Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01574/08.3BELRS 0626/13
Data do Acordão:12/17/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:CIRCULAR
GARANTIA
ACORDO
CONSOLIDAÇÃO NA ORDEM JURÍDICA
NEUTRALIDADE FISCAL
Sumário:I - Nos termos do disposto no artigo 31.º/2 (actual artigo 32.º) do EBF os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, por parte das SGPS, não concorrem para formação do lucro tributável, decorrendo da letra e espírito do citado normativo que apenas não concorrem para a formação do lucro tributável os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, sendo que o critério a ter em conta para a determinação dos encargos financeiros só pode ser o critério da afectação/imputação directa ou real.
II - A aplicação pela AT da Circular 7/2004, sem que tenham sido avançados fundamentos que conduzam à demonstração da inadequação do método utilizado pela recorrente, determina a ilegalidade da correção efectuada, pois que a invocada impossibilidade prática em distinguir os encargos financeiros, efectivamente, suportados com a aquisição de partes de capital, dos restantes encargos, não pode servir de fundamento para a utilização de um outro critério determinativo da correção sindicada.
III - Estando em causa contratos de mútuo em que ambas as sociedades se obrigaram conjunta e solidariamente na satisfação do crédito nos exactos termos contratuais, a sua responsabilidade é determinada pelo próprio contrato (princípio da liberdade contratual) sendo que ainda que uma das mutuárias seja dominante da outra, a sua posição contratual é própria, nos termos contratuais, e não pode ser transmutada em garantia atípica de obrigações sujeita ao regime de preços de transferência, por falta de verificação dos seus pressupostos.
IV - Os conceitos de colocação à disposição e recebimento de rendimentos são distintos como resulta da ordem natural das coisas e dos procedimentos, e o momento relevante para a verificação dos pressupostos para a dedução de 95% dos dividendos atribuídos por uma empresa brasileira à sua participante empresa portuguesa é, claramente, o do recebimento, decorrente da expressão legal “receber dividendos”, contida no artº 23º nº 2 da ADT Portugal-Brasil e não o momento da sua colocação à disposição.
V - O regime da consolidação fiscal parte sempre do pressuposto de que os resultados decorrentes das operações efectuadas entre sociedades do mesmo grupo são eliminados na totalidade, não só os resultados imediatos, mas igualmente todos os circunstancialismos que permitam considerar para efeitos fiscais o objecto de tais operações como desligado de uma operação intragrupo – princípio da neutralidade;
VI - Tanto o regime consagrado no DL 414/87, de 31/12, como o artigo 59º do CIRC provinham da mesma fonte comum, sendo que o regime daquele DL (Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado) acabou por ser incorporado no CIRC sem alterações relevantes a nível estrutural, nomeadamente quanto ao princípio da neutralidade fiscal.
Nº Convencional:JSTA000P25362
Nº do Documento:SA22019121701574/08
Data de Entrada:07/03/2013
Recorrente:A...., SGPS, S.A.
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 - RELATÓRIO – Processo nº 626/13-30
A Representante da Fazenda Pública e a A………, SGPS, S.A. melhor identificada nos autos, vêm, ambas, interpor recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por esta, contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada sobre a liquidação de IRC nº 2007 8500015694, referente ao exercício de 2003.
As recorrentes apresentaram as suas alegações de recurso com o seguinte quadro conclusivo, (sendo os negritos da nossa autoria para melhor apreensão/compreensão);
Recurso da Fazenda Pública:
«A) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por A………, SGPS, SA, contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada relativamente à liquidação de Imposto sobre o Rendimento das pessoas Colectivas (doravante “IRC”) n.º 2007 8500015694, respeitante ao exercício do ano de 2003, e acto de demonstração de acerto de contas n.º 2007 00001218577.
B) O presente recurso prende-se com a análise da decisão contida na sentença, sobre a correcção efectuada, em sede de inspecção tributária, no valor de € 11.074.676,69, respeitante aos encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, nos termos do art.° 31, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante “EBF”).
C) A fundamentação da sentença recorrida, na parte em que decaiu a posição da Administração Tributária, assenta, em síntese, no entendimento segundo o qual “... a fundamentação da correcção assenta, exclusivamente, na aplicação da circular, sem que tenham sido invocados, concretamente, quaisquer fundamentos que conduzam a inadequação do método utilizado pelo impugnante, sendo certo que, tal como referimos, este método não poderá ser afastado de forma automática (pela aplicação da circular), porquanto, o disposto n°2 do art.° 31.º do EBF não exclui a sua utilização.”
D) E continua considerando que “Em suma, a aplicação da fórmula vertida na Circular n.º 7/2004 aos encargos financeiros das Sociedades Gestoras de Participações Sociais, de forma automática, contraria o disposto no n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, consequência, ilegal.”
E) E conclui decidindo que “Face ao exposto, a correcção enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, e nessa medida, deve ser anulada, assistindo razão à Impugnante, nesta parte.”
F) Ora tal entendimento não pode esta representação da fazenda publica aceitar, porquanto:
G) A propósito da matéria em apreço, o art.° 31°, n.º 2 do EBF introduziu, no sistema fiscal português, uma isenção em matéria tributária de que beneficiam exclusivamente as SGPS, que consiste na não tributação das operações relativas à alienação de participações financeiras.
H) Entendeu também o legislador, em estrita obediência ao princípio do balanceamento entre os custos e proveitos, de resto já previsto no art.° 23.º do CIRC, afastar, para efeitos de tributação, os custos indispensáveis à obtenção dessas mesmas participações financeiras.
I) Sucede que, sendo as sociedades gestoras de participações sociais, regra geral, sociedades que recorrem normalmente ao financiamento bancário numa óptica de gestão de tesouraria integrada, querendo com isto dizer que utilizam tais financiamentos indistintamente em diversas e numerosas operações permitidas ao abrigo do seu regime jurídico, quer seja a aquisição de partes de capital quer seja a concessão de crédito às participadas, a prestação de serviços técnicos de administração e gestão ou a simples gestão corrente que são, como sabemos, as únicas actividades admitidas às SGPS.
J) Desta forma observando-se que sendo a moeda um bem fungível, ela pode ser substituída por outra que tenha o mesmo valor pecuniário pelo que, os recursos financeiros próprios podem facilmente ser substituídos por recursos financeiros oriundos de terceiros e vice-versa, originando desta forma a total impossibilidade de comprovação por parte da AT da utilização de recurso a empréstimos, cujos encargos não seriam elegíveis como custos, e levariam a legitimidade da correcção efectuada.
K) É daqui que advém a impossibilidade prática em distinguir os encargos financeiros efectivamente suportados com a aquisição de partes de capital dos restantes encargos financeiros suportados, o que levou a Administração Fiscal a implementar, por meio da dita circular 7/2004, um método de alocação/AFECTAÇÃO de tais encargos, com o objectivo de desconsiderar, na determinação do lucro sujeito a tributação, a parte associada a empréstimos utilizados na aquisição de partes de capital.
L) Sendo que, a fórmula proposta por esta Circular 7/2004 procura associar os encargos financeiros (juros suportados decorrentes de empréstimos obtidos) às aplicações que geram proveitos sujeitos a IRC (juros obtidos decorrentes de empréstimos remunerados concedidos), para considerá-los na determinação do lucro tributável (custos aceites fiscalmente).
M) Ora posto isto, o não reconhecimento da fórmula de cálculo preconizada pelo método previsto na Circular, como correctamente aplicada ao caso concreto, só poderá quer dizer que o Tribunal a quo não logrou atentar aos supra mencionados condicionalismos e dificuldades, sendo que os mesmos são por si só passíveis de alterar os objectivos subjacentes ao benefício legalmente concedido.
N) Mais importa ainda atentar que admitindo nós que, efectivamente tais orientações administrativas constantes de circulares ou ofícios - circulados são regulamentos internos que não vinculam os particulares, nem obrigam os tribunais, não deixam de ser relevantes para a adequada prossecução do interesse público.
O) Pelo que o teor das mesmas não deve ser simplesmente afastado sem que se proceda a análise da legitimidade da aplicação dos métodos que nas mesmas se preconizam e a relevância da sua aplicação ao caso concreto.
P) Ora in casu a metodologia prevista na circular era a única forma capaz de fazer cumprir a lei sem alterar o espírito inerente ao benefício fiscal em análise.
Q) Porquanto manter o sentido da decisão do Tribunal a quo, e considerando os constrangimentos supra mencionados, decorrentes da impossibilidade prática da determinação dos meios financeiros usados para fazer face a aquisição de partes de capital, mais não será que premiar os contribuintes que aproveitam os benefícios fiscais previstos na lei para deles extraírem resultados para além dos legalmente pretendidos.

Termos em que o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser reconhecida a legalidade da correcção efectuada e em consequência revogada a douta sentença que determinou a anulação parcial dos actos tributários impugnados.»

