Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0854/11
Data do Acordão:11/30/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
Sumário:As alterações legislativas decorrentes da Lei n.º 55-A/2010 não são aplicáveis aos processos judiciais de verificação e graduação de créditos pendentes nos Tribunais Administrativos e Fiscais em 1 de Janeiro de 2011, os quais continuam a seguir a forma processual vigente à data da sua instauração
Nº Convencional:JSTA000P13539
Nº do Documento:SA2201111300854
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1.1. O Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga interpõe recurso jurisdicional do despacho emitido no processo de verificação e graduação de créditos nº 1347/10.3BEBRG que ordenou a remessa do processo ao órgão de execução fiscal para aí ser tramitado.
Para tal, apresenta alegações onde se conclui o seguinte:
I - Os presentes autos foram instaurados a 20/9/2010, nele tendo sido ordenadas e realizadas diversas diligências com vista à prolação da decisão final, de acordo com a competência material atribuída pelo art. ° 151.°, n. ° 1, do CPPT;
II - A competência material dos tribunais administrativos e fiscais, tal como dos tribunais comuns, fixa-se no momento da propositura da acção, sendo irrelevantes as alterações de facto e de direito ocorridas posteriormente, conforme o disposto no art.º 5.° do ETAF;
III - Assim, o facto de a Lei n. ° 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que entrou em vigor a 1/1/2011, ter alterado os artigos 97°, 151°, nº 1 e 245°, nº 2 do CPPT, de modo a atribuir competência aos órgãos de execução fiscal para decidir o incidente de verificação e graduação de créditos, não poderá produzir qualquer efeito no desenrolar dos presentes autos, continuando aquela competência a caber ao tribunal administrativo e fiscal;
IV - A decisão sobre o incidente de verificação e graduação de créditos tem natureza jurisdicional, pelo que a norma do artº 126.°, da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro, na parte em que atribuiu essa competência a um órgão da administração fiscal é de duvidosa constitucionalidade, uma vez que faz perigar o princípio da igualdade de meios processuais, consagrado no art.º 98º da LGT e o princípio da equidade processual consagrado no artigo 20.°, nº 4 da CRP. Daí que, havendo dúvidas legítimas sobre a constitucionalidade da citada norma legal, no caso dos autos, a interpretação mais sensata parece ser aquela que considera competente o tribunal tributário para decidir o presente incidente de verificação e graduação de créditos, uma vez que é no tribunal que reside o poder jurisdicional;
V - Por outro lado, não constando da citada Lei qualquer norma transitória sobre essa matéria e considerando o princípio basilar do nosso sistema jurídico de que a lei só rege para o futuro e que a competência material se fixa no momento da propositura da acção, nos termos dos artigos 12.° do C Civil e 5.° do ETAF, e tendo presente que, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art.º 9.°, n.º 3 do C Civil), parece-nos que a competência do órgão de execução fiscal atribuída pelo nº 2 do art. 245.°, na redacção da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro, se aplica apenas aos processos de reclamação de créditos entrados a partir de 1/1/2011;
VI - Decidindo como decidiu, a M.ma Juiz a quo não aplicou, como devia, o disposto no artº 5.° do ETAF, e fez errada interpretação dos artigos 9º, nº 3 e 12º do C Civil, 151.º, n.º 1, 245.º, nº 2, do CPPT, 126.º e 127.º, da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro.
1.2. Não foram apresentadas contra-alegações.
1.3. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir
2. A única questão a decidir no recurso já foi apreciada pelo STA, de modo uniforme e reiterado, o que, nos temos do nº 5 do artigo 713º do CPC, justifica a fundamentação sumária da decisão.
O que está em causa é saber se perante as alterações legislativas decorrentes da Lei n.º 55-A/2010, com início de vigência em 1 de Janeiro de 2011, os Tribunais Administrativos e Fiscais devem continuar a tramitar e a proferir decisão nos processos judiciais de verificação e graduação de créditos pendentes nessa data, ou se, pelo contrário, esses processos devem ser remetidos ao órgão de execução fiscal para que seja este a proceder à sua posterior tramitação e decisão.
Face à ausência de norma transitória, surgiram divergências no entendimento relativo à aplicabilidade imediata do novo regime aos processos de verificação e graduação de créditos pendentes: a decisão recorrida, aplicando o artigo 64º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário, determinou, após trânsito, a baixa dos autos na distribuição e a remessa ao órgão de execução fiscal competente para a verificação e graduação de créditos; discorda do decidido o recorrente Ministério Público, alegando que sendo a reclamação de créditos de data anterior a 1.01.2011, a Lei nº 55-A/2010, de 31/12, não altera a competência para a verificação e graduação de créditos, que continua a ser do Tribunal Tributário, ex vi do artigo 5º do ETAF, pois que em causa norma de processo ou tramitação processual e não norma de competência, pois o órgão não foi extinto, donde inexiste alteração de competência da nova lei para os casos pendentes; o processo continua a ser judicial (de execução) e há-de ser tramitado até final em tal sede judicial.
A divergência foi solucionada em recentes Acórdãos deste Supremo Tribunal, proferidos nos recursos números 362/11 e 384/11, de 6 de Julho e números 0361/77, 0376/11, 0392/11 e 0393/11 de 13 de Julho, para cuja fundamentação se remete e cuja decisão - no sentido de que as alterações legislativas decorrentes da Lei n.º 55-A/2010 não são aplicáveis aos processos judiciais de verificação e graduação de créditos pendentes nos Tribunais Administrativos e Fiscais em 1 de Janeiro de 2011, os quais continuam a seguir a forma processual vigente à data da sua instauração -, também concordamos, uma vez que os argumentos aí considerados, em especial a aplicabilidade do nº 2 do artigo 142º do CPC e do nº 3 do artigo 12º da LGT, afastam a aplicabilidade da nova lei aos processos de verificação e graduação de créditos pendentes, o que conduz, inevitavelmente, à procedência do presente recurso.
Daí que, sem mais, haverá que conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido, baixando os autos ao tribunal “a quo” para aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar.
3. Nestes termos, e com os expostos fundamentos, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e determinar a baixa dos autos ao tribunal recorrido para prosseguimento dos autos.
Sem custas.
Lisboa, 30 de Novembro 2011. – Lino Ribeiro (relator) - Valente Torrão - Dulce Neto.