Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0801/09
Data do Acordão:11/18/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO
INSTAURAÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
CPPT
Sumário:I - A notificação de uma liquidação efectuada ao contribuinte, sem conter a respectiva fundamentação, confere a este o direito de requerer, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento (artº 37º, nº 1).
II - O uso desta faculdade suspende o decurso dos prazos de reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial mas já não o prazo de pagamento voluntário e de instauração da respectiva execução, nos termos dos artigos 85.º e 86.º do CPPT, se decorrer o prazo de pagamento sem que ele seja efectuado.
III - A existência de irregularidades da notificação (que não as previstas no n.º 9 do artigo 39.º do CPPT, pois estas consubstanciando nulidades da notificação tornam esta absolutamente irrelevante para assegurar a eficácia do acto notificado) não constitui fundamento de oposição à execução fiscal enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P11141
Nº do Documento:SA2200911180801
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I. A…, contribuinte fiscal nº 181 417 391, residente em …, …, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Viseu, que julgou improcedente a oposição à execução fiscal contra si instaurada para cobrança de dívida de IRS do ano no montante de 6.085,39 euros, acrescidos do montante de 244,90 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
1ª). Os actos tributários carecem de notificação, a qual deve conter sempre a decisão e os respectivos fundamentos.
2ª). Quando a notificação não contenha esses elementos, padece a mesma de ilegalidade por violação do disposto no artigo 36.°, n.° 2, do CPPT.
3ª). Nessas circunstâncias, não existe notificação válida do acto tributário, o que prejudica a produção dos seus efeitos, conforme decorre do artigo 36.°, n.° l, do CPPT.
4ª). O artigo 37.°, n.°s l e 2, admite a sanação dessa ilegalidade quando o contribuinte não requerer a notificação dos elementos omitidos e que deviam constar da notificação. No entanto, no caso de ter sido requerida a notificação desses elementos, inexiste sanação da apodada ilegalidade, não podendo considerar-se a notificação validamente realizada sem que os mesmos tenham sido levados ao conhecimento do contribuinte, o que acarreta a ineficácia do acto notificado (artigo 36.°, n.° l, do CPPT).
5ª). Enquanto que o n.° 2 do artigo 37.° do CPPT apenas disciplina o início da contagem do prazo de impugnação/reclamação/recurso, não contendendo substantivamente com a ineficácia do acto irregularmente notificado, o suporte legal para a ineficácia do acto irregularmente notificado encontra-se substantivamente na disposição do artigo 36.° do CPPT,
6ª). Não pode o recorrente considerar-se validamente notificado sem que lhe sejam comunicados todos os elementos legalmente exigidos, maxime quando este expressamente os requeira.
7ª). Não produzindo efeitos o acto "notificado" não pode instaurar-se a execução fiscal por inexigibilidade da dívida, sobretudo nos casos, como o presente em que foi requerida certidão contendo os elementos em causa antes de instaurada a execução e em tempo para que a Administração respondesse no prazo legal também antes da instauração do processo executivo.
8ª). A inexigibilidade da dívida tributária constitui causa de oposição à execução, e sendo a dívida inexigível devia a mesma ter sido julgada procedente.
9ª). Diverso entendimento do alegado, implica a inconstitucionalidade da norma do artigo 36.°, n.°s l e 2, do CPPT na interpretação segundo a qual a validade da notificação, e a eficácia do acto notificando, dispensa a comunicação dos fundamentos do acto de liquidação, mesmo quando a mesma tenha sido expressamente requerida e os elementos omitidos não tenham sido notificados ao requerente, por violação do disposto no artigo 268.°, n.°s l e 3 da CRP.
10ª). O mesmo juízo se fazendo em relação à norma do artigo 37.°, n.° 2, do CPPT, interpretada no sentido de que, não contendo a notificação os elementos legalmente exigidos quanto à fundamentação do acto notificado, o uso da faculdade prevista na norma apenas "suspende" o decurso dos prazos de reclamação, recursos, impugnação ou outros meios judiciais, podendo instaurar-se o processo de execução fiscal sem que ao contribuinte tenha sido entregue a certidão requerida com a fundamentação fáctico-jurídica do acto notificado ou sem que estes elementos lhe tenham sido comunicados, por violação do disposto nos mesmos artigos do texto constitucional.
