Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01058/13
Data do Acordão:06/26/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
REVISÃO OFICIOSA
Sumário:Ainda que se encontre garantida a dívida exequenda e o acrescido (no caso concreto, através da penhora de imóveis), o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artº. 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o art. 52.º, n.º 1, do mesmo diploma legal.
Nº Convencional:JSTA00068325
Nº do Documento:SA22013062601058
Data de Entrada:06/07/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF CASTELO BRANCO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:LGT98 ART78 ART52 N1 ART49.
CPPTRIB99 ART169 N1 ART25 N3
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC065/09 DE 2009/04/15.; AC STA PROC0649/09 DE 2009/07/29.; AC STA PROC01/12 DE 2012/01/25.; AC STAPLENO PROC0460/11 DE 2011/11/16.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I. A……., com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Castelo Branco, que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra decisão do órgão da execução fiscal, que recusou a suspensão do processo executivo com fundamento em pedido de revisão do acto tributário formulado ao abrigo do artº 78º do CPPT, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:

a) Entendeu-se na sentença que a pretensão reclamatória da agora Recorrente não merecia provimento pelo facto de o pedido de revisão do acto tributário apresentado fora do prazo da reclamação graciosa não tem efeito suspensivo da execução.

b) O facto de ter sido a AT a tomar a iniciativa de fazer a penhora que fez, obtendo assim uma garantia, em nada impede que a execução seja suspensa.

c) Nos termos do artigo 199º, nº 4 do CPPT vale como garantia a penhora já feita para assegurar o pagamento da dívida e essa já se encontrava feita e não se questiona.

d) Assim o sendo a execução teria de ficar suspensa até à decisão final do pleito pendente que é o que decorre da interpretação conjugada dos artigos 169º, nº 3 e 199º do CPPT.

e) E é precisamente isto que é sustentado pela Doutrina e Jurisprudência supra citadas.

f) O pedido de revisão do acto tributário consubstancia uma verdadeira reclamação em sentido lato e por isso é-lhe aplicável o regime previsto no artigo 169º do CPPT.

g) Sendo este também o entendimento que veio a obter vencimento no Supremo Tribunal Administrativo e vertido no Douto acórdão também supra citado.

h) Violou a sentença recorrida os artigos 78º da LGT, 169º e 199º do CPPT, pelo que deve ser revogada e substituída por uma decisão que, na procedência da pretensão da Recorrente, devolva a situação ao ex ante à venda efectuada mais se ordenando a suspensão da execução.

Nestes termos e nos melhores de direito deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a sentença que assim se não entendeu e substituída a mesma por uma decisão que dê provimento à pretensão da ora recorrente, tudo o mais com as consequências legais.

II. Em contra-alegações, a recorrida Fazenda Pública veio pronunciar-se pela manutenção do decidido, louvando-se, para além do mais, em jurisprudência deste STA e no facto de só o pedido de revisão formulado no prazo da reclamação graciosa poder constituir fundamento de suspensão da execução fiscal.

III. O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 652/653, no qual se pronuncia no sentido da improcedência do recurso.

IV. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:

1º) A reclamante é revertida nos processos de execução fiscal nº 1252200401500074 e apensos, instaurados em nome da originária executada "B……., Lda."; foi citada nessa qualidade em 21/04/06 - cfr. fls. 32 a 39 e fls. 140 a 149 dos presentes autos;

2º) Em Maio de 2006, foram efectuadas as penhoras solicitadas pelo Serviço de Finanças de Pinhel, dos imóveis urbanos, artigo nº 581 da freguesia de ……. e, artigo nº 3028 da freguesia de ……. e a penhora do prédio rústico referente ao artigo nº 339, da freguesia de …….. - cfr. fls. 171 a 178 dos presentes autos;

3º) Em 05/03/07, após notificação do Serviço de Finanças para o efeito, o marido da ora reclamante, C……., no âmbito do processo de execução fiscal nº 1252200401500074 e apensos vem solicitar a separação judicial de bens - cfr. fls. 181 dos presentes autos;

4º) Efectuados pagamentos parciais pela ora reclamante, o valor actual da dívida exequenda e acrescidos é de cerca de € 19.657,59 e o valor da garantia bancária a prestar é de € 27.769,27 - cfr. fls. 38 dos presentes autos;


5º) O valor patrimonial dos imóveis penhorados no âmbito do processo executivo nº 1252200401500074 e apensos, é o que consta do seguinte quadro:


Imóvel/Artigo
Freguesia
Valor Patrimonial Ónus
Valor
Artigo U n° 581
…-…..
€ 66.959,55
Hipoteca (cgd) 14/4/99
€ 108.213,21
Hipoteca (cgd) 18/3/05
€42.221,40
Artigo U nº 3028
…..
€ 12.551,15
Hipoteca (cgcam) Esc. 27.550.000$00 - (€5.523.279,1)
Artigo Rústico Matriz n° 339
…..-…..
€ 15,23
-

