Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02057/13.5BELRS
Data do Acordão:02/17/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:PRESCRIÇÃO
Sumário:I - O STA, na sequência da alteração de redação do art. 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), pela Lei n.º 55-B/2004 de 30 de dezembro, entendeu, desde logo, que a nova forma de contagem (em particular, quando iniciar o cômputo, casuístico, dos prazos de prescrição), respeitante ao IVA [e aos impostos sobre o rendimento (em determinadas situações)], era aplicável aos casos de prazos prescricionais, já, em curso, aquando da entrada em vigor, a 1 de janeiro de 2005, do diploma operante da aludida alteração.
II - Não existindo quaisquer superveniências capazes de colocar em causa esta forma de entender o aspeto em discussão, só podemos continuar a reiterar o doutrinado.
Nº Convencional:JSTA000P27225
Nº do Documento:SA22021021702057/13
Data de Entrada:11/11/2020
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A...........................
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;
# I.

O/A representante da Fazenda Pública (rFP) recorre da sentença proferida, no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, em 13 de maio de 2020, que julgou procedente oposição a execução fiscal (e apensos), apresentada por A………………, …, para cobrança de dívidas de IRS, IRC e IVA, do ano de 2003, no montante de € 107.346,09, na qualidade de responsável subsidiário.
A recorrente (rte) apresentou alegação, rematada com as seguintes conclusões: «

4.1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão que julgou procedente a Oposição judicial, intentada, pelo ora recorrido contra execução fiscal com o processo n.º 3107200501076728, e apensos, instaurados pelo Serviço de Finanças de Lisboa 8 por dívidas de IVA, IRC e IRS - Retenções na fonte, contra a sociedade comercial “B……………………., Lda.”, referentes ao exercício de 2003, dívidas essas posteriormente revertidas na ora oponente, no montante total de 107.346,09 €.

4.2. Como fundamentos da oposição invocou o oponente no seu petitório inicial, em suma, a falta de fundamentação do despacho de reversão e o não exercício de facto da gerência na sociedade executada, fundamentos estes geradores de ilegitimidade do oponente para a execução em questão, bem como a prescrição das dívidas tributárias em execução, fundamento de oposição este gerador da inexigibilidade da quantia exequenda.

Concluiu o seu articulado inicial peticionando a procedência da oposição, por provada, e, em consequência, a extinção da reversão.

4.3. O Ilustre Tribunal “a quo” julgou procedente a presente oposição, considerando, para o efeito, inexigível a dívida exequenda, por ter-se verificado a prescrição da mesma.

No entanto,

4.4. é entendimento da Fazenda Pública que a decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice.

Isto porque,

4.5. o Ilustre Tribunal recorrido, no respeitante à aplicação do direito à factualidade tida por assente, no modesto entendimento da Fazenda Pública e salvo sempre melhor entendimento, incorreu em erro de julgamento, não aplicando o devido regime jurídico no que ao início do decurso do prazo prescricional diz respeito, relativamente ao IVA e IRS - Retenção na fonte.

Ora,

4.6. considerou o Ilustre Tribunal a quo na sentença ora em crise, que por força do disposto no n.º 1 do artigo 48.º da LGT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, o início do decurso do prazo de prescrição das dívidas de IVA e IRC em questão, respeitando estes impostos ao ano de 2013 (2003), ter-se-á iniciado em 01-01-2004.

4.7. No entanto, é entendimento da Fazenda Pública, com o devido respeito e s.m.e., que o regime prescricional in casu aplicável, no que ao início de decurso do prazo de prescrição dos impostos em questão diz respeito, será o regime estatuído pelo n.º 1 do mesmo artigo 48.º da LGT, mas de acordo com a sua versão originária, que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro.

Em verdade,

4.8. e conforme consta da alínea D) do provatório, parte da dívida exequenda respeita a IVA e IRS - Retenções na fonte cujos factos tributários ocorreram em 2013 (2003). Ora, sendo incontroverso que os impostos em questão são classificados, no que à formação dos mesmos diz respeito, como sendo impostos de obrigação única, no que à prescrição diz respeito postulava o n.º 1 do citado artigo 48.º da LGT, à data em que ocorreram os respectivos factos tributários, que o início do cômputo do prazo prescricional verificava-se com o facto tributário, de acordo com a redacção dada ao normativo em questão pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro.

4.9. Isto porque nova redacção do n.º 1 do artigo 48.º da LGT, dada pela referida Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, no que ao início do decurso do prazo de prescrição das obrigações tributárias diz respeito, é aplicável apenas aos impostos cujos factos tributários se verifiquem após a vigência da referida Lei, ou seja, a partir de 01-01-2005.

Razão pela qual,

4.10. sendo o facto tributário o vetor relevante para a determinação do regime da prescrição, no que ao início do decurso deste diz respeito, é entendimento da Fazenda Pública, com o devido respeito e salvo melhor entendimento, que o regime prescricional aplicável in casu às dívidas de IVA e de IRS - Retenções na fonte terá de ser o constante do n.º 1 do citado artigo 48.º da LGT com a redacção que lhe foi dada pelo decreto-Lei n.º, 398/98, de 17 de Dezembro, e não o regime constante desse mesmo normativo com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, com início de vigência em 01-01-2005, sob pena de violação do princípio geral de direito da irretroactividade da lei, plasmado no artigo 12.º do Código Civil.

4.11. Ao assim não entender, o Ilustre Tribunal recorrido, no entendimento da Fazenda Pública e salvo sempre melhor entendimento, fez uma errada aplicação do regime jurídico in casu aplicável no que ao início do decurso do prazo de prescrição das dívidas tributárias de IVA e IRS - Retenções na fonte, diz respeito, violando o princípio geral da irretroactividade da Lei, plasmado no artigo 12.º do Código Civil, ao considerar o regime jurídico constante no n.º 1 do artigo 48.º da LGT, na sua redacção que lhe foi dada Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, no respeitante à aplicação do regime de prescrição das dívidas de IVA e IRS - retenções na fonte, incorrendo, assim, em erro de julgamento, no que à aplicação do direito diz respeito.

Razão pela qual,

4.12. com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, deve ser revogada a decisão ora recorrida, com as legais consequências daí decorrentes.

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e costumada

JUSTIÇA! »


*

Não ocorreu a formalização de contra-alegações.

*

O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, no sentido de que “deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida no segmento em que julgou verificada a prescrição das dívidas de IVA e IRS (retenção na fonte, do ano de 200), prosseguindo o processo para apreciação e decisão das restantes questões elencadas.”.

*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

*******

# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, consta: «

A) No Serviço de Finanças de Lisboa 8, foram instaurados contra a sociedade “B……………………., Lda.”, diversos processos de execução fiscal, sendo o principal o nº 3107200501076728 (cfr. fls. 1 e seguintes do PEF apenso);

B) O Oponente foi designado gerente da referida sociedade para o triénio 2002/2004 por deliberação de 01.10.2002 e renunciou ao cargo em 31.05.2005 (cfr. certidão permanente - Doc. 22 junto com a p.i.);

C) Por despacho assinado pela Chefe de Finanças, mas sem indicação de data, foi determinada a reversão contra o Oponente, na qualidade de responsável subsidiário, do qual consta, designadamente: “Face às diligências de fls.______ e estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s), prossiga-se a reversão da execução fiscal contra A………………… (…). (...) proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão.” (cfr. fls. 24 do PEF apenso);

D) Foi remetido ao Oponente o ofício “Citação (Reversão)” nº 1208, de 19.12.2012, através de carta registada com A/R, com o seguinte teor:

“(…) FUNDAMENTOS DA REVERSÃO

Inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (artº 23º/2 LGT).

Fundamentos de emissão central.

Insuficiência de bens da devedora originária (artº 23º/2 e 3 da LGT): decorrente da situação liquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal.

Gerência (administrador, gerente ou director) de direito (artº 24º/1/b da LGT) no terminus do prazo legal de pagamento ou entrega do imposto em questão, conforme cadastro da … AT

Gerência de facto, decorrente da remuneração da categoria A, auferida ao serviço da devedora originária no período em questão (…).

(cfr. registo nº 006587835 no SITAF);

E) O A/r foi assinado em 24.12.2012 (cfr. fls. 24-verso do PEF apenso);

F) Os autos de Oposição foram apresentados junto do Serviço de Finanças de Lisboa 8 em 23.01.2013 (cfr. fls. 3 dos autos).

Mais se provou que:

G) Em 31.04.2002, o Oponente outorgou, na qualidade de gerente da “B……………….., Lda.”, uma Procuração a favor de C……………….., constituindo-a como procuradora da sociedade com amplos poderes, cujo instrumento se dá aqui por reproduzido (cfr. Doc. 2 junto com a p.i.);

H) A sociedade executada originária foi declarada insolvente por sentença de 01.02.2007, proferida no processo nº 1619/05.9TYLSB que correu termos no Tribunal de Comércio de Lisboa (cfr. informação de fls. 57 dos autos);

I) Foi proferida decisão de encerramento do processo de insolvência por “insuficiência da massa insolvente, nos termos do disposto nos artigos 230º, nº 1, al. d) e 232º, nº 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa.”, o que foi publicado em Diário da República de 29.04.2008 (cfr. Doc. 5 junto com a p.i.). »


***

A rte atribui, à sentença recorrida, erro de julgamento, porque, no conhecimento e decisão, da invocada prescrição da dívida exequenda, não aplicou “o devido regime jurídico no que ao início do decurso do prazo prescricional diz respeito, relativamente ao IVA e IRS - Retenção na fonte”, pelo que, deve ser revogada, “com as legais consequências daí decorrentes”.

A fundamentação, jurídica, utilizada, pelo julgador, para afirmar a verificação da disputada prescrição, é do teor que, de seguida, se transcreve: «

Da prescrição da dívida exequenda
Alega o Oponente que as dívidas referentes a 2003 se encontram prescritas.
O órgão de execução fiscal, interpelado para averiguação da prescrição, nada referiu em relação às dívidas de 2003, apenas referindo que as respeitantes a 2001 e 2002 não foram incluídas na reversão.
Vejamos.
A prescrição traduz-se na faculdade concedida ao devedor (Oponente) de, após ter decorrido determinado prazo, previsto na lei, recusar o cumprimento da prestação e opor-se ao seu exercício coercivo (cfr. artigo 304º, nº 1 do CC). É uma garantia do contribuinte que tem por fundamento o interesse público, justificado por razões de certeza e segurança jurídicas. O prazo de prescrição corresponde, pois, ao espectro temporal de que o credor tributário (AT) dispõe para efectuar a cobrança coerciva dos respectivos créditos.
Sobre a prescrição, prevê o artigo 48º da LGT (na redacção originária):

(…).
Com a entrada em vigor da Lei nº 55-B/2004, de 30.12, foi alterado o nº 1 do artigo 48º, que passou a ter a seguinte redacção:
(…).
A respeito da interrupção e suspensão do prazo de prescrição, estabelece o artigo 49º da LGT, na redacção dada pela Lei nº 100/99, de 26.07, o seguinte:
(…).
A Lei nº 53º-A/2006, de 29.12, revogou o nº 2 do citado artigo e alterou o nº 3 e 4, que passaram a ter a seguinte redacção:
(…).
Revertendo o quadro legal descrito aos presentes autos:
Estão em apreciação, conforme explanado supra e como decorre da alínea D) do probatório, dívidas de IRS/Retenção na fonte, IRC e IVA do exercício de 2003.
Assim sendo, não é controvertido que o regime de prescrição aplicável é o previsto na LGT, que entrou em vigor a 01.01.1999, o qual estabelece o prazo de prescrição de 8 anos.
Sobre o início da contagem do prazo, o mesmo difere conforme a natureza do imposto em causa.
Quanto ao IRC, é unanimemente aceite que o mesmo constitui um imposto periódico, pelo que o prazo de prescrição se inicia a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, portanto, a 31.12.2013.
No que se refere ao IVA e IRS/retenção na fonte, verificou-se, como transcrito supra, uma alteração na lei que, a partir de 2005, passou a prever expressamente estes casos. Quanto à sucessão da lei no tempo é entendimento jurisprudencial reiterado, o seguinte:
“Estando em causa dívidas de IVA referentes ao ano de 2002 e sendo este imposto de obrigação única (e não um imposto periódico) o termo inicial do prazo de prescrição (de 8 anos) que se contava, à luz da inicial redacção do nº 1 do art. 48º da LGT, a partir da data da ocorrência dos respectivos factos tributários e não a partir do início do ano civil seguinte, passou a contar-se, por via da alteração que o art. 40º da Lei nº 55-B/2004 introduziu neste nº 1, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, ou seja, no caso, a partir de 1/1/2003.” (cfr. acórdãos do STA de 14.01.2015, processo nº 01684/13 e de 17.03.2011, processo nº 0177/11).
Tributando da referida tese, que é aplicável nos mesmos termos ao IRS/Retenção na fonte, resulta que, quanto a estas dívidas, o início do prazo de prescrição é 01.01.2004.
Resta aferir se ocorreu alguma das causas suspensivas ou interruptivas do prazo.
Desde logo, poderia equacionar-se a ocorrência da situação de insolvência [alíneas H) e I) do probatório] como causa suspensiva do prazo.
No entanto, neste conspecto, o Tribunal Constitucional já decidiu no acórdão nº 557/2018, de 23.10, “declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 100º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário, por violação do artigo 165º, nº 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa”, e como se afirma designadamente no acórdão do STA de 30.01.2019, processo nº 0708/17.1BEAVR, “Esse juízo de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, ainda que formulado após a prolação da sentença, impõe-se-lhe, uma vez que a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral de uma norma produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional (art. 282.º, n.º 1 da CRP)”.
Por conseguinte, tal causa abstracta de suspensão não releva em relação ao Oponente revertido.
Dos elementos carreados para os autos, não se vislumbra a ocorrência de qualquer outra causa de interrupção ou suspensão, nem mesmo a citação da sociedade devedora originária (do PEF apenso consta uma citação à devedora originária, mas no âmbito do PEF nº 3107200501126636, o que não é objecto da presente oposição).
Assim, na ausência de qualquer obstáculo à contagem linear do prazo de prescrição temos:
Relativamente ao IRC do exercício de 2003, o prazo de 8 anos, iniciado a 31.12.2003 termina a 31.12.2011; a respeito do IRS/Retenção na fonte e IVA do mesmo exercício, o terminus do prazo, iniciado a 01.01.2004, ocorreu a 01.01.2012.
Atendendo a que o Oponente apenas foi citado a 24.12.2012, conforme decorre das alíneas D) e E) do probatório, forçoso é concluir que, nessa data, já se encontravam prescritas, quanto a si, as dívidas exequendas objecto de reversão.
Mostra-se, assim, preenchido o fundamento de oposição previsto na alínea d) do nº 1 do artigo 204º do CPPT, devendo, por esse motivo, extinguir-se a execução contra o responsável subsidiário, aqui Oponente.
A verificação da prescrição determina a procedência da presente acção, conforme se determinará.
(…). »

A consideração dos termos em que a rte ataca o julgamento realizado na sentença recorrida, sobre a disputada prescrição, leva-nos a identificar, como questão decidenda, a de determinar qual a data do início do decurso do prazo prescricional, para as dívidas, de IVA e IRS - retenções na fonte, do ano de 2003; concretamente, se 1 de janeiro de 2004 (como julgado) ou 1 de janeiro de 2005 (como parece - só assim o recurso tem alguma lógica- sustentar a rte). Na primeira hipótese, a prescrição ocorreu a 1 de janeiro de 2012 e na segunda, consumar-se-ia no dia 1 de janeiro de 2013, sendo naquela, irrelevante a citação, do revertido, efetivada a 24 de dezembro de 2012 (Alínea E) dos factos provados.), enquanto, nesta, o mesmo ato interromperia o prazo prescricional em curso.

Na situação julganda, estando em causa dívidas de impostos, cuja exigibilidade (no caso do IVA) ou o facto tributário (para o IRS/retenção na fonte), ocorreram no ano de 2003, para decidir da sua, invocada, prescrição, em primeira linha, cumpria atentar no disposto pelo art. 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), na redação em vigor nesse determinante ano, ou seja, naquela que, originariamente, decorreu do Decreto-Lei n.º 398/98 de 17 de dezembro, vigente desde 1 de janeiro de 1999, cujo n.º 1 estatuía “As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.”. Sucede que, a partir de 1 de janeiro de 2005 (Redação da Lei n.º 55-B/2004 de 30 de dezembro.), a redação deste normativo foi acrescentada do seguinte segmento: “…, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.”.

Neste cenário e sequência legislativa, o STA entendeu, desde logo, que a nova forma de contagem (em particular, quando iniciar o cômputo, casuístico, dos prazos de prescrição), respeitante ao IVA [e aos impostos sobre o rendimento (em determinadas situações)], era aplicável aos casos de prazos prescricionais, já, em curso, aquando da entrada em vigor, a 1 de janeiro de 2005, do diploma operante da aludida alteração. Alicerçou esta posição, em síntese, nesta base argumentativa (Ver, acórdão, do STA, de 14 de janeiro de 2015 (01684/13).): «

« (…)

Ora, este novo modo de contagem do prazo de prescrição é já aplicável, no caso, a estas dívidas relativas ao IVA dos anos de 1999 e 2000, dado que se trata de prazos que estavam em curso no início da vigência da lei que introduziu tal alteração, não havendo aí qualquer aplicação retroactiva da nova disposição legal, uma vez que o facto extintivo do direito à cobrança coerciva da dívida tributária é duradouro (o decurso do prazo) e não instantâneo (o início do prazo em momento temporal determinado) - cfr. o segmento final do nº 2 do art. 12° do CCivil (entendimento idêntico tem, aliás, vindo a ser afirmado pela jurisprudência desta secção do STA - cfr., entre outros, os acs. de 26/11/08, no rec. n° 598/08; de 20/5/09, no rec. n° 293/09; de 25/6/09, no rec. n° 1109/08; de 3/3/10, no rec. n° 1076/09; de 30/6/10, nos recs. nºs. 0158/10 e 0201/10; de 17/3/2011, proc nº 177/11; e de 28/9/2011, proc nº 764/2011). (E também no acórdão de 8/2/2012, rec. nº 033/12, se chega à mesma conclusão, embora apelando à aplicação da regra contida no nº 2 do art. 297º e não à aplicação da regra do nº 2 do art. 12º, ambos do CCivil.)

(…).

Logo, cabe à lei nova a competência para determinar os requisitos da constituição da mesma situação jurídica. Achando-se uma situação jurídica em curso de constituição, passa o respectivo processo constitutivo a ficar imediatamente subordinado à lei nova».

Assim, não sendo o início do prazo de prescrição, mas o seu integral decurso, o facto extintivo do direito à cobrança da dívida por parte da AT, é de concluir que, por aplicação da regra contida no segmento final daquele nº 2 do art. 12° do CCivil e no nº 1 do art. 12º da LGT, a nova redacção do preceito é, no caso vertente, aplicável às dívidas exequendas…» (…). »

Não existindo quaisquer superveniências capazes de colocar em causa esta forma de entender o aspeto em discussão, só podemos reiterar o doutrinado e, consequentemente, sem mais, concluir que o julgado, em 1.ª instância, se mostra acertado, por em conformidade, ter eleito, como data do início da contagem da prescrição versada, o dia 1 de janeiro de 2004 e dar a mesma como verificada no dia primeiro do mês de janeiro de 2012.

Aliás, mesmo que se considerasse, como a rte propõe(?), a redação inicial do art. 48.º n.º 1 da LGT, a solução seria a mesma; ocorrência da prescrição. Efetivamente, tendo os factos tributários acontecido no ano de 2003, o prazo prescricional para o IRS iniciou-se em 31 de dezembro de 2003 e, no caso do IVA, respeitando a dívida aos quatro trimestres de 2003, no máximo, o prazo de prescrição, do IVA do 4.º trimestre de 2003, começou a correr no 1.º trimestre de 2004... Logo, em ambos os casos, estava transcorrido, quando, em dezembro de 2012, teve lugar o único (e consensual) facto interruptivo da discutida prescrição.

Em suma, a dívida exequenda prescreveu (o que só não teria sucedido, na hipótese, obtusa, sem apoio legal e/ou doutrinário, de se entender que os prazos prescricionais em apreço se iniciaram no dia 1 de janeiro de 2005).


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# III.


Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso.

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Custas pela recorrente.

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[texto redigido em meio informático e revisto]

Lisboa, 17 de fevereiro de 2021. – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.