Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01050/13
Data do Acordão:10/09/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EMPREENDIMENTO TURÍSTICO
BENEFÍCIOS FISCAIS
Sumário:De acordo com o decidido pelo acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Janeiro de 2013 em julgamento ampliado, nos termos do disposto no art. 148.º do CPTA, no processo n.º 968/12, e que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2013, a aquisição de unidades de alojamento num empreendimento turístico, ainda que integradas no empreendimento em causa e, por isso, afectas à exploração turística, não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83.
Nº Convencional:JSTA000P16375
Nº do Documento:SA22013100901050
Data de Entrada:06/06/2013
Recorrente:A... E OUTRA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 109/12.8BELLE

1. RELATÓRIO

1.1 A……. e B……… (a seguir Impugnantes ou Recorrentes) recorrem para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou improcedente a impugnação judicial por eles deduzida contra as liquidações de Imposto Municipal sobre a Transmissão de Bens Imóveis (IMT) e de Imposto de Selo (IS) – Verba 1.1 e na qual pediram a anulação desses actos, sustentando, em síntese, que a aquisição que lhes deu origem beneficia de isenção de IMT e redução de IS por se integrar na previsão do art. 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, aquisição de «fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística».
1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.3 Os Recorrentes apresentaram a alegação de recurso, que resumiram em conclusões do seguinte teor:
«
1- Tratando-se da primeira aquisição de uma fracção integrante de um empreendimento turístico, feita com a opção deliberada de afectar o bem à exploração turística (como resulta claramente de o contrato de cedência de exploração ter sido assinado ainda antes da escritura pública de compra e venda), e mantendo-se a unidade afecta a esta actividade, devem ser aplicáveis a essa aquisição os benefícios fiscais previstos no artigo 20.º do DL 423/83 – isenção de IMT e redução de 4/5 de Imposto do Selo.
2- A posição do Douto Tribunal na sentença ora recorrida, parece, com a devida vénia, resultar da desconsideração da nova realidade jurídica constituída pelo aldeamento turístico, em que se verifica, ao contrário de anteriores situações de aplicação destes benefícios, e para além do promotor, uma pluralidade de proprietários que adquiriram as suas fracções antes da entrada em funcionamento do empreendimento e em que todos exercem, através das unidades de alojamento de que são proprietários, uma actividade turística.
3- O conceito de instalação, em torno do qual gira toda a questão em apreciação, deve, desta forma, ser interpretado de forma dinâmica, e, muito em particular, com consideração dessas novas realidades jurídico económicas.
Nestes termos e nos demais de Direito e com o sempre mui Douto Suprimento deste Venerando Tribunal deve ser dado provimento ao presente Recurso, anulando-se a Douta Sentença recorrida, por ilegal com as demais consequências legais, nomeadamente a anulação da liquidação de IMT, IS e juros compensatórios».
1.4 A Fazenda Pública não contra alegou.
1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto, que identificou a questão decidenda como sendo a da «interpretação do inciso com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística integrante da previsão da norma constante do art. 20.º n.º 1 DL n.º 423/83, de 5 Dezembro, enquanto pressuposto da isenção de IMT e da redução do Imposto de Selo para um quinto, na aquisição de prédios ou de fracções autónomas», emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento. Isto, com a seguinte fundamentação:
«1. A norma controvertida deve ser interpretada com um duplo sentido segundo o qual:
˗ a aquisição dos prédios ou fracções autónomas deve ser prévia à instalação do empreendimento de utilidade turística;
˗ a instalação do empreendimento turístico precede necessariamente o seu início de funcionamento.

Argumentário:
1.º O elemento teleológico da concessão do benefício fiscal, consistente na promoção do investimento dirigido à criação de empreendimentos turísticos novos, à remodelação, beneficiação, reequipamento ou aumento substancial da capacidade dos empreendimentos existentes; e não na promoção da aquisição de fracções integradas em empreendimentos já instalados (art. 7.º DL n.º 423/83, de 5 Dezembro);
2.º O DL n.º 167/97, de 4 Julho, considerava instalação de empreendimentos urbanísticos o licenciamento da construção e ou da utilização de edifícios destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos (art. 9.º);
3.º O DL n.º 55/2002, 11 Março, fez recuar a data da instalação ao (início do) processo de licenciamento ou de autorização para a realização de operações urbanísticas relativas à construção e ou utilização de edifícios ou fracções destinadas ao funcionamento daqueles empreendimentos (nova redacção conferida ao art. 9.º DL n.º 167/97, 4 Julho);
4.º O DL n.º 39/2008, 7 Março (novo regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos) revogou os diplomas indicados na alínea precedente sem estabelecer um conceito normativo de instalação de empreendimento turístico;
5.º O elemento histórico e o elemento sistemático do diploma apontam inequivocamente no sentido da distinção em progressão cronológica das fases de instalação e de funcionamento e exploração.