- cfr. fls. 171 a 178 dos presentes autos;

6º). Em 18/01/13, é afixado Edital (Venda e Convocação de Credores) com referência à venda nº 1252.2013.9, e relativo ao prédio urbano descrito no artigo 581, sito em …….., ……., como valor patrimonial € 66.959,55 - cfr. fls. 363 e 364 dos presentes autos;

7º). Em 22/01/13, a reclamante é notificada, na qualidade de fiel depositária e de executada, de que fora marcada para o dia 01/03/13, pelas 10 horas, no Serviço de Finanças de Pinhel, a venda judicial do artigo urbano inscrito na matriz predial de ……., sob o artigo 581 - cfr. fls. 371 e 372 dos presentes autos;

8º). Em 31/01/13, a ora reclamante, deduz pedido de Revisão Oficiosa dos impostos liquidados adicionalmente pela AF (IRC e IVA/2001 e 2002) e a que se refere o processo executivo nº 1252200401500074 e apensos - cfr. fls. 405 a 425 dos presentes autos;

9º). Em 31/01/13, a ora reclamante, dá entrada no Serviço de Finanças de Pinhel de uma petição na qual requer a suspensão do processo executivo nº 1252200401500074 e apensos, com argumentação de que o bem penhorado no processo executivo serve como garantia e solicita a desmarcação da venda que se encontra agendada, por se encontrar pendente pedido de revisão oficiosa - cfr. fls. 20 a 23 dos presentes autos;

10º) Em 28/02/13, através do Oficio nº 133, é remetido Fax/notificação à mandatária da ora reclamante, dando conta que não se encontram reunidos os pressupostos para a suspensão do processo executivo, não existindo motivos legais que obstem ao prosseguimento da venda do bem penhorado (imóvel urbano da freguesia de ……. com a matriz predial urbana nº 581) pelo que indefere com estes fundamentos o requerido - cfr. fls. 386 dos presentes autos;

11º) Em 1/3/13, a ora requerente, envia fax através do qual apresenta reclamação da decisão do órgão de execução fiscal (referida no ponto anterior), solicitando que a mesma tenha efeitos suspensivos e requerendo a suspensão da venda judicial marcada para o próprio dia (01 de Março de 2013) - cfr. fls. 2 e segs. dos autos;

12º) Em 01/03/13, pelas 16.51 horas, a ora reclamante, apresenta neste TAF de Castelo Branco, Providência Cautelar, pedindo a anulação da abertura das propostas para venda do imóvel da executada, sito na freguesia de …../……, sob o artigo matricial nº 581, com pedido de decretamento provisório - cfr. fls. 394 a 395 dos presentes autos;

13º) Em 05/03/13, através do Oficio nº 139, o Serviço de Finanças de Pinhel, emite notificação à mandatária da, ora reclamante, informando-a que a venda não havia sido suspensa, com os seguintes fundamentos:

“Em resposta ao vosso requerimento que deu entrado neste Serviço de Finanças em 2013-03-01, cumpre-me informar V, Ex.cia que a venda judicial marcada no processo de execução fiscal nº 1252200401500074 e apensos, não foi suspensa, uma vez que o processo de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal não tem, nos termos do artigo 276º e seguintes do CPPT, efeitos suspensivos”. - cfr. fls. 396 dos presentes autos;

14º) Em 06/03/13, é admitido liminarmente o requerimento cautelar e proferida decisão no âmbito do processo cautelar com nº 135/13.0BECTB, a qual indefere o pedido de decretamento provisório da providência - cfr. 399 dos presentes autos;

15ª) A reclamante detém em regime de compropriedade (1/2), imóvel urbano sito na freguesia de ……, sob o artigo nº 3843, fracção: cave, fracção A, inscrito na matriz em 2011, que em 31/12/12 foi avaliado no valor de € 66.599,90 - cfr. fls. 403 dos presentes autos;

16º) A reclamante detém em regime de compropriedade (1/2), imóvel urbano sito na freguesia de ……., sob o artigo nº 3843, fracção: r/c, fracção A, inscrito na matriz em 2011, que em 20/02/12 foi avaliado no valor de € 111.700,00 - cfr. fls. 404 dos presentes autos;

V. Cumpre decidir.

A única questão a conhecer no presente recurso é a de saber se a apresentação de requerimento de revisão oficiosa nos termos do artº 78º da LGT, estando penhorado um bem imóvel, determina a suspensão da execução fiscal.

A decisão recorrida respondeu negativamente à questão, louvando-se em doutrina e também em jurisprudência deste STA, considerando que o pedido de revisão oficiosa realizado pela ora reclamante, porque realizado fora dos prazos de reclamação graciosa, não tem enquadramento nos casos de suspensão previstos no artº 52º da LGT.

No mesmo sentido se pronunciaram o MºPº e a recorrida (v. fls. 652/653 e 639/648, respetivamente.

