Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0543/12
Data do Acordão:05/30/2012
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SANTOS BOTELHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA
PRESSUPOSTOS
Sumário:O recurso de revista só é de admitir quando a questão a decidir, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental, ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária em prol de uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P14247
Nº do Documento:SA1201205300543
Data de Entrada:05/16/2012
Recorrente:A……
Recorrido 1:MINISTÉRIO PÚBLICO
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:
I - RELATÓRIO
1.1. A……………………. vem interpor recurso de revista, ao abrigo do n.º 1, do artigo 150.° do CPTA, do Acórdão do TCA Sul, de 02-02-2012, que não conheceu do recurso por si interposto, com o fundamento de que, tendo sido proferida sentença pelo juiz relator, no quadro da invocação dos poderes conferidos pelo art. 27°, nº 1, alínea i) do CPTA, não cabe recurso jurisdicional, mas sim reclamação obrigatória para a conferência nos termos do art. 27°, nº 2 do CPTA.
Nas conclusões da sua alegação a Recorrente sustenta, designadamente que:
“(A) Salvo o devido respeito, o douto acórdão recorrido, que decidiu não tomar conhecimento do recurso interposto, com base no art. 27, nº 2 do CPTA, conjugado com o art. 40°, nº 3 do ETAF, por remissão do art. 60° do RN, opera uma errada e interpretação e aplicação do Direito e, consequentemente, deverá ser revogado e substituído por outro que admita o recurso e ordene o seu prosseguimento até decisão de mérito;
(...)
(E) Salvo o devido respeito, sofre de clamorosa injustiça e erro grosseiro a decisão de não conhecer o recurso, em caso idêntico, ou pelo menos ela suscita fundadas dúvidas, dado o seu atropelo inédito de consolidada corrente jurisprudencial, e daí que se imponha a admissão da revista como “claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
(F) Na situação em análise, tendo em conta a relevância jurídica e social e as razões melhor desenvolvidas nas alegações, verificam-se estarem reunidos os pressupostos de admissão do recurso previstos no art. 150º, nº 1 do CPTA, justificando-se a admissão da revista como “claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”;
(...)” — cfr. Fls. 264-265.
1.2. Por sua vez, o ora Recorrido, Ministério Público, contra-alegou, salientando, designadamente, nas conclusões das suas alegações, o seguinte:
“A) Deve admitir-se o presente recurso de revista quanto à questão do funcionamento interno dos Tribunais Administrativos de Círculo, nas acções de oposição à aquisição da nacionalidade e nas acções administrativas especiais.
B) Porém, não deve admitir-se o recurso quanto à questão da violação do princípio pro actione, no caso concreto, por ainda não haver decisão sobre se o tribunal de 1ª instância convola efectivamente o recurso em reclamação para a conferência e por respeitar exclusivamente ao circunstancialismo do caso.
(...)
E) Consequentemente, deve o presente recurso de revista improceder, na parte em que seja admitido, de acordo com as conclusões A) e B)” -cfr. fls. 286.
1.3. Cumpre decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. O recurso de revista a que alude o n.° 1, do artigo 150.° do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA.
Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA).
Vejamos, então.
2.2. Na sua decisão, de 26-06-2010, o TAC de Lisboa julgou procedente a ação de oposição aquisição da nacionalidade portuguesa, intentada pelo ora Recorrido Ministério Público, por ter entendido, designadamente, que a ora Recorrente, “tal como os seus familiares mais próximos, isto é, pais e avós, são todos naturais do Brasil, aí têm a sua vida organizada, não mantendo contacto permanente ou suficiente forte com Portugal de modo a poder afirmar-se da verificação do pressuposto da aquisição da nacionalidade, ora em causa, da sua ligação à comunidade nacional”. (cfr. fls. 100)
O TCA Sul, por sua vez, decidiu não conhecer do recurso, interposto pela ora Recorrente, salientando, desde logo, que “conforme resulta da matéria fáctica provada, a sentença foi proferida pelo juiz relator no quadro da invocação dos poderes conferidos pelo art. 27º, n° 1, al. i), do CPTA, de acordo com o qual compete àquele proferir decisão quando entenda que a questão a decidir é simples, designadamente por já ter sido judicialmente apreciada de modo uniforme e reiterado, ou que a pretensão é manifestamente infundada”, nestes termos, “(...) da decisão proferida no quadro da invocação desses poderes não cabe recurso jurisdicional, mas reclamação para a conferência, nos termos do citado art. 27°, n° 2 (...)” — cfr. Fls. 88.
Já a Recorrente discorda do decidido no Acórdão do TCA Sul nos termos que explicita na sua alegação de recurso, a fls. 249-276, referindo, designadamente, que o recurso interposto deve ser conhecido, uma vez que, “o princípio “pro actione”, nos termos do art. 7° do CPTA, reclama a prevalência da interpretação dos artigos 27°, n° 2 do CPTA e 34º, n° 3 do CPTA no sentido mais favorável ao conhecimento do recurso (...)” — cfr. conclusão M a fls. 266.
Como decorre do já exposto, o Acórdão do TCA parte de um determinado enquadramento fáctico, concretamente, a circunstância de a decisão objecto de recurso jurisdicional ter sido proferido pelo Relator do processo, com expressa invocação do uso dos poderes conferidos pela alínea i), do n° 1, do artigo 26° do CPTA, daí que, na óptica do Acórdão recorrido, de tal decisão caiba reclamação para a conferência e não recurso directo para o TCA. Sucede que, perante tal matéria de facto e dado o prescrito no n° 2, do citado artigo 26°, não se evidencia que o decidido no TCA enferme de erro grosseiro, razão pela qual se não justifica a admissão da revista no quadro de uma hipotética necessidade de melhor aplicação do direito.
Por outro lado, as questões que a Recorrente pretende ver dirimidas não se apresentam como particularmente relevantes em termos jurídicos e sociais, na exacta medida em que a sua resolução não requer a realização de operações lógico-jurídicas especialmente complexas, ao mesmo tempo que não contendem com interesses comunitários de grande alcance, sendo que, inclusivamente, a decisão do TCA, para além de não conhecer do recurso, ordenou a baixa dos autos ao TAF para que aí se pondere, eventualmente, da hipotética convolação do recurso em reclamação.
Em suma, não se mostram preenchidos os pressupostos de admissão do recurso de revista.
3 DECISÃO
Nestes termos, acordam em não admitir o recurso de revista interposto do Ac. do TCA Sul, de 2-02-12.
Custas pela Recorrente.
Lisboa 30 de Maio de 2012. José Manuel da Silva Santos Botelho - (relator) -Rosendo Dias José - Luís Pais Borges.