2. A questão decidenda foi apreciada no recente acórdão STA-SCT, de 23 Janeiro 2013, processo n.º 968/12 proferido em julgamento ampliado (art. 148.º CPTA), com fundamentação que merece o sufrágio do Ministério Público e justifica a transcrição do sumário publicado no Diário da República n.º 44-Série 1, de 4 Março 2013:
O conceito de instalação, para efeitos dos benefícios a que se reporta o n.º 1 do art. 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, reporta-se à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos turísticos construídos/instalados em regime de propriedade horizontal uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação»
A doutrina do acórdão proferido pela formação ampliada foi, posteriormente, reiterada nos acórdãos STA-SCT 23.01.2013 processo n.º 1069/12; 30.01.2013 processo n.º 999/12; 30.01.2013 processo n.º 972/l2; 30.01.2013 processo n.º 1003/12; 30.04.2013 processo n.º 973/12.
3. Aplicação da doutrina do acórdão proferido pela formação ampliada ao caso concreto:
A aquisição pelos recorrentes em 25 Fevereiro 2011 da fracção autónoma com transmissão sujeita à incidência de IMT e de Imposto de Selo foi posterior à instalação do empreendimento turístico onde aquela se situava, o qual dispunha de:
˗ título constitutivo de empreendimento turístico com propriedade horizontal aprovado pelo Instituto do Turismo, IP em 20 Julho 2010 e 24 Setembro 2010;
˗ alvará de utilização para apartamentos turísticos de quatro estrelas emitido pela C.M. Vila do Bispo em 19 Julho 2010;
˗ estatuto de utilidade turística atribuído por despacho do Secretário de Estado do Turismo publicado no Diário da República, II Série, de 31 Dezembro 2010».
1.6 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.
1.7 A questão suscitada pelos Recorrentes é a de saber se a aquisição pelos ora recorridos, efectuada em 2011, de uma fracção autónoma que constitui unidade de alojamento do aldeamento turístico “C…………” e que integra um empreendimento turístico a que foi reconhecido o estatuto de utilidade turística, se destinou ainda à instalação desse empreendimento ou se integra, pelo menos, no processo de concretização dessa instalação, ou se, pelo contrário, o empreendimento já se encontrava instalado à data da aquisição. Dito de outro modo, importa indagar se a primeira aquisição de imóvel integrado em empreendimento a que foi atribuída utilidade turística ainda integra a fase de instalação do empreendimento.
* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO
Na sentença recorrida o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos:
«
1. Em 19 de Julho de 2010, a Câmara Municipal de Vila do Bispo emitiu o alvará de utilização n.º 152/2010, relativo ao “Aldeamento Turístico C…………”, onde consta a utilização “apartamentos turísticos de quatro estrelas”.
2. Nos dias 20 de Julho e 24 de Setembro de 2010, o Instituto do Turismo, IP, aprovou o título constitutivo do empreendimento turístico com propriedade horizontal designado “Aldeamento Turístico C………..”.
3. Em 31 de Dezembro de 2010, na 2.ª Série do Diário da República, foi publicado o Despacho do Secretário de Estado do Turismo n.º 19.364/2010 no qual, além do mais, foi decidido “1 – Atribuir utilidade turística a título definitivo ao Aldeamento Turístico C..........” e “2 – Fixar a validade da utilidade turística em sete anos (...) ou seja, até 19 de Julho de 2017”.
4. No dia 25 de Fevereiro de 2011, A…….. e B………. adquiriram a fracção autónoma designada pelas letras AZ, destinada a alojamento turístico, que faz parte do Aldeamento Turístico C……….
5. Os Impugnantes celebraram com D………., SA, na qualidade de entidade exploradora do aldeamento turístico “C……..”, um acordo designado “Contrato de Arrendamento para Exploração Turística” relativo à fracção autónoma identificada em 4.
6. No dia 7 de Janeiro de 2011, foram apresentadas as declarações Modelo 1 n.º 2011/5452 e 2011/5464 para liquidação de IMT e respectivo imposto de Selo Verba 1.1., referente àquela aquisição do direito de propriedade plena da fracção autónoma AZ do Aldeamento Turístico C…….., na proporção de 50% para cada Impugnante.
