Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02782/18.4BEBRG
Data do Acordão:12/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IRS
MAIS VALIAS
Sumário:I - O artigo 46.º n.º 3 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), objetivamente, supõe, na sua previsão normativa, as situações de não existirem dúvidas sobre a realidade do imóvel construído e da respetiva responsabilidade/autoria a cargo do sujeito passivo (de IRS).
II - O legislador entendeu ser apropriado facultar uma, específica, fórmula de cálculo, do valor de aquisição, para estes casos típicos, assente no estabelecimento da necessidade, incontornável, de devida comprovação, dos custos incorridos, por parte, única e exclusivamente, do sujeito passivo/contribuinte.
III - Na falta desta devida comprovação, só o sujeito passivo pode ser, eventualmente, prejudicado, ao ponto, extremo, de, apenas, poder subsistir e ser valorado o valor do terreno (não obstante integrar o edificado).
Nº Convencional:JSTA00071349
Nº do Documento:SA22021120902782/18
Data de Entrada:10/06/2021
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO JURISDICIONAL
Objecto:SENTENÇA TAF DE BRAGA
Decisão:CONCEDE PROVIMENTO
Área Temática 1:IRS
Área Temática 2:MAIS VALIAS
Legislação Nacional:ArtigoS 10º, 44º E 46.º n.º 3 CIRS
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;


# I.

A representação da Fazenda Pública (rFP) recorre de sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga, em 30 de abril de 2021, que julgou procedente impugnação judicial, apresentada por A…………, …, contra ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), respeitante ao ano de 2014, no valor de € 26.685,71.
A recorrente (rte) produziu alegação e concluiu: «

A. Vem o presente recurso apresentado pela Fazenda Publica (FP), aqui recorrente, da douta decisão proferida pelo TAF (Tribunal Administrativo e Fiscal) de Braga, que julgou procedente a impugnação com fundamento na violação de lei por errónea quantificação da matéria tributável, considerando, para o efeito, que o valor de aquisição do imóvel, para efeitos de apuramento de mais-valias, deveria ser o de EUR 112.270,00, de harmonia com o disposto no artigo 46º do CIRS.

B. O douto Tribunal a quo alicerçou tal conclusão nos concretos factos elencados sob as alíneas G) e H) do provado na douta sentença, os quais sustentaram a fundamentação da decisão de procedência da presente impugnação judicial, conforme, o que infra se transcreve:

“(…) Reza assim o artigo 46º do CIRS na versão aplicável à data do acto impugnado:


Artigo 46.º

Valor de aquisição a título oneroso de bens imóveis


1 - No caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação do imposto municipal sobre as transações onerosas de imóveis (IMT).

2 - Não havendo lugar à liquidação de IMT, considera-se o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, determinado de harmonia com as regras próprias daquele imposto.

3 - O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele.

4 - Para efeitos do número anterior, o valor do terreno será determinado pelas regras constantes dos n.ºs 1 e 2 deste artigo. (…)

“Ora, resulta do probatório que o Impugnante adquiriu um terreno para construção pelo valor de cerca de EUR 10.000,00 e que celebrou com o B…………, S.A., contrato de mútuo no montante de EUR 135.000,00, destinado a construção de habitação no referido terreno – cfr. als. B) e C).

Mais resulta do probatório que, no âmbito de ação inspetiva desenvolvida pela Autoridade Tributária que o Impugnante efetivamente construiu a referida habitação/moradia, e que, de acordo com a plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação de EUR 112.270,00. – Cfr. als. G) e H).

Ora, ainda que o Impugnante não tenha logrado demonstrar que as faturas por si apresentadas concernem à efetiva construção do imóvel em causa, certo é que o mesmo tem existência física – como aliás é reconhecido pela AT – e que fora construído pelo Impugnante. Nesta medida, é manifesto que o valor de aquisição do imóvel não se pode reconduzir ao valor do terreno em singelo (cerca de EUR 10.0000), quando, na realidade, no mesmo fora edificada pelo Impugnante uma habitação unifamiliar constituída por cave, rés-do-chão, andar e logradouro sendo a cave destinada a garagem, arrumos e lavandaria e os pisos acima da cota de soleira a habitação, composta por hall, cozinha, sala comum, 4 quartos, 4 instalações sanitárias e 5 varandas.

Destarte, concatenado o probatório supra descrito com o disposto no art.º 46.º do CIRS resulta manifesto o erro na quantificação devendo a AT não atuar em deficit instrutório, mormente quando reconhece que, de acordo com a plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação de EUR 112.270,00.

Pelo exposto, procede a presente impugnação, anulando-se a liquidação de IRS impugnada.

C. Extrai-se, assim, da douta sentença recorrida que o Ilustre Julgador seleccionou dois concretos factos - G) e H) do provado, para dali concluir, como, aliás, concluiu, que, de harmonia com o disposto no art.º 46.º do CIRS, resultou um erro manifesto na quantificação da matéria tributável, devendo a AT não actuar em deficit instrutório, mormente quando reconhece que, de acordo com a plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação de EUR 112.270,00.

D. A Fazenda Pública, por discordar do entendimento propugnado na douta sentença recorrida pela Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, considera que, pese embora a factualidade dada por assente, mormente os concretos pontos G) e H), nos quais fundamentou a decisão recorrida, considera que inexistiu qualquer violação da lei por banda da AT, no tocante a um suposto erro de quantificação da matéria tributável.

Senão vejamos,

E. A questão controvertida no caso sub judice reporta-se ao apuramento de mais-valias imobiliárias, para efeitos da respectiva tributação a título de rendimento da categoria G do IRS, a qual resulta da diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição do bem imóvel (artigo 10.º, n.º 1, al a e n.º 4, al a do CIRS).

F. O acto de liquidação que foi objecto de impugnação apurou um montante de imposto a pagar de € 26.685,71 - Liquidação nº 2017 5005054546, com base nos valores indicados na declaração modelo 3 de IRS, do ano de 2014, sendo ela “Oficiosa” {0426-2014-D0011-49, de 2017-05-25}, em que o valor de realização era de € 140.000,00 (2014) e o valor de aquisição de € 9.499,95 (ano de 2001).

G. Incumbe referir, como ponto prévio, que o aqui impugnante, porque inconformado com a liquidação de IRS, apresentou Reclamação Graciosa (cfr. processo 0426201704000730) que mereceu decisão de indeferimento, vindo ali alegar que: “o valor de aquisição do terreno que consta da declaração modelo 3 de IRS de 2014, (EUR 9.499,95) não era o valor real do imóvel alienado, uma vez que aquele montante corresponde apenas ao valor patrimonial do terreno, pois, o reclamante construiu ali uma casa, que foi o imóvel vendido (apesar de não ter sido averbada nas Finanças nem na Conservatória do Registo Predial). Assim, o valor de aquisição a considerar deveria ser o resultante da soma do terreno com as despesas de construção no valor de € 203.280,00, ou, pelo menos, o valor real do imóvel de € 185.000,00€”. (vide facto E) do provado na sentença).

