Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:070/18.5BEVIS
Data do Acordão:05/21/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO
DOCENTE
PROFESSOR-COORDENADOR
ACESSO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão confirmativo da sentença de TAF que julgou improcedente a ação sub specie - onde a recorrente peticionou a condenação da entidade demandada a reconhecer-lhe o direito à realização de provas públicas para acesso à categoria de professora coordenadora ao abrigo do disposto no art. 26.º do DL n.º 185/81 e de harmonia com requerimento apresentado em 13.06.2017 - se a pronúncia unânime das instâncias se mostra sustentada em fundamentação que se apresenta como plausível e razoável e consonante com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, e se a questão não goza de relevância jurídica ou social fundamental.
Nº Convencional:JSTA000P25947
Nº do Documento:SA120200521070/18
Data de Entrada:02/10/2020
Recorrente:A.............................
Recorrido 1:INSTITUTO POLITÉCNICO DE VISEU
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………… [doravante A.], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 18.10.2019 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 200/219 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso de apelação que a mesma deduziu por inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu [doravante TAF/V] [cfr. fls. 120/146], que havia julgado totalmente improcedente a ação administrativa por si instaurada contra o INSTITUTO POLITÉCNICO DE VISEU [doravante R.], e pela qual veio impugnar os despachos proferidos pelo seu Presidente, datados de 13.09.2017 e de 12.12.2017, através dos quais foi indeferido o seu requerimento, de 13.06.2017, para a prestação de provas públicas para acesso à categoria de professora coordenadora, peticionando que a entidade demandada lhe reconheça o direito a realizar provas públicas para acesso à categoria de professora coordenadora e condenada a marcar tais provas, ao abrigo do disposto no art. 26.º do DL n.º 185/81, de 01.07 [Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico - ECPDESP - na redação anterior ao DL n.º 207/2009, de 31.08, e dos arts. 28.º e 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15.01, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 51/2005, de 30.08].

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 228/241] na necessidade de «uma melhor aplicação do direito», fundada na incorreta interpretação e aplicação feita pelo aresto recorrido dos arts. 06.º, 15.º e 26.º do ECPDESP, 28.º e 29.º, da Lei n.º 2/2004 [diplomas nas redações supra aludidas], o qual «decidiu que um princípio geral de direito - o princípio do “tempus regit actum” - prevalece sobre um direito potestativo puro adquirido ao abrigo de normas de carácter imperativo».

3. O R. produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 243/255] nas quais pugna, desde logo, pela não admissão da presente revista.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/V julgou totalmente improcedente a pretensão deduzida na ação administrativa sub specie pela A., aqui Recorrente, por entender que a mesma ao haver requerido, apenas em 13.06.2017, a realização de provas públicas para aceder à categoria superior de professor coordenador o fez quando já não lhe assistia esse direito, visto não poder «procurar, nesta data, repristinar, em seu benefício, um direito que entende que lhe era conferido 10 anos antes, e num quadro legal totalmente distinto, sob pena de absoluta e intolerável violação das mais básicas normas de aplicação da lei no tempo», quando o poderia ter feito a «partir de 2007 […] se assim entendesse e considerasse que preenchia os requisitos previstos no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 185/81» e a forma de recrutamento de professores do ensino superior politécnico, especificamente, de professores coordenadores, havia sofrido uma profunda alteração com a entrada em vigor do DL n.º 207/2009, o qual não se basta «atualmente, com a verificação de 3 anos de bom e efetivo serviço docente e com a prestação de provas públicas, antes se exigindo a realização de um concurso documental para tal recrutamento, concurso perante o qual apenas podem ser opositores os detentores do grau de doutor ou do título de especialista, obtido há mais de cinco anos, na área para qual é aberto tal concurso» [cfr. fls. 120/146].

7. O TCA/N confirmou inteiramente este juízo, negando provimento ao recurso quanto ao erro de julgamento que lhe era assacado, declinando-o, tendo, com esse desiderato, feito apelo ao princípio tempus regit actum, sustentando que «é insofismável que o regime jurídico que a aqui Recorrente pretendia ser-lhe aplicável, já não vigorava quando o requereu», pelo que «[v]igorando uma nova lei disciplinadora do regime jurídico dos Institutos Politécnicos, enquanto “lex nova”, quando é apresentado o Requerimento da aqui Recorrente em 2017, o qual veio a merecer decisão de indeferimento, é este o regime que vigorará e deverá ser aplicado à análise do requerido, à luz do referido princípio “tempus regit actum”», assomando, ainda, do seu discurso fundamentador que «[e]m concreto, a Recorrente cessou a comissão de serviço, como subdiretora da ……….. em 30.03.2007, sem que, desde aí e até 13.06.2017, tivesse manifestado qualquer vontade de requerer a prestação de provas públicas para aceder à categoria de professora coordenadora, por força do exercício daquelas funções dirigentes, sendo que, como se viu, entretanto o enquadramento legal da situação foi sendo significativamente alterado», desde logo porque «o art. 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro - na redação dada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de agosto -, em que assenta a pretensão da aqui Recorrente, foi revogado pelo n.º 2 do art. 25.° da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, salvaguardando apenas no seu n.º 3 queO disposto no artigo 29.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de agosto, e 64-A/2008, de 31 de dezembro, mantém-se aplicável aos titulares dos cargos dirigentes atualmente designados, ainda que em substituição ou em gestão corrente, até ao fim do respetivo prazo, nele não incluindo eventuais renovações posteriores", situação que manifestamente se não aplica à aqui Recorrente, há muito desligada do exercício de funções de direção», para concluir que «a Recorrente não estava em condições em 2017 de requerer a prestação das provas públicas para acesso à categoria de professora coordenadora, uma vez que há 10 anos que havia cessado o exercício de funções dirigentes, sendo que os normativos em que assentaria a sua pretensão, há muito que se mostram revogados, prevalecendo assim o referido principio do "tempus regit actum"».

8. A alegação expendida pela Recorrente não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes os contornos do caso sub specie, no sentido de que as instâncias decidiram com pleno acerto, tanto mais que se mostram assentes em fundamentação jurídica que se apresenta como plausível e razoável e consonante com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, alguma da qual cita, e que vem sendo tecida sobre os critérios de aplicação das leis no tempo e do princípio do tempus regit actum, o que vale por dizer que, não lhe sendo assacado erro grosseiro ou palmar, a admissão do recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito.

9. Ademais, a circunstância de se tratar de questão que se esgota na interpretação de um regime jurídico que já não é o vigente torna-a redutora pelo seu interesse limitado em função do tempo e dos sujeitos envolvidos, e aniquila virtualidade de expansão de controvérsia de molde a consagrá-la de relevância jurídica ou social fundamental no sentido de a decisio litis a proferir poder ser orientadora em hipotéticos casos futuros, não revestindo, assim, tal questão, interesse comunitário relevante que extravase os limites do caso concreto e a sua singularidade.

10. E, tão pouco, se trata de quaestio juris que apresente a se grau de controvérsia bastante ou litigiosidade significativa que transcenda o caso sujeito e que a consagre de importância fundamental, de tal sorte que justifique a admissão deste recurso excecional de revista.

11. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO

Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.

Custas a cargo da A./Recorrente. D.N..


Lisboa, 21 de maio de 2020. – Carlos Carvalho (relator) - Teresa de Sousa - Madeira dos Santos.