Recurso da A………, SGPS, S.A.:
(1) O presente recurso, circunscreve-se ao segmento da sentença que manteve na ordem jurídica os actos impugnados na parte correspondente às correcções que adiante se enunciam, posto que, em todos os casos o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento;
(ii) A correcção do resultado líquido do grupo no valor de “€ 3.681.542,38, relativo ao não reconhecimento em proveitos pela sociedade A………., SGPS, SA, da remuneração resultante da prestação de garantia pessoal atípica em conformidade com o Principio de Plena Concorrência previsto no art.º 58º do CIRC “ é ilegal por assentar no errado pressuposto de que esta norma é aplicável à posição assumida pela recorrente nas operações de financiamento por si realizadas em conjunto com a sua subsidiária A………FINANCIAL OPERATIONS, BV, com sede na Holanda;
(iii) Acontece que nem uma empresa independente estaria disposta a pagar, pela suposta garantia pessoal, o preço determinado pela Administração tributária (equivalente ao da emissão de garantias bancárias), nem, tão-pouco, uma empresa independente estaria, em circunstâncias comparáveis, disposta a prestar garantias pessoais em patrocínio de entidades terceiras, tanto mais que se trata de uma actividade para a qual uma entidade com a natureza da recorrente nem sequer teria capacidade (cf. artigo 6.º, n.ºs 1 e 4, do Código das Sociedades Comerciais e alínea b) do n° 1 do artigo 4.° e artigo 8.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro);
(iv) A alegada garantia pessoal prestada pela recorrente em benefício da sua participada constitui, antes, prática incluída na actividade própria dos accionistas (cf. previsto no § 7.9 do mencionado Relatório da OCDE), uma vez que a assunção das obrigações em causa visa o desenvolvimento da actividade da empresa participada e a rendibilidade do investimento financeiro da empresa participante;
v) Só na aparência, portanto, a assunção da posição assumida pela recorrente no âmbito dos contratos em causa surge livre e incondicionada, já que a «inexistência de remuneração» não tem aqui o significado de um enriquecimento da sociedade participada, por não a onerar com um vínculo retributivo;
(vi) Acresce que por força das disposições conjugadas dos artigos 501.º e 491.º do Código das Sociedades Comerciais, a ora recorrente já era responsável solidária pelo cumprimento das obrigações assumidas pela A………. FINANCIAL OPERATIONS B.V. o que significa que as obrigações alegadamente por si assumidas se reconduzem à reprodução formal do regime legal em vigor, não consubstanciando, por isso, um serviço susceptível de ser remunerado autonomamente.
(vii) Mais, a ora recorrente nota que a interpretação de acordo com a qual o disposto nos artigos 501.° e 491.º do Código das Sociedades Comerciais não é aplicável aos casos em que a participada tem sede noutro Estado-Membro sempre seria contrária ao Direito da União Europeia, nomeadamente ao disposto no artigo 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que corresponde ao revogado artigo 43.° do Tratado da Comunidade Europeia), relativo aos princípios da não-discriminação e da liberdade de estabelecimento; sendo, igualmente, inconstitucional por violação do disposto no artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.
(viii) Assim, a Administração tributária sempre estaria obrigada a reconhecer a desconformidade entre o suposto âmbito de aplicação do regime de responsabilidade da sociedade dominante e o Direito da União Europeia, abstendo-se de determinar qualquer correcção com fundamento no artigo 58.º do Código do IRC;
(ix) Considerando o disposto no artigo 276.º do TFUE, a menos que considere que a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia nesta matéria é suficientemente clara para dissipar qualquer dúvida sobre a conformidade das disposições internas acima identificadas com o artigo 43.º do TCE (artigo 49.° do TFUE), o Tribunal ad quem deve reenviar esta questão àquele órgão europeu, o que desde já se requer.
(x) A Administração tributária incorreu, ainda, em erro ao considerar como operações comparáveis a prestação pelos Bancos de garantias bancárias a pedido da recorrente em diversos processos de execução fiscal, já que, nem estas garantias implicam os mesmos riscos para o emitente, nem o credor, beneficiário da garantia, se encontra igualmente garantido num caso e noutro;
(xi) Na verdade, a garantia cuja prestação a Administração tributária imputa à recorrente é, a existir, uma garantia necessariamente acessória, posto que comunga das vicissitudes da relação jurídica principal, em termos tais que a sua validade, eficácia e conteúdo se vão ajustando à medida das mutações que aquela relação jurídica principal vai sofrendo;
(xii) A demonstração da natureza diferente da garantia alegadamente prestada pela recorrente relativamente à que foi utilizada para comparação implica que se conclua pela ilegalidade da correcção em apreço, por erro sobre os pressupostos de direito, já que não se verifica o requisito da comparabilidade. E a inexistência deste requisito verifica-se, igualmente, no que respeita à remuneração, já que a remuneração pela prestação de garantias bancárias nunca seria a adequada para fixar a remuneração da garantia supostamente prestada pela recorrente;
(xiii) Acresce, ainda, que, o entendimento manifestado pelo Tribunal a quo quanto a esta matéria parte de uma confusão entre os conceitos de acessoriedade e de subsidiariedade ou, de outro prisma, entre as ideias de incomunicabilidade dos vícios da relação principal no caso de garantia autónoma, por um lado, e de responsabilidade principal do condevedor, por outro;
(xiv) Assim, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter mantido na ordem jurídica uma correcção que não encontra acolhimento no regime previsto no artigo 58.º do Código do IRC impondo-se a sua revogação por violação do mesmo preceito legal, com as demais consequências;
(xxiii) São também ilegais as correcções realizadas pela Administração tributária com referência aos ajustamentos do consolidado. Assim...
(xxiv) A Administração tributária acresceu ao resultado fiscal do GRUPO A……… o valor de € 12.256.484,29 referente à não aceitação das amortizações decorrentes da reavaliação de bens do activo imobilizado - transmitidos intragrupo em 1996 - que foi realizada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro. Entendeu a Administração tributária que se encontraria esgotado o período máximo de vida útil dos mesmos bens posto que calculou o referido período máximo de vida útil por referência ao ano em que os mesmos entraram em funcionamento na sociedade alienante (a ora recorrente);
(xxv) A Administração tributária acresceu também ao resultado do GRUPO A………, o valor global de € 3.605.788,40, por considerar que, em virtude de os bens do activo imobilizado terem sido reavaliados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 22/92, de 14 de Fevereiro, ainda antes da sua transmissão intragrupo - que ocorreu em 1996 - o GRUPO A……..deveria ter acrescido 40% do excesso das amortizações decorrentes das reavaliações efectuadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 22/92, de 14 de Fevereiro, por a isso se encontrar obrigada a entidade alienante;
(xxvi) Ambas as correcções assentam no pressuposto de que “durante o período em que os bens do activo transaccionados infra-grupo continuarem a pertencer ao património do mesmo, as reintegrações e amortizações desses mesmos bens são calculados como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo”
(xxvii) O Tribunal a quo concluiu que assistia razão à Administração tributária, uma vez que considerou que o “nº 2 do art.° 16.º do preâmbulo do CIRC veio estender o regime do art.° 6.º, do DL n.º 414/87, de 31 de Dezembro, às situações de abrangidas pelo regime de tributação pelo lucro consolidado previsto no CIRC”;
(xxviii) A Administração tributária acresceu, por último, ao resultado do GRUPO A……… o valor global de € 47.962,74, relativo à incorporação, no exercício de 2003, dos resultados internos obtidos em transmissões efectuadas entre a recorrente e a A…….. INDÚSTRIA DE ………, S.A., durante o regime de tributação do lucro consolidado. Esta correcção assentou no pressuposto de que os resultados eliminados aquando da transmissão intragrupo de bens do activo imobilizado se consideram realizados nos exercícios em que tais bens sejam transmitidos a entidades estranhas ao grupo, nos termos afirmados na Circular 15/94, de 6 de Maio;
(xxix) O Tribunal a quo também não expurgou da ordem jurídica a correcção correspondente à reposição dos resultados suspensos, argumentando, para o efeito, que o artigo 7.º, nº 2, da Lei n.º 30-G/ 2000, de 29 de Dezembro, estabelece um transitório segundo o qual a sociedade dominante deve “incorporar no lucro tributável do grupo os resultados internos que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo”. Acrescentando, ainda que a interpretação da Circular n.º 15/94, de 06 de Maio se encontrava “em consonância com a lógica do sistema de consolidação e com o regime excepcional do art.° 59.°, n.º 8, do CIRC, reflectindo o entendimento (...) vertido no preâmbulo do DL n.º 251-A/91, de 16 de Julho”;
(xxx) Acontece, todavia, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, já que as correcções efectuadas pela Administração tributária se encontram inquinadas de erro sobre os respectivos pressupostos de direito;
(xxxi) No que diz respeito à correcção do ajustamento das amortizações, bem como à correcção do ajustamento correspondente a 40% e do aumento das reintegrações, os problemas que se colocam são os de saber se, (i) tendo os referidos bens reavaliados sido alienados, em 1996, à A……. — INDÚSTRIA DE ……., SA (que posteriormente procedeu a uma nova reavaliação de parte desses bens), a amortização dos mesmos bens deve obedecer ao regime que vinha sendo seguido pela sociedade alienante, e se (ii) a limitação (dos 40%) da sociedade alienante, em termos de dedução fiscalmente relevante do acréscimo das reintegrações resultante da reavaliação anterior dos mesmos bens, constituía, ou não, uma limitação que igualmente se impunha à sociedade adquirente (a A……… - INDÚSTRIA DE ………., SA);
(xxxii) Acontece que, nem o regime previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, é aplicável às situações constituídas de acordo com o artigo 59.º do Código do IRC, nem o regime previsto nos artigos 59.° a 60.º do Código do IRC determina tal consequência no que respeita às amortizações ou às reintegrações resultantes das reavaliações efectuadas em momento anterior ao da transmissão intragrupo dos elementos do activo imobilizado;
(xxxiii) De facto, embora o regime da tributação dos grupos de sociedades, introduzido em Portugal pelo Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, determinasse que “as reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos são calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo” e que “As mais-valias ou menos-valias correspondentes aos mesmos elementos, quando se verifique a sua posterior transmissão e haja lugar a imposto, são calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo” (cf. artigo 6.°, nº. 2, alíneas a) e b) desse diploma legal), tal disciplina não foi mantida, nesses exactos termos no regime constante dos artigo 59.° e seguintes do Código do IRC;
(xxxiv) É que o n.º 1 do artigo 59.º do Código do IRC previa, simplesmente, que o lucro tributável em IRC do grupo de sociedades deveria “calculado em conjunto para todas as sociedades do grupo mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados que o integram.” (o sublinhado é da recorrente);
(xxxv) Por efeito do referido método da consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados, “as vendas internas de imobilizado deverão ser corrigidas por forma a se evidenciarem os valores como se essa operação não se tivesse realizado. Por esse motivo, as correcções a efectuar serão: (...) Retificação do valor de aquisição (...) Anulação das mais ou menos-valias não realizadas (cf. ANTÓNIO BORGES, AZEVEDO RODRIGUES e ROGÉRIO RODRIGUES, Elementos de Contabilidade Geral, 19.ª edição, Áreas Ed, p. 1002) (o sublinhado é da recorrente).
(xxxvi) No respeita às implicações das transmissões intragrupo a solução que se extrai do n.º 1 do artigo 59º do Código do IRC é idêntica à que se encontrava vertida no revogado e acima transcrito artigo 6.°, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro - já que tanto ao abrigo do anterior regime da tributação pelo lucro consolidado como no âmbito da aplicação do regime que lhe sucedeu os efeitos fiscais das operações intragrupo eram totalmente eliminados;
(xxxvii) Com efeito, em ambos os regimes, não são tributadas as mais - valias ou menos -valias decorrentes das transmissões intragrupo. Do mesmo modo, também não é considerado o valor de realização dessas operações como custo de aquisição relevante para a determinação das consequentes mais-valias ou menos-valias que pudessem vir a ser realizadas aquando da futura venda desses mesmos bens.
(xxxviii) A única diferença que é possível identificar entre o anterior e o novo regime tem, pois, natureza meramente formal. Efectivamente, no n.º 1 do artigo 59.º do Código do IRC, a desconsideração (eliminação) dos efeitos fiscais das transmissões intragrupo não resulta - como sucedia no anterior regime — de específicas e detalhadas prescrições normativas [cf. alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro], ancorando-se, ao invés, na singela referência à consolidação de balanços e das demonstrações de resultados como método a utilizar na determinação do lucro tributável dou grupos.
(xxxix) Em ambos casos, portanto, as transmissões intragrupo assumem um carácter fiscalmente neutro.
(xl) Todavia, se relativamente ao apuramento das mais e menos-valias não existiam diferenças entre ambos os regimes, já o mesmo não sucedia em matéria de amortizações e de reintegrações;
(xli) Na verdade, o artigo 6°, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, exigia que as reintegrações e amortizações dos bens objecto de transmissão intragrupo fossem calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo. Este regime era semelhante ao previsto na alínea b) do n.º 4 do artigo 68.º do Código do IRC (regime das fusões e cisões na redacção em vigor em 2003), na qual também se prescreve a obrigação de as reintegrações e as amortizações sobre os elementos do activo imobilizado transmitidos serem efectuadas de acordo com o regime que vinha sendo seguido nas sociedades fundidas ou cindidas. Na amortização e reintegração desses bens para efeitos fiscais deveria, por isso, levar- se em linha de conta o respectivo valor liquido contabilístico (princípio da neutralidade) e, bem assim, continuar a aplicar o exacto e preciso regime que vinha sendo seguido nestas sociedades (característico do princípio da continuidade);
(xlii) Porém, a disciplina prevista no artigo 59.º do Código do IRC já não parece pressupor a aplicação do princípio da continuidade, ou seja, não implicava a manutenção do estatuto fiscal dos bens.
(xliii) E assim é posto que a lógica do grupo é diversa da que subjaz às operações de fusão ou cisão. Nestas últimas, existe um racional de continuidade no desenvolvimento de uma actividade económica, isto é, a ideia de empresa ou de ramo (autónomo) de actividade (enquanto unidade económica autónoma, nos termos do n.º 4 do artigo 68.° do Código do IRC). Já tratando-se de operações intragrupo, as transmissões de bens podem assumir os mais variados fins económicos, uma vez que as empresas que compõem o grupo não têm necessariamente que prosseguir a mesma actividade, não cabendo ao legislador optar por um deles, ou impor ou subentender, ao abrigo de um princípio de neutralidade supostamente assente numa — no caso concreto, errada — ideia de continuidade, uma utilização específica dos mesmos.
(xliv) A percepção destas diferenças terá constituído o motivo que levou o legislador a alterar o regime — de neutralidade fiscal justificado e reforçado por comandos de continuidade - anteriormente aplicável às operações realizadas intragrupo, nos termos previstos no revogado Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro, e a consagrar, ao invés, um regime de neutralidade justificado e assegurado, única e exclusivamente, pelo método de consolidação de balanços e demonstrações de resultados.
(xlv) De resto, no entender da recorrente, uma interpretação, segundo a qual o artigo 59.º do Código do IRC imporia às sociedades abrangidas pelo Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado uma determinada utilização obrigatória dos bens (atenta a obrigatoriedade de aplicação do mesmo regime fiscal que vinha sendo aplicável na sociedade alienante) contrariaria os mais elementares princípios da liberdade de iniciativa económica, plasmados na Constituição da República Portuguesa, em particular no seu artigo 61.º, o qual, sob a epígrafe de «Iniciativa privada, cooperativa e autogestionária», consagra, nas palavras de JORGE MIRANDA, “o direito de iniciar uma actividade económica, (..) [bem como o direito] de organização de certos meios de produção para um determinado fim económico” (cf. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo 1, Coimbra Editora, p. 620).
(xlvi) A eliminação dos resultados no âmbito de operações intragrupo, operada através da consolidação de balanços e de demonstrações de resultados, constitui, em sim mesma, garantia suficiente da plena e correcta aplicação do princípio da neutralidade às operações intragrupo, dispensando, deste modo, a convocação do erróneo pressuposto da continuidade.
(xlvii) Na verdade, nos casos em que a continuidade é um pressuposto (como sucede com as fusões), o regime de neutralidade tem como efeito a “desconsideração (ou eliminação) das operações”, tudo se passando como se a operação não tivesse sido realizada. Diferentemente, nos casos (como o presente) em que a transmissão é alheia à ratio de continuidade, o regime de neutralidade opera apenas a eliminação dos “resultados da operação”.
(xlviii) O conceito eliminação das operações visa identificar a ficção ablativa que caracteriza o regime da neutralidade assente no pressuposto da continuidade, e que consiste, efectivamente, na desconsideração da própria existência do acto translativo (como se o mesmo não tivesse existido). Pelo contrário, a denominada eliminação de resultados implica, somente, como se infere da própria expressão, a desconsideração dos efeitos directamente imputáveis à ocorrência do acto translativo (isto é, as consequências - os resultados - que este, não fora a indicada eliminação, seria susceptível de produzir).
(xlix) Ora, de acordo com o regime da tributação pelo lucro consolidado assente na consolidação de balanços e demonstrações de resultados — que é o que se encontra previsto nos artigos 59.º e 60.º do Código do IRC -, a transmissão intragrupo só implica a eliminação do resultado apurado nesse momento (mais ou menos-valia) e a desconsideração do correspondente valor de realização, com a consequente consideração, para efeitos fiscais, do valor pelo qual o bem se encontrava registado na sociedade alienante no momento da sua transmissão intragrupo.
(l) Ora, como atrás se indicou, a primeira correcção que a Administração tributária efectuou foi alicerçada no pressuposto de que aos bens objecto da reavaliação efectuada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro, se aplicava, por imposição do regime de tributação pelo lucro consolidado, o regime das reintegrações e amortizações previsto para os elementos do activo imobilizado adquiridos em estado novo ou fabricados ou construídos pela própria empresa (já que pressupunha que as reintegrações e amortizações fossem calculadas como se não tivesse existido transmissão infra grupo);
(li) Porém, uma vez que a transmissão intragrupo dos bens do imobilizado corpóreo não implica a manutenção do estatuto fiscal desses mesmos bens, os elementos do imobilizado que aqui se discutem não se encontravam sujeitos ao regime dos bens novos, mas, ao invés, ao regime das reintegrações e das amortizações previsto para os bens adquiridos em estado de uso. Neste sentido, já se pronunciou o Tribunal Tributário de Lisboa, na sentença (já transitada em julgado) proferida no âmbito do processo de impugnação judicial n.º 29/03, da 3 UO (cf. cópia da referida sentença junta pela recorrente com as suas Alegações em 1ª instância, a fls... dos presentes Autos);
(lii) Ora, relativamente aos bens adquiridos em estado de uso, a alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, determina que “as taxas de reintegração e amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada, o qual pode ser corrigido quando se considere que é inferior ao que objectivamente deveria ter sido estimado”. Por seu turno, o n.º 4 do citado artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, estatui que: “Quando em relação aos elementos mencionados nas alíneas a) e b) do nº 2 for conhecido o ano em que pela primeira vez tiverem enfiado em funcionamento, o período de utilidade esperada não pode ser inferior diferença entre o período mínimo de vida útil do mesmo elemento em estado de novo e o número de anos de utilização já decorrido”;
(liii) Do exposto resulta que, tratando-se de bens adquiridos em estado de usados como é o caso dos que aqui se apreciam -, são de considerar como custos ou perdas para efeitos fiscais todas as reintegrações ou amortizações praticadas até se encontrar esgotado o período de utilidade esperada, o qual (tendo também como limite máximo o período que se deduz de uma taxa igual a metade das taxas aceites fiscalmente segundo o método das quotas constantes) assume a particularidade de ser contado a partir da data da aquisição desses mesmos elementos em estado de uso
(liv) Assim, uma vez que a Administração tributária fundeou esta correcção numa limitação que tem por medida o período máximo de vida útil, ao invés, como se lhe impunha, de a analisar por referência ao período de utilidade esperada, é evidente que a correcção realizada pela Administração tributária não poderia manter-se, por assentar em pressupostos de direito errados, pelo que se impunha a sua anulação. Não tendo assim decidido, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, devendo ser revogada a sentença recorrida por ter mantido na ordem jurídica uma correcção ilegal, em violação do disposto no artigo 59.º do Código do IRC, bem como do artigo 5º, nº 2, alínea a), e n.º 4 do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro;
(lv) Do mesmo modo e por paridade de razões, tem que se aceitar que os bens reavaliados por uma das empresas do grupo perdem esse seu estatuto - de bens reavaliados -, com a consequente extinção das limitações que lhe estão associadas - v.g. a dos 40% em apreço -, a partir do momento em que sejam adquiridos por outra empresa do grupo, limitando-se o regime de neutralidade previsto no artigo 59.º do Código do IRC a impor que, no apuramento do lucro tributável do grupo, as amortizações sejam determinadas de acordo com o valor pelo qual esses bens se encontravam registados na esfera da sociedade transmitente, ou seja, in concreto, pelo valor resultante da reavaliação efectuada e não, portanto, pelo valor pelo qual esses bens foram adquiridos no âmbito da transmissão intragrupo;
(lvi) O que significa, portanto, que, no apuramento do respectivo lucro tributável, o GRUPO A……. não estava obrigado a acrescer 40% do aumento das reintegrações resultante das reavaliações anteriores à data da transmissão intragrupo dos bens, mas, apenas, como efetivamente fez, a acrescer 40% do aumento das reintegrações resultantes da reavaliação feita após 31 de Dezembro de 1996, ou seja, a realizada ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro.
(lvii) Sucede que, como acima se indicou, a Administração tributária considerou — erradamente - que a limitação (dos 40%) inerente à pessoa da recorrente se havia transferido, qua tale, para a sociedade adquirente (a A……. - INDÚSTRIA DE ………, SA);
(lviii) Assim, a correcção efectuada pela Administração tributária é ilegal, na medida em que se ancora no errado pressuposto de que os artigos 59.° e seguintes do Código do IRC consagram um regime de neutralidade fiscal assente no princípio da continuidade, quando, ao invés, aquele princípio encontra, ao abrigo do novo regime, a sua justificação no método da consolidação de balanços e de demonstrações de resultados, cuja aplicação não implica, como se viu, a manutenção, como se de uma sequela se tratasse, de todas as vicissitudes dos bens adquiridos intragrupo, mas tão-somente, a recuperação do valor contabilístico pelo qual esses bens se encontravam registados na esfera da alienante. Este foi também o entendimento seguido pelo Tribunal Tributário de Lisboa, no âmbito do já indicado processo nº 29/03, da 3ª Unidade Orgânica;
(lix) Não tendo assim decidido, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, impondo-se a revogação da sentença recorrida por ter mantido na ordem jurídica uma correcção que viola o disposto no artigo 59.º do Código do IRC;
(lx) Acresce que o Tribunal a quo só manteve estas correcções por considerar que “o princípio da continuidade previsto [no] artigo 6.º, nº 2, do DL n.º 414/87, permaneceu em vigor no regime de tributação pelo lucro consolidado previsto no CIRC”. Efectivamente, entende este Tribunal que o n.º 2 do artigo 16.º do Diploma preambular do Código do IRC vem “reforçar que o regime do art° 6.° do DL 414/87, de 31 de Dezembro, é aplicável a todas as situações de determinação da matéria colectável, quer as constituídas ao abrigo desse diploma, quer as novas, abrangidas já pelo CIRC”;
(lxi) Porém, esta interpretação quanto à aplicação daquela disposição transitória é errada. Na verdade, como é sabido, as disposições transitórias destinam-se a regular circunstâncias que, em face de uma nova regulamentação jurídica, exigem disciplina diferente. Foi exactamente essa - e não outra - a intenção do legislador.
(lxii) Com efeito, atento o que acima se indicou acerca das diferenças existentes entre o regime anterior e o regime de tributação do lucro consolidado consagrado nos artigos 59.º e seguintes do Código do IRC, impunha-se estabelecer um regime transitório aplicável aos grupos de sociedades anteriormente abrangidos pelo revogado Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro.
(lxiii) O a 1 do referido artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, encontra, assim, a sua justificação na significativa diferença existente entre o anterior e novo regime no tocante aos requisitos e às condições a observar na composição dos grupos e, consequentemente, na necessidade de garantir que a entrada em vigor de um novo regime com requisitos mais exigentes não era aplicável aos grupos já constituídos ao abrigo de um regime bastante mais flexível, como era o previsto no Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro. Efectivamente, o regime de tributação pelo lucro consolidado nos termos do regime anterior não impunha designadamente a inclusão no perímetro do grupo de todas as sociedades que satisfizessem os requisitos exi Já de acordo com o previsto no artigo 59.º do Código do IRC a inclusão de todas essas sociedades constituía uma das condições de aplicação do novo regime.
(lxiv) Porém, com o n.º 1 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro - que apenas se refere à validade da autorização emitida - o legislador pretendeu, somente, assegurar que os grupos de sociedades para os quais tivesse sido emitida uma autorização de tributação ao abrigo do disposto no artigo 1.º do Decreto n.º 414/87, de 31 de Dezembro, pudessem continuar a ser tributados no âmbito do regime de tributação pelo lucro consolidado após a entrada em vigor do Código do IRC, ainda que não reunissem todas as condições e não preenchessem todos os requisitos enunciados no artigo 59.º do Código do IRC para a composição dos grupos constituídos a partir de 1 de Janeiro de 1989.
(lxv) Na verdade, da simples referência à subsistência da autorização, em termos válidos, para a tributação pelo lucro consolidado, ou, melhor dizendo, da garantia conferida pela disposição em apreço quanto à subsistência do regime de tributação do grupo, nos termos e nas condições autorizadas (concedidas), não se extrai - por impossibilidade - qualquer solução relativa aos aspectos do regime que não fossem susceptíveis de se encontrar compreendidos nessa “autorização”, nomeadamente, os determinados no artigo 6º, n.º 2, do citado Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, os quais, por resultarem de lei, não se podem considerar compreendidos na previsão do n.º 1 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro.
(lxvi) Foi esse o motivo que levou o legislador a acrescentar o n° 2 ao referido artigo 16.º do Decreto-Lei que aprovou o Código do IRC. De facto, pretendendo o legislador assegurar que aos grupos já constituídos ao abrigo do regime anterior fossem também aplicadas as regras nele previstas para efeitos do apuramento do lucro tributável do grupo.
(lxvii) Assim, contrariamente ao que o Tribunal a quo indica, o efeito útil do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, não foi o de tornar extensível a aplicação 6º, n.º 2, do Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro, ao regime de tributação pelo lucro consolidado, previsto no CIRC;
(lxviii) Na verdade, o único e exclusivo propósito daquela norma transitória foi o de acautelar, para os grupos já constituídos de acordo com a legislação anterior, a estrita aplicação do disposto no n° 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro, uma vez que o cumprimento deste não era, nesses exactos termos, como se viu, assegurado pelo disposto no n.º 1 do artigo 59.º do Código do IRC.
(lxix) Por último, regista-se que se a intenção do legislador fosse a de configurar o regime de tributação pelo lucro consolidado previsto no artigo 59.º do Código do IRC, como um regime consumptivo do princípio da continuidade, tê-lo-ia construído, como parece curial, mediante reprodução expressa da redacção do nº 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro no corpo do artigo 59º do Código do IRC.
(lxx) Perfilam-se, deste modo, razões suficientes para entender que a finalidade da inclusão de tal norma no diploma preambular não foi a de regular as situações futuramente constituídas ao abrigo do regime previsto no artigo 59.º do Código do IRC, mas, pelo contrário, a de estabelecer um regime transitório aplicável às situações constituídas ao abrigo do revogado Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro.
(lxxi) Acresce que, uma interpretação segundo a qual o apuramento da matéria tributável do grupo sujeito ao regime previsto no artigo 59.º do Código do IRC deveria ser feito - por efeito da mencionada norma transitória - nos mesmos termos que se encontravam expressamente consagrados no Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro violaria o princípio da legalidade consagrado nos artigos 103.º e 165 posto que o sentido que e norma teria, de acordo com tal interpretação, vai para além daquele que o legislador consagrou e equivale à criação, por via interpretativa, de uma norma que só podia ser criada por lei
(lxxii) E não se diga que da aplicação do artigo 59.º do Código do IRC e das regras gerais previstas no mesmo Código para efeito de cálculos das amortizações resultava que as reintegrações e amortizações de bens transmitidos intragrupo deviam ser calculadas como se não tivesse havido transmissão entre sociedades do grupo;
(Ixxiii) De facto, se assim fosse, isto é se a consolidação de balanços produzisse, por si só, tal efeito, ter-se-ia que concluir pela ausência de aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442- B/88, de 30 de Novembro, já que escusaria o legislador de consagrar uma disposição transitória para a assegurar aos grupos constituídos de acordo com o regime anterior a aplicação das regras de determinação da matéria tributável previstas nesse anterior regime quando esse efeito se encontrava já assegurado pela consolidação de balanços;
(lxxiv) Dito isto, e porque se deve entender que o legislador se quis expressar nos exactos termos em que o fez, o único sentido útil que se pode retirar daquele n° 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, é o de que o legislador quis, em obediência ao princípio da confiança, foi assegurar aos grupos constituídos ao abrigo do anterior regime de tributação pelo lucro consolidado a aplicação das mesmas normas de determinação da matéria tributável enquanto durasse a autorização que tinha sido concedida antes da entrada em vigor do Código do IRC.
(lxxv) Consequentemente, a sentença recorrida, porque decidindo em sentido contrário - no errado pressuposto de que a alínea a) do nº 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, se aplica às transmissões do activo imobilizado, ocorridas no âmbito do regime de tributação previsto no artigo 59º do Código do IRC — viola, também ela, o disposto no n° 1 do artigo 59.º do Código do IRC, pelo que deve ser revogada, com as legais consequências.
(lxxvi) No que respeita à correcção referente à reposição dos resultados suspensos, a questão que se coloca é a de saber se a alienação para fora do grupo de elementos do activo imobilizado, previamente transaccionados intragrupo, constitui a verificação de um resultado sujeito a tributação efectiva em termos equivalentes aos previstos na fórmula constante do n.º 8 do artigo 59º do Código do IRC, em conformidade com o previsto no artigo 7°, n.º 2, alínea a), 2), da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, e na Circular n.º 15/94, de 6 de Maio;