H. Com vista à instrução do processo de Reclamação Graciosa mencionado em G), foi solicitada a colaboração dos Serviços de Inspecção da Direcção de Finanças de Braga, para que, por eles, fossem prestadas as informações relacionadas com o que havia sido alegado:

confirmação da construção do imóvel e a indispensável comprovação das despesas na construção do predito imóvel, para efeitos do artigo 51º do CIRS” (cfr. facto elencado sob a alínea F) do provado).

I. Os SIT confirmaram que no terreno existia um prédio construído desde 2008 (inscrito na matriz predial urbana em 2018, sob o artigo 928), mas não foram comprovados os valores com os custos da construção do imóvel, atento a falta de documentos de suporte, vindo, assim, a ser determinado o VPT de € 112.270,00, à data da alienação (2014-07-09), resultante da aplicação do simulador SIMMI, disponível no Portal das Finanças – cfr. facto provado sob o ponto G) da sentença.

J. E assim, no caso, existe consenso entre as partes quanto ao valor de realização, que corresponde ao valor da escritura de venda celebrada em 2014 (€ 140.000,00), conforme artigo 44º, nº 1, f), do CIRS – vide facto A) do provado.

K. O objecto do litígio prende-se então, exclusivamente, com a determinação do VALOR DE AQUISIÇÃO a título oneroso, por estarmos perante um terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ......, concelho da Póvoa de Lanhoso, adquirido pelo impugnante em 14 de Novembro de 2001, pelo valor de € 9.499,95 – (vide facto B) do provado).

L. Ora, com relevo para a questão aqui em apreço avultam os seguintes factos:

a) O imóvel (terreno para construção urbana) foi adquirido pelo aqui Impugnante em 14.11.2001, inscrito na matriz predial sob o artigo ......, da freguesia de Lanhoso, foi avaliado nos termos da CA e IMSISD (contribuição Autárquica e Imposto Municipal de Sisa) ao qual foi atribuído o valor patrimonial de € 9.499,95 - cfr. ponto B) do provado na sentença.

b) O imóvel acima referido foi construído pelo próprio, tal, como o comprova a informação do SIT, dali se extraindo que a construção do imóvel iniciou no ano de 2003 (processo 13372003), com obtenção de licença de construção, emitida pela Câmara Municipal de Povoa de Lanhoso em 2004 (alvará de obras de construção nº 221/2004), tendo sido declarada apta para utilização de habitação em 2008 (cfr. alvará nº 89/2008) – cfr. facto G) do provado.

c) O SIT não conseguiu comprovar os custos/despesas com a construção do imóvel, face ao preceituado no artigo 51º, do CIRS, por, entre outros, manifesta falta de registo contabilístico, inexistência de facturas e demais suporte documental para comprovação das despesas (vide facto G) do provado).

d) O valor patrimonial definitivo do imóvel, à data da aquisição, era de € 9.499,95- cfr. facto B) do provado.

M. Assim sendo, pese embora ter sido comprovada a construção do imóvel, certo é que não foram comprovadas as despesas com os custos de construção do imóvel para que pudesse ser aplicável o disposto nos nºs 3 e 4, do artigo 46º do CIRS – cfr. facto G) do provado.

N. No que respeita à quantificação do valor de aquisição, segundo a regra do artigo 46.º, n.º 3 do CIRS, aquela deve fazer-se de acordo com o seguinte: “O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele”.

O. Quer isto dizer que o legislador, no caso em que o imóvel tenha sido construído pelo sujeito passivo, admite que o mesmo possa, para efeitos de cálculo do ganho a partir do qual se apura a mais-valia a tributar, beneficiar do maior de um dos seguintes valores: i) valor patrimonial tributário do imóvel originário (quando este seja depois objecto de reconstrução total, dando origem a um novo imóvel) ou ii) valor do terreno (calculado segundo as regras do n.º 1 e 2 do artigo 46.º do CIRS ex vi n.º 4 do mesmo artigo), acrescido do valor dos custos de construção.

P. No caso, como bem o destaca a douta sentença recorrida com base na matéria de facto dada como provada (vide Facto G), não se demonstraram nem se comprovaram os custos com a construção do imóvel.

Q. Razão pela qual o valor de aquisição não poder deixar de ser o valor apurado no momento da aquisição – seja o valor patrimonial do imóvel inscrito na matriz àquela data, seja o mesmo apurado a partir do somatório do valor do terreno e dos custos de construção –, i. e., o valor do imóvel determinado no momento em que o mesmo ingressa na titularidade do adquirente.

R. Por conseguinte, o valor de aquisição a considerar na situação vertente terá que ser determinado nos termos dos nºs 1 ou 2, por remissão do nº 4, do artigo 46º do CIRS, que considera como valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de IMT, ou, não havendo liquidação de IMT, o que lhe serviria de base.

S. De harmonia com o disposto nos nºs 1 e 2, do citado artigo 46º do CIRS, o valor de aquisição a considerar para efeitos de apuramento das mais- valias, no presente caso, é o que serviria de base à liquidação de IMT, que, no caso, foi o valor de € 9.499,95 (VPT determinado a partir da avaliação do terreno para construção, na data da respectiva inscrição matricial (2001), com as devidas actualizações.

T. Em conclusão, o valor de aquisição é fixado quando a aquisição tem lugar, não se admitindo actualizações do mesmo ao longo do tempo. A partir do momento em que ocorre a transmissão onerosa para o sujeito passivo, todas as valorizações que o imóvel alcançar – seja por intervenção do sujeito passivo através de obras de valorização, seja por factores externos à sua vontade – consubstanciam ganhos, que serão apurados e tributados a título de mais-valias no momento da respectiva realização e de acordo com os critérios legalmente estabelecidos nessa data.

U. O legislador consagrou ainda a regra de que o valor de aquisição, determinado a partir da inscrição matricial do imóvel no momento em que ele ingressa na titularidade do proprietário, pode depois ser complementado (para além da correcção monetária do artigo 50.º do CIRS, que foi aplicada pela AT) pelo disposto no segmento inicial do artigo 51.º, al a) do CIRS, quando acrescem encargos com a valorização do bem, o que não está em discussão neste caso, pois não existe qualquer comprovação relativamente à realização deste tipo de obras ou despesas.

V. Ora, a tributação das mais-valias incide, precisamente, sobre a valorização de mercado que o bem alcança ao longo do tempo em que permanece na titularidade do sujeito passivo, um valor que, enquanto ganho externo à sua actividade, constitui o facto tributário.

W. Com efeito, in casu, poder-se-á concluir que, para efeitos de apuramento das mais-valias imobiliárias, o valor de aquisição do imóvel construído pelos sujeitos passivos corresponde ao valor de inscrição matricial do imóvel quando ele ingressa na titularidade dos proprietários, a não ser que os mesmos comprovem que é superior o valor do terreno, acrescido dos custos de construção (artigo 46.º, n.º 3 do CIRS).