Termos em que e nos mais de direito, se requer que V.as Exas, na procedência do recurso, se dignem revogar a douta sentença recorrida e, consequentemente, julgar a oposição procedente por provada, determinado a extinção da execução fiscal, com todas as legais consequências.
II. O MºPº emitiu o parecer constante de fls. 79 no qual defende a improcedência do recurso.
III. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.
III. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
a) O oponente foi notificado da liquidação de IRS referente ao exercício de 2002.
b) O Oponente requereu no Serviço de Finanças competente, em Setembro de 2004, certidão gratuita da fundamentação legal de facto e de direito daquela liquidação.
c) Tal certidão não lhe foi entregue, até à data.
d) Em 23/11/04, o oponente foi citado por aviso postal registado para a execução fiscal n° 2631200401001248, instaurada para cobrança da supradita liquidação.
e) A presente oposição deu entrada na Repartição de Finanças de S. João da Pesqueira em 05/01/05.
IV. Das 10 conclusões das alegações resulta que, a única questão a conhecer no recurso, é a de saber se o uso da faculdade prevista no artº 37º, nº 1 do CPPT obsta à instauração da execução fiscal do acto de liquidação por inexigibilidade da dívida.
A decisão recorrida respondeu negativamente a essa questão louvando-se nos seguintes argumentos:
a) O uso de tal faculdade apenas suspende o decurso dos prazos para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que da decisão caiba.
b) Deste modo, efectuada a notificação da liquidação e decorrido o prazo de pagamento voluntário, a execução fiscal não pode deixar de ser instaurada em obediência aos artºs 85º e 86º do CPPT.
c) Uma vez que o recorrente (executado) foi notificado do acto de liquidação - independentemente de esta notificação não ter sido acompanhada dos fundamentos -, a dívida tornou-se exigível não podendo, por isso, invocar-se como fundamento de oposição à execução fiscal a inexigibilidade da dívida.
Diferentemente, o recorrente entende que a execução não poderia ter sido instaurada antes da emissão e entrega da certidão por si requerida ao abrigo do artº 37º do CPPT, argumentando pela forma seguinte:
a) A notificação dos actos tributários deve conter a decisão e os respectivos fundamentos e, quando assim não suceder, padece de ilegalidade (artº 36º, nº 2 do CPPT)
b) Tendo o recorrente requerido, ao abrigo do nº 2 do artº 37º do CPPT, certidão com os fundamentos da liquidação, não pode a notificação do acto tributário considerar-se validamente efectuada enquanto não ocorrer a entrega de tal certidão.
c) E, assim sendo, não produzindo efeitos o acto notificado, não pode ter lugar a execução fiscal, por a dívida ainda não ser exigível.
d) Diverso entendimento - o seguido na decisão recorrida – implica a inconstitucionalidade do artº 36º, nº 1 do CPPT, por violação do disposto no artº 268º, nºs 1 e 3 da Constituição.
e) Do mesmo modo, também o artº 37º, nº 2 acima citado, interpretado no sentido de que é admissível a instauração da execução antes de entregue a certidão pedida pelo recorrente é inconstitucional por ofensa do citado artº 268º da CRP.
IV. 1. Recordando o probatório acima transcrito, temos que o recorrente (oponente)
foi notificado da liquidação de IRS referente ao exercício de 2002, requerendo no Serviço de Finanças competente, em Setembro de 2004, certidão contendo a fundamentação legal de facto e de direito daquela liquidação. Tal certidão não lhe foi entregue, até à data, tendo sido em 23/11/04 citado por aviso postal registado para a execução fiscal n° 2631200401001248, instaurada para cobrança da supradita liquidação.
Será então que, essa execução fiscal padece de ilegalidade por inexistir a inexigibilidade da dívida liquidada à data da sua instauração?
IV.2. O artº 36º do CPPT estabelece o seguinte:
“1. Os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.
2. As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências”.
Porém, e relativamente ao nº 2, estabelece o nº 1 do artº 37º do mesmo diploma que “1. Se a comunicação da decisão em matéria tributável não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento”.
