Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0635/18
Data do Acordão:07/12/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23536
Nº do Documento:SA1201807120635
Data de Entrada:06/25/2018
Recorrente:MUNICÍPIO DE SANTO TIRSO
Recorrido 1:A..., LDA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A………….., L.dª, S.A intentou, no TAF de Penafiel, contra o Município de Santo Tirso, acção de contencioso pré contratual onde formulou os seguintes pedidos:
1) Deve ser declarado nulo ou anulado o procedimento administrativo que culminou na decisão de adjudicação da empreitada à concorrente “B……………. L.dª”, por violação do disposto no artigo 123.º, n.º 1 do CCP;
Se assim não se entender,
2) Deve ser atribuída à proposta da Autora a classificação final de 4,19 pontos e, em consequência, por referência ao critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa, deve ser ordenada em 1.º lugar e ser-lhe adjudicada a empreitada em questão nos autos, com prática dos actos subsequentes;
….
5) Ao abrigo do art.º 103.º A, do CPTA, com a presente acção ficam automaticamente suspensos os efeitos do acto de adjudicação da empreitada à concorrente “B………….., L.dª” ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado.”

Indicou como contra-interessados os restantes concorrentes ao dito concurso.

O TAF julgou a acção parcialmente procedente.

E o TCA Norte, para onde a Autora apelou, concedeu provimento ao recurso e revogou a sentença, anulando “o acto de adjudicação com as legais consequências.”

É desse Acórdão que o Município de Santo Tirso vem recorrer (artigo 150.º/1 do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. A Autora propôs, no TAF de Penafiel, contra o Município de Santo Tirso, acção de contencioso pré-contratual onde pediu a declaração de nulidade, ou a anulação, do procedimento que culminou com a adjudicação da empreitada à concorrente “B……….., L.dª ou, se assim não se entendesse, que se posicionasse a sua proposta em 1.º lugar e, consequentemente, se lhe adjudicasse o objecto da referida empreitada, com a suspensão automática dos efeitos do acto de adjudicação ou da execução do contrato, caso este já tivesse sido celebrado.
O TAF pronunciou-se sobre os vícios que haviam sido imputados ao acto impugnado considerando que a petição inicial não era inepta, que não se verificava a caducidade do direito de impugnação do acto de adjudicação, que as propostas da Autora e das contra interessadas tinham sido correctamente pontuadas. Todavia, por outro lado, entendeu que tinha sido violado o direito de audiência e que tal determinava a anulação do acto impugnado.
De seguida indeferiu os pedidos que o Réu havia formulado na contestação (1) de afastamento do efeito suspensivo automático previsto no art.º 103.º-A do CPTA e de (2) afastamento do efeito anulatório do contrato.
Por isso julgou a acção parcialmente procedente, tendo proferido a seguinte decisão:
“- Anula-se o despacho impugnado.
- Indefere-se o afastamento do efeito suspensivo.
- Afasta-se o efeito anulatório do contrato celebrado.”

A Autora apelou para o TCA Norte sustentando, por um lado, que a omissão da audiência prévia devia determinar não só a nulidade do acto impugnado como do respectivo contrato e, por outro, que o Júri errou ao apreciar a sua proposta, o que determinou a sua errada pontuação. E aquele Tribunal concedeu provimento com um discurso fundamentador de que se destaca o seguinte:
“No caso em apreço, a Apelante podia exercer o seu direito de defesa/o contraditório e foi-lhe vedada essa oportunidade pelo órgão decisor;
Com esta actuação, impedindo a parte recorrente de se defender e/ou de exercer o contraditório, previamente à decisão tomada, afectou o Município/Recorrido o falado direito de audiência; é que a Autora/Recorrente nem sequer foi ouvida sobre o sentido da decisão.
A total omissão da participação desta no procedimento concursal não gera a nulidade do acto impugnado como pretende a Recorrente mas também se não degrada em formalidade não essencial; antes gera a anulabilidade do acto, como o próprio Réu/Município acaba por aceitar.
Efectivamente, dizer-se que a pronúncia da aqui Recorrente seria um acto inútil, insusceptível de alterar o relatório do júri e o acto de adjudicação porque o relatório do júri e o acto de adjudicação não podia ser outro, representa um salto no escuro que não podemos dar.
Refira-se ainda que o Tribunal a quo, em sede de fundamentação da sentença … entrou em franca contradição ao concluir “pela violação do direito de audiência prévia da autora, pelo que é de anular o ato impugnado - não se afigura existir nulidade porque esta implicaria a total omissão (núcleo essencial), o que no caso em apreço não ocorreu”, isto é, concluiu pelo efeito da anulação do acto impugnado mas depois não agiu em conformidade, acrescentando por não se afigurar existir nulidade, porque esta implicaria total omissão (núcleo essencial), o que no caso em apreço não ocorreu, raciocínio jurídico ilógico.
Termos em que, sem necessidade de outras considerações, por estultícias, se atende a pretensão da Recorrente.
Em suma:
- o que está em causa na audiência dos interessados é a participação destes na tomada de decisão (decisões) que lhes digam respeito, o que aqui foi completamente afastado/preterido;
- tal torna desnecessária a apreciação dos demais fundamentos do recurso.
Procedem, pois, as conclusões da peça processual da Apelante.”
Daí que tivesse concluído da seguinte forma:
Termos em que concede provimento ao recurso, revoga-se a sentença e anula-se o acto de adjudicação com as legais consequências.”

3. Como se acaba de ver o Acórdão sob censura concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida e anulou o acto de adjudicação com as legais consequências.
O que vale por dizer que, apesar daquele Acórdão ter revogado a sentença, no essencial, as instâncias decidiram da mesma forma uma vez que o TAF anulou o despacho impugnadoo qual só pode ser a decisão de adjudicação da empreitada à concorrente “B………… L.dª” decisão que o TCA confirmou ao anular o acto de adjudicação com as legais consequências. E fizeram-no pela mesma razão, isto é, por terem entendido que o Réu violou o direito de audiência da Autora já que não lhe concedeu a possibilidade de se pronunciar sobre o sentido da decisão.
Nesta conformidade, e tendo-se em atenção que as legais consequências daquela anulação passam pela suspensão automática dos efeitos do acto impugnado ou da execução do contrato, se este já tiver sido assinado (art.º 103-A do CPTA),
Deste modo, a entidade demandada terá de retomar o procedimento administrativo e proceder a nova classificação depois de corrigido o vício que determinou a mencionada anulação.
A admissão da revista não é, assim, necessária para uma melhor aplicação do direito como, por outro lado, não está em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental.
DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 12 de Julho de 2018. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.