X. Não tendo sido feita a referida e respectiva comprovação dos custos, conforme os comandos do nº 3, do artigo 46º, conjugado com o artigo 51º do CIRS, é forçoso concluir que não tem acolhimento legal o entendimento do Tribunal a quo quando considerou que as mais-valias deveriam ser calculadas a partir da diferença entre o valor patrimonial tributário do imóvel à data da alienação e o valor pelo qual o mesmo é alienado, uma vez que não é esse o conceito legal de mais-valias.

Y. Por essa razão, é opinião da Fazenda Pública, salvo sempre o devido respeito, que a douta sentença proferida pela Mmª Juíza a quo fez uma incorrecta interpretação das normas legais e do ratio legis que a fundamentam, mormente o artigo 46º, nºs 1 e 2, por remissão do nº 4, do CIRS, incorrendo assim em erro de julgamento, devendo, por esse motivo, ser revogada, com as legais consequências.

Termos em que se peticiona o provimento do presente Recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, e, assim, Vossas Excelências farão, agora como sempre, a costumada JUSTIÇA»


*

O recorrido (rdo) formalizou contra-alegações, onde conclui: «

I- A douta sentença ora recorrida não é merecedora de qualquer censura ou reparo no que respeita ao facto de ter anulado a liquidação de IRS impugnada por considerar que se verificou uma errónea quantificação do imposto apurado oficiosamente pela Autoridade Tributária.

II- O Tribunal a quo, concluindo pela efectiva existência da construção da moradia no lote de terreno em causa (facto igualmente reconhecido pela própria AT), que a construção da mesma foi realizada pelo Recorrido (facto igualmente reconhecido pela AT) e verificando que a própria AT determinou como valor patrimonial tributário da moradia, aquando da sua alienação, o valor de 112.270,00 €, considerou ter de ser aquele o valor a considerar para efeitos de valor de aquisição e não apenas o V.P.T. do lote de terreno, como pretendido pela Autoridade Tributária.

III- Sábios Conselheiros, lamentavelmente a Autoridade Tributária, através dos presentes autos, não procura cumprir aquela que deve ser a verdadeira finalidade da mesma – a prossecução da justiça e a descoberta da verdade tributária - mas “agarrar-se à letra da lei” na tentativa de obter do Recorrido o pagamento de um imposto que não é de todo devido. O “papel” da Autoridade Tributária deveria ser mais extensivo do que um “mero cobrador de impostos”, cobrador esse que a todo e qualquer custo pretende obter o recebimento de impostos, mesmo que claramente aqueles se afigurem como indevidos. Contudo, esta é a imagem que a Autoridade Tributária deixa transparecer com a apresentação do presente recurso.

IV- A Autoridade Tributária, inexplicavelmente, continua a pretender que, no cálculo do rendimento referente às mais valias eventualmente obtidas pelo Recorrido com a alienação do imóvel melhor descrito na alínea a) dos factos dados como provados, se tenha em consideração como valor de aquisição, apenas o valor patrimonial do lote de terreno, ignorando a valorização do mesmo resultante da construção, pelo Recorrido, naquele da moradia alienada, facto este que se torna ainda mais grave, quando é a própria Autoridade Tributária que reconhece a existência da referida construção da moradia, assim como o facto da mesma ter sido construída pelo próprio Recorrido.

V- Sábios Conselheiros, foi a própria Autoridade Tributária que determinou, na aplicação SIMMI da sua plataforma informática do Portal das Finanças, que o valor patrimonial tributário da habitação alienada, aquando da alienação do imóvel, ascendia à quantia de 112.270,00 €. No entanto, não obstante tal facto pretende que o valor a considerar, para efeitos de cálculo de imposto devido a título de mais-valias pelo Recorrido ascenda apenas ao V.P.T. do terreno (9.499,95 €).

VI- Lamentavelmente, a Autoridade Tributária, ao invés de procurar alcançar a verdade e a justiça tributária, procura através de “subterfúgios” sustentados na interpretação restritiva que faz da lei lograr obter do Recorrido um imposto, determinado e calculado oficiosamente por aquela, que a mesma bem sabe e não pode ignorar, não ser devido.

VII- Nos presentes autos, veio o Recorrido intentar a competente impugnação judicial, pugnando pela anulação do acto de liquidação de Imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) nº 2017 500054546, relativa ao ano de 2014, no valor de EUR 26.685,71, por entre outros argumentos, entender que a Autoridade Tributária fez uma errada quantificação do imposto apurado em sede de mais valias, pois, como considerou, para efeitos de apuramento oficioso de tal imposto, como valor de aquisição o V.P.T. apenas do terreno (lote de construção) no montante de 9.499,95 €, ignorando, totalmente, a construção da moradia que o Recorrido nele edificou e que a própria Autoridade Tributária reconhece existir e ter sido construída por aquele.

VIII- Por entender que assistia razão ao Recorrido no entendimento por aquele perfilhado, o Tribunal a quo, através da douta sentença recorrida decidiu no sentido de julgar procedente a presente impugnação judicial, anulando-se a liquidação de IRS impugnada por aquele por ter considerado, em suma que:

Destarte, concatenando o probatório supra descrito com o disposto no artº 46º do CIRS resulta manifesto o erro na quantificação devendo a AT não atuar em deficit instrutório, mormente quando reconhece que, de acordo com a plataforma informática Portal das finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação de ERU 112.270,00.

IX- A Autoridade Tributária, vem agora, recorrer da douta decisão em causa, alegando em suma que, no caso concreto, a mesma não incorreu em nenhum erro na aplicação da lei quando determinou que o valor de aquisição, para efeitos de cálculo do imposto devido pelo Recorrido, deveria cingir-se ao valor patrimonial tributário do lote de terreno, com total desvalor pela construção da moradia que reconhecidamente confessa que o Recorrido construiu no aludido lote. Salvo o devido respeito, entendemos que não assiste razão nos argumentos invocados pela mesma.

X- A Autoridade Tributária não impugnou a matéria de facto dada como provada e não provada em sede de sentença recorrida, motivo pelo qual aceitou aquela nos exactos termos em que fora proferida.

XI- Do nº 3 do artigo 46º do CIRS resulta que no caso de se estar perante imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos, como é o caso em apreço nos autos, o valor de aquisição, para efeitos de apuramento do imposto devido a título de mais-valias, ou é o valor patrimonial ou o valor do terreno, acrescido de custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele.

XII- No caso em concreto, o Tribunal a quo, atenta a prova produzida e carreada para os presentes autos, deu como provados, com relevo para a decisão da causa os seguintes factos: - que o Recorrido adquiriu o terreno para construção pelo valor de 10.000,00 € - alínea b) da matéria de facto dada como provada; - que o Recorrido celebrou com o B………… um contrato de mútuo no valor de 135.000,00 € destinado à construção da habitação no referido terreno – alínea c) da matéria de facto dada como provada; - que o Recorrido efectivamente construiu a referida moradia no lote de terreno em causa; - alíneas g) e h) da matéria de facto dada como provada e - que a Autoridade Tributária na plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação, o valor de 112.270,00 € - alíneas g) e h) da matéria de facto dada como provada.

