Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01320/14
Data do Acordão:05/06/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P18983
Nº do Documento:SA22015050601320
Data de Entrada:11/10/2014
Recorrente:ATA - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

1. A…………….., S. A., identificada nos autos, instaurou no TAF do Porto, os presentes autos de execução de julgados (por apenso aos autos do processo de impugnação), tendo em vista a integral execução da sentença proferida pelo TAF do Porto em 15/07/2011 e em que foi julgada procedente a impugnação, com a consequente anulação das liquidações de IVA e juros compensatórios, relativos ao ano de 2002, identificando como entidade executada a Autoridade Tributária e Aduaneira, peticionando a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 26.446,18 € a título de indemnização por prestação de quantia indevida, acrescida de juros de mora vencidos sobre aquela quantia, à taxa de 4%, desde a sua notificação até efectivo e integral pagamento.

Naquele Tribunal foi decidido julgar procedente a pretensão executiva, reconhecendo-se assistir à exequente, o direito à peticionada indemnização por prestação de garantia indevida, no montante de 26.446,18 € e devendo a entidade executada proceder, no prazo de trinta dias, ao pagamento daquela quantia, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados sobre aquele montante, desde 18/06/2012 (data da notificação da entidade executada para os presentes autos de execução de julgados) até efectivo e integral pagamento.

2. Inconformada, a Fazenda Pública veio recorrer para este Supremo Tribunal, formulando as seguintes conclusões das suas alegações:

1. Contrariamente ao que se entendeu na sentença recorrida, não pode a Recorrente concordar com a decisão judicial na parte referente ao pagamento dos juros de mora, pelo que o presente recurso é interposto somente quanto à condenação do pagamento dos juros de mora desde 18/06/2012 (data da notificação da entidade executada para os autos de Execução de Julgados) até efectivo e integral pagamento.
2. Em execução da sentença exequenda, a Administração procedeu à anulação das liquidações de IVA de 2002 e de juros compensatórios, em conformidade com o decidido: anulação n° 1342, no montante de € 74,76, anulação n° 1343, de € 12.241,60, anulação n° 1344, de € 198,81 e anulação n° 1427 de € 435.366,60.
3. Ora, na douta sentença recorrida deu-se como provado que o contribuinte não peticionou, no referido processo de impugnação judicial, a fixação de uma indemnização pela prestação de garantia indevida, tendo apenas requerido tal pedido em sede de Acção de Execução de Julgados.
4. A questão fulcral reside no facto de não tendo o contribuinte exercido esse direito através do referido enxerto no processo tributário ou em requerimento autónomo, não havendo, assim, uma decisão que condenasse a Administração ao pagamento da aludida indemnização pelos prejuízos sofridos pelo contribuinte com a prestação da garantia, não podia esta estar obrigada a pagar-lhe esse tipo de indemnização no âmbito de execução espontânea da decisão anulatória, pelo que não pode considerar-se que existiu mora da AT na reconstituição da plena legalidade no que concerne ao ressarcimento dessas despesas a partir do termo do prazo da execução espontânea do julgado anulatório.
5. Aliás, este fundamento encontra sustentação na sentença recorrida. A saber:
“(…)
Na situação dos autos a sociedade exequente não havia formulado previamente à instauração dos presentes autos de execução de julgados pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, nem tão pouco interpelou a Administração Tributária após transito em julgado da sentença anulatória nesse sentido, mormente com indicação dos encargos que suportou com a garantia prestada. Pelo que na sua ausência não cabia à Administração Tributária espontaneamente, em sede de execução de julgado anulatório, proceder ao pagamento da indemnização, que apenas veio formulada através dos presentes autos de execução’ (sublinhado nosso)
6. Os artigos 100º e 102º da LGT, conjugados com as normas do CPTA sobre a execução de sentenças de anulação de actos administrativos, aplicáveis por força daquele n.° 1 do artigo 102.° da LGT, resulta, pois, que em caso de procedência da impugnação (meio judicial onde foi proferida decisão anulatória da liquidação em causa nestes autos), a Administração fica obrigada a reconstituir a situação jurídica hipotética, repondo a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, por forma a que a ordem jurídica seja reintegrada e o beneficiário da anulação veja reparado os danos sofridos em resultado da prática desse acto (artigo 173.° do CPTA).
7. Ora, como se referiu anteriormente, o contribuinte veio pela primeira vez em sede de Execução de Julgados, suscitar a questão dos encargos com a prestação de duas garantias, pelo que não havia qualquer pedido nem decisão a condenar a AT ao pagamento dos correspondentes encargos, não estando esta obrigada a reconstruir uma situação jurídica hipotética, repondo a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado.
8. Como é sabido, a execução da sentença transitada em julgado é obrigatória para a AT (art. 100º da LGT) que a deve cumprir espontaneamente, no prazo de 3 meses (nos termos do n° 1 do art. 175° do CPTA) ou no prazo de 30 dias, se a execução consistir apenas no pagamento de quantia certa (n° 3 do mesmo artigo).
9. A sentença exequenda nos autos de Execução de Julgados, constitui uma sentença anulatória, devendo a Administração reconstituir a situação hipotética que existiria à data do trânsito em julgado, como se o acto ilegal não tivesse sido praticado, na sequência do que determina o n° 1 do art. 175º do CPTA.
10. A execução segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos, sendo que, em caso de a sentença implicar a restituição de tributo já pago, são devidos juros de mora a partir do termo do prazo da sua execução espontânea (n°s. 1 e 2 do art. 102° da LGT). (sublinhado nosso)
11. Por outro lado, nos termos do n° 2 do art. 146° do CPPT, “o prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução, podendo o interessado requerer a remessa no prazo de 8 dias após o trânsito em julgado da decisão». E decorrido o prazo de execução espontânea sem que a sentença seja cumprida, pode, então, o interessado requerer ao Tribunal Tributário que a tiver proferido (em 1° grau de jurisdição) a respectiva execução (n°3 do citado art. 146° e n° 1 do art. 176° do CPTA).
