Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0151/22.0BCLSB
Data do Acordão:01/19/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
TRIBUNAL ARBITRAL
Sumário:Não é de admitir a revista se a questão suscitada desmerece tanto por não se divisar a necessidade de uma melhor aplicação do direito, como por, face aos contornos particulares do caso concreto, ela não ter vocação «universalista».
Nº Convencional:JSTA000P30470
Nº do Documento:SA1202301190151/22
Data de Entrada:01/09/2023
Recorrente:ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DE BRAGA
Recorrido 1:CLUBE DESPORTIVO DE CELEIRÓS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A «ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DE BRAGA» [AFB] vem, invocando o artigo 150º do CPTA, interpor «recurso de revista» do acórdão do TCAS - datado de 02.11.2022 - que anulou a decisão recorrida - acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto [TAD] de 08.08.2022 - na parte em que, no dispositivo, revogou as decisões do Conselho de Disciplina da AFB - datadas de 31.12.2020 e de 29.03.2021 - e - conhecendo do respectivo objecto - declarou a nulidade da decisão do Conselho de Justiça da AFB de 25.05.2021 - que manteve a anterior decisão do seu Conselho de Disciplina - por não terem sido assegurados - no procedimento disciplinar em causa - os direitos de audiência e de defesa do arguido, em violação do disposto no artigo 32º, nº10, da CRP.

Alega que o «recurso de revista» deve ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito» e em nome da «relevância jurídica e social da questão».

O recorrido - CLUBE DESPORTIVO DE CELEIRÓS - apresentou contra-alegações em que defende, além do mais, a «não admissão da revista» por falta de verificação dos necessários pressupostos legais - artigo 150º, nº1, do CPTA.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. O TAD, por acórdão de 08.08.2022, concedeu provimento ao recurso interposto pelo CLUBE DESPORTIVO DE CELEIRÓS e, em conformidade, revogou as decisões do Conselho de Disciplina da AFB - datadas de 31.12.2020 e 29.03.2021 - que o haviam condenado - nos termos do artigo 65º, nº2, do Regulamento Disciplinar - nas seguintes penas: a) Derrota por 3-0; b) Multa de 125,00€; c) Pagamento de despesas de arbitragem. E isto, porque considerou que «não tinham sido plenamente assegurados os direitos de audiência e de defesa», em violação do artigo 32º, nº10, da CRP, o que consubstanciava vício de violação de lei, sancionado com nulidade nos termos do artigo 161º, nº2 alínea d), do CPA.

O TCAS, conhecendo de «apelação» interposta pela AFB anulou o acórdão do TAD na parte em que - no seu dispositivo - revogou as decisões do Conselho de Disciplina - datadas de 31.12.2020 e 29.03.2021 -, antes declarando a nulidade da decisão do Conselho de Justiça da AFB - de 25.05.2021 - que mantivera tais decisões, invocando para o efeito o mesmo vício de violação de lei julgado procedente no acórdão aí recorrido, isto é, o «não terem sido assegurados- no procedimento disciplinar - os direitos de audiência e defesa do arguido, em violação do disposto no artigo 32º, nº10, da CRP».

De novo a AFB discorda, e pede «revista» do assim decidido pelo tribunal de apelação, apontando ao seu acórdão «nulidades e erro de julgamento de direito». Efectivamente, em seu entender, o acórdão padece das nulidades previstas nas alíneas c), d) [2ª parte] e e) [2ª parte] do nº1 do artigo 615º do CPC, por referência aos artigos 607º, nº4, do CPC, e 95º, nº1 e nº2 [1ª parte], do CPTA. E erra de direito por, segundo alega, não existirem fundamentos fácticos e legais «para a declaração de nulidade» da decisão do Conselho de Justiça da AFB de 25.05.2021, pois todas as diligências foram por ela encetadas de forma a serem assegurados os direitos de audição e defesa do então arguido - no âmbito de processo disciplinar desencadeado pela sua «falta de comparência ao jogo que se encontrava marcado com o GDR Esporões, no dia 20.12.2020, para o CD Divisão de Honra Seniores».

Mas a verdade é que no âmbito da «apreciação preliminar sumária» que cumpre a esta Formação fazer, torna-se bastante claro que a presente revista da AFB não deverá ser admitida. É que, associada às decisões substancialmente semelhantes das instâncias - arbitral e judicial - está o discurso fundamentador das mesmas que, perante a factualidade provada, se mostra lógico e dotado de razoabilidade jurídica, de modo que a decisão tomada, pelo tribunal de apelação, surge como aceitável, não carecendo, claramente, de ser sujeita ao crivo deste tribunal de revista em ordem a uma melhor aplicação do direito. Importa ainda sublinhar que no cerne das «questões» subjacentes às referidas nulidades e erro de julgamento de direito estão apreciações de prova, as quais, postas em causa no âmbito dos anteriores recursos [arbitral e judicial], ainda alimentam boa parte das actuais alegações da AFB, e cuja apreciação não cabe dentro dos limites estreitos impostos ao tribunal de revista para tal efeito - artigo 150º, nº4, do CPTA.

É certo que os comportamentos neste âmbito desportivo, pelo impacto que têm, são, à partida, dotados de relevância social, porém, os contornos específicos das «questões» concretas aqui em causa, aliados às ditas limitações no âmbito da apreciação da prova, acabam por impor a solução jurídica mantida no acórdão do tribunal de apelação como a mais acertada, retirando-lhe, por isso, importância fundamental a nível jurídico e até social.

Por isso, entendemos não se verificar qualquer um dos «pressupostos» justificativos da admissão da revista, pelo que, não será este caso susceptível de quebrar a «regra da excepcionalidade» da admissão do respectivo recurso.

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 19 de Janeiro de 2023. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Carlos Carvalho.