XIII- Perante esta factualidade dada como provada, o Tribunal a quo, entendeu e bem que a Autoridade Tributária não poderia, como erradamente fez, ignorar a construção no lote de terreno da moradia edificada pelo Recorrido.

XIV- Como o próprio Tribunal a quo, entendeu, ainda que se considere que o Recorrido não tenha logrado provar que as facturas por si juntas aos autos concernem à efectiva construção do imóvel em causa (o que não se admite e apenas por mera hipótese teórica se coloca), é inegável que a construção tem existência física, foi edificada pelo Recorrido, factos esses confessadamente reconhecidos pela própria Autoridade Tributária.

XV- A estes factos acrescem a circunstância de a própria Autoridade Tributária ter, por referência à data da alienação do imóvel identificado em a) da matéria de facto dada como provada, ter atribuído o valor patrimonial tributário da habitação em causa em 112.270,00 €.

XVI- Sábios Conselheiros, a mesma Autoridade Tributária que procedeu à inspecção e elaborou o processo instrutor junto aos autos e consequentemente determinou que o valor de aquisição da moradia transmitida em 2014-07-09, de acordo como o seu valor patrimonial tributário, perfaz a importância de 112.270,00 €, precisamente por considerar que o valor conhecido era o valor patrimonial do terreno e que tal não correspondia à realidade dos factos (e como tal não deveria ser esse o atendido para apuramento do imposto) é a mesma Autoridade que, procedeu à liquidação do imposto imputado ao Recorrido tendo em consideração como valor de aquisição o V.P.T. do terreno e que agora pugna pela incorrecção da decisão recorrida precisamente porque a mesma considerou que o valor de aquisição deveria ser o por ela apurado no processo instrutor - 112.270,00 € e não o V.P.T. do terreno em singelo.

XVII- Além de carecer de total fundamento o entendimento defendido pela Autoridade Tributária nas suas motivações de que, não obstante reconhecer que a construção da moradia no lote de terreno existe e foi levada a cabo pelo Recorrido, deve ser atendido como valor de aquisição apenas o V.P.T. do lote de terreno em singelo, quando a própria, em sede do processo de inspecção junto aos autos, apurou que o valor de aquisição deveria ser o de 112.270,00 € por ser o V.P.T. da moradia à data da alienação e não o V.P.T. do terreno por não corresponder à realidade dos factos, o mesmo consubstancia um manifesto abuso de direito por parte da Autoridade Tributária, facto que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.

XVIII- É inexplicável como é que a própria, que considerou no âmbito da inspecção que levou a cabo, precisamente, para apurar o valor do imposto devido pelo Recorrido a título de mais-valias devido à alienação do imóvel descrito na alínea A) da matéria de facto dada como provada, que o V.P.T. da moradia ascendia a 112.270,00 € e que deveria ser esse o valor a ter em consideração como valor de aquisição para efeitos do disposto no nº 3 do artigo 46º do CIRS, e agora que o Tribunal a quo na sentença recorrida decidiu exatamente nesse sentido, venha a mesma interpor o presente recurso, alegando que, em sede de liquidação oficiosa do imposto, deveria ser considerado como valor de aquisição, o V.P.T. do terreno em singelo, sabendo confessadamente que tal valor não corresponde de todo à realidade dos factos.

XIX- Com o devido respeito por opinião diversa, Sábios Conselheiros, o Recorrido não consegue entender este comportamento da Autoridade Tributária e muito menos compreender como é que a mesma, não obstante o supra exposto, não mostre qualquer pejo em apresentar o presente recurso, com as motivações que invoca, quando a sentença recorrida, no fundo, se limitou a confirmar as conclusões que a própria Autoridade Tributária retirou no âmbito do processo instrutor junto aos autos e o qual esteve precisamente na origem da liquidação impugnada.

XX- Assim sendo e sem mais considerandos, a decisão recorrida ao ter considerado que, no caso concreto, o valor de aquisição determinado para efeitos do nº 3 do artigo 46º do CIRS deveria corresponder ao V.P.T. da moradia construída pelo Recorrido e que, à data da alienação, porque determinado pela própria AT com recurso à aplicação SIMMI, tal V.P.T. se cifrava no valor de 112.270,00 €, não incorreu em qualquer erro ou imprecisão, sendo a mesma de uma lisura irrepreensível, pelo que deve ser mantida nos exactos termos em que fora proferida.

XXI- Não obstante ainda que assim não se entendesse, o que não se admite e apenas por mera hipótese teórica se coloca, sempre se deixará alegado que não assistia fundamento nos argumentos invocados pela Autoridade Tributária no recurso por si interposto.

XXII- Foi dado como provado em sede de matéria de facto dada como provada na sentença Recorrida que o Recorrido comprou o lote de terreno, pelo preço de 10.000,00 €, que naquele lote de terreno edificou uma moradia e que para conclusão da mesma, contraiu junto do B…………, um contrato de mútuo precisamente para terminar a sua conclusão, no valor de 135.000,00 € - Ver alíneas A), B), C), G) e H) da matéria de facto dada como provada.

XXIII- Além do montante do empréstimo em causa, o Recorrido ainda despendeu de quantias que possuía a título de poupanças, sendo que para a construção do referido imóvel o mesmo despendeu a quantia global de cerca de 203.280,00 €, tituladas pelas facturas dos pagamentos serviços e obras de construção do imóvel em causa juntas como documentos nºs 10 a 19, nas quais consta a seguinte indicação: “Continuação dos trabalhos na vossa vivenda em Lanhoso – lote .......” e “Iniciação dos trabalhos na vossa vivenda em Lanhoso- lote ......”, o que denota que as mesmas se reportam ao pagamento de serviços e material aplicado na construção da moradia em causa.

XXIV- As facturas em causa foram aceites pela Autoridade Tributária e em momento algum impugnada a sua existência e veracidade, pelo que, o Recorrido, comprovadamente, na construção do imóvel alienado despendeu a quantia de 213.280,00 € (valor de aquisição do terreno + valor das obras de construção da moradia).

XXV- A Autoridade Tributária, ao não ter considerado como valor de aquisição o V.P.T. da habitação apurado pela própria, teria pelo menos, que no apuramento do imposto atender não somente o valor da venda do imóvel, mas também o valor referente ao custo de aquisição do terreno onde foi construído o mesmo, bem como o valor inerente aos encargos e despesas com a sua construção. Cfr. alíneas a),b),c), g) e h) da matéria de facto dada como provada e documentos nºs 10 a 19 juntos com a P.I.

XXVI- Se a Autoridade Tributária tivesse em consideração tais valores, tal como deveria nos termos do disposto no artigo supra citado, teria determinado que, no caso concreto, não se estaria perante uma situação de mais-valias, uma vez que, enquanto que o valor da venda foi de 140.000,00 €, os custos de construção acrescidos do valor do terreno resultaram num total de 213.280,00 €, não havendo lugar ao pagamento de qualquer imposto pelo Recorrido, pelo que, mesmo perante esta circunstância, a liquidação impugnada porque sustentada numa errada quantificação do rendimento, teria que ser anulada, facto que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.