artigo 7.º, nº 2, da Lei n.º 30-G/ 2000, de 29 de Dezembro, estabelece um transitório segundo o qual a sociedade dominante deve “incorporar no lucro tributável do grupo os resultados internos que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo”. Acrescentando, ainda que a interpretação da Circular n.º 15/94, de 06 de Maio se encontrava “em consonância com a lógica do sistema de consolidação e com o regime excepcional do art.° 59.°, n.º 8, do CIRC, reflectindo o entendimento (...) vertido no preâmbulo do DL n.º 251-A/91, de 16 de Julho”;
(lxxvii) Acontece que a alienação, para fora do grupo, de elementos do activo transaccionados intragrupo implica, somente, a incorporação no lucro do grupo de um resultado suspenso de tributação, sendo este constituído pelas mais ou menos-valias fiscais realizadas aquando dessa transmissão intragrupo.
(lxxviii) Com efeito, no âmbito das transmissões sujeitas ao regime de neutralidade impõe-se considerar como custo de aquisição dos bens assim adquiridos o valor que se encontrava registado na esfera das sociedades transmitentes e não, portanto, o valor de realização, ou seja, o resultante da efectiva contraprestação acordada nessa transacção intragrupo.
(Ixxix) Por conseguinte, aquando da transmissão desses mesmos bens para fora do grupo, no cálculo das correspondentes mais-valias ou menos valias ter-se-ia que atender à diferença entre o referido custo de aquisição originário e o valor de realização respeitante a essa transmissão para fora do grupo, sendo que este ajustamento traduz uma “recuperação económica” (do resultado que tinha sido objecto de diferimento) da tributação que não fora concretizada no momento da realização da transmissão intragrupo;
(lxxx) Foi neste pressuposto que, em 2003, aquando da alienação dos bens para fora do Grupo, a recorrente considerou, para efeitos de cálculo das mais-valias e menos-valias ficais, como relevantes, os valores pelos quais os bens se encontram registados na sociedade alienante.
(lxxxi) Todavia, na correcção que efectuou, além de utilizar um coeficiente de desvalorização monetária diverso, a Administração tributária considerou a totalidade das amortizações praticadas durante o tempo em que os bens permaneceram no seio do GRUPO A…….. amortizações essas que se encontravam influenciadas pelas reavaliações entretanto efectuadas. Assim, a Administração tributária considerou também para esse cálculo as amortizações decorrentes das reavaliações efectuadas, antes e após, a data da transmissão intragrupo desses mesmos bens;
(lxxxii) Porém, nem esta correcção podia ser justificada pela suposta aplicação de um regime equivalente ao que veio a ser previsto no n.º 8 do artigo 59º do Código do IRC, nem a fórmula prevista naquele preceito legal — ou a fórmula descrita no Preâmbulo do Decreto-Lei n° 251-A/91, de 16 de Julho - permitia que a Administração tributária fizesse a referida correcção nos termos acima descritos;
(lxxxiii) Sem prejuízo do exposto, a verdade é que, ainda que se admitisse a aplicação de uma fórmula idêntica à constante da alínea a) do n.º 8 do artigo 59.º do Código do IRC, tal formulação não possibilitava que a Administração tributária procedesse à correcção nos moldes em que a mesma foi efectuada;
(lxxxiv) De facto, a disciplina constante da alínea a) do n.º 8 do artigo 59º do Código do IRC deve, antes, ser lida em consonância a aplicáveis para determinação das mais valias fiscais previstas nos artigos 42.º e 43º do Código do IRC, na redação em vigor até 2003.
(lxxxv) Assim, ainda que tal norma determinasse que se deveria somar, ou diminuir, a diferença positiva entre o total das amortizações praticadas pela sociedade adquirente e o total das amortizações praticadas pelo grupo, é evidente que a referência a total das reintegrações praticadas deve ser entendida como reportando-se às reintegrações praticadas sobre o custo histórico - ou, melhor dizendo, sobre o valor de aquisição do bem - sob pena de subversão das regras legais de determinação das mais-valias;
(lxxxvi) Ora, é consabido que os valores dos bens reavaliados não relevam para efeitos de apuramento dos ganhos e perdas (cf., nesse sentido, Acórdão de 26 de Setembro de 2006, proferido no processo nº 01312/06, disponível em www.dgsi.pt e código do IRC Comentado e Anotado pela Direcção-Geral dos Impostos, 1990, p. 199);
(lxxxvii) Aqui chegados, impõe-se concluir que a fórmula vertida na alínea a) do n.º 8 do artigo 59.º do Código do IRC apenas imporia que às mais-valias e menos-valias apuradas no momento da transmissão intragrupo se somasse, ou se diminuísse, a diferença entre o total das reintegrações praticadas pela sociedade para a qual os bens foram transmitidos - sobre o valor de aquisição dos bens considerado individualmente naquela sociedade - e o total das amortizações praticadas pelo grupo - sobre o valor de aquisição dos mesmos bens aquando da sua entrada para o grupo;
(lxxxviii) Neste contexto e desconsiderando a questão da aplicação do coeficientes de desvalorização monetária, se a Administração tributária tivesse utilizado, correctamente, a fórmula prevista na alínea a) do n.º 8 do artigo 59.º do Código do IRC e que considera ser a que traduzia a interpretação que decorria do regime geral de tributação pelo lucro consolidado, como o Tribunal a quo também veio a defender, o resultado a que chegaria seria similar ao apurado pela recorrente;
(lxxxix) Em face do exposto a correcção em apreço é ilegal, por inexistência de fundamento legal para a sua realização, pelo que se impunha a sua anulação, por violação do disposto no artigo 59º do Código do IRC. Não tendo assim decidido, o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento, sendo igualmente ilegal a decisão recorrida por violação do preceito acima indicado;
(xc) A anulação das correcções supra referenciadas deveria - e deverá -, ter, necessariamente, por efeito, a correcção, do ajustamento dos prejuízos fiscais reportáveis efectuado pela Administração tributária, no valor proporcional ao das correcções aqui discutidas;
(xci) Por último, a revogação da sentença recorrida no segmento em que a recorrente ficou vencida, com a consequente procedência da impugnação judicial deverá determinar o pagamento de indemnização pelos prejuízos causados à recorrente com a prestação da garantia apresentada, em 28 de Dezembro de 2007, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º 3247200701155571, na parte correspondente à dívida de exequenda relativa ao exercício de 2003, desde a data da sua emissão até à data do seu cancelamento, por força do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 53º da Lei Geral Tributária.

Em reação ao recurso da Fazenda Pública a A…….. SGPS, SA veio apresentar as suas contra alegações a fls 1201/1221 dos autos, alegando em síntese que a Fazenda Pública efectuou uma correção ilegal por violação dos princípios da especialização dos exercícios e da tributação pelo lucro real o que constitui motivo para a sua anulação concluindo:
Assim sendo, e em coerência, conclui que deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e deve ser confirmada a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa na parte correspondente ao segmento que esta colocou em crise.
O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«As recorrentes acima identificadas vêm sindicar a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 31 de Dezembro de 2012, exarada a fls. 971/1056.
A sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa, por sua vez, deduzida contra a liquidação de IRC do exercício de 2003.
As recorrentes terminam as suas alegações com as conclusões de fls. 1088/1091 e 1171/1195, respectivamente, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684.°/3 e 685.°-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
A A…….. contra-alegou, ainda, nos termos de fls. 1201/1221 que aqui, também, se dão por reproduzidos.
RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA
A sentença recorrida julgou procedente a impugnação na parte respeitante aos encargos financeiros suportados com a aquisição de empréstimos, tendo em vista a aquisição de partes de capital em sociedades participadas, no entendimento de que tal correcção assenta, exclusivamente, na aplicação da Circular 7/2004, sem que tenham sido avançados fundamentos que conduzam à inadequação do método utilizado pela recorrente, sendo certo que tal método não pode ser afastado de forma automática, pela aplicação da circular, pois que o normativo do artigo 31.°/2 (actual artigo 32.°) não exclui a sua utilização.
Ressalvado o devido respeito pela tese da recorrente, o recurso não merece provimento, como, doutamente, a recorrida demonstra nas suas contra-alegações, cujo discurso fundamentador, no essencial, se subscreve.
Nos termos do disposto no artigo 31.º/2 (actual artigo 32.º) do EBF os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, por banda da SGPS, não concorrem para formação do lucro tributável.
Ora, decorre da letra e espírito do citado normativo que apenas não concorrem para a formação do lucro tributável os encargos financeiros suportados com a sua aquisição.
O critério a ter em conta para a determinação dos encargos financeiros parece só poder ser o critério da afectação/imputação directa ou real.
A alegada impossibilidade prática em distinguir os encargos financeiros, efectivamente, suportados com a aquisição de partes de capital, dos restantes encargos, salvo melhor juízo, não pode servir de fundamento para a utilização de um critério que parece não ter apoio legal.
Aliás, como bem acentua a sentença recorrida, a AT limitou-se a aplicar «cegamente» a doutrina da Circular 7/2004, sem que tenha fundamentado a não aceitação do critério utilizado pela recorrida.
Portanto, a nosso ver, o recurso da Fazenda Pública não merece provimento.