12. E somente depois de decorrido o referido prazo de execução espontânea por parte da AT «... o credor da restituição de tributo pago, terá direito a juros de mora.
13. Tendo a sentença recorrida determinado que deve a “Entidade Executada proceder, no prazo de trinta (30) dias, ao pagamento daquela quantia…” (indemnização por prestação de garantia indevida), essa obrigação mantém-se durante o prazo da execução espontânea do julgado — 30 dias, nos termos do artigo 170.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável por força do artigo 102°, n.° 1, da LGT, e 146°, n.° 1, do CPPT.
14. Como se referiu anteriormente, a questão colocada no recurso é apenas a de saber se são ou não devidos os correspondentes juros de mora.
15. É nosso entendimento que os mesmos não são devidos, como já referimos anteriormente, O prazo de execução espontânea deste julgado — 30 dias — ainda não decorreu, pois a sentença recorrida foi notificada à Administração em 12/03/2014, pelo que ainda não ocorreu o trânsito da respectiva decisão.
16. Assim, atento o disposto no artigo 102°, n° 1 da LGT, os processos de execução de julgados dos tribunais tributários são regulados pelas normas aplicáveis à execução de julgados dos tribunais administrativos, a saber artigos 170° e segs. do CPTA.
17. Estabelecendo no que respeita à eficácia das sentenças, o n° 1 do artigo 160° do CPTA que “Os prazos dentro dos quais se impõe à Administração a execução das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos correm a partir do respectivo trânsito em julgado”. (sublinhado nosso)
18. Facto é, que por regra os recursos das decisões proferidas pelos tribunais administrativos têm efeito suspensivo, cfr artigo 143°, n° 1 do CPTA e assim o sustentam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos 3ª edição revista 2010, pág. 1046.
19. Segundo aqueles autores, compreende-se por isso, que a Administração também só tenha de executar as sentenças a partir do respectivo trânsito em julgado, cfr. artigo 160°, n.° 1 do CPTA, uma vez que, só a partir desse momento se impõe verdadeiramente o princípio da obrigatoriedade das decisões judiciais, cfr. artigo 158°, n.° 1 do CPTA.
20. No presente caso, atendendo ao facto de ainda não existir uma decisão transitada em julgado que confirme o incumprimento do pagamento referente aos encargos com a prestação das garantias, a Administração não está ainda a incumprir o prazo para a execução espontânea da sentença, como é evidente, os mesmos não são devidos.
21. E, como decidiu esse Supremo Tribunal, no Acórdão de 24-11-2010, proferido no Processo n°01103/09, em situação semelhante, cuja doutrina (nesta parte) subscrevemos:
22. «(...) quanto aos “juros moratórios”, uma vez que não houve prévia condenação da Administração ao pagamento da indemnização pelos prejuízos sofridos pelo contribuinte com a prestação da garantia, não estando, assim, esta obrigada a pagar-lhe esse tipo de indemnização no âmbito da execução espontânea da decisão anulatória, não pode considerar-se, como considera o Recorrente, que existiu atraso ou mora da Administração na reconstituição da plena legalidade no que concerne ao ressarcimento dessas despesas a partir do termo do prazo da execução espontânea do julgado anulatório» (publicado em www.dgsi.pt).
23. E assim sendo — como é —, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, não são devidos ao contribuinte quaisquer juros.
24. Além do mais não se entende a razão pela qual o início da contagem dos juros deve ser a partir da citação da Entidade demandada na acção de execução. Assim, do confronto do n° 1 e 2 do artigo 219° do CPC resulta que tanto a citação como a notificação servem para dar conhecimento de um facto ou chamar alguém a juízo. A citação destina-se, essencialmente, a dar conhecimento ao réu de que contra ele foi proposta uma acção, de forma a possibilitar a sua defesa. Mais, a citação constitui um acto essencial para efeitos de realização do princípio do contraditório, visto que dá as partes a oportunidade de defesa.
25. Perante estes conceitos e funções da citação, não se compreende como se pode através da citação vir determinar que é a partir deste momento que a Administração fica na obrigada ao pagamento dos correspondentes juros de mora. Sendo que estes, são de aplicar exactamente quando a Administração incumpra o prazo para a execução espontânea da sentença, entrando, assim, numa situação de mora.
26. Ao assim não entender, a douta sentença recorrida procedeu a uma menos correcta interpretação e aplicação da lei, sendo desconforme com todos os preceito legais acima referidos, e, em consequência, não merece ser confirmada na parte referente aos juros de mora.
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deverá ser considerado procedente o recurso e revogada parcialmente a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.