XXVII- Acresce que, para efeitos de avaliação em sede de processo de insolvência, o imóvel em causa foi sujeito a uma avaliação pelo Montepio tendo aquele determinado que o valor real, patrimonial e de mercado do imóvel em causa era de 185.000,00 €. Ver documento nº 2 (documentos nºs 8 e 9 junto àquele).

XXVIII- A Autoridade Tributária ao pretender que, para efeitos do cálculo do valor do imposto devido a título de mais-valias, o valor de aquisição se cinja ao V.P.T. do lote de terreno bem sabe e não pode ignorar que tal valor não traduz a realidade dos factos e não se traduzirá na determinação de um valor justamente determinado.

XXIX- Tendo em conta que o Montepio, entidade bancária credível, efectuou a avaliação do imóvel edificado no referido lote de terreno, atribuindo-lhe um valor real, patrimonial e de mercado de 185.000,00 € e tendo a Autoridade Tributária conhecimento de tal facto, deveria, para efeito de imposto devido a titulo de mais-valias pela venda do imóvel em questão sempre ser tido em conta o seu valor real de € 185.000,00 e não o V.P.T. do terreno, em singelo, tal como agora defende, pelo que, também perante esta circunstância, a liquidação impugnada porque sustentada numa errada quantificação do rendimento, teria que ser anulada, facto que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.

XXX- Ainda que nenhum dos argumentos anteriores merecesse o devido provimento, o que não se admite de todo e apenas por mera hipótese teórica se coloca, sempre, atenta a matéria de facto dada como provada nos presentes autos, teriam que improceder os argumentos invocados pela Autoridade Tributária.

XXXI- No caso concreto, ainda que a Autoridade Tributária entendesse que não poderia considerar como valor de aquisição, o V.P.T. da moradia no montante de 12.270,00 € (valor que a própria determinou), o que não se admite, SEMPRE a mesma teria que considerar como valor de aquisição, o valor do terreno acrescido dos custos de construção.

XXXII- Atenta a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, é inegável que o Recorrido construiu a moradia no terreno em causa, que a mesma foi concluída no ano de 2008 e que o mesmo celebrou com o B…………, para a conclusão da referida moradia, o contrato de mútuo no valor de 135.000,00 €.

XXXIII- O contrato de mútuo foi celebrado por escritura pública que goza de força probatória plena, pelo que, ainda que a Autoridade Tributária considerasse que o Recorrido não logrou provar que as facturas que juntou se destinaram ao pagamento de serviços e materiais aplicados na construção da moradia, tinha sempre que considerar como custo de construção, o valor de 135.000,00 € resultante do mútuo celebrado precisamente para esse efeito.

XXXIV- Ainda que a Autoridade Tributária entendesse que, no apuramento do valor do imposto devido, não poderia considerar como valor de aquisição o V.P.T. da moradia o valor determinado pela própria (112.270,00 €) sempre teria que considerar, atenta a factualidade dada como provada e a qual foi aceite por aquele (que não a impugnou) teria que considerar como valor de aquisição a quantia de 145.000,00 € (valor do terreno (10.000,00 €) + custos de construção (135.000,00 €), pelo que, tendo a moradia sido vendida por 140.000,00 €, no caso em apreço resultaria a inexistência de qualquer imposto a pagar pelo Recorrido, motivo pelo qual, também perante esta circunstancia, os argumentos invocados pela Autoridade Tributária no seu recurso teriam que improceder.

NESTES TERMOS,

deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida de acordo com as precedentes conclusões, como é de elementar justiça!!! »


*

A Exma. Procuradora-geral-adjunta emitiu parecer, no sentido de que deve ser concedido provimento ao recurso.

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Cumpridas as formalidades legais, cabidas, compete-nos decidir.

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# II.

Na sentença recorrida, em sede de julgamento factual, consta: «

A) Em 09/07/2014, na sequência do processo de insolvência n.º 77/13.9TBPVL, que correu termos no Tribunal Judicial de Póvoa de Lanhoso – Secção Única, foi celebrada escritura de compra e venda através da qual foi vendido pelo Administrador de Insolvência do Impugnante ao Banco Caixa Económica Montepio Geral, o prédio urbano composto por parcela de terreno para construção, situado no Lugar de ………, freguesia de Lanhoso, conselho da Póvoa de Lanhoso, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...... e descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Lanhoso sob o n.º ………, pelo preço de EUR 140.000,00 – cfr. fls. docs. 3 e 4 juntos com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

B) O prédio referido em A) foi adquirido pelo Impugnante em 14/11/2001 pelo valor de cerca de EUR 10.000,00 (dez milhões de escudos) – cfr. doc. 5 junto com a petição inicial e ponto 36 da pi, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

C) Em 27/02/2008, o Impugnante celebrou com o B…………, S.A., contrato de mútuo no montante de EUR 135.000,00, destinado a construção de habitação no prédio identificado em A) – cfr. doc. 7 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

D) No âmbito da aquisição referida em A), foi emitida, em nome do Impugnante, a liquidação de IRS n.º 2017 00005352926, no valor de EUR 26.85,71 com data limite de pagamento em 26/07/2017 e a liquidação dos respetivos juros compensatórios – cfr. docs. 1 e 2 juntos com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

E) Tendo sido notificado das liquidações referidas em D), o Impugnante apresentou reclamação graciosa junto da Direção de Finanças de Braga cujo procedimento foi aberto em 07/08/2017 – facto não controvertido e processo administrativo instrutor constante do suporte físico dos autos, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

F) No âmbito do procedimento de reclamação graciosa referido em E) foi elaborada a comunicação interna n.º 700421 pela Direção de Finanças de Braga, datada de 13/09/2017, da qual consta, entre o mais o seguinte: “(…)

A…………, contribuinte n.° ………, com domicílio fiscal na Rua da ………, ……, 4830-…… SERZEDELO PVL, reclamou da liquidação de IRS/2014.

O contribuinte reclama da tributação da mais-valia gerada pela alienação de um imóvel (artigo ...... da freguesia de Lanhoso, concelho de Póvoa de Lanhoso - 030915).

Entre outros argumentos o reclamante vem alegar que o valor de aquisição (€ 9.499,95) corresponde ao VPT do terreno para construção, mas que o prédio alienado (€ 140.000,00) consiste numa casa que construiu no terreno, pelo que o custo da edificação deve ser tido em conta. Junta comprovativos do alegado (faturas e fotografias).

Ora, tanto o documento de compra e venda como a inscrição matricial descrevem o bem como “terreno para construção".

Para a análise do mérito do pedido é necessária a intervenção dos serviços de inspeção, para a verificação dos factos invocados, nomeadamente:

- Confirmação de que foi construída uma habitação no terreno e, no caso de se confirmar,

- Recolha dos elementos para a avaliação do prédio edificado e alteração matricial;

- Idoneidade das faturas comprovativas das despesas de construção;

- Outras informações que se considere relevantes para a apreciação do pedido.

Nestes termos, remeta-se o processo à Divisão de Inspeção Tributária, para informação sobre o pedido.