Acrescenta o nº 2 deste mesmo artigo que, “Se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial, conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida”.
Temos então que, uma notificação de um acto de liquidação desacompanhada da fundamentação, não é nula ou ineficaz. E que assim é resulta do nº 9 do artº 39º segundo o qual “O acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou de subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data”, inexistindo norma equivalente para a falta de notificação da fundamentação. Quer isto então dizer que, a notificação nos termos acima referidos, é meramente irregular, podendo essa irregularidade ser suprida pelo interessado pela forma referida no nº 1 do artº 37º do CPPT, sanando-se no caso de ausência de reacção.
Isto mesmo resulta com toda a clareza do recente Acórdão deste Tribunal e Secção de 07.10.2009, proferido no Recurso nº 129/09, no qual ficou escrito o seguinte:
“O regime previsto no artº. 37.º, n.ºs 1 e 2, e 39.º, n.º 9, do CPPT é o de que, fora dos casos previstos nesta última disposição, em que a notificação se considera nula (Indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data.
Nestes casos de nulidade, a notificação não produzirá quaisquer efeitos jurídicos, como resulta do art. 134.º, n.º 1, do CPA.), o acto de comunicação ao destinatário de um acto em matéria tributária que não o informa de todos os elementos do acto notificado só é irrelevante para efeitos de determinação dos prazos de reacção contra o acto notificado, por via administrativa ou judicial, e mesmo esta única consequência apenas ocorre se for utilizada a faculdade prevista no n.º 1 daquele artº. 37.º.
Na verdade, por um lado, fora dos casos de nulidade previstos no artº 39.º, n.º 9, é aquela a única consequência prevista para a irregularidade da notificação, no referido n.º 2 do artº. 37.º.
O facto de apenas nos casos previstos no artº. 39.º, n.º 9, do CPPT a não observância dos requisitos legais das notificações implicar a sua nulidade, que tem como consequência a eliminação jurídica da totalidade dos efeitos do acto que dela enferma (artº. 134.º, n.º 1, do CPA), revela que se pretendeu legislativamente que, em todos os outros casos de não observância dos requisitos legais, a notificação irregular produza todos os efeitos para os quais é idónea, com excepção da determinação do início dos prazos de reacção contra o acto notificado, no caso de vir a ser usada a faculdade prevista no n.º 1 deste art. 37.º.
Por outro lado, o facto de não se exigir, para regularização da situação gerada com a notificação irregular, a realização de uma nova notificação substituindo a anterior, mas apenas a «notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha» (n.º 1 deste artº. 37.º), confirma que se pretendeu que se mantenham os efeitos produzidos pela notificação dos elementos não omitidos, pois não se impõe que eles sejam comunicados novamente. À mesma conclusão conduz o facto de, se não for pedida, no prazo legal, a comunicação dos requisitos omitidos, a notificação produzir todos os seus efeitos, como se os contivesse.
Sendo assim, a notificação sem todos os requisitos exigidos, mas que contenha aqueles sem os quais ela é considerada nula, indicados no n.º 9 do artº. 39.º do CPPT, não deixará de valer como acto de comunicação ao destinatário quanto a tudo o que comunicou, produzindo os efeitos próprios de uma notificação quanto àquilo de que o informou, só não produzindo, no caso de o destinatário utilizar tempestivamente a faculdade prevista no art. 37.º, n.º 1, do CPPT, o efeito de determinar o início dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa do acto notificado”.
E mais adiante: “... tendo a comunicação efectuada aptidão para informar o destinatário sobre o montante da quantia liquidada e o prazo de pagamento voluntário e não sendo afastada por lei a relevância da notificação para este fim, quando ocorrer omissão de indicação da fundamentação de facto e de direito, tem de se concluir a notificação produz o seu efeito útil que lhes está legalmente associado de tornar eficaz o acto de liquidação em relação ao destinatário.”
No caso dos autos, está provado que o recorrente foi notificado da liquidação de IRS referente ao exercício de 2002.