RECURSO DA A……..
CORRECÇÃO RELATIVA À PRESTAÇÃO DE GARANTIA PESSOA ATÍPICA.
São pressupostos cumulativos da aplicação do regime de preços de transferência estatuído no artigo 58.º do CIRC (actual artigo 63.°):
1 Existência de relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa;
2.Que entre ambos sejam estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes;
3. Que tais relações sejam causa adequada das ditas condições;
4.Que aquelas conduzam a um lucro apurado diverso do que se apuraria na sua ausência (Acórdão do STA, de 2007.01.31, proferido no recurso nº 01016/06, disponível no sitio da internet www.dgsi.pt).
Ora, como sustenta a recorrente nas suas alegações/conclusões, cujo discurso fundamentador, nesta parte se subscreve, por inteiro e, por isso nos dispensamos de repisar a mesma argumentação, a AT não logrou demonstrar a verificação do requisito referido em 2, pelo que esta correcção à matéria tributável não se pode manter.
DEDUÇÕES AO ABRIGO DO ARTIGO 23.°/2 DA CDT PORTUGAL/BRASIL.
Quanto a esta correcção parece-nos que a mesma não se pode manter na ordem jurídica, como muito bem demonstra a entidade recorrente, cujo discurso fundamentador se subscreve.
De facto, quando o artigo 23.°/2 da CDT refere «receber dividendos», fá-lo no sentido de obter dividendos, ou seja, tem em vista a data em que esses dividendos são colocados à disposição do seu titular.
Esta interpretação está em consonância com o princípio da especialização dos exercícios estatuído no artigo 18.º do CIRC, segundo o qual os rendimentos e os custos/gastos são imputados ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento.
Ora, os dividendos foram colocados à disposição da recorrente em 2002, altura em que se verifica a condição de dedução de 95% dos dividendos.
Aliás, como lucidamente refere a recorrente nas suas alegações “a vencer entendimento contrário, estar-se-ia a permitir que as empresas que, à data da colocação do rendimento à disposição, não detivessem a participação relevante na sociedade distribuidora há mais de dois anos manipulassem o momento do pagamento efectivo do rendimento para conseguirem a dedução de 95% do seu valor ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 23.º da ADT - o que, manifestamente, não se coaduna com a propósito da introdução do mesmo preceito no referido ADT.”
AJUSTAMENTOS DO CONSOLIDADO
No que concerne a estas correcções, também, concordamos com a análise jurídica que a recorrente faz das questões controvertidas, subscrevendo o seu discurso, fundamentador, pelo que se nos afigura que, ressalvado melhor juízo, estas correcções devem ser anuladas.
Termos em que, ressalvado melhor juízo, deve ser dar-se negar-se provimento ao presente recurso da Fazenda Pública, e dar-se provimento ao recurso da recorrente A……..»
2 - Fundamentação
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto com interesse para a decisão:
A) A Impugnante é a sociedade dominante do GRUPO A…………, SGPS, SA, sujeito ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades previsto nos artigos 63.° e seguintes do Código do IRC (cfr. documento de fls. 346 dos autos).
B) Em 31 de Maio de 2004, a impugnante entregou a Declaração Modelo 22 de IRC do GRUPO A……, referente do exercício de 2003 (cfr. documento de fls. 249 dos autos).
C) Nos campos 380 e 382 do quadro 09 da declaração de IRC mencionada na alínea anterior, a Impugnante indicou como lucro tributável do GRUPO A……… o valor de € 19.330.435,65, apurando um montante de imposto a receber de € 335.608,67 (cfr. documento de fls. 249 e ss dos autos).
D) Em 1 de Julho de 2005, a Impugnante recebeu a demonstração de liquidação de IRC n.° 2004 2500106487, decorrente da apresentação da Declaração Modelo 22 acima indicada (cfr. documento de fls. 253 dos autos).
E) Na referida demonstração de liquidação de IRC, além do reembolso do montante de € 335.608,67, constava o montante de €10.665,91, a título de juros indemnizatórios, sendo o reembolso processado no dia 17 de Junho de 2005, no montante total de € 346.274,58 (cfr. documento de fls. 253 dos autos).
F) Na sequência da emissão das ordens de serviço n.° 01200700042 e 01200700043, de 24 de Janeiro de 2007, a Administração Tributária realizou uma acção de inspecção externa, de âmbito parcial, com incidência sobre o IRC do Grupo A…….., com referência aos exercícios de 2003 e de 2004 (cfr. documento de fls. 255 e ss dos autos).
G) Em 18 de Julho de 2007, a impugnante foi notificada, através do Ofício n.° 02316, de 17 de Julho, do Projecto de Relatório de Inspecção Tributária que incluía a proposta de correcções efectuada por aqueles Serviços, quer relativamente ao exercício de 2003, quer relativamente ao exercício de 2004 (cfr. documento de fls. 254 dos autos).
H) Em 1 de Agosto de 2007, a impugnante exerceu o seu direito de audição no âmbito do procedimento de inspecção (cfr. documento de fls. 253 dos autos).
I) Na referida petição de audição prévia, e relativamente ao exercício de 2003, a Impugnante aceitou as correcções identificadas sob os pontos 1 - 3.1.1.6, I - 3.1.1.8 e I - 3.1.2 do mesmo Projecto de Relatório (cfr. documento de fls. 253 dos autos).
J) A impugnante indicou, ainda, que, muito embora discordasse das restantes correcções, apenas se iria pronunciar, nesse momento, sobre as correcções identificadas sob os pontos I - 3.1.1.3 e I - 3.1.1.4 (cfr. documento de fls. 253 dos autos).
K) Em 23 de Agosto de 2007, a impugnante recebeu o Ofício 02694, de 22 de Agosto, do Relatório de Inspecção Tributária elaborado em consequência da referida acção de inspecção externa, bem como do Despacho do Senhor Chefe de Divisão dos Serviços de Inspecção Tributária, datado de 22 de Agosto de 2007, que o sancionou (cfr. documento de fls. 346 dos autos).
L) No âmbito da acção de inspecção foram efectuadas, em sede de IRC, correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, ao exercício de 2003, no montante de €13.814.810,44 e ajustamento aos prejuízos fiscais no montante de 7.797.702,30, e apurado IRC em falta no montante de menos € 5.289,77 (cfr. relatório de inspecção de fls. 346 e ss dos autos).
M) As correcções mencionadas na alínea anterior, em síntese, assentaram no seguinte entendimento (cfr. relatório de inspecção a fls. 349 e ss dos autos, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais):
“ - EXERCÍCIO DE 2003
111-1.1. CORRECÇÕES À MATÉRIA COLECTÁVEL DO GRUPO
O total de correcções ao nível do lucro tributável do grupo, ascende a € 30.544.377,58 (trinta milhões, quinhentos e quarenta e quatro mil, trezentos e setenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos), conforme se passa a discriminar:
III - 1.1.1. Acréscimo ao resultado líquido
Efectua-se a correcção ao nível do resultado líquido do grupo, no valor de € 3.681.542,38, relativo ao acréscimo ao resultado líquido da sociedade A…………., SGPS, SA, face ao não reconhecimento em proveitos da - remuneração resultante - da prestação de garantia - pessoal atípica em conformidade com o Princípio de Plena Concorrência previsto no art. 58°do CIRC, conforme a seguir se fundamenta:
Caracterização sucinta das operações em causa
No exercício de 2003 foram identificadas operações entre a A……. SGPS, SA e a A………Financial Operations SV., em que a primeira detém 100% do capital da segunda, existindo portanto relações especiais, nos termos do n.º 4 do art.º 58º do CIRC.
A A…….. Financial Operations B V. (com sede na Holanda) obtém empréstimos bancários junto de Bancos Internacionais sendo que a A……….. SGPS (enquanto mutuária) assume conjunta e solidariamente riscos e responsabilidades inerentes aos mesmos empréstimos: Os contratos de empréstimo em vigor durante o exercício de 2003 foram os seguintes:
Da análise aos contratos dos empréstimos referidos no quadro anterior foram identificadas várias cláusulas que estabelecem riscos e obrigações assumidos pela A……. SGPS (Portugal), sendo de destacar, nomeadamente, os pontos 2.1,2.6, 17.7e 17;8 do contrato de empréstimo bancário celebrado entre as mutuárias A……. SGPS e A…….. BV e o mutuante Banco …….., SA, Sociedade Aberta (London Branch), no valor dê 250.000.000€, e dos quais seguidamente se apresenta um resumo:
• O banco concede às mutuárias (conjuntamente e solidariamente), nos termos é condições definidas no presente contrato um empréstimo em euro no montante total de Eur 250.000.000 (ponto 2.1.);
• As obrigações definidas no contrato são conjuntas e solidárias e os agentes financeiros poderão reclamar a dívida junto de qualquer mutuário (independentemente de quem for a mutuária relevante) sob critério discricionário dos agentes financeiros (ponto 2.6);
Cada mutuária (incluindo a empresa mãe do grupo) deverá assegurar que nenhum membro do grupo poderá criar ou permitir hipotecas sobre receitas presentes ou futuras bem como de bens que não sejam considerados “hipotecas permitidas”, sem a autorização prévia dos mutuantes (ponto 18.7);
• As mutuárias deverão proporcionar que nenhum membro do grupo, sem autorização dos mutuantes, realize empréstimos, conceda crédito ou garantias a qualquer pessoa desde que o montante global dos empréstimos e garantias seja superior a Eur 50.000.000 (ponto 18.8).
Paralelamente, constatou-se que a A…….. Finance BV procedeu à celebração em 26 de Junho de 2003, de um contrato de emissão e colocação privada (private placement) de títulos de dívida nele designados por Senior Notes, no montante total de USD 404.000.000, junto de um conjunto de adquirentes contratualmente definidos.
Esta emissão será efectuada em duas séries de Senior Notes, sendo a Série a efectuada pelo montante total de USD.150.000.000, com uma taxa de remuneração anual de 4,75%; prazo de maturidade de 10 anos. A Série B será emitida pelo montante total de USD 254 000 000, tom (sic) uma taxa de remuneração de anual de 4,90%, e prazo de maturidade de 12 anos. Em ambos os casos os juros serão pagos numa base semestral, a 20 de Junho e Dezembro de cada ano.
Em conformidade com as Secções 1 e 14 do contrato celebrado, a A………. SGPS SA assume a figura de responsável solidário por todas as obrigações e riscos decorrentes desta emissão de títulos (contratualmente identificada como the obligor), podendo os investidor exigir-lhe o reembolso dos fundos aplicados na emissão e os juros respectivos, nos termos exigíveis: à sociedade emitente. Mais nele se afirma que, face à não aplicabilidade do regime de responsabilização das sociedades directoras face às obrigações das sociedades subordinadas, preconizado no art.° 501.º do Código das Sociedades Comerciais (em virtude de no caso em análise, a sociedade subordinada não ser uma sociedade de direito português), pelos termos descritos no contrato de emissão e colocação de Senior Notes, pretende a A……… SGPS SA ver produzidos similares efeitos aos estatuídos naquele normativo legal.
Em ambas as operações verifica-se, assim, que a captação (utilização) de fundo ... é realizada pela A……... SGPS, assistindo-se apenas a utilizações por parte da A……... Natureza jurídica das operações de empréstimo bancário contratualizadas pela A……... SGPS e A……... Financial Operations B.V..
O empréstimo bancário é a operação pela qual uma instituição de crédito entrega fundos ao beneficiário, por tempo determinado, comprometendo-se este a pagar os juros ajustados e a reembolsar à instituição de crédito nas condições previstas pelo contrato.
Tratando-se o empréstimo bancário de uma operação activa de crédito em que a instituição de crédito que assume a qualidade de cedente de fundos por crédito recebe nessa qualidade de credora um “juro”, tal operação assume natureza comercial de acordo com o disposto no artigo 362.° do Código Comercial, conduzindo-nos o regime legal de integração do Direito comercial `aplicação ao empréstimo bancário das disposições relativas ao mútuo previstas nos artigos 17142.° a 1151.° do Código Civil (CC), aplicáveis subsidiariamente nos termos do preceituado no artigo 3.° do Código Comercial.
Igualmente, a emissão de Senior Notes em análise, enquanto operação de captação de meios monetários para a esfera patrimonial da A……... Financial Operations BV, constitui uma forma de financiamento remunerada, enquadrável na previsão do art. 1142.° e seguintes do Código Civil.
Nesta conformidade, é à luz do disposto nas disposições reguladoras do mútuo civil acima mencionadas que deverá ser efectuada a interpretação e integração negocial das declarações negociais plasmadas nos contratos de empréstimo em causa.
Ora, diz-nos o artigo 1142. ° do CC que o “mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade”. Nas operações em apreço, o vínculo obrigacional estabelece-se entre pessoas em sentido jurídico: o sujeito activo ou credor e o sujeito passivo ou devedor. O primeiro é a pessoa em proveito de quem terá de efectuar-se a prestação e que pode exigir ou pretender o seu cumprimento; o segundo é a pessoa sobre quem recai o dever de realizá-la.
De cada um dos lados da relação obrigacional podem encontrar-se um ou mais sujeitos, sendo que de acordo com o número de sujeitos, as obrigações classificam-se em singulares e plurais: nas primeiras, há um único sujeito activo e um único sujeito passivo; nas últimas, há vários sujeitos activos ou passivos (pluralidade activa ou pluralidade passiva), ou simultaneamente vários sujeitos activos e vários sujeitos passivos (pluralidade dupla).
Por sua vez, as obrigações plurais subdividem-se em obrigações conjuntas e obrigações solidárias. Nas obrigações conjuntas a cada um dos credores ou dos devedores compete apenas, mesmo nas relações externas, uma fracção do crédito ou débito comum. Pelo contrário, nas obrigações solidárias cada um dos credores pode exigir a totalidade da prestação, do mesmo modo que cada um dos devedores responde por toda ela.
Na sequência da análise dos contratos de mútuo bancário, nas cláusulas que estabelecem riscos e obrigações assumidos pela “A……...”, é claramente referido que (i) ‘O banco concede às mutuárias (conjuntamente e solidariamente) nos termos e condições definidas no presente contrato um empréstimo em euro no montante total de Eur (...) e que (ii) as obrigações definidas no contrato são conjuntas e solidárias e os agentes financeiros poderão reclamar a dívida junto de qualquer mutuária (independentemente de quem for a mutuária relevante) sob critério discricionário dos agentes financeiros”.
Da análise dos contratos de emissão e colocação de Senior Notes (cfr. cláusulas constantes das Secções 1 e 14), constata-se que a A……...Financial Operations BV e a A…….. SGPS, se obrigam conjunta e solidariamente perante os adquirentes dos títulos emitidos, a responder na qualidade de devedores principais pelo reembolso da totalidade do financiamento obtido via emissão de Senior Notes e demais obrigações dela decorrentes.
Mais se verifica que em conformidade com o ponto 8.6. do contrato de emissão, do rating da A……….. SGPS abaixo do nível BBS- definido pela Standard & Poors, que constitui evento susceptível de determinar a possibilidade de exigência de reembolso antecipado por parte dos adquirentes das Senior Notes em Circulação. Acrescidamente, constatou-se que, são as demonstrações financeiras da empresa portuguesa e das suas subsidiárias, os elementos financeiros a fornecer periodicamente aos adquirentes das Senior Notes, para análise do risco do investimento efectuado mediante a aquisição destes títulos (v cláusula 7.1. do contrato de emissão).
Verifica-se, portanto, nos termos das cláusulas supra, que a “A……...” e a A……... Financial Operations B V. se obrigaram conjuntamente, tendo-se também estipulado entre estes o regime da solidariedade, o que faz com que nos mútuos bancários e na relações jurídicas de crédito subjacentes, assumindo aquelas empresas comerciais a qualidade de co-devedores solidários perante as instituições de crédito credoras dos empréstimos bancários, cada uma delas terá de responder na qualidade de devedor principal pela totalidade do crédito mutuado, nos termos do disposto no artigo 512.° n.° 1 do CC.
Em face do exposto, conclui-se que, em ambas as operações a A……… SGPS se circunscreve a servir de garante do cumprimento das obrigações decorrentes dos contratos mencionados, ainda que não esteja definida uma garantia com as características de acessoriedade própria das garantias pessoais típicas das obrigações (fiança, subfiança mandato de crédito), porquanto a A……... SGPS e a A……...BV assumem na operação em causa a qualidade de devedoras principais, conjunta e solidariamente. No entanto, atendendo a que a “A……...” detém uma participação de 100% no capital social da A……...Financial Operations BV, e uma vez que os fluxos financeiros decorrentes destas operações de financiamento beneficiam directa e exclusivamente a A……... Financial Operations BV, e afigurando-se que nas obrigações solidárias em causa a A……… SGPS desempenha a simples fruição de garante do crédito mutuado, pode alegar-se que estamos perante uma garantia pessoal atípica a favor da A……...Financial Operations BV.
De facto; consideram-se “garantias especiais os meios destinados a reforçar, em beneficio de determinado credor, a garantia comum dos credores, dada a todos eles, em pé de igualdade, pelo património do obrigado” e, por outro lado, que as garantias pessoais típicas “como a fiança e o aval, são prestadas por terceiro, que reforça com o seu património a expectativa de satisfação do crédito oferecidas pelo património do devedor”.
Ora, como bem nota o Prof Doutor Almeida Costa, “dizem-se garantias pessoais aquelas que outra ou outras pessoas, além do devedor, ficam responsáveis com os seus patrimónios pelo cumprimento da obrigação (...). É natural que acuda à lembrança a solidariedade passiva pois também nesse caso existem vários patrimónios que se responsabilizam pela dívida. O credor pode exigir de qualquer dos co-devedores o cumprimento integral da prestação. Nesta medida se alegará tratar-se de uma garantia pessoal. Mas não oferece dúvidas a diferença relativamente às garantias pessoais de que nos ocupamos agora. Repare-se que na solidariedade passiva os patrimónios responsáveis se encontram todos eles na primeira linha visto que - perícncem aos próprios devedores. Ao passo que na fiança e na subfiança - garantias pessoais típicas - são terceiros que vêm com os seus patrimónios reforçar a garantia dada pelo acervo patrimonial do devedor. Constitui-se em regra como observaremos uma responsabilidade de segunda frente, e, de qualquer modo, menos forte do que a dos co- devedores solidários.
Nesta medida a “A……...” presta um serviço de garante financeiro à sua filial, uma vez que a primeira aceitou ser co-devedora com a segunda em vários empréstimos bancários e operações de financiamento pela emissão de títulos de dívida, utilizados exclusivamente por esta.
Enquadramento em Preços de Transferência
O n°1 do artigo 58° do CIRC estabelece que nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis”.
No n.°2 do mesmo artigo refere-se que “o sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites e praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais, tendo em conta, designadamente, as características dos bens, direitos ou serviços, a posição de mercado, a situação económica e financeira, a estratégia de negócio, e demais características relevantes das empresas envolvidas, as funções por elas desempenhadas, os activos utilizados e a repartição do risco”.
Este princípio está igualmente incorporado no número 1 do Artigo 9° do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE, que tem sido posto em prática quer pelos países membros quer por países não membros, o que revela um elevado índice de aceitação generalizada dos princípios nele contidos. No artigo 9° estipula o seguinte:
“(Quando) ... as duas empresas [associadas] nas suas relações comerciais ou financeiras, estiverem ligadas por condições aceites ou impostas que difiram das que seriam estabelecidas entre empresas independentes, os lucros que, se não existissem essas condições, teriam sido obtidos por uma das empresas, mas não o foram por causa dessas condições, podem ser incluídos nos lucros dessa empresa e tributados em conformidade”.
O princípio de plena concorrência, ao proceder ao ajustamento dos lucros remetendo para as condições prevalecentes entre empresas independentes relativamente a operações idênticas e em circunstâncias análogas, adopta o critério que consiste em trataras membros de um grupo multinacional como entidades separadas e não como subconjuntos indissociáveis de uma única empresa unificada. A aplicação do princípio de plena concorrência assenta; assim, numa comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes. Para que essa comparação seja relevante, é necessário que as características económicas das situações consideradas sejam suficientemente comparáveis. Os principais factores de comparabilidade são: características dos bens ou serviços; análise funcional (funções exercidas e riscos assumidos); cláusulas contratuais; enquadramento económico; e estratégias empresariais.
Relativamente ao caso em apreço, verifica-se a existência de uma prestação de serviços entre a A……… SGPS, SA e a A……... Financial Operations B V., uma vez que sob a forma de contratos conjuntos e solidários, a A……... SGPS assume a função de garante do crédito mutuado. O desempenho da função de garante por parte da A……...SGPS, implica a assunção de um conjunto de responsabilidades e riscos económicos, que nenhuma entidade independente estaria disposta a assumir sem que obtivesse uma contrapartida económica dois problemas se colocam na fixação dos preços de transferência nos serviços intra-grupo o primeiro é de saber se houve efectivamente uma prestação de serviços; e o segundo incide sobre a conformidade do preço dos serviços ao princípio de plena concorrência”.
Assim, de acordo com o parágrafo 7.13 das Guidelines da OCDE, “não se deve considerar que uma empresa associada beneficie de um serviço intra grupo quando ela obtém vantagens acessórias que são unicamente imputáveis ao facto de ela fazer parte de uma entidade mais vasta e não ao exercício de uma actividade específica. Por exemplo, não há prestação de serviço quando uma empresa associada dispõe, pelo único facto da sua associação, de uma melhor cota de crédito, mas em geral considera-se que há uma prestação de serviço quando esta melhor notação é devida a uma garantia de um outro membro do grupo ou quando a empresa beneficia de renome do grupo devido às campanhas gerais de comercialização e de relações públicas”. Neste sentido, pode-se concluir que certos tipos de contratos de empréstimo onde os subscritores assumem obrigações conjuntas e solidárias sem que usufruam directamente dos fundos obtidos, constituem em substância uma prestação de garantia e configuram-se, portanto, como uma prestação de serviços sujeitas a remuneração como contrapartida aos riscos assumidos pelo garante. Por outro lado, pela sua natureza económica os contratos de empréstimo não poderão ser considerados como mero exercício de actividade de accionista (previsto no parágrafo 7.9 do Relatório da OCDE), uma vez que constituem um efectivo benefício para a participada da A……... SGPS que assim consegue obter crédito junto de entidades terceiras. Assim, é natural que seja devidamente remunerada a função de garante prestada pela “A……...” relativamente aos empréstimos utilizados pela A……... Financial Operations BV. Acresce que, uma entidade independente estaria disposta a fazer a contratação de uma garantia como forma de recorrer ao crédito externo.
Verificar a conformidade do preço dos serviços ao princípio de plena concorrência significa verificar se o preço praticável deveria ser aquele que fora praticado e aceite entre empresas independentes em circunstâncias comparáveis. Para determinar o preço de plena concorrência de .... serviços intra-grupo é necessário tomar em consideração designadamente o valor dos serviços para o beneficiário e o montante que uma empresa independente comparável estaria disposta a pagar por este serviço em circunstâncias equiparáveis assim como os custos para o fornecedor do serviço sendo para tal necessário colocar-se sob o ponto de vista do fornecedor do serviço e do beneficiário. Na situação em análise teremos de ter em consideração, quer o montante que a A……... Financial Operations S V. estaria disposta a pagar para obter o financiamento quer a remuneração a auferir pelo -garante para incorrer nos riscos associados à conta-atualização dos financiamentos.
Dos Métodos
O sujeito passivo deve adoptar, para determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método mais apropriado a cada operação ou série de operações. Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor ou mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas e entre as entidades seleccionadas para a comparação, que conte com melhor qualidade e maior quantidade de informação disponível para a sua adequada justificação e aplicação e que implique o menor número de ajustamentos para efeitos de eliminar as diferenças existentes entre os factos e as situações comparáveis. Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminemos efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas.
Poderão ser utilizados os seguintes métodos: método do preço comparável de mercado (MPC); método do preço de revenda minorado (MPKM); método do custo majorado (MCM); método do fraccionamento do lucro (MFL); método da margem líquida da operação (MMLO); ou outro considerado apropriado.
Método do preço comparável de mercado (MPC)
O método do preço comparável de mercado (MPC) consiste em comparar o preço de um bem transferido ou de um serviço prestado no âmbito de uma operação controlada como preço de um bem transferido ou de um serviço prestado no âmbito de uma operação em mercado aberto, em condições comparáveis. Uma operação em mercado aberto é comparável com uma operação controlada para efeitos de aplicação do MPC, desde que se verifique uma das duas condições seguintes: a) nenhuma das diferenças entre as operações objecto da comparação ou entre as empresas que efectuam essas operações é susceptível de influenciar de modo sensível o preço do mercado aberto; b) ou ajustamentos suficientemente precisos Podem ser introduzidos para eliminar os efeitos materiais dessas diferenças. Desde que seja possível identificar operações comparáveis em mercado aberto, o MPC constitui o meio mais directo e mais fiável de aplicação do princípio de plena concorrência. Por consequência, neste caso deve ser dada preferência a este método sobre todos os demais”. De igual forma, o número 1 do art° 6° da Portaria 1446C/2001 refere que “a adopção do método do preço comparável de mercado requer o grau mais elevado de comparabilidade com incidência tanto no objecto e demais termos e condições da operação como na análise funcional das entidades intervenientes”, o que significa que, podendo ser aplicado, satisfaz a condição prevista no nº2 do art°4° da mesma portaria sendo por isso considerado o método mais apropriado.
Este método pode ser utilizado, designadamente, nas seguintes condições”
a) Quando o sujeito passivo ou uma entidade pertencente ao mesmo grupo realiza uma transacção da mesma natureza que tenha por objecto um serviço ou produto idêntico ou similar, em quantidade ou valor análogos, e em termos e condições substancialmente idênticos, com uma entidade independente no mesmo ou em mercados similares;
b) Quando uma entidade independente realiza uma operação da mesma natureza que tenha por objecto um serviço ou um produto idêntico ou similar, em quantidade ou valor .
(…)
Melhor(es) Método(s
Os métodos tradicionais são os que apresentam maior fiabilidade para serem aplicados na verificação da aplicação do princípio de plena concorrência e, portanto, são os mais susceptíveis de serem utilizados como métodos mais apropriados.
Podendo ser aplicado e dadas as suas características o Método do Preço Comparável de Mercado apresenta-se como o mais apropriado, seguido do Método do Custo Maior do é em último lugar o método transaccional da Margem Liquidada Operação. Note-se que o n° 3 do artigo 12° da Portaria, dispõe que na determinação do preço de transferência de um serviço e de ser utilizado o método do preço comparável de mercado ou supletivamente o método do custo majorado.
O Método do Preço de Revenda Minorado e o Método do Fraccionamento do Lucro deverão ser rejeitados pois aplicam-se essencial mente a operações de comercialização e a situações de operações integradas ou intangíveis, respectivamente.
Dos Comparáveis
A aplicação do princípio de plena concorrência assenta, de um modo geral, numa comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes. Para que essa comparação seja relevante, é necessário que as características económicas das situações consideradas sejam suficientemente comparáveis. Isto significa que não deve haver diferenças entre as situações comparadas susceptíveis de afectar, designadamente, a condição a examinar nimetodologia (e.g., o preço ou a margem de lucro) ou que podem ser efectuados ajustamentos a fim de eliminar o efeito dessas diferenças. Para determinar o grau de comparabilidade, e nomeadamente os ajustamentos a introduzir para obter essa comparabilidade; é necessário entender o modo como as sociedades independentes avaliam os termos de eventuais operações. Na ponderação das condições de uma eventual operação, as sociedades independentes vão comparar essa operação com outras opções que realisticamente se lhes oferecem e só continuam a operação senão tiverem outra alternativa claramente mais vantajosa.”