3. Não houve contra-alegações.

4. O magistrado do Ministério Público emitiu parecer, pronunciando-se pela procedência do recurso, conforme se transcreve:

Recorre a Autoridade Tributária e Aduaneira da sentença do TAF do Porto de 27.02.2014 que, julgando procedente a pretensão executiva deduzida pela firma A…………. SA, condenou a ora recorrente no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, no montante de € 26.446,18, quantia esta a ser paga no prazo de 30 dias, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados sobre aquele montante desde 18.06.2012 (data da notificação da entidade executada para os presentes autos de execução de julgados) até efectivo e integral pagamento.
É o segmento relativo aos juros de mora que vem questionado no presente recurso.
Vejamos:
A execução pela Administração da sentença anulatória de acto administrativo “corresponde à noção de cumprir, de dar seguimento à transformação operada pela sentença: a execução de sentença de anulação do acto administrativo consubstancia-se na execução voluntária, no cumprimento pelo próprio obrigado (a Administração), dos deveres que se lhe impõem” (cfr. Mário Aroso de Almeida, in “Anulação de Actos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes”, pág. 25).
O dever de executar a sentença anulatória consubstanciado, nos termos legais, pela reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, implica que a Administração extraia “todas as consequências jurídicas da anulação decretada pelo tribunal” através da “prática de actos jurídicos e operações materiais necessários à reintegração efectiva da ordem jurídica violada” (Cfr. Mário Aroso de Almeida, in ob. cit. a pgs. 418, citando Diogo Freitas do Amaral) - art. 100.º da LGT e 173º do CPTA.
De facto, em caso de procedência total ou parcial de impugnação judicial a AT está obrigada à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei (art. 100º da LGT, redacção da Lei n. 64- B/2011, de 30 de Dez.).
No que especificamente respeita à indemnização por prestação de garantia indevida há lugar a indemnização, pelos prejuízos resultantes da sua prestação, nos precisos termos dos nºs. 1 a 3 do art. 53.°, n.º 1 da LGT.
Refere Mário Aroso de Almeida, in “Anulação de Actos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes”, pág. 25, que a mesma, segundo Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in LGT Anotada e comentada, 4ª edição, pgs. 869, “(a)pesar de neste art. 100º se fazer referência apenas a juros indemnizatórios, o sujeito passivo poderá ter também direito a juros de mora, nos termos do n.º 4 do art. 43°, aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro”.
Sendo presentemente pacífica a jurisprudência no sentido de que pedido pode ser formulado em execução de sentença anulatória, a questão que a recorrente coloca prende-se unicamente com os juros de mora que foram fixados na sentença.
Os juros moratórios têm por finalidade a reparação do dano moratório decorrente da não realização da prestação em causa no tempo devido
Embora a indemnização por prestação de garantia indevida se compagine com o dever de reconstituição plena da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, a verdade é que a mesma, como assinala Jorge Lopes de Sousa, in CPPT Anotado e Comentado, 6ª edição, vol. III, a págs. 240, “não se insere no âmbito da execução espontânea (designadamente porque a administração tributária nem saberá exactamente o que o impugnante despendeu com a prestação de garantia)”.
Assim, tendo sido formulado em execução de sentença o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, não podem acrescer juros moratórios à indemnização fixada uma vez que inexiste incumprimento gerador de dano moratório a ressarcir (cfr., nesse sentido, os doutos Acórdãos deste Supremo Tribunal de 24-11-2010 e de 18-06-2014 - Recs. nºs 01103/09 e 01062/12).
Concluo, em face do exposto, pela procedência do presente recurso e, nessa medida, pela revogação da sentença recorrida quanto ao segmento que vem sindicado.

5. Cumpre apreciar e decidir.

Considerando o valor da acção e o disposto no artigo 151 do CPTA foi suscitada a incompetência do STA para conhecer do recurso em razão da hierarquia.