De acordo com o disposto no artº 88º, nº 1 do CPPT “Findo o prazo do pagamento voluntário estabelecido nas leis tributárias, será extraída pelos serviços competentes certidão de dívida com base nos elementos que tiverem ao seu dispor”. E acrescenta o artº 188º, nº 1 do mesmo diploma que “Instaurada a execução, mediante despacho a lavrar no ou respectivos títulos executivos ou em relação destes, no prazo de vinte e quatro horas após o recebimento e efectuado o competente registo, o órgão da execução fiscal ordenará a citação do executado”.
Então, verificada a ausência do pagamento voluntário nada obsta, antes obriga a que a execução fiscal seja instaurada e ordenada a citação do executado. Deste modo, não ocorre a inexigibilidade da dívida, pelo que o fundamento invocado não pode enquadrar-se na alínea i) do nº 1 do artº 204º do CPPT.
IV.3. Na conclusão 9ª o recorrente, como acima se referiu, alega a inconstitucionalidade das normas contidas nos nºs 1 e 2 do artº 36º do CPPT se interpretadas no sentido de que “a validade da notificação, e a eficácia do acto notificando, dispensa a comunicação dos fundamentos do acto de liquidação, mesmo quando a mesma tenha sido expressamente requerida e os elementos omitidos não tenham sido notificados ao requerente, por violação do disposto no artigo 268.°, n.°s 1 e 3 da CRP”.
Por sua vez, na conclusão 10ª, invoca a inconstitucionalidade da norma do artigo 37.°, n.° 2, do CPPT, “interpretada no sentido de que, não contendo a notificação os elementos legalmente exigidos quanto à fundamentação do acto notificado, o uso da faculdade prevista na norma apenas "suspende" o decurso dos prazos de reclamação, recursos, impugnação ou outros meios judiciais, podendo instaurar-se o processo de execução fiscal sem que ao contribuinte tenha sido entregue a certidão requerida com a fundamentação fáctico-jurídica do acto notificado ou sem que estes elementos lhe tenham sido comunicados”, por violação do disposto no mesmo artigo do texto constitucional.
Esta questão foi também tratada em recente acórdão deste Tribunal e Secção – Acórdão de 16.09.2009 – Recurso nº 611/2009. Porque se concorda com o que aí ficou decidido, transcrevemos o que ali ficou escrito, relativamente a esta matéria.
“A Administração Tributária, antes de ter emitido a certidão pretendida, instaurou o processo de execução fiscal a que a recorrente se veio, então, opor com fundamento na inexigibilidade da dívida.
Não estamos, assim, perante um caso de falta de notificação da liquidação mas apenas de falta de notificação dos fundamentos da liquidação, tendo, entretanto, sido requerida certidão dos mesmos, a qual não foi ainda emitida.
De acordo com o que preceitua o n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, em obediência ao comando constitucional estabelecido no n.º 3 do artigo 268.º da CRP, não há dúvida que os actos em matéria tributária que afectem os interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados, sendo certo que, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, as notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meio de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências.
... E, como vimos, os actos em matéria tributária que afectam os direitos e interesses legítimos dos contribuintes, para que produzam efeitos em relação a estes, devem ser-lhes notificados validamente, ou seja, contendo as notificações sempre a decisão e os seus fundamentos, nos termos do artigo 36.º do CPPT.
Daí que a falta de notificação dos fundamentos da liquidação, aquando da notificação desta ao contribuinte, não possa ser suprida pela notificação a este, em data anterior, de relatórios, pareceres ou informações dos serviços de inspecção tributária.
E, assim sendo, a notificação efectuada à ora recorrente, não contendo a respectiva fundamentação, mostra-se insuficiente.
A questão que se coloca, então, é a de saber qual a consequência de uma tal notificação.
... Alega a recorrente que, embora o artigo 37.º do CPPT admita a sanação da notificação que seja deficiente quando o contribuinte não requerer a notificação dos elementos omitidos, o certo é que no caso de ter sido requerida a notificação desses elementos inexiste essa sanação, razão por que não pode considerar-se a notificação validamente realizada, o que acarreta necessariamente a ineficácia do acto notificado e, sendo a inexigibilidade da dívida causa de oposição à execução, devia a oposição deduzida ter sido julgada procedente.