Para determinar o grau de comparabilidade efectiva e efectuar em seguida os ajustamentos apropriados para estabelecer as condições (ou um leque de condições) de plena concorrência, há que comparar as características das operações ou das empresas susceptíveis de ter impacto sobre as condições inerentes às operações de plena concorrência. As características que se podem revelar importantes são as relativas aos bens ou serviços transaccionados, as funções exercidas pelas partes (incluindo os activos utilizados e os riscos assumidos), as cláusulas contratuais, a situação económica das partes e as respectivas estratégias negociais”.
Tal como estabelecido no art° 5° da Portaria 1446-C/2, o grau de comparabilidade entre uma operação vinculada e uma operação não vinculada deve ser avaliado em termos genéricos, tendo em conta, designadamente, os seguintes factores:
a) As características específicas dos bens, direitos ou serviços que, sendo objecto de cada operação, são susceptíveis de influenciar o preço das operações, em particular as características físicas; a qualidade, a quantidade, a fiabilidade, a disponibilidade e avolume de oferta dos bens, a forma negocial, o tipo, a duração, o grau de protecção e os benefícios antecipados pela utilização do direito e a natureza e a extensão dos serviços;
b) As funções desempenhadas pelas entidades Intervenientes nas operações, tendo em consideração os activos utilizados e os riscos assumidos;
c) Os termos e condições contratuais que definem, de forma explícita ou implícita, o modo como se repartem as responsabilidades, os riscos e os lucros entre as partes envolvidas na operação;
d) As circunstâncias económicas prevalecentes nos mercados em que as respectivas partes operam, incluindo a sua localização geográfica e dimensão, o custo da mão-de-obra e do capital nos mercados, a posição concorrencial dos compradores e vendedores, a fase do circuito de comercialização, a existência de bens e serviços sucedâneos o nível da oferta e da procura e o grau de desenvolvimento geral dos mercados;
e) A estratégia das empresas, contemplando, entre os aspectos susceptíveis de influenciar o seu funcionamento e conduta normal, a prossecução de actividades de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos, o grau de diversificação da actividade, o controle do risco, os esquemas de penetração no mercado ou de manutenção ou reforço de quota e, bem assim, os ciclos de vida dos produtos ou direitos;
J) Outras características relevantes quanto à operação em causa ou às empresas envolvidas.
Tal como referido no parágrafo 1.1. do Relatório da OCDE em matéria de preços de transferência, poderão existir problemas de ordem prática na aplicação do princípio de plena concorrência quando empresas associadas realizam operações que empresas independentes não efectuariam. A realização de tais operações tornam difícil a aplicação do princípio de plena concorrência podendo conferir alguma artificialidade às operações. No entanto, e de acordo com doutrina internacional nesta matéria “, esta artificialidade é endémica da aplicação do princípio de plena concorrência e não poderá impedir a sua aplicação.
Importa aqui ident operações com características económicas suficientemente comparáveis às emergentes dos contratos de financiamento celebrados pela A…….. SGPS e a A……….. Financial Operations B V; nomeadamente quanto aos riscos assumidos. No exercício de 2003, estavam em vigor diversas garantias bancárias contratadas pela A…….. SGPS (ver anexo 1, fls 1 a 5). As garantias bancárias configuram operações economicamente comparáveis às obrigações assumidas pela A…….. SGPS no âmbito da subscrição conjunta e solidária de empréstimos sem que no entanto usufrua directamente dos fundos obtidos, uma vez que em ambas:
“Do ponto de vista económico existe para o credor beneficiário uma garantia do cumprimento das obrigações assumidas pelo utilizador (A……. Financial Operations) dos fundos;
“ Se encontram balizados o âmbito dos seus efeitos;
O subscritor que não utiliza os montantes contratados assume uma obrigação de pagar;
O credor beneficiário poderá reclamar a dívida junto da entidade que assume os riscos (na garantia, o emitente, no caso controvertido, o subscritor não utilizador de fundos, ou seja, a A………SGPS);
Quer o emitente da garantia quer o subscritor não utilizador protege o credor dos riscos económicos do incumprimento por o utilizador dos fundos não lhe pagar o que é devido.
O custo de uma garantia tem como principal componente o risco envolvido para a entidade emitente. Tal risco manifesta-se na notação de risco atribuída à entidade beneficiária. No caso em
(…)
Na esteira do preconizado no parágrafo 1.45 do Relatório da OCDE de 1995, a fixação dos preços de transferência não é uma ciência exacta pelo que a aplicação do método mais adequado conduz a um intervalo de valores (intervalo de plena concorrência), todos eles com uma fiabilidade mais ou menos equivalente. No mesmo sentido dispõe o número 5 do artigo 40 da Portaria. Assim, qualquer valor que se encontre no intervalo de plena concorrência poderá ser considerado conforme o Princípio de Plena Concorrência (Cfr. parágrafo 1.48 do Relatório da OCDE de 1995).
Para efeitos de determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes, e de acordo com a doutrina aludida na revista fisco n.° 105/106, no artigo “As Novas Regras de Preços de Transferência em Análise”, de Eduardo Goldszal (página 96), consideramos a mediana” do intervalo de Plena Concorrência (0,093 75%/Trimestre ou 0,3750%/Ano), tendo sido apurados os encargos conforme anexo n.° 2, fls. 7.
Conforme resulta do quadro em anexo referido anteriormente, caso as operações controvertidas realizadas entre a A…….. SGPS e A……… Financial Operations B.V. tivessem sido realizadas.
Conclusões: Face a tudo o que foi exposto, podemos concluir que as condições emergentes dos contratos de empréstimo controvertidos, nomeadamente a ausência de remuneração por parte da A…….. SGPS em resultado da assunção de riscos de garante, divergem das condições que seriam praticadas entre entidades independentes.
Assim, e tendo em conta que, a violação do Princípio de Plena Concorrência tem repercussão no lucro tributável do grupo, estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no n.°3 do artigo 77° da Lei Geral Tributária, propõe-se que se proceda a uma correcção positiva ao resultado fiscal declarado pelo grupo, relativo ao exercício de 2003, no montante de. € 3.681.542,38 (três milhões, seiscentos e oitenta e um mil, quinhentos e quarenta e dois euros e trinta e oito cêntimos), nos termos do estatuído no artigo 58° do CIRC. (...).
III - 1.1.3 Encargos Financeiros suportados com a aquisição de Partes de Capital
A A………., SGPS, SA, foi, em 2007-05-10, notificada para, identificar os valores inscritos no quadro 07 da declaração modelo 22 dos exércitos de 2003 e 2004 referente à aplicação do n.° 2 do artigo 1° do Estatuto dos Beneficias Fiscais (EBF), relativo aos encargos financeiros suportados com à aquisição de partes de capital.
Refere este artigo, aditado pelo art° 37° da Lei nº 32-8/ 2002 de 30 Dezembro (Orçamento Estado de 2003), que “as mais-valias e as menos- valias realizadas pelas SGPS incidente a transmissão onerosa, qualquer que sela o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por um período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades”.
Vem a Circular 7/2004, de 30 de Março, da Direcção de Serviços do IRC, sancionar o seguinte entendimento:
- o novo regime, relativamente aos encargos financeiros, é aplicável “nos períodos de tributação iniciados após 1 de Janeiro de 2003, ainda que sejam relativos a financiamentos contraídos antes daquela data”. (ponto 5)
- Quanto ao método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais,” dada a extrema dificuldade de utilização... de um método de afectação directa ou especifica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, … deverá, essa afectação ser efectuada com base numa fórmula ... “. (ponto 7).
Esta fórmula tem subjacente a seguinte metodologia em:
1 ° Imputar os passivos remunerados das SGPS aos empréstimos remunerados concedidos às empresas participadas e a outros investimentos geradores de juros;
2° Afectar o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao custo de aquisição.
Deste modo, foi solicitado à sociedade dominante, através da notificação referida, a identificação dos activos remunerados e dos passivos remunerados constantes do balanço referente aos exercícios de 2003 e 2004, a valorização das partes de capital ao custo de aquisição, bem como a discriminação dos encargos financeiros relacionados com a aquisição de partes de capital.
Da resposta à notificação foram entregues os elementos solicitados, e efectuados os cálculos em anexo com o n.° 4, fls 9, de acordo com o entendimento constante da Circular 7/2004, de 30 de Março.
Face ao exposto, tendo em conta o mencionado no n.° 2 do artigo 31° do EBF, e dado que o sujeito passivo não considerou qualquer montante de acréscimo ao quadro 07 da declaração de rendimentos do Grupo, e que os encargos imputáveis às partes de capital, de acordo com a referida Circular ascendem a €11.074.676,69 (onze milhões, setenta e quatro mil, quinhentos e setenta e seis euros e sessenta e nove cêntimos), efectua-se a correcção ao lucro tributável do grupo nesse montante.
III - 1.1.4 Dedução indevida ao abrigo do disposto no artigo 23°, n.° 2, da Convenção de Dupla Tributação celebrada entre Portugal e o Brasil.
O grupo A………, SGPS, SA considerou no apuramento do seu lucro tributável do exercício de 2003, o montante total de € 4.298.654;35, referente à dedução prevista no artigo 23°, n.° 2, da Convenção destinada a evitar a dupla tributação celebrada entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, correspondente a 95% dos dividendos recebidos pela sociedade dominante, no valor de € 4.515.673,28, e pela sociedade A…….. Internacional, SGPS, SA no valor de € 9.226,03, da sociedade Companhia de ………..do Brasil.
Refere o artigo 23°, n.° 2 da referida Convenção que “ ... quando uma sociedade residente de Portugal receber dividendos de uma sociedade residente do Brasil sujeita ao Imposto Federal.
Sobre a senda e não abrangida por qualquer isenção em que a primeira detenha diferentemente.
Uma participação não inferior a 25% Portugal permitirá a dedução de 95% desses dividendos incluídos na sua base tributável, desde que a referida participação tenha sido detida durante os dois anos precedentes.
Notificada a A………, SGPS, SA, em 2007-06-27, para demonstrara verificação dos pressupostos, para a dedução efectuada, no exercício de 2003, ao abrigo do artigo acima referido, vem a respectiva sociedade indicar que “a Requerente fez coincidir a dedução. Com o exercício do efectivo recebimento dos dividendos vertentes e não; conforme, afinal, se impunha fazer, com o exercício em que tais dividendos foram colocados à sua disposição, em termos fiscalmente relevantes.” Desta forma, refere que deduziu no exercício de 2003 o valor que deveria ter deduzido em 2002 (a assembleia geral da Companhia de ………do Brasil, na qual foram aprovadas as contas daquela sociedade relativamente ao exercício de 2001 e foi deliberado distribuir dividendos aos accionistas, no prazo de 60 dias, realizou-se no dia 16 de Abril de 2002).
Refira-se que a sociedade apresentou comprovativos, nomeadamente a cópia do recibo da entregada declaração de informações económico-fiscais e do documento de arrecadação de receitas federais, do primeiro requisito previsto no artigo 23, n.° 2 da Convenção, referente à sujeição da sociedade Brasileira ao Imposto Federal sobre a Renda.
Relativamente à comprovação do segunda requisito previsto neste artigo, vem a sociedade referir que “os dividendos em apreço traduzem o rendimento resultante da detenção directa de uma participação de 68,84% do capital social da Companhia de ………. do Brasil e, bem assim, que essa participação corresponde a 568.920.461 acções, permaneceu na titularidade da requerente desde 1997 até à data em que tais dividendos foram colocados à sua disposição (...).”
Em suma, considera assim o sujeito passivo que a dedução prevista no artigo 23°, nº 2 da Convenção, deveria ter sido efectuada aquando do momento da colocação à disposição dos dividendos.
Não deverá entender-se que os conceitos da colocação à disposição e recebimento são semelhantes. O recebimento é a concretização factual da colocação à disposição, ocorrendo em momento posterior àquela, a qual não é, por si, suficiente para a materialização do dito recebimento.
Com a colocação à disposição o contribuinte fica dotado dos meios tendentes à efectivação do recebimento, na esteira do disposto no artigo 294° do esc, mas este só se consubstancia coma recepção do valor, como seu acolhimento na esfera patrimonial.
O artigo 23°, n.° 2 da Convenção de dupla tributação celebrada entre Portugal e o “Brasil é claro quando emprega a expressão “ receber dividendos”, não podendo aí ler-se colocação à disposição.
Nestes termos, relativamente ao segundo requisito previsto neste artigo, o sujeito passivo teria que comprovar que detinha uma participação directa não inferior a 25%, “desde que a referida participação tivesse sido detida. durante os dois anos precedentes” (ao recebimento).
Refira-se que a data do recebimento destes dividendos pela A………, SGPS, SA, de acordo com cópia de documento comprovativo da transferência bancária, foi em 2003-11-27, tendo a sociedade efectuado o respectivo registo contabilístico na conta de Proveitos Financeiros (conta POC-7841) em 2003-11-28.
Da análise das participações financeiras do grupo, constatou-se que, tanto a participação detida pela sociedade dominante, a qual à data da acta era de 68,84%, como a participação detida pela sociedade A……. Internacional, SGPS, SA, a qual ascendia na mesma data a 0,14,%, foram alienadas em Dezembro de 2002 à A…….. Inversiones.
Desta forma, conclui-se o seguinte:
Relativamente aos dividendos recebidos pela sociedade dominante, na data do recebimento efectivo destes dividendos, esta não detinha “directamente uma participação não inferior a 25%”;
Relativamente aos dividendos recebidos pela A……. Internacional;
SGPS, SA, além desta sociedade já não deter qualquer participação na A…….. Brasil, a participação que esta detinha antes da alienação para a A…….era de apenas 0,14%.
Assim, é devida uma correcção ao lucro tributável do grupo no montante total de € 4.298.654,35 (quatro milhões, duzentos e noventa e oito mil, seiscentos e cinquenta e quatro euros e trinta e cinco cêntimos); correspondente à dedução efectuada, ao abrigo do artigo 23°, n.° 2 da Convenção destinada a evitar a dupla tributação celebrada entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, pelas sociedades dominante e A……… Internacional, SGPS, SA, no valor de € 4.289;889,62 e € 8.764,73, respectivamente, a qual se considera indevida pelo não cumprimento dos pressupostos enunciados na respectiva Convenção.
III - 1.1.7.1 Ajustamento relativo ao diferencial das amortizações.
A lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, n.° 2 estabelece um regime transitório para os grupos de sociedades a que foi concedida autorização para a aplicação do RTLC, cujo período de validade da autorização estivesse em curso à data da entrada em vigor daquela Lei, e que não pretendessem renunciar ao Regime nos termos do n.° 1 da alínea a) do nº 2 do art.º 70 do referido diploma. Estabelece, relativamente aos resultados internos eliminados durante a vigência do anterior regime, que continuam pendentes de incorporação que a estes pode continuar a ser concedido o tratamento que vinha sendo adoptado.
De acordo com este normativo, a sociedade dominante reduziu ao somatório previsto no art.° 64º do CIRC, o montante de € 33.025.120,80.
O referido montante resulta da reposição das amortizações do exercício tidas em consideração pela sociedade A……. Indústria, SA, no valor de € 10.644.524,43, bem como à consideração das amortizações do exercício calculadas com base nos valores registados na sociedade A..………, SGPS, SA (sociedade alienante dos bens), no valor de € 43.669.645,23, dos bens transmitidos no exercício de 1996.
Este procedimento resulta do facto de, durante o período em que os bens do activo transaccionados intra-grupo continuarem a pertencer ao património do mesmo, as reintegrações e amortizações desses bens são calculados como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo. Assim, e tendo em conta que as amortizações que estão a afectar o resultado fiscal do grupo são as efectivamente contabilizadas pela sociedade adquirente, através do somatório dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais, estas são repostas, através de ajustamento de consolidação, sendo consideradas as calculadas com base nos valores da ... sociedade alienante, as quais efectivamente passam a integrar o resultado fiscal do grupo.
Realce-se o facto de este ajustamento às amortizações estar influenciado pela reavaliação efectuada ao abrigo do DL 31/98, de 11 de Fevereiro, pela sociedade A……….., SGPS, SA, na medida em que, e conforme Oficio n.° 006313, de 01/02/1999; da Direcção de Serviços do IRC, foi suspensa a reavaliação efectuada pela A…….. Indústria de ………; SA, e calculada nova reavaliação, com base nos valores dos bens que seriam registados pela A…………., SGPS, SA.
O n.° 1 do artigo 6° do DL 31/98 de 11 de Fevereiro estabelece que “o regime fiscal das reintegrações dos elementos reavaliados ao abrigo deste diploma regular-se-á pelas disposições sobre reintegrações e amortizações do Código do IRC e do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro”.
Por outro lado, e conforme o n.° 5 do artigo 3° do Decreto Regulamentar acima referido, “não são aceites como custos ou perdas para efeitos fiscais as reintegrações ou amortizações praticadas para além do período máximo de vida útil (…)”, sendo considerado período máximo de vida útil de um bem do activo imobilizado, conforme o n.° 2 do mesmo artigo, o que se deduz de uma taxa igual a metade daquela que pode ser aceite fiscalmente. No decurso da acção de inspecção foram fornecidos pela empresa os mapas de amortização, da sociedade alienante e da A……… Indústria, SA, os quais suportam este ajustamento. Da análise dos referidos mapas, constatou-se que o grupo considerou, para o apuramento do seu lucro tributável, amortizações, relativas à sociedade dominante (alienante), praticadas para que além do período máximo de vida útil, no montante total de €12.256.484,29, relativas aos bens discriminados no anexo n.°5, fls 10 a 17.
Refira-se ainda que, alguns destes bens foram adquiridos em data anterior à aplicação do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de Janeiro. No entanto, também a Portaria 737/81, de 29 de Agosto, no artigo 4°, n°3, referia que “Não são consideradas como custos ou perdas, (...) as reintegrações e amortizações dos elementos patrimoniais que, (...) tenham excedido o período máximo de vida útil (...).
Desta forma, efectua-se a correcção no montante total de €12.256.484,29 (doze milhões, duzentos e cinquenta, e seis mil, quatrocentos e oitenta e quatro euros e vinte e nove cêntimos), relativa a amortizações consideradas no apuramento do lucro tributável do grupo A……., SGPS, SA, as quais, e por corresponderem a elementos do activo cujo período máximo de vida útil já foi ultrapassado, não poderão ser aceites como custo fiscal face ao disposto na legislação acima referida.
Na sequência desta correcção procede-se de seguida ao ajustamento do cálculo do valor dos 40% do acréscimo das amortizações decorrentes da reavaliação, não aceites como custo.
I - 1.1.7.2 Ajustamento correspondente a 40% do aumento das reintegrações resultante de reavaliações dos bens do activo imobilizado corpóreo vendidos intra grupo.
- Acréscimo em falta de 40% do aumento das reintegrações resultantes de reavaliações de bens do activo corpóreo considerado pela sociedade dominante:
A sociedade dominante efectuou o acréscimo ao lucro tributável do grupo em €12;999.549,09; relativo ao cálculo do acréscimo de 40% do excesso das amortizações resultantes da avaliação do imobilizado, para efeitos de ajustamento de consolidação, considerando que o imobilizado transmitido em 1996 pela A………., SGPS, SA à sua dependente A……… Indústria, SA, ainda se encontrava registado na primeira sociedade.
Refira-se que quando a A………., SGPS, SA, efectuou a alienação da quase totalidade do seu activo imobilizado corpóreo, à A…….. - Indústria de ……, SA no exercício de 1996, este; havia sido reavaliado nos termos do DL n.° 264/92 de 24 de Novembro, e DL n.° 22/92 de 14 de Fevereiro.
Em 1998-12-31, parte daquele imobilizado corpóreo foi de novo objecto de reavaliação ao abrigo do DL n° 31/98, de 11/02, pela A…….. - Indústria de …….., SA, (empresa adquirente), de que resultou um acréscimo nas amortizações do exercício em análise de € 208.348,93, não sendo nos termos da alínea a) do n.° 1 do art. 7° do referido Dec. Lei, considerado custo para efeitos fiscais, o valor de € 83.339,57, correspondente a 40% do referido aumento.
No âmbito do antigo Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado (RTLC), previsto na anterior redacção do art. 59° do Código do IRC, e conforme Oficio n.° 006313, de 1999-02-01, da Direcção de Serviços do IRC, foi suspensa a reavaliação efectuada pela A……. Indústria de ………; SA, e calculada nova reavaliação, com base, nos valores dos bens que seriam registados pela A………., SGPS, SA, (empresa alienante), à data de 1997-12-31, e consequentemente apuradas novas reintegrações e novo acréscimo (40% do aumento das reintegrações), sendo estes considerados para efeitos da determinação do lucro tributável do grupo.
Com a revogação do RTLC, com efeitos a partir do exercício de 2001, inclusive, foi previsto no artigo 7°, n.° 2 da Lei n.° 30-G/2000, de 29 de Dezembro, um regime transitório, nos termos do qual, e de acordo com o n.° 4.3 da Circular n.° 5/2002, de 2/04, os grupos que tenham optado pela transição para o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, relativamente aos resultados internos ainda pendentes de incorporação no lucro tributável, devem atribuir. O mesmo tratamento que vinha sendo adoptado no anterior regime, procedendo às correcções que se mostrem necessárias.
No decurso da presente acção de inspecção foram facultados pela sociedade dominante os mapas de amortizações relativos ao referido imobilizado transmitido intra-grupo com base nos valores que estariam registados na sociedade A…….SGPS, SA, tendo-se verificado que das reavaliações, efectuadas nos termos do DL 264/92 de 24/11, DL n.° 22192 de 14/02, e DL nº 31/98 de 11/02, resultou um acréscimo nas amortizações do exercício em análise de € 41,721:,692,66.
Assim sendo, o valor a considerar para efeitos do apuramento do resultado fiscal do grupo no exercício em análise, referente ao acréscimo de 40% do aumento das reintegrações resultante das reavaliações, dos bens transaccionados no exercício de 1996, efectuadas ao abrigo dos diplomas acima referidos, é o que estava obrigada a sociedade alienante, (Inf N° 298/2002 da Direcção de Serviços do IRC), o qual ascende a € 16.688.677,06, desconsiderando o valor acrescido individualmente pela A…….. Indústria, SA de € 83.339,57 (sociedade adquirente).
Nestes termos, e dado que o acréscimo considerado pelo grupo; no apuramento do seu lucro tributável é de € 12.999.549,09, é devida uma correcção a favor do Estado, no valor de € 3.605.788,40 (três milhões, seiscentos e cinco mil, setecentos e oitenta e oito euros e quarenta cêntimos) correspondente à diferença entre o valor calculado (€ 16:688.677,06 - € 83.339,57) e o considerado para o apuramento do lucro tributável do grupo (ver anexo 10, fls 39).
(…)
Desta forma, e dado que não são aceites como custo fiscal, conforme fundamentos explanados no ponto III 7.1.7.1 deste documento, reintegrações consideradas pelo grupo no montante total de € 12.256.484,29, de bens que foram reavaliados, efectua-se a correcção a favor do grupo, na importância de € 4.591.639,99 (quatro milhões, quinhentos e noventa e uni mil, seiscentos e trinta e nove euros e noventa e nove cêntimos) , conforme cálculos em anexo como nºs, fls 10 a 17, correspondente ao valor considerado pelo grupo de 40% do aumento. Da amortização resultante das reavaliações efectuadas pela sociedade dominante, amortizações essas que não foram aceites como custo fiscal.
III. 1.1. 7.3 Reposição de no decurso do RTLC - Alienação a terceiros de bens corpóreos adquiridos intra grupo
O artigo 7°, n.° 2 da Lei n.° 30-G/2000, de 29 de Dezembro, estabelece um regime transitório relativo à tributação dos grupos de sociedades, nos termos do qual, os grupos que tenha optado pela transição para o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, devem incorporar no lucro tributável do grupo, os resultados que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime, à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo.
O grupo, relativamente aos bens do activo imobilizado corpóreo alienados a entidades exteriores ao grupo pela A…….. Indústria de …….., SA, efectuou a reposição dos respectivos resultados internos, o montante de € 2.614,00, referente à alienação de imobilizado adquirido em 1996 à sociedade B……….., SA, já que se consideram realizados no exercício em que ocorre a sua saída para o exterior, conforme esclarece ainda o ponto 4.2. da circular n.° 5, de 02/04/2002 da Direcção de Serviços de IRC.
Constatou-se no entanto, através da análise dos elementos apresentados no dossier fiscal, que a A…….. Indústria, SA alienou para fora do grupo e abateu por inutilização, bens que havia adquirida sociedade dominante no exercício de 1996, não tendo considerado no seu resultado fiscal a reposição dos resultados que haviam ficado suspensos transmissão intra grupo.
O Decreto-Lei 251-A /91, de 16 de Julho referia que “ Durante o processo de consolidação dos balanços e das demonstrações dos resultados das sociedades de uma grupo são eliminados, na - sua totalidade, os resultados gerados nas operações efectuadas entre aquelas sociedades. Em consequência disso, opera-se um deferimento na tributação daqueles resultados, porquanto só serão considerados na determinação do lucro tributável do exercício em que os elementos do activo a que respeitem sejam alienados a entidades estranhas ao grupo.”
O mesmo entendimento foi transposto para a Circular -15/94 de 6 de Maio, no seu ponto 7.3.1. na qual se refere que os resultados eliminados consideram-se realizados para efeitos de “tributação no exercício em que os elementos a que respeitam forem transmitidos a entidades estranhas ao grupo (momento em que deixam de integrar o património de qualquer sociedade do grupo).
Também o regime transitório refere que o grupo deve incorporar no caso de se considerarem realizados, os resultados internos que tenham sido eliminados.
Relativamente aos bens reintegráveis do activo imobilizado, são eliminadas do resultado fiscal do grupo, as mais e menos valias fiscais obtidas no exercício da transmissão intra-grupo, bem como o diferencial das amortizações consideradas na sociedade detentora dos bens e as calculadas com base nos valores registados na sociedade alienante desses mesmos bens. Refira-se que o grupo A…….. tem vindo a efectuar estas eliminações, durante o período em que os bens integram o seu imobilizado.
Desta forma o valor a incluir no apuramento do lucro tributável do grupo no exercício de 2003, corresponde aos resultados eliminados, nomeadamente o valor da mais ou menos valia fiscal suspensa no ano da transmissão intra-grupo (1996) e o diferencial das amortizações existente entre as que foram praticadas e as que teriam sido efectuadas pela sociedade alienante nos exercícios posteriores ao da transmissão.
Neste contexto foi solicitado a relação dos bens alienados para fora do grupo, bem como, o valor dos resultados eliminados e pendentes de tributação relativos às mais e menos valias apuradas pela sociedade dominante em 1996, bem como aqueles que seriam necessários para apurar o cálculo do diferencial das amortizações relativas à anulação do custo da amortização calculada com base nos valores registados na sociedade alienante (A………., SGPS, SA), o qual foi considerado no cálculo do lucro tributável dos exercícios em que os bens permaneceram no imobilizado do grupo, bem como à reposição das amortizações do exercício relativas à sociedade adquirente dos bens, tendo a sociedade dominante entregue para o efeitos os mapas constantes em anexo n.° 6, fls. 18 a 23.
Na sequência de notificação foram facultados pela sociedade dominante 3 mapas relativos aos bens transaccionados entre a A……….. SGPS, SA e a A……… Indústria, SA.
No primeiro mapa é possível identificar os bens que deixaram de constar do balanço consolidado (transaccionados para entidades fora do grupo) e as mais ou menos Valias que ficaram suspensa no exercício da transmissão intra-grupo (1996). O saldo das mais valias que foram suspensas relativamente a estes bens foi, no exercício de 1996, de € 54.230,01 (€34.512,87+ €19.717, 14).
Relativamente à tributação dos valores eliminados em exercícios anteriores face ao ajustamento das amortizações, efectuaram-se, com base nos mapas apresentados, os seguintes cálculos:
- As amortizações praticadas pela sociedade adquirente dos bens desde o exercício da transacção intra-grupo (1996) até ao exercício em análise (ano da transmissão a terceiros), constam do mapa 3 e ascendem a € 92.089,27 (€35.198,14 + €56.891,13). Assim, é devida uma correcção a favor do grupo neste exercício relativa a consideração do custo das amortizações do exercício praticadas pela sociedade A…….. Indústria, SA e expurgadas do resultado fiscal do grupo, na sequência dos ajustamentos de consolidação.
- Relativamente às amortizações consideradas pelo grupo no apuramento do Lucro tributável (calculadas com base nos valores considerados pela sociedade A…….. SGPS,SA), estas terão que ser desconsideradas no exercício da transmissão para fora do grupo.
No mapa 1 estão evidenciadas as amortizações calculadas até a data da transacção intra grupo: € 469.181,41(€ 113.306,10 + € 355.875,31).
O mapa 2 foi efectuado como se os mesmos não tivessem sido alienados, ou seja, à data da venda para fora do grupo (2003), constará o montante de amortizações acumuladas que seriam efectuadas em caso se não se ter verificado a venda entre sociedades do grupo. O total das amortizações que seriam praticadas no caso se não ter havido transacção intragrupo é de € 555.003,41 (€ 113.306,45+ € 441.696. A este montante, teremos que retirar o valor das amortizações acumuladas até à data da venda intra-grupo (1996), de forma a saber que amortizações é que a sociedade alienante praticaria no caso de não haver transmissão intra-grupo, entre a data da transmissão intra-grupo e a data da transmissão para fora do grupo, ou seja, o montante das amortizações que ao longo destes exercícios foram consideradas para o cálculo do lucro tributável do grupo. Neste caso o valor é € 8.822,00. Assim, efectua-se a correcção a favor do Estado neste montante de forma a repor as amortizações consideradas pelo grupo para o apuramento do seu lucro tributável nos exercícios em que os bens estiveram no imobilizado da sociedade A…….Indústria, SA.
Assim, na sequência do descrito, procede-se à correcção do resultado do grupo no valor total de € 47.962,74 (quarenta e sete mil, novecentos e sessenta e dois euros e setenta quatro cêntimos), relativamente à incorporação neste exercício de resultados diferidos de resultados internos obtídos em transmissões de imobilizado efectuadas entre as sociedades A………., SGPS, SA e A…….. Indústria, SA durante o Regime de Tributação do Lucro Consolidado.
(…)”
N) Em 3 de Setembro de 2007, a impugnante recebeu uma demonstração de liquidação de IRC, com o n.° 2007 8500015694, no valor de € 337.618,59 a receber, constando a título de juros compensatórios o montante de € 893,88 (cfr. documento de fls. 578 dos autos).
O) Em 4 de Setembro de 2007, a impugnante recebeu a demonstração de acerto de contas n.° 2007 00001218577, emitida na sequência da demonstração de liquidação de IRC 2007 8500015694, na qual foi apurado um crédito final a favor da Impugnante, no montante de € 8.655,99 (cfr. documento de fls. 579 dos autos).
P) O montante de imposto a pagar, aposto na demonstração de liquidação mencionada na alínea anterior, resulta estorno da liquidação n.° 2004 2500106487, no montante de € 346.274,58, acerto da liquidação n.° 2007 8500015694, no montante de € 338.512,47 e do montante de € 893,88 referente a juros compensatórios por recebimento indevido (cfr. documento de fls. 578 dos autos).
Q) Em 21 de Dezembro de 2007, a Impugnante apresentou, junto do Serviço de Finanças de Lisboa- 2, reclamação graciosa contra os actos tributários acima indicados, constantes, respectivamente, do Despacho do Senhor Chefe de Divisão dos Serviços de Inspecção Tributária, datado de 22 de Agosto de 2007, da demonstração de liquidação de IRC n.° 2007 8500015694, e da demonstração de acerto de contas n.° 2007 00001218577 (cfr. documento de fls. 119 dos autos e fls. 1 e ss do Processo de Reclamação Graciosa).
R) Em 9 de Novembro de 2007, a Impugnante foi citada para o processo de execução fiscal n.° 3247200701155571, instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa-2 (cfr. documento de fls. 580 dos autos).
s) O referido processo de execução fiscal foi instaurado para cobrança coerciva dos valores de € 8.655,99 e de € 4.980.745,34, apurados, respectivamente, nas demonstrações de acerto de contas n.°s 2007 00001218577 e 2007 00001220530, referentes ao IRC dos exercícios de 2003 e de 2004 (cfr. documento de fls. 580 dos autos).
T) Em 28 de Dezembro de 2007, a Impugnante prestou garantia, na modalidade de seguro de caução, e no valor global de € 6.455.188,95 para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal mencionado na alínea anterior (cfr. documento de fls. 581 a 583 dos autos).
U) No dia 25 de Janeiro de 2008, a Impugnante informou, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, da prestação da garantia e reiterou o pedido de pagamento de indemnização por prestação indevida de garantia, já constante da petição de reclamação (cfr. documento de fls. 584 dos autos).
V) No decorrer do presente processo de impugnação judicial, a Impugnante foi notificada, através do Ofício 060027, de 17 de Julho de 2009, da Direcção de Finanças de Lisboa, do despacho de revogação parcial dos actos impugnados, proferido, na mesma data, pelo Senhor Director de Finanças Adjunto (cfr. documento de fls. 688 dos autos, e fls. 619 e ss do Processo Administrativo).
W) Nos termos do despacho mencionado na alínea anterior, foi revogado parcialmente o acto de correcções à matéria tributável, no valor de € 162.109,31, correspondente às correcções relativas aos donativos concedidos à Fundação Portugal-África, o acto de liquidação de juros compensatórios no valor de € 893,88, e determinou-se o pagamento à impugnante de indemnização por garantia indevidamente prestada, na parte proporcional ao montante das rectificações efectuadas (cfr. decisão de fls. 619 e ss do Processo Administrativo).
x) a impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 22//09/2008 (cfr. fls. 3 dos autos).