7. Com base em cada uma destas declarações foram emitidas – actos impugnados – as liquidações adicionais de IMT e IS que foram notificadas ao Impugnante respectivo nos seguintes termos: “Fica por este meio notificado para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção, solicitar guias neste Serviço de Finanças para pagamento do valor total de € 18.635,25, sendo € 16.981,25 referente a Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), e € 1.672,00 de Imposto de Selo, devido pelo facto de ter sido indevidamente reconhecida a isenção do IMT e 80% do Imposto de Selo, nos termos do artigo 20.º do DL n.º 423/83, de 5 de Dezembro, por se verificar que não estão reunidos os pressupostos para aplicação da isenção prevista no referido diploma legal (...)”».
*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A questão que se suscita no presente processo tem vindo a ser decidida de modo uniforme por este Supremo Tribunal Administrativo, na sequência do julgamento ampliado com a intervenção de todos os juízes desta Secção de Contencioso Tributário, realizado ao abrigo do disposto no art.º 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), no processo n.º 968/12, e que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2013, de 23 de Janeiro de 2013, publicado na 1.ª Série do Diário da República, de 4 de Março de 2013 (http://dre.pt/pdfgratis/2013/03/04400.pdf), págs. 1197 a 1217(O acórdão pode também ser consultado em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f4a0c005dab5bc0980257b110039c597?OpenDocument.).
A sentença recorrida louvou-se nesse acórdão, cuja fundamentação o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé adoptou.
No processo em que foi proferido o mencionado acórdão estava em causa indagar, tal como nos presentes autos, da ilegalidade dos actos de liquidação de IMT e de Imposto de Selo respeitantes à aquisição de uma fracção autónoma que faz parte de um aldeamento turístico, ou seja, se a mesma reúne todas as condições legais para beneficiar da isenção de IMT e de redução de imposto de selo previstos no art. 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, dada a utilidade turística reconhecida àquele aldeamento pelo Senhor Secretário de Estado do Turismo.
A sentença entendeu que não, pois não se verifica «o primeiro requisito cumulativo previsto naquele normativo – aquisição de fracção autónoma com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística –, uma vez que o empreendimento já se encontrava licenciado e apto a funcionar e os Impugnantes actuaram como consumidores finais de um produto turístico posto no mercado pelo promotor, que não como co-financiadores na construção do empreendimento, de modo que a aquisição da fracção já não integrou a fase de instalação do empreendimento, mas a da sua exploração».
Os Recorrentes continuam a sustentar que, tratando-se da primeira aquisição de uma fracção integrante de um empreendimento turístico, feita com a opção deliberada de afectar o bem à exploração turística e mantendo-se a unidade afecta a esta actividade, devem ser aplicáveis a essa aquisição os benefícios fiscais previstos no citado art. 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83 (isenção de IMT e redução de 4/5 de Imposto do Selo).
Ou seja, o que importa determinar é se a primeira aquisição de imóvel integrado em empreendimento a que foi atribuída utilidade turística se destinou ainda à instalação desse empreendimento ou se integra, pelo menos, no processo de concretização dessa instalação, ou se, pelo contrário, o empreendimento já se encontrava instalado à data dessas aquisições.
2.2.2 DO CONCEITO DE INSTALAÇÃO PARA EFEITOS DOS BENEFÍCIOS A QUE SE REFERE O ART. 20.º DO DECRETO-LEI N.º 423/83, DE 5 DE 5 DE DEZEMBRO
Como deixámos já dito, a questão foi apreciada e decidida no referido acórdão de 23 de Janeiro de 2013, proferido em julgamento ampliado com a intervenção de todos os juízes desta Secção de Contencioso Tributário, ao abrigo do disposto no art. 148.º do CPTA, o qual, por decisão tomada pela maioria dos Juízes Conselheiros em exercício na Secção, uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:
«O conceito de «instalação», para efeitos dos benefícios a que se reporta o n.º 1 do art. 20.º, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, reporta-se à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação»».
Como tem vindo a ser afirmado por este Supremo Tribunal Administrativo em ulteriores acórdãos em que a mesma questão se colocou, «tendo em conta a suprema importância da uniformidade da jurisprudência no âmbito interno dos tribunais, sobretudo em face da segurança e da estabilidade das relações jurídicas a que o direito deve ambicionar e aceder, e que encontra consagração no art. 8.º, n.º 3 do Código Civil – ao impor ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito – cumpre-nos aderir a essa orientação jurisprudencial e aos fundamentos em que se estriba o referido acórdão, vertidos, de forma abreviada mas elucidativa, no respectivo sumário». Sumário que é do seguinte teor:
«I – Na determinação do sentido e alcance das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”, sendo que “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei” (art. 11.º, n.ºs 1 e 2, da LGT).
