Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02141/16.3BEBRG
Data do Acordão:05/24/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P31029
Nº do Documento:SA22023052402141/16
Data de Entrada:05/10/2023
Recorrente:AA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

AA, com restantes sinais dos autos supra indicados, em que é Oponente/Recorrente, não se conformando com o acórdão proferido nos autos dele vem interpor RECURSO DE REVISTA - art. 285° do CPPT -, a subir imediatamente e nos próprios autos.

Concluiu do seguinte modo:
1 - O interesse jurídico relevante para efeitos de acesso ao terceiro grau de jurisdição encontra-se na questão de direito que, em face da doutrina e da jurisprudência, assuma uma notória pertinência, para efeitos da melhor aplicação do direito;
2- Está em causa determinar, para melhor aplicação do direito, o alcance das normas do art.° 37º do CPPT e do art. o 192º do Código de Processo Civil, quando está em causa uma nulidade de citação praticada pelo órgão que dirige o processo executivo (OEF) e posteriormente suprida pelo próprio, os efeitos quanto à contagem do prazo para dedução da defesa.
3- Esta questão jurídica, peja sua relevância no processo, onde está em causa determinar a verificação da exceção da caducidade do direito de deduzir oposição à execução fiscal revertida, assume claro relevo jurídico, para boa aplicação do direito e de forma a assegurar a realização da justiça.
4- O Impugnante/Recorrente considera que a douta decisão recorrida não fez uma correcta ponderação da demanda, da prova constante dos autos e do direito aplicável à facticidade alegada e situação sub judicie;
5- O executado pode arguir a nulidade de citação junto do órgão que dirige o processo executivo, que a apreciará e decidirá, e, em caso de indeferimento, poderá ser apresentada reclamação para o Tribunal Tributário;
6- É a própria Administração Tributária, órgão que dirige o processo executivo, quem aprecia e conhece da arguida nulidade, deferindo-a promove o aperfeiçoamento do ato de citação, a partir do qual se conta o prazo de interposição da oposição à execução. 7- O órgão que dirige o processo executivo, Serviço de Finanças, e promotor da citação do Oponente/Recorrente, recebeu o requerimento apresentado pelo Recorrente a suscitar a nulidade da citação por preterição das formalidades da citação prevista na lei - estavam em falta os títulos executivos, o despacho de reversão e a citação da reversão -, apreciou aquela questão, deferindo-a, e promoveu a notificação do executado do cumprimento dos requisitos em falta - os títulos executivos, o despacho (reversão) e citação (reversão) -;
8- A norma do art.° 37° do CPPT é similar à norma do art. 192° do Código de Processo Civil, em vigor à data do ato de citação, a qual dispõe:
"Quando a falta ou a nulidade da citação tenha sido arguida pelo citando, a notificação do despacho que a atenda dispensa a renovação da citação desde que seja acompanhada de todos os elementos referidos no artigo 227º ", e o prazo para apresentação da defesa começa a contar daquela notificação;
9- Arguida a nulidade de citação pelo executado no processo de execução em requerimento dirigido àquele órgão que dirige o processo executivo, o seu deferimento através da notificação ao executado dos elementos essenciais omitidos sana aquela nulidade, mas o prazo para a defesa começa a contar a partir dessa notificação, sob pena prejudicar a defesa;
10- Nos autos, a carta de citação enviada ao Executado/Oponente/Recorrente não continha os títulos executivos, o despacho de reversão e a citação de reversão, os quais deveriam acompanhar a citação e essenciais para o Recorrente organizar a sua defesa;
11- O executado suscitou no próprio processo e junto do órgão que dirige o processo executivo, o Serviço de Finanças, a questão da nulidade do acto de citação por preterição elas formalidades previstas na lei;
12- A questão da nulidade foi conhecida pelo indicado órgão no próprio processo executivo, com decisão de deferimento, promoveu a notificação do executado, com envio dos documentos em falta, por ofício ele 26 de Fevereiro de 2014;
13- O prazo para apresentação da defesa conta-se a partir da notificação pelo órgão que dirige o processo executivo ao executado do deferimento da reclamação e do aperfeiçoamento do acto de citação;
14- Atenta a regra de contagem dos prazos não caducou o do direito de deduzir oposição à execução fiscal revertida pelo decurso do prazo de trinta dias após o ato de aperfeiçoamento da citação;
15- Na altura da citação nada impedia que o revertido/reclamante solicitasse a entrega dos documentos em falta à administração tributária nos termos do art. 37° do CPPT beneficiando da interrupção do prazo para reagir designadamente através de reclamação do art. 276° do CPPT, como fez, sendo que o prazo para oposição só se contaria a partir da entrega dos documentos pretendidos e que não acompanharam a citação;
16- O "aperfeiçoamento" da citação (no processo executivo) deficiente por parte do responsável pela citação pode ocorrer nos termos do disposto do n.º 1 do art.° 37° do CPPT, e é de aceitar a aplicação do comando do n.º 2 daquele normativo legal;
17- O executado, tendo requerido a nulidade da citação, não pode ser prejudicado pelo meio de aperfeiçoamento escolhido pelo órgão que dirige o processo executivo;
18- Tendo o responsável pelo processo executivo optado pela sanação da nulidade de citação com recurso ao comando do art.° 37° do CPPT, essa opção não pode prejudicar o executado, e o recurso àquela disposição legal - n.º 2 do art.° 37° do CPPT - afigura-se adequada, está inserida na Subsecção II (Das notificações e citações) do CPPT e, ali definida a citação:
"A citação é o acto destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a este, pela primeira vez, pessoa interessada" - n.° 2 do art.° 35° do CPPT.
19- O prazo para a oposição à execução conta-se a partir da notificação ao executado/Recorrente do despacho de aperfeiçoamento da citação, o qual ocorreu em 26.02.2014 e rececionado pelo Oponente a 03.03.2014, e a oposição foi apresentada a 25.03.2014, antes do termo do prazo de 30 dias;
20- Não ocorreu a exceção perentória da caducidade do direito de deduzir oposição à execução fiscal revertida pelo decurso do prazo de trinta dias após o ato de citação aperfeiçoado.
21- Ainda acresce, em defesa da pretensão do oponente/recorrente, as irregularidades processuais, quando não estejam feridas de nulidade, mas afectem directamente os direitos de defesa do contribuinte - de se defender contra o prosseguimento da execução - produzem nulidade quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa, como aqui ocorre, nos termos do disposto no art.° 195.° do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no art. 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário.