3. Do Direito
As questões a decidir nos presentes autos consistem, em aferir da legalidade de parte das correcções efectuadas em sede de acção de inspecção, ao exercício de 2003 da impugnante, as quais (as ainda subsistentes) foram julgadas como tendo sido acertadas com excepção da correção relativa à matéria tributável no montante € 11.074.676,69, respeitante aos encargos financeiros suportados pela impugnante com a aquisição de partes de capital, nos termos do art.° 31, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante “EBF”).
Não se conforma com o julgamento a impugnante na parte em que decaiu e não se conforma também a Fazenda Pública no que respeita à anulação da sobredita correcção de € 11.074.676,69 sendo que o recurso o seu recurso merecerá a nossa atenção em primeiro lugar.
DECIDINDO NESTE STA
DO RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA:
A Fazenda Pública insatisfeita com a sentença na parte em que considerou ilegal a correcção efectuada, em sede de inspecção tributária, à matéria tributável no montante € 11.074.676,69, respeitante aos encargos financeiros suportados pela impugnante com a aquisição de partes de capital, nos termos do art.° 31, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante “EBF”), veio interpor recurso para este STA alegando em suma que a sentença seguiu erradamente o entendimento segundo o qual a fundamentação da correcção ao assentar na fórmula vertida na circular 7/2004, contraria o disposto no n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais o que fez sem que tenham sido invocados, concretamente quaisquer fundamentos que conduzam a inadequação do método utilizado pelo impugnante, o qual não é excluído pelo referido preceito legal.
Desde já adiantamos que não assiste razão à recorrente Fazenda Pública.
A sentença recorrida considerou e expressou a seguinte fundamentação:
“A impugnante entende que o método de identificação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, para efeitos da sua exclusão do lucro tributável, é o método aplicável aos encargos associados a proveitos excluídos de IRC, ou seja, o da afectação directa.
Já a Administração Tributária entende que a referida imputação deve ser efectuada de forma diversa, designadamente mediante aplicação de uma fórmula constante da Circular n.º 7/2004, de 30 de Março.
O n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, estatui que “As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades”. (sublinhado nosso).
Ou seja, aquele preceito legal refere-se a encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, sem precisar o método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais.
Resulta então, do art. 31.º, n.º 2 do EBF, que não foi consagrado qualquer método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais.
Por seu turno, a Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, na parte dedicada ao estabelecimento do método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais, exara que: “Quanto ao método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afectação directa ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efectuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS e SCR deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afectando-se o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição”.
A AT, entendeu, por meio da circular supra citada, estabelecer um método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais, excluindo o método da afectação directa, com o do que com os regulamentos sucede, não são fonte de direito, mas meras resoluções administrativas” (cf. ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal, I, Lisboa, 1974, págs. 139 e 140).
“As chamadas orientações administrativas, tradicionalmente apresentadas [nas] mais diversas formas como instruções, circulares, ofícios circulares, ofícios-circulados, despachos normativos, regulamentos, etc., e que são muito frequentes no direito dos impostos (...), por terem como destinatário apenas a administração tributária, só esta lhes deve obediência, sendo, pois, obrigatórios apenas para os órgãos situados hierarquicamente abaixo do órgão autor dos mesmos” (cf. JOSÉ CASALTA NABAIS, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2000, pág. 180).
De igual modo, é jurisprudência, nesta matéria, que as circulares não constituem fonte de direito, mas apenas a manifestação geral do entendimento da Administração tributária, cujo conteúdo só os Serviços vincula.
“As circulares administrativas em matéria tributária têm valor simplesmente administrativo, vinculando apenas os órgãos da Administração Fiscal mas sem carácter normativo directo para os contribuintes ou para os tribunais” (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15 de Novembro de 1995, Processo n.º 19.451) - Nesse mesmo sentido, v. Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24/04/2007, processo n.º 01704/07, de 03/11/2004, processo n.º 00151/04 e de 09/05/2006, processo n.º 00436/05.
Não obstante, sempre a AT poderá, caso a caso, efectuar um controle da afectação dos encargos financeiros às participações sociais, e chegar à conclusão, que o método adoptado conduz a distorções comprovadas ou desvios significativos, que não reflectem a realidade. Mas para tanto, importa demonstrar casuisticamente que assim é, não bastando assumir uma posição jurídica de forma geral, por meio de circular, e aplicá-la, tout court a todas as situações, sem qualquer análise concreta.
Neste contexto, e voltando ao caso dos autos, a fundamentação da correcção assenta, exclusivamente, na aplicação da circular, sem que tenham sido invocados, concretamente, quaisquer fundamentos que conduzam a inadequação do método utilizado pela Impugnante, sendo certo que, tal como referimos, este método não poderá ser afastado de forma automática (pela aplicação da circular), porquanto, o disposto n.º 2 do art. 31.º do EBF não exclui a sua utilização.
Em suma, a aplicação da fórmula vertida na Circular n.º 7/2004 aos encargos financeiros das Sociedades Gestoras de Participações Sociais, de forma automática, contraria o disposto no n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, sendo, por consequência, ilegal.
Face ao exposto, a correcção enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, e nessa medida, deve ser anulada, assistindo razão à Impugnante, nesta parte”.