(…)” – cfr. fls. 75 do processo administrativo instrutor constante do suporte físico dos autos, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

G) Em 20/06/2018, foi elaborada informação pela Divisão de Inspeção Tributária III – Equipa 34, da Direção de Finanças de Braga, da qual consta, entre o mais o seguinte:

(…)

I - 2. MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL

Motivo - A presente ação inspetiva com o código do plano nacional de actividade da Inspeção Tributária e Aduaneira (PNAITA) 2222210701 foi iniciada na sequência do despacho proferido pelo Exmo. Senhor Chefe de Divisão de Justiça Tributária, visando os esclarecimentos necessários à análise e consequente decisão sobre o processo de reclamação graciosa nº 0426201704000730, em que é reclamante o sujeito passivo A………… NIPC ……… através da comunicação interna n.º 700421, de 2017-09-13.

Âmbito e incidência temporal - Ação inspetiva de âmbito parcial, em sede de imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) e extensão ao exercido de 2014, nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 14.º, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA).

(…)

I.3.2. - Fundamentos da reclamação graciosa

O sujeito passivo foi notificado da demonstração de liquidação de IRS n.º 201700005352926, datada de 2017-06-09, respeitante ao ano 2014.

Dessa notificação, assiste-lhe o direito de reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos no artigo 140.º do Código do IRS (Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Singulares) e nos artigos 70.º e 102.º do CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário).

Em 2017-08-07, o sujeito passivo, apresentou a reclamação graciosa n.º 0426201704000730, onde reclama da tributação da mais-valia gerada pela alienação de um imóvel (artigo ...... da freguesia de Lanhoso, concelho de Póvoa de Lanhoso).

(…)

I.3.5. - Descrição da Matéria de Facto, Análise e Conclusões

Tanto, o documento de compra e venda como a inscrição matricial descrevem o bem como "terreno para construção”.

Para a análise do mérito do pedido foi solicitada a intervenção dos serviços de inspeção, para a verificação dos factos invocados, nomeadamente:

1. Confirmação de que foi construída uma habitação no terreno e, no caso de se confirmar,

2. Recolha dos elementos para a avaliação do prédio edificado e alteração matricial;

3. Idoneidade das faturas comprovativas das despesas de construção;

(…)

4. Outras informações que se considere relevantes para a apreciação do pedido.

Dentro do que nos foi possível apurar, confirma-se que no terreno para construção em causa, foi efetivamente construída uma habitação unifamiliar constituída por cave, r/c, andar e logradouro. A cave destina-se a garagem, arrumos e lavandaria e os pisos acima da cota de soleira destinam-se a habitação, composta por hall, cozinha, sala comum, 4 quartos, 4 instalações sanitárias e 5 varandas.

Quanto a elementos complementares, como sistemas de climatização não conseguimos recolher qualquer prova que indicie a existências dos mesmos.

Quanto à idoneidade das faturas comprovativas das despesas de construção, conseguimos recolher além das faturas apresentadas pelo sujeito passivo anexas à reclamação graciosa, mais duas faturas (fatura nº 2006033, de 15-06-2007 no valor de 18.150,00€ e fatura nº 2006082, de 26-05-2008, no valor de 30.250,00€), 6 recibos, o orçamento da obra e as plantas/projeto do imóvel, licença de construção, licença de habitação e certidão de registo.

Não foi possível recolher mais elementos contabilísticos corroborativos da idoneidade das faturas, uma vez que a empresa construtora já se encontra liquidada desde 03-07-2015, o contabilista certificado também já cessou a atividade e atualmente é residente em França. Parte da documentação fiscal e contabilista da empresa ficou com o contabilista e outra ficou retida no imóvel penhorado.

(…)

No entanto face aos elementos recolhidos junto da Câmara Municipal da Povoa de Lanhoso, podemos verificar que o processo de obras foi iniciado no ano 2003 (processo n.º 13372003), que o reclamante obteve licença para construção em 2004 (alvará de obras de construção n.º 221/2004), sendo a moradia dada como apta para utilização como habitação em 2008 (alvará de autorização de utilização n. 89/08).

Assim, e também considerando os elementos carreados para o processo de reclamação graciosa pelo reclamante, como fotografias da moradia, tiradas pelo Banco Montepio Geral, aquando da avaliação do prédio, para efeitos de proposta que efetuou, sendo-lhe adjudicado o imóvel em causa, no processo de insolvência do reclamante, podemos concluir que a moradia à data da transmissão que gerou a mais-valia em IRS aqui em discussão, de facto existia, era uma realidade.

Assim, teve de haver um processo construtivo que levou à verificação por parte da autoridade municipal (processo de vistoria n.º 87/08), da condição de prédio apto para o fim que foi produzido, habitação, em 2008-06-27.

Contudo nem o reclamante, com os elementos que dispôs no processo de reclamação, nem a inspeção, com a atuação mais diligente possível, apenas reuniram faturas de serviços de construção emitidas em 2007 e 2008 (as faturas referem trabalhos na obra em Lanhoso, no lote ……), balanço do ano 2005 e balancetes do ano 2006, que descrevem obras em curso, mas não têm suporte em registo contabilístico na invocada empresa construtora A………… UNIPESSOAL LDA. NIF ………, não existindo peças contabilísticas de registo, da produção em curso, nos anos 2007, 2008, anos de construção, e mesmo nos balancetes dos anos 2015 e 2006, que o reclamante facultou de abertura, nem sequer figura como cliente naquelas peças da contabilidade da referida sociedade dita como construtora.

O reclamante, sócio e gerente da sociedade que é invocada como empreiteiro na obra do prédio, cuja mais-valia em IRS, originada pela transmissão em 2014, aqui se discute, não logrou juntar ao processo prova de pagamento das faturas, como cópia de cheques, de transferências bancárias, nem sequer recibos de quitação para todas as faturas emitidas em nome da referida sociedade nos anos 2007 e 2008, para além dos balancetes que aquele remeteu, não constar como cliente da sociedade emitente.

Assim, as insuficiências reveladas pelos parcos elementos trazidos ao processo de reclamação graciosa, como falta de registos contabilísticos, falta de comprovativos de pagamento, descrições genéricas mencionadas nas faturas como «Continuação dos trabalhos na vossa vivenda em Lanhoso lote …… Póvoa de Lanhoso», sem especificação dos trabalhos e materiais em concreto realizados e empregues, que deviam ser completados com atos de mediação de obas, impossibilitam comprovar devidamente e determinar o valor efetivo dos custos com a construção da moradia do lote …….

(…)

Face à impossibilidade da determinação do valor de aquisição, partindo do valor do terreno, adicionando os custos de construção, porque o reclamante, não conseguiu comprova-los documentalmente, deve ser utilizado para valor de aquisição, que deve ser levado ao quadro 4 do anexo G, o valor patrimonial tributável inscrito na matriz, para a moradia do lote …….

Não podemos ter o seu valor patrimonial tributário definitivo, à data da alienação, já que nesta data, bem como à data atual, não está determinado, porque a construção não foi objeto de participação ao Serviço de Finanças, como o obriga a alínea d), nº 1 do art.º 13.º do CMI, o que é conhecido é o valor patrimonial do terreno para construção, que não é a mesma realidade.

