dispensa do remanescente da taxa de justiça (vide segundo parágrafo do pedido das alegações de recurso).
3. No entanto- e certamente que por manifesto lapso - nada foi dito no referido Acórdão em relação ao remanescente da taxa de justiça.
4. O regime de custas processuais dita que deve ser computado na conta final o remanescente da taxa de justiça quando o valor da causa supere €275.000,00, calculado nos termos dispostos no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, e na Tabela I, in fine, anexa ao mesmo Regulamento.

5. E assim sucederá, a menos que “a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento” (cfr. artigo 6.º, n.º 7, RCP).
6. Ora, tendo em conta que a presente ação e deste recurso tem o valor de €1.389.473,23 a condenação da Requerente em 90% das custas, sem mais, implica que aos montantes já pagos a título de taxa de justiça acresça o pagamento do referido remanescente que, in casu, se cifra em €6.196,50.
7. Uma vez que o remanescente é devido por cada uma das partes, o mesmo será imputado duplamente à Requerente e cifrar-se-á em €12.393,00, nos termos do n.º 9 do artigo 14.º do RCP.
8. Contudo e com o devido respeito, entende a Requerente que estão verificados os requisitos da sua dispensa, considerando não só excessivo e desproporcional o referido montante – atendendo não só ao valor em si, em absoluto – mas à própria tramitação do processo aqui em causa, quer no que respeita à tramitação regular, à devida conduta processual das partes mas também ao facto de a própria decisão se ter baseado (sem grandes considerações) em decisões já proferidas sobre a mesma temática, maxime no que toca à questão fulcral dos autos, na invocada e seguida decisão deste mesmo Venerando Tribunal no processo de uniformização de jurisprudência proferida no processo 52/19.0BALSB e 7/19.4BALSB.
9. Sendo, por isso, s.m.o., justificada a dispensa, total (ou, na eventualidade de assim não se entender, parcial), do pagamento do montante remanescente da taxa de justiça.
10. Para aferir da complexidade da causa, importa atentar no artigo 530.º, n.º 7, do CPC, nos termos do qual «(…) consideram-se de especial complexidade as ações que:
a) Contenham articulados ou alegações prolixas;
b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; e
c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.»
11. Ora, a tramitação dos autos do recurso foi simples e célere (repare-se que as alegações de recurso da recorrente deram entrada em Maio de 2019 e em menos de um ano (mesmo com o “estado de calamidade”, entretanto decretado);
12. Não houve produção de prova testemunhal em Primeira Instância e a matéria de facto não é complexa.
13. As peças processuais apresentadas pelas partes foram, em termos de forma e conteúdo, adequadas e bastante sintéticas.
14. A matéria de direito não envolveu questões de especial complexidade, tendo o Douto Tribunal começado precisamente por reconhecer que “as questões que são formuladas no presente recurso não são novas na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo e foram já tratadas anteriormente, em jurisprudência consolidada – referimo-nos por todos, aos Acórdãos proferidos por esta Secção do STA a 4 de Março de 2015 no Processo n.º 081/13, a 3 de Junho de 2015 no Processo n.º 0970/13, a 17 de Junho de 2015 no Processo n.º 01874/13, a 27 de Janeiro de 2016 no Processo n.º 0331/14 e a 15 de Novembro de 2017 no Processo n.º 0485/17 –, tendo o seu sentido sido recentemente reiterado, em acórdãos de uniformização de jurisprudência, exarados em 4 de Março de 2020, nos processos 52/19.0BALSB e 7/19.4BALSB. Todos disponíveis em www.dgsi.pt, razão pela qual nos dispensamos de promover a junção aqui de cópia das mencionadas decisões” – vide página 18 do Acórdão.
15. Tendo, consequentemente, o Douto Tribunal aderido, sem reservas, a essa jurisprudência “limitamo-nos a remeter, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 656.º do CPC (aplicável ex vi do artigo 281.º do CPPT), para o que nesses processos se decidiu sobre cada um dos pontos questionados no presente recurso, tal como passamos, sumariamente, a enunciar” – vide página 18 do Acórdão.
16. No que diz respeito à conduta das partes, na senda do que tem vindo a ser entendido pela jurisprudência, deverá atender-se ao preceituado nos artigos 7.º e 8.º do CPC.
17. Ora, in casu, as partes agiram de boa-fé, não tendo recorrido a manobras dilatórias ou incidentes que obstassem ou dificultassem a prolação da decisão.
18. Tendo agido ambas sempre com retidão e lisura, num espírito de cooperação, entre si e com o Tribunal, tendo em vista a justa composição do litígio.
19. A aplicação deste valor de remanescente serviria para punir uma atuação processual das partes que, in casu, não merece qualquer censura.
20. Muito pelo contrário, as partes usufruíram dos serviços judiciais com toda a pertinência.

Face ao exposto,

21. Conclui-se estarem verificados todos os pressupostos que, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, justificam a dispensa das partes do pagamento da totalidade do remanescente da taxa de justiça.

Nestes termos e nos mais de direito, requer-se a V. Exa. a reforma do Acórdão quanto a custas, determinando assim a dispensa da totalidade do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelas partes, tudo nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP.
Subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que só se concebe por dever de patrocínio, requer-se a V. Exa. se digne a conceder a respetiva redução do remanescente, em percentagem considerada adequada pelo Tribunal, tudo nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP.


2 - O Requerido não se pronunciou
3 - Cumpre apreciar e decidir, vindo o processo à conferência com dispensa de novos vistos.


II – Fundamentação

Pediu o Requerente a reforma do acórdão quanto a custas, pretendendo que este Supremo Tribunal Administrativo use da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art. 6.º do RCP, de modo a dispensá-lo do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

O acórdão cuja reforma é peticionada concedeu apenas parcial provimento ao recurso interposto pelo Recorrente e consequentemente, foi o mesmo condenado nas custas respeitantes à parte em que decai a sua pretensão, condenação que se nos afigura inquestionável em face das normas legais que regulam a responsabilidade por custas.

No que concerne ao peticionado, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar que a dispensa do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação e pela conduta das partes.

Ora, o caso sub judice apresenta uma complexidade normal (e não menor), razão pela qual não se verificam in casu os requisitos expressamente consagrados na lei para determinar a requerida dispensa de remanescente.

Não obstante, admite-se, com base num juízo de proporcionalidade, que, atento o valor da causa, seja adequado proceder à dispensa de parte do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Assim, e em linha com o que tem sido a orientação jurisprudencial deste Tribunal, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, quando o montante da taxa de justiça devida se mostre desproporcionado em face do concreto serviço prestado, mesmo que a questão decidenda no recurso não se afigure de complexidade inferior à comum, e desde que a conduta processual das partes se limite ao que lhes é exigível e legalmente devido.

Face ao exposto, acorda-se em reformar o acórdão quanto a custas e dispensar em 90% o pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a €275.000.

Sem custas

Lisboa, 15 de julho de 2020. – Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes – Aragão Seia.