Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01517/07.1BEBRG-A
Data do Acordão:03/04/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P25696
Nº do Documento:SA12020030401517/07
Data de Entrada:10/23/2019
Recorrente:A...
Recorrido 1:REITOR DA UNIVERSIDADE DO MINHO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do STA:

I. RELATÓRIO
A………….. intentou, no TAF de Braga, contra a Universidade do Minho, execução da sentença proferida naquele Tribunal, confirmada pelo Tribunal Central Administrativo, pedindo que a Executada fosse condenada a prove-lo na categoria de professor associado, com efeitos a partir de 11/07/2007, com todas as consequências daí decorrentes.

O TAF, atenta a existência de causa legítima de inexecução, condenou a Executada a pagar ao Exequente, no prazo de 30 dias, uma indemnização no valor € 7.500,00.

Decisão que o TCA Norte manteve.
É desse Aresto que o Exequente recorre (artigo 150.º/1 do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. O TCA, por Acórdão de 11.02.2015, confirmou a sentença do TAF que anulou a deliberação, de 10.07.2007, do Júri do Concurso para provimento de dois lugares de Professor Associado, no grupo de ……… da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, com o fundamento daquele ter definido os critérios de selecção dos candidatos quando já tinha conhecimento dos seus elementos curriculares.
A Universidade do Minho não executou espontaneamente essa decisão o que forçou o Autor a instaurar esta execução a qual foi julgada pelo TAF do seguinte modo:
“ (…)
Entendeu o Tribunal que a aposentação do Candidato, aqui Exequente, constituiu causa legítima de inexecução, pelo que era de afastar a obrigação de reconstituição da situação hipotética actual.
Ou seja, a indemnização não resulta de um qualquer acto ilícito e culposo, isto é, de uma responsabilidade subjectiva da Administração, mas antes de um dever objectivo de indemnizar pela perda de chance no Concurso.
A perda de chance/oportunidade, pese embora um dano certo, é de difícil quantificação.
....
Daí que forçoso será recorrer a um juízo de equidade – artigo 566.º, n.º 3, do CC – para a atribuir a indemnização.
.....
Tal como foi já referido, não é possível estimar o grau de probabilidade do Exequente na obtenção de vencimento no Concurso em causa, já que o mesmo teria de ser retomado à fase da designação do júri, à fixação dos critérios a utilizar na avaliação dos factores de avaliação, seguindo-se a apresentação das candidaturas e apreciação dos curricula dos opositores ao concurso. Porém, o universo de possíveis opositores, atendendo ao tipo de concurso em discussão, seria sempre reduzido, eventualmente voltaria a ter os mesmos três opositores.
Assim, após ponderação global do exposto, inclusivamente as diferenças remuneratórias entre o que o Exequente auferia à data da deliberação do Júri do concurso como professor auxiliar e a remuneração que iria auferir como professor associado na hipótese de vir a ser graduado em lugar elegível, contabilizado até 31/12/2011 temos – à luz da jurisprudência mais recente – que uma indemnização de € 7.500,00 será adequada para indemnizar a perda de chance.
Pelos fundamentos expostos, fixa-se a indemnização devida ao Exequente em €7.500,00, a pagar no prazo de 30 dias.

O Exequente apelou para o TCA Norte mas este negou provimento ao recurso. Fê-lo numa decisão que foi assim fundamentada:
(…)
Ora, em face desta decisão anulatória do supra citado concurso, de harmonia com o disposto no artigo 173º do CPTA de 2002, caberia à Universidade reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, praticando um novo acto expurgado do vício que ditou a sua anulação, o que implicava definir de novo os critérios de selecção no Edital de abertura do concurso.
Todavia, o Exequente, ora Recorrente, está desligado do serviço por aposentação desde 01.01.2012, por motivo de invalidez, aposentação que tornou impossível dar execução ao acórdão do TCAN de 11.02.2015, como decidiu a sentença proferida em 04.11.2016, a declarar a existência de causa legítima de inexecução do julgado anulatório.
......
Com a aposentação do Recorrente deixou de ser possível repetir o acto viciado de forma a repor, sempre na medida do possível, a situação que ocorreria se não tivesse sido praticado.
Esta impossibilidade de inexecução do acto viciado não é imputável à UdM, mas à aposentação do Autor.
.....
O que importa agora analisar é acerto da decisão ora recorrida que, partindo do pressuposto já estabilizado na ordem jurídica de existir causa legítima de inexecução, fixou a indemnização face à inexecução justificada.
......
No caso concreto o Exequente, ora Recorrente deduz o seu pedido, incluindo por danos futuros, os lucros cessantes, no pressuposto, errado, de que a execução do julgado é possível e se traduz na sua colocação em 1º lugar no concurso.
Mas não é possível, não se retomando o concurso, saber em que posição ficaria o Recorrente e é indiferente, para saber os prejuízos que o próprio sofreu com a inexecução do julgado, saber quanto auferem ou poderão vir a auferir os demais candidatos, pois essa realidade deriva de factos alheios ao concurso aqui em causa, à sua anulação e à impossibilidade de execução do julgado anulatório.
Não sendo possível determinar o valor exacto dos danos resultantes da inexecução, como é o caso, o Tribunal julgará equitativamente, nos termos do disposto no artigo 566º, n.º3, do Código Civil, segundo a equidade (neste sentido, o já citado acórdão do STA de 01.10.2008, processo 042003A, e de 30.09.2009, processo 634/09; e acórdão do TCAN, de 05.11.2009, processo n.º 00978/04.5BEBRG).
No caso concreto, o Exequente, ora Recorrente, pretende que a indemnização se fixe num montante global de 117.158,66, conforme consta do parágrafo imediatamente às conclusões das alegações, por entender que este valor traduz a diferença pecuniária entre a situação que se consumou e a situação que existiria se o julgado anulatório tivesse sido executado nos termos em que entende que seria possível executar: a sua nomeação para o lugar posto a concurso e o pagamento de vencimentos no activo e depois como aposentado tendo como pressuposto essa nomeação.
Mas esse valor é infundado e manifestamente exorbitante.
Não é possível fixar o pressuposto de que o Exequente seria colocado em primeiro lugar ou sequer num dos lugares postos a concurso por não ser possível retomar o concurso.
E tanto mais que os critérios de classificação foram considerados ilegais, pela falta de fixação e divulgação atempada.
A indemnização não poderá passar, portanto, como pretende o Recorrente, ora Exequente, por essas diferenças remuneratórias que invoca, quer no activo, quer como aposentado.
Por outro lado, não se pode ficcionar que o Recorrente ora Exequente, se aposentaria em 2031, como pretende também, porque efectivamente se aposentou, por invalidez, em 01.01.2012, sendo certo que a partir desta data auferiria exactamente o que auferiu porque estaria, em todo o caso, fosse ou não promovido, impossibilitado de exercer funções.
Nada impede, no entanto, que o valor pretendido pelas diferenças salariais devidas até à data em que esteve no activo seja colocado como referência máxima para fixar a indemnização equitativa devida.
.......
No caso a hipótese de preencher um dos lugares postos a concurso é de 2 em 3, ou seja, cerca de 66%.
Temos assim de considerar os seguintes parâmetros: 1º- os 66% de hipóteses de ser provido num lugar posto a concurso; 2º - as diferenças remuneratórias contabilizadas até 31.12.2011: 9.312.61 euros.
Dentro destes parâmetros, a importância fixada pelo Tribunal recorrido mostra-se até um pouco generosa, embora, sendo esta tarefa, de fixação de uma indemnização equitativa, algo discricionária, por um lado, e porque, por outro lado, a Executada, UdM, a não pôs em causa, pelo contrário, pugnou pela sua manutenção, não se justifica alterar.
.....
Não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade nas normas aplicadas, nem na interpretação adoptada, designadamente por violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justa indemnização porque o critério seguido é igual ao seguido em situações idênticas (não sendo comparável, por exemplo, a situação do Exequente com a dos demais candidatos no concurso em apreço) e se mostra adequada, justa e proporcional a indemnização arbitrada no contexto concreto dos factos provados.”