No entanto, a AT disponibiliza através da plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário, a partir do qual se determina aquele valor de 112.270,00 Eur, conforme informação anexa, reportado à data da alienação 2014-07-09.

Deste modo, o valor de aquisição da moradia transmitida em 2014-07-09, de acordo com o seu valor patrimonial tributário, perfaz a importância de 112.270,00 Eur.

(…)

[Imagem]

(…)” – cfr. fls. 80/83v do processo administrativo instrutor constante do suporte físico dos autos, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

H) Em 16/08/2018, foi elaborado Projeto n.º M700.155 pela Direção de Finanças de Braga, Divisão de Justiça Tributária, do qual consta, entre o mais o seguinte: “(…)

Os serviços de inspeção confirmaram que no terreno existe um prédio construído desde 2008 (inscrito em 2018 na matriz, sob o artigo ……).

Quanto a este ponto, o Código do IRS dispõe, no seu art.° 46º, n.° 2, que "O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele". Como o prédio vendido não tinha valor patrimonial inscrito na matriz (ainda estava inscrito como terreno para construção), o valor de aquisição terá de ser encontrado na soma do valor (patrimonial) do terreno (€ 9.499,95) com os custos de construção comprovados. Ora, os serviços de inspeção informaram também que: "... nem o reclamante, com os elementos que dispôs no processo de reclamação, nem a inspeção, com a atuação mais diligente possível, reuniram faturas [para além] de serviços de construção emitidas em 2007 e 2008 (as faturas referem trabalhos na obra em Lanhoso, no lote ……), balanço do ano 2005 e balancetes do ano 2006, que descrevem obras em curso, mas não têm suporte em registo contabilístico na invocada empresa construtora A………… UNIPESSOAL LDA, NIF ………, não existindo peças contabilísticas de registo, da produção em curso, nos anos 2007, 2008, anos de construção, e mesmo nos balancetes dos anos 2005 e 2006, que o reclamante facultou de abertura, nem sequer figura como cliente naquelas peças da contabilidade da referida sociedade dita como construtora. O reclamante, sócio e gerente da sociedade que é invocada como empreiteiro na obra do prédio, cuja mais-valia em IRS, originada pela transmissão em 2014, aqui se discute, não logrou juntar ao processo prova de pagamento das faturas, como cópia de cheques de transferências bancárias, nem sequer recibos de quitação para todas as faturas emitidas em nome da referida sociedade nos anos 2007 e 2008, para além dos balancetes que aquele remeteu, não constar como cliente da

(…)” – cfr. fls. 87/88v do processo administrativo instrutor constante do suporte físico dos auto, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

I) Em 03/09/2018, foi proferido despacho de indeferimento pelo Chefe de Divisão com competências delegadas da Direção de Finanças de Braga, da reclamação referida em E), a qual foi notificada ao Impugnante – cfr. fls. 87/88v do processo administrativo instrutor constante do suporte físico dos autos, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido e ponto 1 da petição inicial;»


***

A matéria que enforma a discussão, neste recurso, relaciona-se com a temática, geral, da tributação, em IRS, das mais-valias (rendimentos da Categoria G - Incrementos patrimoniais), no âmbito da alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis, e, especificamente, circunscreve-se ao aspeto da determinação do “valor de aquisição”, enquanto parcela, necessária, do cálculo da, central, determinante, diferença/saldo entre o “valor de realização” e aquele, cujo resultado constituirá a expressão, quantitativa, das mais-valias (ou menos-valias), casuisticamente, apuradas – cf. arts. 10.º n.º 1 alínea (al.) a), n.º 4 al. a), 44.º e 46.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).

Na situação julganda, mais restritamente, disputa-se a identificação/apuramento do valor de aquisição respeitante a imóvel construído pelo próprio sujeito passivo.

O STA já disse e repetiu (Entre outros, nos acórdãos de 1 de julho de 2020 (315/14.0BEFUN) e de 17 de fevereiro de 2021 (1449/11.9BELRS).), que “a quantificação do valor de aquisição, segundo a regra do artigo 46.º, n.º 3 do CIRS, deve fazer-se de acordo com o seguinte: “[O] valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele”. Quer isto dizer que o legislador, no caso em que o imóvel tenha sido construído pelo sujeito passivo, admite que o mesmo possa, para efeitos de cálculo do ganho a partir do qual se apura a mais-valia a tributar, beneficiar do maior de um dos seguintes valores: i) valor patrimonial tributário do imóvel originário (quando este seja depois objecto de reconstrução total, dando origem a um novo imóvel) ou ii) valor do terreno (calculado segundo as regras do n.º 1 e 2 do artigo 46.º do CIRS ex vi n.º 4 do mesmo artigo), acrescido do valor dos custos de construção.

(…).

O que o valor de aquisição não pode deixar de ser, …, é o valor apurado no momento da aquisição – seja o valor patrimonial do imóvel inscrito na matriz àquela data, seja o mesmo apurado a partir do somatório do valor do terreno e dos custos de construção –, i. e., o valor do imóvel determinado no momento em que o mesmo ingressa na titularidade do adquirente (…).

Em suma, o valor de aquisição é fixado quando a aquisição tem lugar, não se admitindo actualizações do mesmo ao longo do tempo. A partir do momento em que ocorre a transmissão onerosa para o sujeito passivo, todas as valorizações que o imóvel alcançar – seja por intervenção do sujeito passivo através de obras de valorização, seja por factores externos à sua vontade – consubstanciam ganhos, que serão apurados e tributados a título de mais-valias no momento da respectiva realização e de acordo com os critérios legalmente estabelecidos nessa data.

O legislador consagrou ainda a regra de que o valor de aquisição, determinado a partir da inscrição matricial do imóvel no momento em que ele ingressa na titularidade do proprietário, pode depois ser complementado (para além da correcção monetária do artigo 50.º do CIRS, que foi aplicada pela AT) pelo disposto no segmento inicial do artigo 51.º, al a) do CIRS, quando acrescem encargos com a valorização do bem, … .

Em suma, a tributação das mais-valias incide, precisamente, sobre a valorização de mercado que o bem alcança ao longo do tempo em que permanece na titularidade do sujeito passivo, um valor que, enquanto ganho externo à sua actividade, constitui o facto tributário.”.

Coligida esta orientação jurisprudencial, importa, então, avaliar o sentido do julgado em 1.ª instância, na peugada, sobretudo, do apontamento, pela rte, de erro, com os contornos decorrentes do conteúdo da conclusão B. (da sua alegação). Doutro modo, cabe-nos aquilatar da correção (ou não) do entendimento em que, fundamental e exclusivamente, assentou a decisão de julgar procedente a presente impugnação judicial, traduzido nesta, precisa, conclusão: «Destarte, concatenado o probatório supra descrito com o disposto no art.º 46.º do CIRS resulta manifesto o erro na quantificação devendo a AT não atuar em deficit instrutório, mormente quando reconhece que, de acordo com a plataforma informática Portal das Finanças, na aplicação SIMMI, o simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação simulador do valor patrimonial tributário, atribuiu o valor patrimonial tributário à referida habitação, à data da alienação de EUR 112.270,00.»