Concordamos com esta expressão/conclusão, da sentença recorrida na consideração essencial de que o afastamento do método seguido pela contribuinte por outro previsto na referida circular carecia da devida fundamentação que não foi efectuada, carecendo também de demonstração a alegada impossibilidade prática da determinação dos meios financeiros usados para fazer face a aquisição de partes de capital referida pela Administração Tributária (AT). Assim, e ponderando o disposto, à data, no artigo 31.º/2 do EBF de onde resultava que os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, por banda da SGPS, não concorrem para formação do lucro tributável (decorrendo da letra e espírito do citado normativo que apenas não concorrem para a formação do lucro tributável os encargos financeiros suportados com a sua aquisição) então anuímos que o critério a ter em conta para a determinação dos encargos financeiros só poderá ser o critério da afectação/imputação directa ou real que foi o seguido pela impugnante. Nesta mesma linha de entendimento se expressa o Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA, no parecer supra destacado, cuja fundamentação para aqui se aporta.
Improcede pois o recurso da Fazenda Pública.

Vejamos agora o recurso da Impugnante

1ª Questão:

A correcção do resultado líquido do grupo no valor de “€ 3.681.542,38, relativo ao não reconhecimento em proveitos pela sociedade A………., SGPS, SA, da remuneração resultante da prestação de garantia pessoal atípica.
A sentença confirmou a legalidade desta correcção com o que não se conforma a recorrente A……..SGPS SA (Doravante recorrente A……..) nos termos expressos nas suas conclusões de recurso, ii) a XIV), concluindo que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter mantido na ordem jurídica uma correcção que não encontra acolhimento no regime previsto no artigo 58.º do Código do IRC impondo-se a sua revogação por violação do mesmo preceito legal, com as demais consequências;
Quid Juris?
Entendemos que a razão está com a recorrente. E, a fundamentação é a mesma que se expressou no acórdão deste STA nº 793/11 de 13/01/2016 no qual foi tratada questão em tudo similar, sendo a recorrente a mesma impugnante. Ali se deixou expressou:
(…) A primeira questão que se suscita é a do acerto da correcção efectuada pela A. Tributária consistente no acréscimo ao resultado líquido da recorrente de um valor ( ) que foi entendido como justificado pela inexistência de remuneração, à recorrente, que a A. Tributária entende ser devida, pela emissão, que fez, de cartas de conforto em benefício das sociedades suas participadas B…………. SA e C……………. SARL.
A administração fiscal entendeu que tal gerou uma subavaliação de proveitos que deveriam ter sido maiores se a emissão por parte da ora recorrente das referidas cartas de conforto tivesse sido remunerada pelas suas participadas. E, daí ter corrigido a matéria colectável do ano de ( ) acrescendo ao resultado líquido o montante de ( ) Euros.
A decisão recorrida depois de esclarecer o conceito de cartas de conforto que distinguiu em fortes, médias e fracas e também o conceito de preços de transferência entendeu que estava certa a correcção efectuada. Para tanto considerou que no caso uma entidade independente poderia prestar serviço idêntico ao efectuado pela ora recorrente quando emitiu cartas de conforto, através da emissão de garantias bancárias. E que se esse serviço podia ser prestado por uma entidade independente então temos um indicador claro de que a actividade em causa (emissão de cartas de conforto) não dever ser actividade de accionista.
Discorda a ora recorrente esgrimindo essencialmente os mesmos argumentos que apresentou na 1ª Instância. A saber:
Não se suscita, no âmbito em causa, incidência de IRC, por considerar que:
- se trata de uma prática incluída na actividade própria dos accionistas, vantajosa para ambas as partes, e logo não se sujeitando a IRC,
- sendo que não existem entidades independentes que prestem garantias pessoais.
- Que, atendendo aos art.°s 491.° e 501.°, do CSC, sempre seria responsável pelas obrigações assumidas pelas suas participadas.
- Que, a remuneração da garantia bancária não é adequada para fixar a remuneração da emissão de cartas de conforto, alegando que a prestação de garantias pessoais por dívidas de entidades terceiras é inválida, inexistindo assim operações comparáveis.
Nesta parte assiste razão à recorrente como procuraremos demonstrar.
Em primeiro lugar cumpre fixar o conceito e história dos preços de transferência para melhor compreensão da questão. Assim remetemos para o trabalho da Professora Nídia Raquel Horta in Jurisprudência do Direito Fiscal – Universidade de Coimbra, consultável em www.fd.uc.pt/...fiscal.../trabalho%20preços%20de%20transferencia.pdf onde refere:

“(São) os preços pagos por bens, serviços e direitos transferidos entre empresas associadas ou pertencentes ao mesmo grupo” e têm como objectivo evitar a manipulação da base tributável, através do aumento ou diminuição dos preços acordados entre partes relacionadas entre si, com o fim de redução ou eliminação da carga fiscal (1 e 2- O regime dos preços transferência foi regulado primeiramente em 1964 no art.51.º - A do Código da Contribuição Industrial; Mais tarde pelo art. 57.º do CIRC sob a epigrafe “Correcções nos casos de relações especiais ou sujeição a vários regimes de tributação” e actualmente, e desde o DL n.º198/2001 de 3 de Julho, os preços transferência são regulados pelo art. 58.º do CIRC e pela portaria 1446 – C/2001. Apesar do legislador regular o regime jurídico desta figura, sempre se afigurou como necessário o recurso às directrizes da OCDE. (2 Cfr. Glória Teixeira e Duarte Barros (Coordenação) Preços de Transferência e o caso Português Ed. Vida Económica, 2004 p.20) ; isto é, visam uma correcta distribuição da carga tributária entre entidades associadas (sociedades associadas ou em grupo, relações entre dois ou mais estabelecimentos estáveis ou outras entidades desprovidas de personalidade jurídica, etc.), sendo que ao nível internacional tem também por objectivo uma justa distribuição da receita fiscal entre os estados onde estão fixados ou sedeados os sujeitos passivos. (3 Aliás, os preços de transferência assumem hoje uma relevância crescente precisamente porque a maioria das transacções internacionais acontece entre empresas que têm entre si relações especiais); Assentam nos princípios da comparabilidade: o preço praticado entre empresas especialmente relacionadas deve ser comparado com aquele que seria praticado entre empresas independentes; e (no princípio) da independência ou da plena concorrência (arm’s length principle) que postula que as empresas especialmente relacionadas, na definição dos preços das suas transacções, devem seguir os mesmos pressupostos que seriam seguidos por empresas independentes, nas condições e práticas normais de mercado. (4 Neste sentido, Rui Duarte Morais “Preços de Transferência. O sistema fiscal no fio da navalha” in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal Ano II, número 1 Primavera, Almedina 2009, pp. 137 e 142).
Ou seja: são preços devidos a uma empresa que transfere para outra ou outras suas associadas bens corpóreos, activos incorpóreos ou lhe (s)presta serviços.
No caso dos autos, em primeiro lugar, há que determinar se estavam reunidos os pressupostos para a aplicação por parte da Administração tributária do disposto no artº 58º do CIRC e chegando-se a uma resposta positiva cumprirá então entrar no domínio da quantificação uma vez que o preço tomado em consideração foi o de uma garantia bancária contratada junto de uma entidade independente (Instituição Bancária). A tarefa de determinar um preço de mercado não é fácil como reconhece a maioria dos autores mas só nos debruçaremos sobre ela se for ultrapassada a primeira questão atinente à referida verificação dos pressupostos referenciados.
Vejamos:
dispunha o artº 58º do CIRC (que consagra o princípio da plena concorrência previsto no artº 9º do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE) à data que:
Correcções para efeitos da determinação da matéria colectável
Artigo 58º
Preços de transferência
1 - Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
2 - O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais, tendo em conta, designadamente, as características dos bens, direitos ou serviços, a posição de mercado, a situação económica e financeira, a estratégia de negócio, e demais características relevantes das empresas envolvidas, as funções por elas desempenhadas, os activos utilizados e a repartição do risco.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
3 - Os métodos utilizados devem ser:
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
a) O método do preço comparável de mercado, o método do preço de revenda minorado ou o método do custo majorado;
b) O método do fraccionamento do lucro, o método da margem líquida da operação ou outro, quando os métodos referidos na alínea anterior não possam ser aplicados ou, podendo sê-lo, não permitam obter a medida mais fiável dos termos e condições que entidades independentes normalmente acordariam, aceitariam ou praticariam.
4 - Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:
(Redacção dada pelo n.º 1 do artigo 44º da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro)
a) Uma entidade e os titulares do respectivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto;
b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respectivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto;
c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, e respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes;
d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta;
e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;
f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos temos em que esta é definida nos diplomas que estatuem a obrigação de elaborar demonstrações financeiras consolidadas;
g) Entidades entre as quais, por força das relações comerciais, financeiras, profissionais ou jurídicas entre elas, directa ou indirectamente estabelecidas ou praticadas, se verifica situação de dependência no exercício da respectiva actividade, nomeadamente quando ocorre entre si qualquer das seguintes situações:
1) O exercício da actividade de uma depende substancialmente da cedência de direitos de propriedade industrial ou intelectual ou de know-how detidos pela outra;
2) O aprovisionamento em matérias-primas ou o acesso a canais de venda dos produtos, mercadorias ou serviços por parte de uma dependem substancialmente da outra;
3) Uma parte substancial da actividade de uma só pode realizar-se com a outra ou depende de decisões desta;
4) O direito de fixação dos preços, ou condições de efeito económico equivalente, relativos a bens ou serviços transaccionados, prestados ou adquiridos por uma encontra-se, por imposição constante de acto jurídico, na titularidade da outra;
5) Pelos termos e condições do seu relacionamento comercial ou jurídico, uma pode condicionar as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional.
h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em país, território ou região constante da lista aprovada por portaria do Ministro de Estado e das Finanças.
(Redacção dada pelo n.º 1 do artigo 44º da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro)
5 - Para efeitos do cálculo do nível percentual de participação indirecta no capital ou nos direitos de voto a que se refere o número anterior, nas situações em que não há regras especiais definidas, são aplicáveis os critérios previstos no n.º 2 do artigo 483º do Código das Sociedades Comerciais.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
6 - O sujeito passivo deve manter organizada, nos termos estatuídos para o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 121º, a documentação respeitante à política adoptada em matéria de preços de transferência, incluindo as directrizes ou instruções relativas à sua aplicação, os contratos e outros actos jurídicos celebrados com entidades que com ele estão em situação de relações especiais, com as modificações que ocorram e com informação sobre o respectivo cumprimento, a documentação e informação relativa àquelas entidades e bem assim às empresas e aos bens ou serviços usados como termo de comparação, as análises funcionais e financeiras e os dados sectoriais, e demais informação e elementos que tomou em consideração para a determinação dos termos e condições normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes e para a selecção do método ou métodos utilizados.
(Redacção do Decreto-lei n.º DL 198/2001, 3 de Julho)
7 - O sujeito passivo deve indicar, na declaração anual de informação contabilística e fiscal a que se refere o artigo 113º, a existência ou inexistência, no exercício a que aquela respeita, de operações com entidades com as quais está em situação de relações especiais, devendo ainda, no caso de declarar a sua existência:
(Redacção do Decreto-lei n.º DL 198/2001, 3 de Julho)
a) Identificar as entidades em causa;
b) Identificar e declarar o montante das operações realizadas com cada uma;
c) Declarar se organizou, ao tempo em que as operações tiveram lugar, e mantém, a documentação relativa aos preços de transferência praticados.
8 - Sempre que as regras enunciadas no n.º 1 não sejam observadas, relativamente a operações com entidades não residentes, deve o sujeito passivo efectuar, na declaração a que se refere o artigo 112º, as necessárias correcções positivas na determinação do lucro tributável, pelo montante correspondente aos efeitos fiscais imputáveis a essa inobservância.
(Redacção do Decreto-lei n.º DL 198/2001, 3 de Julho)
9 - Nas operações realizadas entre entidade não residente e um seu estabelecimento estável situado em território português, ou entre este e outros estabelecimentos estáveis daquela situados fora deste território, aplicam-se as regras constantes dos números anteriores.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
10- O disposto nos números anteriores aplica-se igualmente às pessoas que exerçam simultaneamente actividades sujeitas e não sujeitas ao regime geral de IRC.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
11 - Quando a Direcção-Geral dos Impostos proceda a correcções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo do IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável deste último devem ser efectuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo das correcções feitas na determinação do lucro tributável do primeiro.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
12 - Pode a Direcção-Geral dos Impostos proceder igualmente ao ajustamento correlativo referido no número anterior quando tal resulte de convenções internacionais celebradas por Portugal e nos termos e condições nas mesmas previstos.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
13 - A aplicação dos métodos de determinação dos preços de transferência, quer a operações individualizadas, quer a séries de operações, o tipo, a natureza e o conteúdo da documentação referida no n.º 6 e os procedimentos aplicáveis aos ajustamentos correlativos são regulamentados por portaria do Ministro das Finanças.
(Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)
Da leitura da lei cumpre observar que o preceito para além de indicar os termos e caracterização de ocorrência de relações especiais determina inequivocamente a forma como se deve calcular o valor de determinados bens ou serviços quando contratados e se contratados entre empresas com relações especiais ou de domínio uma sobre a(s) outra(s) (como, sem contestação das partes, sucede no caso dos autos). Estes normativos seguem no dizer de Carlos Augusto Rodrigues (in A Tributação das Empresas Associadas Das Soluções do MCOCDE às Novas Propostas da UE - Tese de Doutoramento Julho de 2010 consultável em www.cije.up.pt/download-file/858) a posição da OCDE que assume que os preços de transferência são os preços pelos quais uma empresa transfere bens corpóreos, activos incorpóreos ou presta serviços a empresas associadas, assumindo que pode revelar-se difícil determinar um preço de mercado aberto; ou seja: o que a OCDE pretende é conhecer, através da aplicação do princípio da plena concorrência, como é que as empresas independentes fixam os seus preços no mercado livre, para em seguida substituir, se for demonstrada essa necessidade, os preços de transferência pelos valores encontrados através das transacções praticadas pelas empresas não vinculadas.
Mas, do mesmo preceito conjugado com as regras constantes do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE- designadamente o artº 9º- e os princípios directores que constituem uma revisão do Relatório OCDE, Preços de transferência e Empresas Multinacionais (1979) os quais foram aprovados pelo Comité dos Assuntos Fiscais em 27/06/1995 e pelo Conselho da OCDE de 13/06/1995 a que o Caderno de Ciência e Técnica Fiscal nº 189, 2002 Lisboa se refere, já não resulta com a mesma clareza uma “obrigação” de contratar toda e qualquer prestação de bens ou serviços (relembra-se que, especificamente, em causa nos autos está, a emissão de uma carta de conforto pela impugnante a uma empresa a si vinculada para que esta tivesse facilidade na obtenção de crédito bancário), designadamente quando as características económicas da situação sejam divergentes significativamente, com a prestação de serviço que uma empresa não vinculada/associada não estaria em condições de prestar ou então prestar de modo diferente (sublinhado nosso). Em suma: é preciso ocorrer comparabilidade entre a situação e o serviço prestado pela impugnante à sua participada e o mesmo serviço/situação se prestado por uma empresa independente.
Ora, não nos parece que ocorra similitude de situações.
A(s) carta(s) emitida(s), ao contrário do expendido na decisão recorrida, tem mais similitude com a figura da garantia pessoal da fiança do que com a figura da garantia bancária. É verdade que a sociedade impugnante (terceira) prometeu ao banco credor adimplir a obrigação da sua associada, caso esta não o fizesse. Mas, ainda assim, o requisito da comparabilidade não se mostra preenchido. É que, como é sabido e, aliás, brilhantemente, destacado na decisão ora sindicada, ao desenvolver a temática sobre as características que as várias modalidades de garantia bancária assumem, com a prestação de uma garantia bancária não se previne apenas o risco do incumprimento de uma obrigação futura mas assume-se o pagamento de um determinado valor ainda que questionado quanto à sua exigibilidade e de forma irrevogável como expressa Mónica Jardim in A garantia Autónoma – Almedina 2002, p.38.
Assim, enquanto que na fiança, surpreendemos a característica essencial da acessoriedade, que se traduz no facto de a obrigação do fiador se moldar necessariamente à do afiançado, já na garantia bancária o garante assegura a verificação de um determinado resultado, totalmente independente da obrigação assumida pelo devedor não podendo invocar, em princípio, quaisquer meios de defesa por excepção (vide neste sentido os Acórdãos do STJ de 19-05-2010 e 27/05/2010 tirado respectivamente nos processos nºs 4 241/07.0TBMCD-A.S1 da 6ª Secção e 25878/07.3YYLSB-A.L1.S1 da 2ª Secção).
Aqui chegados e dando atenção ao probatório, designadamente às alíneas E) a I) verificamos que as cartas de conforto emitidas pela ora impugnante são de molde a permitirem-lhe opor aos beneficiários confortados as excepções derivadas da relação jurídica entre a sua associada e o credor que a esta concedeu crédito.
A fiança, em princípio, não é remunerada e no caso especial dos autos a carta de conforto assenta nas características próprias da emitente onde os seus atributos subjectivos terão sido determinantes para a aceitação pelos credores (estamos a referir-nos aos atributos de credibilidade, capacidade financeira, honradez baseada no seu historial de cumprimento de obrigações e outros do mesmo jaez).
E, por esta razão especial, a nosso ver, não se reúnem os pressupostos indispensáveis à correcção efectuada ao abrigo do disposto no artº 58º do CIRC, sustentada na similitude da situação com a de regra ocorrida na garantia bancária. Acresce referir que não se patenteia sequer a possibilidade de manipulação da base tributável, até porque a impugnante integra o grupo A……………, SGPS, SA que apresentou, em 28 de Março de 2001, declaração de opção pelo Regime de Especial de Tributação de Grupos de sociedades, abrangendo o período de 2001 a 2004 (probatório al. d)) pelo que os seus proveitos com a alegada poupança concretizada na emissão de cartas de conforto seriam no reverso custos da sua participada a terem de ser relevados contabilisticamente. Assim sendo, a obrigação de contratar a terceiros a “garantia”, para o banco credor, seria até contrária ao princípio da liberdade de gestão que Rui Duarte Morais advoga a propósito da aceitação fiscal de custos (ver Rui D. Morais in Apontamentos ao IRC- Almedina 2007 pag. 85 e segs) e que é perfeitamente transponível para a prática de actos de gestão quando estamos em presença de grupos de sociedades, como no caso específico dos autos. Ali se refere: Os sujeitos passivos são, pois, livres nas suas escolhas, nomeadamente para decidirem como gerir as suas empresas, para decidirem quais (na sua espécie e montante) os encargos por eles tidos por convenientes para a prossecução de determinada actividade económica. Temos, como princípio inerente à ideia de Estado Fiscal, a não interferência da administração na gestão das empresas.
Cumpre ainda destacar, na sequência do exposto que, no caso concreto se nos afigura acertada a alegação de que:
“os actos praticados acabaram por constituir prática incluída na actividade própria dos accionistas (cf. previsto no § 7.9 do Relatório da “OCDE - Princípios aplicáveis em matéria de Preços de Transferência destinados às Empresas Multinacionais e às Administrações Fiscais”), uma vez que, quer a subscrição de tais documentos, quer a assumpção da responsabilidade solidária num contrato de mútuo cuja beneficiária é uma sociedade participada, foram realizadas para prosseguir vantagens para ambas as sociedades, visando o desenvolvimento da actividade da empresa participada e, simultaneamente, a rendibilidade do investimento financeiro da empresa participante e que a exigência de remuneração nestas situações apenas iria originar um desequilíbrio entre os benefícios obtidos por ambas as sociedades com tal actividade e potenciar, para além do mais, o desenvolvimento destas práticas por razões meramente fiscais, permitindo, precisamente, a transferência de resultados entre sociedades. (conclusões d) e e)).
Esta alegação, a nosso ver, vai de encontro ao que se expressa no ponto 7.9 do capítulo VII” Considerações especiais sobre prestação de serviços Intra-grupo” em OCDE Princípios aplicáveis em matéria de preços de transferência destinados às empresas multinacionais e às Administrações Fiscais” Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal nº 189 Lisboa 2002.
Ali se pode ler:” É preciso proceder a uma análise mais complexa quando uma empresa associada exerce actividades que envolvem vários membros do grupo ou do grupo no seu conjunto. Num pequeno número de casos, uma actividade intra-grupo pode ser exercida relativamente a membros de um grupo mesmo quando estes não o necessitem (e quando eles não estariam dispostos a pagá-las se se tratasse de empresas independentes). É então unicamente devido às participações no capital de um ou vários membros do grupo, isto é na qualidade de accionista, que um membro do grupo (em geral a sociedade mãe ou uma sociedade holding regional) exerce estas actividades. Não há razão para que as sociedades que beneficiem destas actividades tenham de pagar este tipo de actividades. Estas podem ser classificadas de “actividades de accionista” a distinguir da designação mais abrangente de actividades de tutela utilizada nos Princípios Directores de 1979 (…).
É certo que em geral se considera haver prestação de serviço quando uma melhor cota de crédito é devida a uma garantia prestada por outro membro do grupo mas cada caso deve ser determinado segundo as próprias circunstâncias e factos e para nós decisivo é que a figura da carta de conforto não se equipara à de garantia bancária, nos termos sobreditos ocorrendo nesta parte claro erro de julgamento da sentença recorrida. Assim, consideramos que, no caso, não se verificando os pressupostos para a correcção operada, pelo que temos de conceder razão nesta parte à recorrente mostrando-se despiciendo dissecar outros fundamentos por si aduzidos, designadamente de ordem quantitativa(…)”.