Na verdade, o artigo 268.º, n.º 3 da CRP estabelece a obrigatoriedade de os actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos serem fundamentados e a sujeição dos actos administrativos a notificação dos interessados.
E sendo obrigatória a notificação do acto, quando ele tem de ser fundamentado é obrigatória também a notificação da fundamentação, pois ela, nesses casos, faz parte do acto.
Assim, como refere Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, volume I, pág. 333, à face dessa norma constitucional, parece que a eficácia do acto que afecte direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos está dependente da sua notificação com a respectiva fundamentação e, sem tal notificação integral do acto, a notificação não será válida e, consequentemente, não será eficaz em relação ao notificado (artigos 77.º, n.º 6 da LGT e 36.º, n.º 1 do CPPT).
Nestas condições, segundo o autor citado, a interpretação constitucionalmente admissível do n.º 1 do artigo 37.º do CPPT, no que concerne à falta de fundamentação, será não a de impor que actos desse tipo tenham eficácia sem a notificação da fundamentação, mas sim a de atribuir às pessoas que devem ser notificadas e a quem foi feita uma notificação inválida uma faculdade para obter a sanação da deficiência.
Sendo certo que o Tribunal Constitucional já entendeu que a norma que faz recair sobre o interessado o ónus de requerer a notificação da fundamentação em falta do acto não viola qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente o artigo 268.º, n.º 3 da CRP, por ela não dispensar a Administração de notificar integralmente o acto administrativo ao respectivo interessado, apenas prevenindo a hipótese de tal não ter sido feito (v. Ac. do TC 245/99, de 29/4/99).
Assim, se for usada esta faculdade, e se a AT não passar a certidão requerida nem efectuar notificação dos requisitos omitidos (ainda que o interessado possa sempre utilizar o meio processual acessório de intimação para passagem de certidão para compelir a AT a passá-la, nos termos dos artigos 146.º, n.º 1 do CPPT e 104.º do CPTA), é certo que o acto notificado permanecerá ineficaz em relação ao notificado irregularmente, não decorrendo o prazo para uso do meio de impugnação administrativa ou contenciosa que pretenda utilizar.
Mas, como resulta do teor literal do n.º 2 do artigo 37.º do CPPT, o que o uso da faculdade aí prevista suspende é o decurso dos prazos de reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial.
Daí que, sendo usada essa faculdade, a notificação irregular será irrelevante para estes efeitos, mas não há suporte legal para concluir, como pretende a recorrente, que ela seja irrelevante para outros fins, designadamente, nos casos de se tratar de notificação de um acto de liquidação, para os efeitos de determinação do prazo de pagamento voluntário e de instauração da respectiva execução, nos termos dos artigos 85.º e 86.º do CPPT, se decorrer o prazo de pagamento sem que ele seja efectuado.
Isto significa que a notificação irregular não deixa de produzir efeitos para que é idónea, que é dar conhecimento ao destinatário da existência de uma decisão da AT, apenas não produzindo, se o interessado da referida faculdade, aqueles para que é inidónea, que são os de iniciar os prazos de impugnação administrativa ou contenciosa (v. Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, vol. I, pág. 337).
A interpretação assim conjugada dos preceitos legais aqui aplicáveis (artigos 36,º e 37.º do CPPT) não contraria qualquer princípio ou norma constitucional, designadamente o artigo 268.º, n.º 3 da CRP, como, de resto, o TC já se pronunciou no aresto supra citado, afirmando que tais normas não dispensam a Administração de notificar integralmente o acto administrativo ao interessado, apenas, prevenindo a hipótese de tal não ter sido feito, mandam contar o prazo para o recurso contencioso da data em que o interessado tomar, efectivamente, conhecimento da fundamentação do acto”.
Por tudo o que ficou dito, improcedem as conclusões das alegações e, em consequência, o recurso.
V. Nestes termos e pelo exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente fixando-se a procuradoria em um sexto.
Lisboa, 18 de Novembro de 2009. – Valente Torrão (relator) – Isabel Marques da Silva – Brandão de Pinho.