II – No âmbito do regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, estabelecido no Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, o conceito de instalação de um empreendimento turístico compreende o conjunto de actos jurídicos e os trâmites necessários ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística (cfr. Capítulo IV, arts. 23.º ss).
III – Quando o legislador utiliza a expressão aquisição de prédios ou de fracções autónomas com destino à «instalação», para efeitos do benefício a que se reporta o n.º 1 do art. 20.º, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, não pode deixar de entender-se como referindo-se precisamente à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos.
IV – Este conceito de «instalação» é o que se mostra adequado a todo o tipo de empreendimentos turísticos e não é posto em causa pelo facto de os empreendimentos poderem ser construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».
V – Nos empreendimentos turístico constituídos em propriedade plural (que compreendem lotes e ou fracções autónomas de um ou mais edifícios, nos termos do disposto no art. 52.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março), destacam-se dois procedimentos distintos, ainda que possam ocorrer em simultâneo: um relativo à prática das operações necessárias a instalar o empreendimento; outro, relativo às operações necessária a pô-lo em funcionamento e a explorá-lo, sendo que a venda das unidades projectadas ou construídas faz necessariamente parte do segundo.
VI – O legislador pretendeu impulsionar a actividade turística prevendo a isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos (ou readaptar e remodelar fracções existentes) e não quando se trate da mera a aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento.
VII – Quem adquire as fracções não se torna um co-financiador do empreendimento, com a responsabilidade da respectiva instalação, uma vez que está a adquirir um produto turístico que foi posto no mercado pelo promotor, seja a aquisição feita em planta ou depois de instalado o empreendimento, como um qualquer consumidor final, tanto mais que as fracções podem ser adquiridas para seu uso exclusivo e sem qualquer limite temporal (no caso de empreendimentos turísticos constituídos em propriedade plural).
VIII – Não estando em causa a aquisição de prédios ou de fracções autónomas destinados à construção/instalação de empreendimentos turísticos, mas sim a aquisição de unidades de alojamento por consumidores finais, ainda que porque integradas no empreendimento em causa se encontrem afectas à exploração turística, a mesma não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83.
IX – Este resultado interpretativo é o que resulta do elemento histórico, racional/teleológico e também literal das normas jurídicas em causa.
X – “Os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.º/1 do EBF) (…)” e embora admitindo a interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF), não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.º/2 do C. Civil), para além de que porque representam uma derrogação da regra da igualdade e do princípio da capacidade contributiva que fundamenta materialmente os impostos, os benefícios fiscais devem ser justificados por um interesse público relevante».
Os Recorrentes não trazem ao processo novas razões, alegando, em síntese, por um lado, que o julgador devia ter seguido os objectivos constantes da introdução do Decreto-Lei n.º 423/83 e fazer uma interpretação mais actualizada dos princípios dele constantes, o que conduziria a uma decisão de sentido oposto àquela a que chegou e, por outro lado, alegam que a sentença recorrida e o acórdão em que a mesma se baseia enfermam de enorme confusão conceptual entre os conceitos de exploração e instalação, por os decisores não terem tido o cuidado e a preocupação de entender a realidade económica subjacente à instalação de um empreendimento turístico. O essencial da tese que defendem coincide com a tese que consta dos votos de vencido lavrados no referido acórdão.
Assim, em face do art. 8.º, n.º 3, do Código Civil, e tendo em conta que, desde a prolação daquele acórdão, a questão tem vindo a ser apreciada e decidida uniformemente e com o mesmo sentido decisório em vários outros acórdãos desta mesma Secção, impõe-se-nos, em respeito pela citada orientação jurisprudencial, julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença recorrida.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão:
De acordo com o decidido pelo acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Janeiro de 2013 em julgamento ampliado, nos termos do disposto no art. 148.º do CPTA, no processo n.º 968/12, e que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2013, a aquisição de unidades de alojamento num empreendimento turístico, ainda que integradas no empreendimento em causa e, por isso, afectas à exploração turística, não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83.
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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.
Custas pelos Recorrentes.
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Lisboa, 9 de Outubro de 2013. - Francisco Rothes (relator) - Valente Torrão - Ascensão Lopes.