A recorrente, por sua vez, alega que um pedido de revisão do acto tributário não deixa de ser uma reclamação para efeitos do disposto no artº 52º, nº 1 da LGT, e, assim sendo, uma vez que estão penhorados bens para garantia da dívida, a execução deve ser suspensa até à decisão daquele pedido.

Vejamos então qual destes entendimentos colhe apoio legal.

Esta questão foi já tratada por este STA, nomeadamente nos acórdãos de 15.04.2009 – Processo nº 065/09, de 29.07.2009 - Processo nº 0649/209, de 20.01.2010 –Processo 01237/2009 e de 25.01.2012 –Processo nº 1/12.

No aresto citado em último lugar, o qual reproduz a jurisprudência anterior sobre a mesma matéria, ficou escrito o seguinte:

“«A questão a dilucidar, nos autos, é […] a de saber se o pedido de revisão oficiosa, previsto no artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, é susceptível de suspender a execução (se obviamente acompanhado da constituição ou prestação de garantia idónea).
Aquela disposição legal prevê “a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou”, seja por iniciativa do contribuinte - aí, “no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade” -, seja “por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços”.
Por sua vez, o seu artigo 52.º, n.º 1, preceitua que “a cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda”.
E de modo semelhante dispõe o artigo 169.º do CPPT.
Ainda, nos termos do artigo 83.º, n.º 3, deste último compêndio legal, a suspensão da execução fiscal só pode ocorrer nos casos previstos na lei. Ora, logo literalmente, a revisão não tem guarida nos aludidos preceitos legais.
Todavia, a asserção não é definitiva, uma vez que outros meios processuais devem considerar-se ali abrangidos, como é, desde logo, o recurso hierárquico sequente do indeferimento de reclamação graciosa.
A questão passa, assim, pela dilucidação da natureza do pedido de revisão.
Ora, o previsto na 1.ª parte do n.º 1 daquele artigo 78.º consubstancia uma reclamação verdadeira e própria pois que tem o mesmo prazo, é dirigida ao próprio autor do acto e por ele decidida e, sobretudo, o mesmo fundamento - qualquer ilegalidade - cfr. os artigos 70.º, n.º 1, e 99.º do CPPT -, correspondendo, pois, ao respectivo conceito doutrinal consagrado no artigo 158.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do CPA.
“Assim, por força do preceituado no referido artigo 52.º, n.º 1, da LGT, que faz uma referência genérica a «reclamação», também este pedido de revisão terá efeito suspensivo, dentro do condicionalismo do n.º 1 deste artigo 169.º.
No entanto, o mesmo parece não se poder entender em relação aos outros casos de revisão do acto tributário, mesmo quando a denominada «revisão oficiosa» é pedida pelo sujeito passivo (o que é permitido, como se vê, pelo n.º 1 do artigo 49.º e pelo n.º 7 do artigo 78.º da LGT). Com efeito, não se está aqui perante reclamação, recurso, impugnação da liquidação ou oposição à execução fiscal e só nestas situações o artigo 52.º, n.º 1, da LGT, prevê a possibilidade de suspensão da execução. Por outro lado, a suspensão da execução fiscal só pode ocorrer nos “casos previstos na lei” (artigo 85.º, n.º 3, do CPPT). O artigo 49.º da LGT, ao referir o pedido de revisão do acto tributário entre os casos interruptivos da prescrição, mas ao não o incluir entre os casos de suspensão da prescrição derivada de paragem do processo de execução fiscal, corrobora esta conclusão, pois será a não existência de efeito de suspensão do processo de execução fiscal que justificará a não suspensão do prazo de prescrição”. Cfr. JORGE DE SOUSA, CPPT anotado e comentado, 2.º volume, 2007, p. 172, nota 3 b). [(Hoje, com maior desenvolvimento, na 6.ª edição do Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, volume III, anotação 3 c) ao art. 169.º, págs. 210 a 214.)]
E, mais desenvolvidamente, o acórdão do STA de 15 de Abril de 2009, processo n.º 065/09.
Conclui-se, assim, que o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária, a que se refere o artigo 52.º, n.º 1, do mesmo diploma legal».

Não existem razões de ordem legal ou factual (repare-se que a recorrente foi citada na qualidade de revertida em 21.04.06 – nº 1 do probatório – e só em 31.01.13 deduziu o pedido de revisão oficiosa – nº 8º do probatório) que determinem agora decisão diversa.

Aliás, para além da jurisprudência citada, o acórdão do Pleno desta Secção de 16.11.2011-Proceso nº 0460/11, embora não tratando expressamente desta matéria, aderiu a este entendimento dando por findo o recurso em virtude de o acórdão recorrido ter seguido esta jurisprudência, ao abrigo do artº 152º do CPTA.

VI. Nestes termos e pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.
Lisboa, 26 de junho de 2013. – Valente Torrão (relator) – Ascensão Lopes – Fernanda Maçãs.