3. O Recorrente não se conforma com essa decisão, pelo que pede a admissão desta revista para a qual formula, entre outras, as seguintes conclusões:
“..........
6. Acórdão proferido pelo Douto STA em 25.02.2009 no âmbito do processo nº 047472A em situação análoga à dos Autos: “(…) a determinação do quantum reparatório com recurso à equidade. Neste juízo, a nosso ver, a despeito da autonomia do dano, entendemos que devem ser ponderados, como referenciais de cálculo, por um lado, a vantagem económica final que a oportunidade poderia propiciar e, por outro lado, a probabilidade que o lesado teria de a alcançar.
No caso dos autos, quanto ao ganho final, temos que o mesmo ascenderia a um pouco mais de € 100.000,00. Quanto à probabilidade de o obter a entidade executada aceita que a oportunidade de sucesso perdida pela exequente é de 1/3, sendo que a interessada não alega nem prova factos dos quais resulte ser superior a probabilidade de êxito. Deste modo, o Tribunal considera equitativo atribuir ao exequente a indemnização de € 35 000,00.”(…)
7. Ora, a utilizar-se tal critério nos presentes Autos o recorrente teria direito não a € 7 500,00 mas a € 78 109,68 que corresponde a 66% de 117.158,66 – este correspondente ao ganho final.

3. No caso em apreço, estamos em sede de execução de sentença, a qual já não pode passar pela reconstituição da situação actual hipotética por ter sido reconhecida a existência de causa legítima de inexecução.
E, por isso, não tendo sido possível acordar o montante indemnizatório, as instâncias recorreram à equidade tendo fixado o valor da indemnização em 7.500 euros, atendendo a que mesmo, efectivamente se aposentou, por invalidez, em 01.01.2012, sendo certo que a partir desta data auferiria exactamente o que auferiu porque estaria, em todo o caso, fosse ou não promovido, impossibilitado de exercer funções.
Valor que o Exequente considera insuficiente por não ressarcir de forma justa os danos provocados pela impossibilidade da reconstituição da situação actual hipotética e por não ter atendido que, não fora a invalidez, se aposentaria em 2031.
Nesta conformidade, o que está em discussão é, unicamente, a questão de saber qual o montante da indemnização que se deve atribuir ao Exequente pelo facto de já não ser possível executar o julgado anulatório na forma por ele pretendida.
Este Supremo tem entendido que “Numa ação executiva de julgado anulatório em que ocorra situação de causa legítima de inexecução apenas pode ser peticionada e arbitrada indemnização dos danos "pelo facto da inexecução" e não dos danos advenientes do ato administrativo ilegal, sendo que a reparação destes deverá ser realizada na ação administrativa comum enquanto forma processual idónea e adequada para tal efeito.” - Acórdão de 7/05/2015, rec. 047307-A. No mesmo sentido podem, ainda, ver-se Acórdãos de 25/09/14 (rec. 1710/13) e de 22/02/2018 (rec. 1221/17)
O que se coaduna com o decidido no Acórdão sob censura.
Sendo assim, e sendo que não parece que a decisão recorrida tenha incorrido no erro que o Exequente lhe aponta não existe necessidade da revista para melhor aplicação do direito sendo certo, por outro lado, que não se vê qualquer elemento revelador de problemática jurídica e social importante que justifique a intervenção deste Supremo.

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 4 de Março de 2020. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – Carlos Carvalho.