II. Fundamentos

De facto

1. O Processo de Impugnação n° 2043/04.6BEPRT deste Tribunal, instaurado pela ali Impugnante, aqui Exequente, A………….., SA., NIPC …………., com vista à anulação da liquidação adicional de IVA referente ao ano de 2002 no valor de 435.366,60 € (liquidação nº 04205251) e respetivos juros compensatórios, foi julgado procedente por sentença de 15/07/2011 (constante de fls. 324 ss. daquele Processo de Impugnação, apenso aos presentes autos), cujo segmento decisório é o seguinte:
Em consequência do exposto, julga-se totalmente procedente a presente impugnação e, por via disso, anulam-se as seguintes liquidações:
- Nº 04205251 referente a IVA 2002, no valor de € 435.366,60, cujo prazo de pagamento voluntário terminava em 31/08/2004;
- Nº 04205248 referente a IVA (Juros compensatórios) 0209, no valor de € 74,76, cujo prazo de pagamento voluntário terminava em 31/08/2004;
- N° 04205249 referente a IVA (Juros compensatórios) 0211, no valor de € 12.241,60, cujo prazo de pagamento voluntário terminava em 31/08/2004;
- Nº 04205250 referente a IVA (Juros compensatórios) 0212, no valor de € 198,91, cujo prazo de pagamento voluntário terminava em 31/08/2004.
(cfr. fls. 324 ss. do Processo de Impugnação apenso aos presentes autos)
2. A ali Impugnante e a Fazenda Pública foram notificadas daquela sentença por ofícios de notificação datados de 19/07/2011, expedidos por correio registado naquela data, sentença que transitou em julgado sem que dela tivesse sido interposto recurso.
(cfr. fls. 352-359 do Processo de Impugnação apenso aos presentes autos)
3. A Petição Inicial daquele Processo de Impugnação n° 2043/04.6BEPRT foi apresentada neste Tribunal em 08/10/2004, nela apenas tendo sido peticionada a anulação da identificação liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios.
(cfr. fls. 1 e fls. 2 ss. do Processo de Impugnação apenso aos presentes autos)
4. Para cobrança coerciva da liquidação de IVA e juros compensatórios objeto de impugnação no Processo n° 2043/04.6BEPRT deste Tribunal foi instaurado o Processo de Execução Fiscal n° 1805200401071092, para cuja suspensão a sociedade impugnante, aqui exequente, apresentou em 11/10/2004 uma garantia bancária no valor de do CPPT 580.000,00 € emitida pelo Banco ………. (Garantia Bancária n° 125-02-0665291), a qual, veio a ser cancelada em 31/05/2007.
(cfr. Processo Administrativo apenso aos presentes autos)
5. Com a prestação e manutenção daquela garantia a sociedade aqui Exequente suportou um total de encargos de 17.899,98 €
(cfr. Doc., n°1 junto com a Petição Inicial, a fls. 21 dos autos)
6. Em 22/05/2007 a sociedade impugnante, aqui Exequente, apresentou nova garantia bancária, em substituição da anterior, no mesmo valor de 580.000,00 €, emitida pelo Banco ………….. (Garantia Bancária n° 36230484086730), tendo suportado com a prestação e manutenção desta garantia um total de encargos de 8.546,20 €.
(cfr. Processo Administrativo apenso aos presentes autos e Doc. n° 2 junto com a Petição Inicial, a fls. 23 dos autos)
7. Em 04/02/2012 o Processo de Execução Fiscal n° 1805200401071092 foi extinto por anulação, na sequência da sentença de 15/07/2011 proferida no Processo de Impugnação n° 2043/04.6BEPRT deste Tribunal.
(cfr. Processo Administrativo apenso aos presentes autos)
8. A Petição Inicial dos presentes autos de execução de julgados foi remetida a este Tribunal por correio eletrónico em 17/02/2012 (cujo respetivo original consta de fls. 11 ss.)
(cfr. fls. 1-4 ss. e fls. 11 ss. dos autos)

Questão prévia

Da incompetência em razão da hierarquia da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo para conhecer do recurso.

A execução de sentenças proferidas nos tribunais tributários é como já tem sido por várias vezes decidido nesta secção do Supremo Tribunal Administrativo regulada pelas normas do Código de processo nos Tribunais Administrativos por força do disposto no artigo 102 /1 da LGT que assim prescreve.
“A execução de sentenças dos tribunais administrativos e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos”.
O regime da execução de sentenças dos tribunais administrativos é regulado no CPTA nos artigos 157 e segs.
O recurso dos actos jurisdicionais praticados no processo judicial tributário em processo tributário e em processo de execução fiscal são regulados nos termos dos artigos 279 e segs do CPPT.
Mas o nº 2 do referido artigo 279 do CPPT estipula que os recursos dos actos jurisdicionais sobe meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.

Constituindo o a execução de julgados um meio comum à execução administrativa e tributária é forçoso concluir que face ao valor da causa e o disposto no artigo 151/1 do CPTA é o STA incompetente em razão da hierarquia para conhecer deste recurso.
Efectivamente este STA tem decidido neste sentido e de forma uniforme em vários arestos designadamente, nos acórdãos datados de 09/07/2014, recursos, nºs. 0165/14 e 01007/12.