Deverá ser revogado o douto acórdão em crise, proferindo-se douta decisão de procedência da oposição e absolvição do Executado/Oponente do pagamento do imposto devido.
TERMOS EM QUE,
nos melhores de direito deve o presente recurso ser provido e, em consequência, revogado o douto acórdão "a quo", com as legais consequências.

Não foram produzidas contra-alegações.

Cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

O presente recurso foi interposto e admitido como recurso de revista, havendo, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Dispõe o artigo 285.º do CPPT, na redacção vigente, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5 – Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.
6 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Tributário.
Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».
Constitui igualmente jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal que atento o carácter extraordinário do recurso excepcional de revista não cabem no seu âmbito a apreciação de alegadas nulidades da decisão recorrida, devendo estas, ao invés, ser arguidas em reclamação para o Tribunal recorrido, nos termos do disposto no artigo 615.º n.º 4 do Código de Processo Civil.
Finalmente, também as questões de inconstitucionalidade não constituem objecto específico do recurso de revista, porquanto para estas existe recurso para o Tribunal Constitucional.

Vejamos.
No essencial o recorrente pretende com o recurso de revista, que intentou para melhor aplicação do direito, que este Supremo Tribunal reaprecie o acórdão recorrido no sentido de decidir a questão colocada nos autos em sentido oposto ao do acórdão recorrido.
Insiste que ocorreu uma nulidade de citação e que a mesma foi suprida pela Autoridade tributária e Aduaneira, sendo certo que no acórdão recorrido se concluiu que não há noticia nos autos de que tenha sido arguida qualquer nulidade da citação junto do órgão de execução fiscal, pelo que, não foi por este decidida tal questão.
Por outro lado, a interpretação que é dada às normas constantes do artigo 37º do CPPT, bem como dos restantes preceitos legais invocados, revela-se conforme à jurisprudência dos tribunais superiores, pelo que não se vislumbra agora que o recurso deva ser admitido para melhor aplicação do direito, uma vez que não é evidente que tenha ocorrido qualquer erro de julgamento.
Assim, o recurso não está em condições de ser admitido.


Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso de revista, por não se mostrarem preenchidos os respectivos pressupostos legais.
Custas do incidente pelo recorrente.
D.n.

Lisboa, 24 de Maio de 2023. – Aragão Seia (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes.