Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01306/17
Data do Acordão:11/30/2017
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
Sumário:I - Não deve admitir-se revista relativamente a questão relativa a aspectos particulares da análise de um concreto “curriculum vitae” em confronto com um Caderno de Encargos e cuja decisão se mostra juridicamente plausível, por se tratar de questão singular sem qualquer projecção fora do concreto litígio onde é colocada.
II – Também não deve admitir-se revista relativamente a outras questões que plausivelmente não serão objecto de análise, por ficarem necessariamente prejudicadas com a solução dada a outras.
Nº Convencional:JSTA000P22644
Nº do Documento:SA12017113001306
Data de Entrada:11/20/2017
Recorrente:A..., SA
Recorrido 1:B..., SA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………… S.A. recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Sul, proferido em 21-9-2017, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Leiria, que por seu turno julgou improcedente a ACÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL instaurada contra B……………… S.A. indicando como contra-interessada C……………………….. S.A. pedindo, além do mais, a anulação da deliberação que excluiu a sua proposta no Concurso aberto pelo Anúncio de Procedimento n.º 6170/2016, para “Aquisição de Serviços de Manutenção de Infraestruturas de Rede, Equipamentos Mecânicos, Eléctricos e Electromecânicos do Sistema de Abastecimento de Água da B…………….”.

1.2. Fundamenta a admissão da revista por estar em causa a exclusão da sua proposta com base no estabelecido na al. b) do n.º 2 do art. 70º do CCP, por adesão ao acórdão deste STA proferido em 29-9-2016, no processo 0867/16, o qual conflitua com outros acórdãos deste mesmo Tribunal. Daí que, a seu ver, tanto basta para que o presente recurso seja admitido.

1.3. A entidade recorrida pugna pela não admissão da revista, alegando no essencial que “o Tribunal recorrido decidiu que se verificava a violação de aspecto da execução do contrato não submetida à concorrência, por experiência indicada na proposta para o técnico em causa não corresponder ao que era exigido pelo caderno de encargos e, com esse fundamento, decidiu, que se verificava a previsão legal que conduz à exclusão da proposta.” A invocação do acórdão 0867/16 destinava-se apenas – como decorre da leitura do acórdão recorrido – “se se tivesse verificado um caso de omissão da indicação da experiência do técnico em causa, na proposta”.

1.4. Pelas mesmas razões a contra-interessada pugna pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. Relativamente à questão que o recorrente coloca como justificativa da admissão da revista o TCA Sul começou por apreciar se a proposta da ora recorrente cumpriu os ditames exigidos no Caderno de Encargos, ou seja, saber se o “curriculum vitae” apresentado respeitava as exigências relativas às áreas de formação e experiência profissional.

O TCA, depois de referir que só no recurso para aquele tribunal é que a recorrente sustentava que o “curriculum vitae” do gestor do contrato por si proposto permitia concluir que o mesmo detinha experiência mínima exigida no Caderno de Encargos, acabou por concluir que “a análise do curriculum constante dos autos (e reproduzido na al. E) dos factos provados) revela a manifesta falta da experiência exigida pelo caderno de encargos”. Afastou ainda a tese da recorrente de que estávamos perante “omissões”, nos seguintes termos:

“(…)

Assim, ao contrário do que sustenta a ora recorrente nas conclusões 9ª e seguintes das respectivas alegações de recurso no sentido de que o currículo entregue contém omissões, do que atrás se disse resulta é que as referências não atestam a experiência do gestor de contrato na área da actividade em apreço. Vale isto por dizer, como bem alcançou o M.mo Juiz a quo, que aqui não se trata de ausência de elementos e/ou indicações susceptíveis de deixar o júri na dúvida sobre o preenchimento dos requisitos exigidos, ou seja, in casu, não ocorre qualquer omissão, o que traz implicada a inaplicabilidade dos acórdãos abundantemente citados pela recorrente.”

Todavia, o acórdão recorrido não ficou por aqui. A fls. 43 do acórdão disse o seguinte:

Acresce que mesmo a admitir-se que a recorrente se limita a omitir um termo ou condição, mesmo assim essa omissão determinaria também a exclusão da proposta com fundamento no art. 70º, n.º 2 al. b) do CCP, isso na senda da doutrina que dimana do acórdão do STA de 29-9-2016, no processo 0867/16.”

A recorrente sustenta neste recurso que está em causa uma omissão e que a decisão recorrida se apoia num acórdão do STA com um entendimento isolado face à demais doutrina e jurisprudência.

Todavia, e tendo em atenção a decisão do TCA e da 1ª instância, existe um entendimento sufragado pelas instâncias que prejudica o conhecimento da questão suscitada no recurso. Na verdade entendeu a decisão recorrida que o “curriculum vitae” apresentado permitia concluir pela ausência de experiência do colaborador proposto em gestão de contratos de manutenção de equipamentos (fls. 40 do acórdão). Ao que acresce a circunstância do TCA ter concluído que não se trata de uma omissão curricular, mas de um curriculum com referências que não atestavam a experiência do gesto de contrato na área da actividade em apreço. Quer isto dizer que o fundamento determinante, acolhido na decisão recorrida, para a exclusão da proposta não foi o de estar perante uma omissão curricular, mas perante um “curriculum” que não satisfazia as exigências do Caderno de Encargos.

A questão da interpretação do art. 70º, 2 do CCP de acordo com o acórdão 0867/16 ou de acordo com outros acórdãos em sentido divergente, pode – assim – nem chegar a colocar-se. Basta que se entenda que o recorrente nem sequer ataca a decisão do TCA Sul quando sustenta estar perante um curriculum demonstrativo da ausência de experiência; ou que efectivamente esse curriculum atesta essa ausência de experiência.

Com esta configuração a questão central deste processo é uma questão que nada tem de geral ou universal. Circunscreve-se, afinal, a analisar um concreto “curriculum vitae” e comparar as valências ali descritas com as exigidas no Caderno de Encargos. Esta tarefa foi levada a cabo pelo TCA (depois de ter reconhecido que se tratava de questão nova), não evidencia, nem lhe é imputado um erro manifesto ou evidente, para além de que em grande medida se trata de questão sobre apuramento da matéria de facto, excluída do âmbito da revista (art. 12º, 4 do ETAF). Tudo indica, pois, que relativamente a este aspecto as instâncias tenham decidido bem e em grande medida no âmbito da sua exclusiva competência (quanto aos factos provados e não provados).

Relativamente a esta questão é assim evidente que não se justifica admitir a revista.

A questão relativa à interpretação do art. 70º, 2 do CCP – é sem dúvida uma questão geral – mas a mesma só justificaria a revista se fosse decisiva para o julgamento da causa, o que, no presente caso não se afigura plausível.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 30 de Novembro de 2017. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.