O mero confronto, das literalidades desta conclusiva e perentória pronúncia e do conteúdo normativo do art. 46.º, em particular, do respetivo n.º 3 do CIRS, é suficiente para se firmar a perceção do cometimento de, evidente, errado julgamento.

Efetivamente, em função da matéria de facto julgada provada, sem oposição, pelo tribunal recorrido, bem como, não havendo divergências quanto a isso, a situação sob análise mostra-se, plena e perfeitamente, enquadrável na previsão do aludido art. 46.º n.º 3 do CIRS, que, como vimos, trata da quantificação do valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos (como sucedeu com o impugnante, nestes autos) e estabelece, sem espaço para tergiversações, que ele corresponde, é igual:

- ao valor patrimonial inscrito na matriz;

- ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior ao valor matricial.

Não ocorrendo, in casu, a primeira variável, ou seja, não se tratando de uma situação em que já existia um imóvel (prédio para habitação), posteriormente, na totalidade, reconstruído pelo impugnante, mas, sendo a realidade a da, prévia, existência de uma parcela de terreno para construção, onde este edificou uma moradia (habitação unifamiliar), o procurado e conflituoso valor de aquisição tem de ser, por imposição legal, correspondente ao valor desse terreno, com a adição dos custos da construção do edificado, “devidamente comprovados”.

Ora, sem prejuízo de o versado normativo não identificar a quem cabe o ónus desta, incontornável, imprescindível, comprovação, isto é, o ónus da prova da efetiva realização/assunção e pagamento dos competentes custos/gastos, o art. 74.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) estabelece, transversalmente, que ele recai, no procedimento e/ou no processo tributário, sobre, com as devidas adaptações, o autor da invocação desses custos com havida construção; incontornavelmente, o contribuinte/sujeito passivo.

Assim sendo, ao invés do defendido na sentença recorrida, o concluído e afirmado “deficit instrutório” reside, objetivamente, do lado do impugnante e não da autoridade tributária e aduaneira (AT), porquanto, como naquela, expressamente, se assume, o primeiro não logrou “demonstrar que as faturas por si apresentadas concernem à efetiva construção do imóvel em causa, …”. Por outras palavras, impendendo, por força da lei aplicável, sobre o impugnante, tanto na reclamação graciosa (que acionou), como nesta, sequente, impugnação judicial, a obrigação, exclusiva, de coligir e provar os custos, efetivamente, suportados com a construção da, dita, habitação unifamiliar, no, previamente, existente e declarado na matriz, terreno para construção, inexiste justificativo para que, não o tendo feito em nenhuma medida, se transfira tal ónus para a AT, impelida, então, a encontrar e valorar um valor, correspondente/respeitante à construção no mesmo levada a cabo.

E, assim tem de ser, mesmo que a solução cause alguma incompreensão (como parece ter sucedido com o tribunal recorrido), quando se sabe que, realmente, na inicial parcela de terreno para construção, foi implantado um edifício e que, no momento da alienação, apesar de ter sido transmitida aquela parcela (Alínea A) dos factos provados.), por consubstanciar, à data, a única realidade jurídico-tributária (matricial), tal transmissão haver englobado a construção, aí, implantada, pelo impugnante.

O aplicável art. 46.º n.º 3 do CIRS, objetivamente, supõe, na sua previsão normativa, as situações, como a julganda, de não existirem dúvidas sobre a realidade do imóvel construído (“existência física”, avançada na sentença) e da respetiva responsabilidade/autoria a cargo do sujeito passivo (de IRS). E, por serem de ocorrência frequente (com o gravame de, muitas vezes, essas construções serem transmitidas sem precedente inscrição matricial própria), o legislador entendeu ser apropriado facultar uma, específica, fórmula de cálculo, do valor de aquisição, para estes casos típicos, assente no estabelecimento da necessidade, incontornável, de devida comprovação, dos custos incorridos, por parte, única e exclusivamente, do sujeito passivo/contribuinte. Reflexa e obviamente, na falta desta devida comprovação, só o sujeito passivo pode ser, eventualmente, prejudicado, ao ponto, extremo, de, apenas, poder subsistir e ser valorado o valor do terreno (não obstante integrar o edificado).

Esta disciplina jurídica, diferentemente do que pode suceder em outras hipóteses de operatividade com diferentes princípios jurídico-tributários, não deixa margem ao aplicador da lei, para poder procurar e eleger uma solução capaz de mitigar estes efeitos que acabámos de ligar à falta de prova, dos custos de construção, pelo sujeito passivo. In casu, isto equivale a que, assente a constatação de que o impugnante não comprovou, em medida alguma, os custos assumidos com a construção da habitação unifamiliar, o julgador estava impedido de lançar mão da via de colocar a cargo da AT a necessidade de estabelecer e atuar um valor para substituir o que aquele tinha de ter comprovado e, assim, pressupomos, assegurar alguma justiça, pretensamente, imposta pela realidade (construção da moradia).

Nem o argumento da possibilidade de os serviços competentes da AT puderem, através de mecanismos, próprios, de simulação, estabelecer um valor patrimonial tributário, atribuível ao prédio edificado no terreno do impugnante, por referência ao dia 9 de julho de 2014 (Concretamente, € 112.270,00.), é capaz de legitimar o julgamento efetivado em 1.ª instância, porque, por um lado, distorce a realidade matricial, à data relevante, da existência de um “prédio urbano composto por parcela de terreno para construção, … artigo ...... …” como objeto da venda, no processo de insolvência, e, por outro, se traduz num mecanismo de, manifesto, benefício, conforto, para os sujeitos passivos (de IRS) não cumpridores da obrigação de devida comprovação dos custos, prescrita no art. 46.º n.º 3 do CIRS (No caso do impugnante, este benefício apresenta-se-nos exponenciado, pelo facto de, como resulta dos factos assentes – als. G) e H) -, ser “o sócio e gerente da sociedade (A………… Unipessoal, Lda.) que é invocado como empreiteiro da obra do prédio”.).

Aqui chegados, só resta reafirmar que a sentença recorrida errou no julgamento efetuado, veredicto que, diga-se, não podemos alterar, mesmo, depois de ponderar o argumentado, pelo rdo, entre outras, na conclusão XXXIV (das suas contra-alegações). O esgrimido montante de € 135.000,00, em função do que resultou provado nestes autos, corresponde à verba que determinado banco emprestou ao impugnante e que, os intervenientes, na outorgada escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança, declararam “destinado a construção de habitação no prédio …”; o que, juridicamente, sem margem para dúvidas, é diferente, não significa terem sido provados “custos de construção” num total de € 135.000,00.


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# III.

Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos:
- prover o recurso e revogar a sentença recorrida;
- julgar improcedente a impugnação judicial, que está na base deste processo.

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Custas pelo recorrido.
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[texto redigido em meio informático e revisto]


Lisboa, 9 de dezembro de 2021. - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) - Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.