Porque perfilhamos igual entendimento chamamos à colacção o acórdão de que se transcreve no que a tal questão importa:
“A execução das sentenças proferidas pelos tribunais tributários é regulada pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 102º da LGT («A execução das sentenças dos tribunais tributários e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos.»), ou seja, pelo disposto nos arts. 157º e ss. do CPTA. O presente recurso é interposto da sentença proferida nestes autos que improcedeu na totalidade o pedido executivo que havia sido formulado. Ou seja, o presente recurso jurisdicional encontra-se sujeito às regras previstas no CPTA, como resulta do estatuído no n.º 2 do art. 279.º do CPPT (« Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos».). Com efeito, a execução de sentença constitui um meio processual comum à jurisdição administrativa e tributária e do art. 278.º do CPPT resulta inequivocamente que o regime de recursos que nele se encontra previsto só se aplica aos processos regulados nesse mesmo Código. Pelo que, na falta de indicação do regime de recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária há que aplicar o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do art. 2.º do CPPT, sendo certo, além do mais, que toda a tramitação da execução é regulada por este mesmo CPTA. Neste contexto, importa ter em conta o disposto no art. 151.º, n.º 1, do CPTA, segundo o qual o recurso per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo só pode ocorrer «Quando o valor da causa seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável e as partes, nas suas alegações, suscitem apenas questões de direito (...)». Como referem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativo, 3.ª edição, Almedina, 2010, anotação 1 ao art. 151.º, pág. 999.), este recurso per saltum só é admitido desde que se encontrem preenchidos os seguintes requisitos: «(a) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (b) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável (artigo 151.º, n.º 1); (c) incida sobre decisão de mérito; (d) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (artigo 151.º, n.º 2)».
No caso, o valor da execução é de 10.228,96€ (juros e capital), que foi o indicado na petição inicial.
Assim sendo, atento o disposto no art. 31.º, n.º 2, alínea c) do CPTA («2 - Atende-se ao valor da causa para determinar:
[…]
c) Se cabe recurso da sentença proferida em primeira instância e que tipo de recurso».) e no já citado n.º 1 do art. 151.º do mesmo código, verifica-se uma circunstância que, desde logo, exclui que o recurso possa assumir-se como uma revista a dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo e impondo-se, consequentemente, observar o disposto no n.º 3 do mesmo art. 151.º do CPTA, segundo o qual «Se, remetido o processo ao Supremo Tribunal Administrativo, o relator entender que as questões suscitadas ultrapassam o âmbito da revista, determina, mediante decisão definitiva, que o processo baixe ao Tribunal Central Administrativo, para que o recurso aí seja julgado como apelação, com aplicação do disposto no artigo 149.º».

Concluímos, portanto, pela incompetência, em razão da hierarquia, desta Secção de Supremo Tribunal Administrativo para conhecer do presente recurso, sendo competente para o seu conhecimento a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte. Nem se diga que ao caso não se aplica o disposto no art. 152.º do CPTA por a distribuição da competência entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, no que se refere ao contencioso tributário, dever ser a que resulta dos arts. 26.º e 38.º do ETAF, motivo por que sempre competiria à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito [cfr. art. 26.º, alínea b) do ETAF] e à Secção de Contencioso Tributário dos tribunais centrais administrativos conhecer dos recursos de decisões dos tribunais tributários, salvo o disposto na referida alínea b) do art. 26.º [cfr. art. 38.º, alínea a) do ETAF].
Na verdade, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica (Apesar de o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais ter sido aprovado por lei (Lei n.º 13/2002, de 15 de Fevereiro) e o Código de Procedimento e de Processo Tributário o ter sido por decreto-lei (Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro), entre a lei e o decreto-lei não existe relação de hierarquia. Para maior desenvolvimento, J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 166 e segs.), regulem de modo que conduza a resultado diverso noutras situações, como sucede, v.g., no art. 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do art. 279.º do CPPT.
Do exposto resulta que o presente recurso jurisdicional deve baixar ao Tribunal Central Administrativo Norte, para aí ser julgado como apelação”.


Decisão

Pelas razões constantes do aresto transcrito que subscrevemos, acordam, os juízes da Secção do Contencioso Tributário em conferência, em declarar este Supremo Tribunal Administrativo incompetente para conhecer do presente recurso e ordenar a baixa dos autos ao competente Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para que o recurso aí seja julgado como apelação (n.º 3 do art. 151.º do CPTA).

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça 1 UC.

Lisboa, 6 de Maio de 2015. - Fonseca de Carvalho (relator) - Isabel Marques da Silva - Pedro Delgado.