Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01878/18.7BEBRG
Data do Acordão:03/01/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24294
Nº do Documento:SA12019030101878/18
Data de Entrada:02/21/2019
Recorrente:DESPORTIVO DE ...
Recorrido 1:FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

DESPORTIVO DE ……. intentou, no TAF de Braga, contra a FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL e ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DE ……., providência cautelar requerendo a suspensão da eficácia:
“(a) da norma contida no art. 25.º, n.º 1, do RECITJ, aprovado pela Direcção da 1ª Requerida, na reunião de 25.06.2015, publicado em 30.06.2015, através do Comunicado Oficial nº 435;
(b) da norma na Tabela 6, do Comunicado Oficial n.º 1 - 2018/2019, publicado em 30.06.2018, sob a epígrafe “Quotas de transferência de clube estrangeiro para clube nacional”, estabelecendo que as quotas a pagar, pelos clubes nacionais, nas transferências internacionais para clubes nacionais de campeonatos distritais, de futebol sénior masculino, são de € 1.065, por cada jogador de futebol amador”;

O TAF julgou-se incompetente para conhecer da matéria pelo que absolveu as Requeridas da instância.

E o TCA Norte, para onde o Autor apelou, negou provimento ao recurso.

É desse Acórdão que o DESPORTIVO DE ……. recorre (artigo 150.º do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. O TAF justificou a sua incompetência para conhecer da matéria aqui em causa do seguinte modo:

.... a nossa jurisprudência já se pronunciou no sentido do Tribunal Arbitral do Desporto deter competência exclusiva para conhecer e julgar os litígios respeitantes à validade de normas regulamentares emitidas ao abrigo de poderes públicos.
........
Aderindo e sufragando os fundamentos consignados no douto Aresto supra reproduzido, é inequívoca a competência do Tribunal Arbitral do Desporto [nos termos do art. 4.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 33/2014, de 16/06, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º74/2013, de 06/09] para conhecer da validade ou invalidade das normas suspendendas, na medida em que foi, no exercício dos poderes de regulamentação das competições desportivas de futebol que se encontram atribuídos à Federação Portuguesa de Futebol [cf. art. 10.º e art. 41.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Regime Jurídico das Federações Desportivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31/12, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 93/2004, de 23/06], que tais normas suspendendas foram emitidas por tal entidade.
Com efeito, do domínio da arbitragem necessária instituída pela Lei n.º33/2014, de 16/06 - alterada pela Lei n.º 74/2013, de 06/09) - compete exclusivamente ao Tribunal Arbitral do Desporto conhecer, além do mais, quer das acções administrativas de impugnação de normas emitidas pelas federações desportivas ao abrigo de poderes públicos quer das respectivas providências cautelares instrumentais daquelas.
Em suma, tendo presente o teor do requerimento inicial, em articulação com o consignado no art. 4.º da Lei n.º 33/2014, de 16 de Junho (na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 74/2013, de 06 de Setembro), a competência para conhecer dos presentes autos cautelares pertence, inequivocamente, à jurisdição arbitral desportiva (Tribunal Arbitral do Desporto) e não a esta jurisdição administrativa ...
Assim, sem maiores delongas, não é da competência dos Tribunais Administrativos de Círculo conhecerem de tal matéria, mas antes dos Tribunais Arbitrais (nomeadamente, o Tribunal Arbitral do Desporto) - o que determina a absolvição da presente instância cautelar das Requeridas.”

Julgamento que o TCA confirmou com o seguinte discurso fundamentador:
“…
Refira-se que se não vislumbram razões para divergir do entendimento adotado em 1ª instância.
...
Como resulta do Acórdão do STA, de 21/09/2010, proferido no Recurso nº 0295/10, as questões estritamente desportivas não serão suscetíveis de tutela jurisdicional, com exceção dos casos de tais normas versarem sobre direitos indisponíveis, afetando direitos fundamentais, ou violando normas que protejam outro tipo de valores (v. g. corrupção, violência. doping).
Como se sumariou no referido Acórdão do STA “(...) não são suscetíveis de recurso fora das instâncias competentes na ordem desportiva as decisões e deliberações sobre questões estritamente desportivas.
(...) são questões estritamente desportivas aquelas que tenham por fundamento normas de natureza técnica ou de carácter disciplinar, emergentes da aplicação das leis do jogo, dos regulamentos e das regras de organização das respectivas provas. ...”
....
Importa sublinhar final e designadamente, que as questões de natureza constitucional suscitadas pelo Recorrente, alegadamente violadoras, nomeadamente do princípio da igualdade (Discriminação na contratação de desportistas estrangeiros) não deixam de poder ser colocadas em sede de Tribunal Arbitral, o que não determina que as mesmas só pudessem ser analisadas em sede de Tribunais Administrativos.”

3. Como se acabou de ver o que ora está em causa é a da identificação do Tribunal competente para apreciar um requerimento onde se pede a suspensão de eficácia de normas de natureza desportiva.
Todavia, esta questão – por si só - não justifica a admissibilidade da revista e isto porque, como esta Formação tem decidido em casos idênticos, não é de “admitir recurso de revista excepcional quando a intervenção do STA não seja a última palavra sobre a questão que lhe é colocada, como acontece neste caso. Na verdade, a intervenção deste STA nem sequer evita a possibilidade de posterior conflito negativo de competência. Não existe assim a vantagem inerente a este tipo de recursos que é a de contribuir para a pacificação da jurisprudência.” – Acórdão de 23/11/2017 (rec. 1254/17). No mesmo sentido podem ainda ver-se os Acórdãos de 4/01/2017, (rec. 962/17), de 9/02/2017 (rec. 94/17) e de 16/11/2017 (rec. 1226/17).

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Sem custas.
Porto, 1 de Março de 2019. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – Carlos Carvalho.