Esta fundamentação é no seu essencial e em geral transponível para o caso dos autos onde sendo certo que “a recorrente A………. prestou um serviço de garante financeiro à sua filiada, uma vez que a primeira aceitou ser co-devedora com a segunda em vários empréstimos bancários e operações de financiamento pela emissão de títulos de dívida, utilizados exclusivamente por esta” , a verdade é que também no presente caso não ocorre comparabilidade entre a situação e o serviço prestado pela impugnante à sua participada e o mesmo serviço/situação se prestado por uma empresa independente que pudesse prestar uma garantia remunerada. A situação dos autos também tem mais similitude com a figura da garantia pessoal da fiança do que com a figura da garantia bancária, não se mostrando verificado/preenchido o requisito da comparabilidade. De facto com a prestação de uma garantia bancária não se previne apenas o risco do incumprimento de uma obrigação futura mas assume-se o pagamento de um determinado valor ainda que questionado (assegura a verificação de um determinado resultado, totalmente independente da obrigação assumida pelo devedor) enquanto que na fiança, se surpreende a característica essencial da acessoriedade, que se traduz no facto de a obrigação do fiador se moldar necessariamente à do afiançado. Ora, ainda que seja certo que em geral se considera haver prestação de serviço quando uma melhor cota de crédito é devida a uma garantia prestada por outro membro do grupo cada caso deve ser determinado segundo as próprias circunstâncias e factos e para nós decisivo é que a figura da carta de conforto não se equipara à de garantia bancária, nos termos sobreditos, e nada no caso dos autos autoriza a partir dos factos provados a extrapolação jurídica de que estamos perante uma situação de garantia bancária, numa das suas várias modalidades, determinativa do recurso aos preços de transferência para cálculo do custo associado à prestação do conforto que a ora impugnante concedeu à sua associada e daí que a correcção efectuada se nos afigure ser indevida ocorrendo nesta parte erro de julgamento da sentença recorrida. Assim, consideramos que, no caso, não se verificavam pressupostos para a correcção operada, pelo que devemos conceder razão, nesta parte, recorrente mostrando-se despiciendo dissecar e analisar outros fundamentos, por si aduzidos, o que se determinará a final.
Segunda questão:
Questiona, em segundo lugar, a impugnante, ora recorrente A……., a legalidade da correcção do “valor de € 4.298.654,35, relativo à dedução considerada indevida nos termos do artigo 23º, n° 2 da Convenção de dupla tributação celebrada entre Portugal e o Brasil, efectuada pelas sociedades A………., SGPS, SA e A……… Internacional, SGPS, SA, e considerada no cálculo do lucro tributável do grupo”;

Considerou a decisão recorrida que:
“(…) Conforme resulta do relatório de inspecção, no exercício de 2003, foram efectuadas deduções ao lucro tributável, ao abrigo do disposto no artigo 23.°, n.º 2 da Convenção entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil Destinada a Evitar a Dupla Tributação e a Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos Sobre o Rendimento (doravante ADT ou Convenção).
Os montantes deduzidos correspondem a 95% do valor dos dividendos distribuídos pela sociedade Companhia de ……. do Brasil (C...B), na sequência do que foi aprovado na Assembleia-Geral dessa sociedade do dia 16 de Abril de 2002.
Na referida Assembleia-Geral, foram aprovadas as contas daquela sociedade relativamente ao exercício de 2001 e foi deliberado distribuir dividendos aos accionistas (entre os quais a Impugnante e a sociedade A……… Internacional, SGPS, SA) no prazo de sessenta dias a contar daquela data.
Os dividendos em causa foram colocados à disposição no dia 17 de Junho de 2002, no entanto apenas foram efectivamente recebidos em 27/11/2003.
Neste contexto, resulta dos autos que a Impugnante e a A………Internacional SGPS SA, efectuaram a respectiva dedução, correspondente a 95% dos dividendos recebidos, relativamente ao lucro tributável referente ao exercício de 2003.
Os Serviços de Inspecção tributária concluíram que “relativamente aos dividendos recebidos pela sociedade dominante, na data do recebimento efectivo destes dividendos, esta não detinha «directamente uma participação não inferior a 25%”, e que “relativamente aos dividendos recebidos pela A……… Internacional, SGPS, SA, além desta sociedade já não deter qualquer participação na A……. Brasil, a participação que esta detinha antes da alienação para a A………. Inversiones era de apenas 0,14%”, e por conseguinte, acresceu ao lucro tributável do Grupo o valor de € 4.298.654,35, considerando que, em 2003, não se encontrarem reunidos os pressupostos enunciados no referido n.º 2 do artigo 23.° do ADT.”

A Impugnante, ora recorrente A………., ao invés, entende que os dividendos aqui em causa, e a consequente dedução, deveriam ter sido imputados ao exercício de 2002 - por se tratar do exercício em que o rendimento foi colocado à disposição - e não, como afinal acabaram por o ser, a 2003.
Por outro lado, invoca ainda que, no exercício de 2003, estavam preenchidos todos os pressupostos do disposto no art. 23°, n.º 2 do ADT, na medida em que, o período de detenção relevante para efeitos de aplicação daquele preceito do ADT seria o período de dois anos anteriores ao momento da obtenção do rendimento e adianta uma interpretação própria da expressão legal “receber dividendos” como tendo o significado de “obter dividendos” ou seja, refere-se “à colocação à disposição” dos mesmos dividendo, interpretação que refere resultar do parágrafo 7 dos comentários da OCDE ao artigo 10º da Convenção Modelo.
No entanto, não lhe assiste razão como procuraremos demonstrar.
Está em causa a alegada violação da sentença recorrida, por indevida interpretação, do disposto no artº 23º da CDT, celebrada entre Portugal e o Brasil publicada no Diário da República n.º 98/2001, Série I-A de 2001-04-27 aprovada pela Resolução da Assembleia da República número 33/2001 sendo que se pretende com base em tal alegação concretizar/evidenciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos então, se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.

Como se disse no recente acórdão deste STA de 06/11/2019 subscrito por dois Juízes da presente formação de julgamento: ” ocorre uma situação de dupla tributação quando se verifica a regra das quatro identidades: do objecto, do sujeito passivo, do período tributário e do imposto. Esta dupla tributação é internacional quando as normas em colisão integram ordenamentos de dois diferentes Estados. Está em causa a pretensão de dois Estados tributarem, na titularidade de uma mesma pessoa, o mesmo rendimento (em impostos sobre o rendimento), relativamente a um mesmo ano fiscal.
Os Estados estão conscientes da necessidade de eliminar esta cumulação internacional de tributações, porquanto a desejável, e inevitável, internacionalização das relações económicas resultaria, de outro modo, gravemente prejudicada. A forma mais equilibrada de o conseguirem, uma vez que implica a partilha amigável das pretensões tributárias nacionais, com o consequente abdicar mútuo de parte delas, é a celebração de convenções bilaterais (CDT), norteadas pela regra da reciprocidade e, normalmente, baseadas em modelos de convenção-tipo, as quais revestem a natureza jurídica de mera recomendação (cfr. Rui Duarte Morais, Dupla Tributação Internacional em IRS, in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, nº.1, Abril de 2008, pág.109 e seg.; Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2ª. Edição Actualizada, Almedina, 2007, pág.31 e seg. e 97 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª. Edição, Coimbra Editora, 2007, pág.80 e seg.)”

E mais se expressou:

“E recorde-se que a interpretação destas Convenções, enquanto tratados internacionais que versam matéria fiscal, deve ser realizada de acordo com a doutrina geral de interpretação dos tratados e das normas tributárias (cfr.artºs.31 e 32 da Convenção de Viena; artº.25, § 3, da Convenção Modelo OCDE; artº.11, da L.G.T.; Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2ª. Edição Actualizada, Almedina, 2007, pág.149 e seg.)”.

Tendo presentes tais regras, temos de considerar, essencialmente, o disposto nos art.s 10º e 23º, n.º 2 do ADT em causa, sendo que neste último preceito se estipulava que:
“(...) quando uma sociedade residente de Portugal receber dividendos de uma sociedade residente do Brasil sujeita ao imposto Federal sobre a renda e não abrangida por qualquer isenção, em que a primeira detenha directamente uma participação não inferior a 25%, Portugal permitirá a dedução de 95% desses dividendos incluídos na sua base tributável, desde que a referida participação tenha sido detida durante dois anos precedentes (...)“.

Apreciando:
Cabe em primeiro lugar a observação de que não deve ocorrer qualquer confusão ou dúvida de que os conceitos de colocação à disposição e recebimento de rendimentos são distintos como resulta da ordem natural das coisas e dos procedimentos, e que o momento relevante para a verificação dos pressupostos é, claramente, o do recebimento, decorrente da expressão legal “receber dividendos”, contida no artº 23º nº 2 da ADT e não o momento da sua colocação à disposição. É até vulgar ou normal que o momento do recebimento dos dividendos possa não coincidir com o momento da colocação à disposição do mesmo, sendo posterior, como sucedeu no caso dos autos, e nestas situações em que o rendimento foi colocado à disposição da ora recorrente em momento anterior ao do seu recebimento, o facto tributário apenas se verifica quando ocorre o fluxo financeiro, ou seja, quando efectivamente se verifica o recebimento dos montantes que foram colocados à disposição, pois que só o efectivo pagamento representa acréscimo patrimonial na sua esfera jurídica.
Portanto, atendendo ao probatório, no caso dos autos o exercício de 2003 é o que deve relevar como data da verificação do facto tributário. Acresce que é de considerar também para a resposta à presente questão (em sentido negativo quanto à pretensão da recorrente) a conclusão retirada pela AT de que na data do recebimento efectivo dos dividendos em causa, as entidades não detinham directamente uma participação não inferior a 25%, (que a lei prevê) consideração que está de acordo com os factos apurados, não controvertidos.
Em conclusão é de manter a correcção efectuada e supra enunciada, com o fundamento da não verificação dos pressupostos previsto no art. 23.º, n.º 2 do ADT.
Face ao exposto, improcedem os fundamentos invocados pela Impugnante quanto esta correcção.
TERCEIRA E QUARTA QUESTÕES
Terceira questão:
Em terceiro lugar considera a recorrente que são ilegais as correcções realizadas pela Administração tributária (AT) com referência aos ajustamentos do consolidado, quando acresceu ao resultado fiscal do GRUPO A……..:
a) o valor de € 12.256.484,29 referente à não aceitação das amortizações decorrentes da reavaliação de bens do activo imobilizado - transmitidos intragrupo em 1996 - que foi realizada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro.
E em decorrência da não aceitação do referido montante de amortizações procedeu em consequência à respectiva correcção com reflexos na liquidação.
Quarta Questão:
b) Correcção do valor global de € 3.605.788,40, por a AT considerar que, (em virtude de os bens do activo imobilizado terem sido reavaliados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 22/92, de 14 de Fevereiro, ainda antes da sua transmissão intragrupo - que ocorreu em 1996) - o GRUPO A…….. deveria ter acrescido 40% do excesso das amortizações decorrentes das reavaliações efectuadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 22/92, de 14 de Fevereiro, por a isso se encontrar obrigada a entidade alienante;

Ora, das extensas e fastidiosas conclusões que sustentam a discordância com estas correções (conclusões xxiii a lxxxix) com reiterados juízos conclusivos sobre as correções efectuadas e o alegado erro de julgamento da sentença recorrida que manifestamente prejudicam a imediata apreensão do objecto do recurso, cremos que em jeito de síntese podemos retirar, no essencial, que a recorrente entende que o nº 2 do artigo 6º do Dec.-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro, não é aplicável, mas sim o artigo 59º do CIRC, o qual na transmissão intragrupo dos bens do activo imobilizado corpóreo não implica a manutenção do estatuto fiscal desses mesmos bens, pelo que os bens reavaliados por uma das empresas do grupo perdem esse seu estatuto - de bens reavaliados -, com a consequente extinção das limitações que lhe estão associadas - V.g. a dos 40% em apreço -, a partir do momento em que sejam adquiridos por outra empresa do grupo, limitando-se o regime de neutralidade previsto no artigo 59° do Código do IRC a impor que, no apuramento do lucro tributável do grupo, as amortizações sejam determinadas de acordo com o valor pelo qual esses bens se encontravam registados na esfera da sociedade transmitente, ou seja, pelo valor resultante da reavaliação efetuada e não, portanto, pelo valor pelo qual esses bens foram adquiridos no âmbito da transmissão intragrupo pelo que no seu modo de ver é ilegal a correcção efectuada pela administração tributária, por partir do pressuposto errado de que os artigos 59° e seguintes do Código do IRC consagram um regime de neutralidade fiscal assente no princípio da continuidade, quando, ao invés, aquele princípio encontra, ao abrigo do novo regime, a sua justificação no método da consolidação de balanços e de demonstrações de resultados, cuja aplicação não implica, a manutenção, de todas as vicissitudes dos bens adquiridos intragrupo, mas tão somente, a recuperação do valor contabilístico pelo qual esses bens se encontravam registados na esfera da alienante.

E, a sentença recorrida de modo diverso considerou que estava certa a correcção dita supra em a) sustentada pela AT simultânea e articuladamente, no n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro, que determina que “o regime fiscal das reintegrações dos elementos reavaliados ao abrigo deste diploma regular-se-á pelas disposições sobre reintegrações e amortizações do Código do IRC e do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12 de Janeiro” e no n.º 5 do artigo 3.º daquele Decreto Regulamentar, na parte em que estipula que “não são aceites como custos ou perdas para efeitos fiscais as reintegrações ou amortizações praticadas para além do período máximo de vida útil”.
E, acrescentou que também se mostrava correcta a correcção dita supra em b) pois a mesma foi efectuada com base no pressuposto de que “o valor a considerar para efeitos do apuramento do resultado fiscal do grupo no exercício em análise, referente ao acréscimo de 40% do aumento das reintegrações resultante das reavaliações, dos bens transaccionados no exercício de 1996, é o que estava obrigada a sociedade alienante (Inf. N° 298/2002 da Direcção de Serviços do IRC), o qual ascende a € 16.688.677,06, desconsiderando o valor acrescido individualmente pela A……… Indústria, SA de € 83.339,57 (sociedade adquirente)”.
Com efeito a expressão da sentença foi a seguinte:
Desde logo, o art.º 16.º, do diploma preambular do CIRC, não refere, ao contrário do pretende a impugnante, que o regime do art.º 6°, do DL n.º 414/87, de 31 de Dezembro, seja apenas aplicável às situações abrangidas pelo referido diploma.
Aliás, o facto de se ter previsto tal n.º 2 vem sim reforçar que o regime do art.º 6.°, do DL n.º 414/87, de 31 de Dezembro, é aplicável a todas as situações de determinação da matéria colectável, quer as constituídas ao abrigo desse diploma, quer as novas, abrangidas já pelo CIRC, relativas a tributação pelo lucro consolidado. Se assim não se entendesse, não havia efeito útil na previsão deste n.º 2, porquanto a aplicação só para as situações já constituídas decorria já do n.º 1 do mesmo art.º 16.°. Como tal, o referido n.º 2 do art.º 16.º do preâmbulo do CIRC veio estender o regime do art.º 6.°, do DL n.º 414/87, de 31 de Dezembro, às situações de abrangidas pelo regime de tributação pelo lucro consolidado, previsto no CIRC.
A este propósito, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 30 de Setembro de 2008 (Processo: 02350/08): “... cada sociedade do grupo autorizada pela tributação do regime do lucro consolidado, tem, de apresentar a sua própria declaração periódica de rendimentos, onde se apura o seu próprio lucro tributável (como se o regime do lucro consolidado não fosse aplicável), que depois é transposto para a declaração periódica de tributação pelo lucro consolidado, já que este é apurado com base no balanço e demonstração dos resultados consolidados de cada uma das sociedades do grupo, sendo aplicável o n.º 2 do art.º 6° do Dec-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, por força do disposto no art.º 16° n.º 2 do Dec-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, na determinação da matéria colectável (sublinhado nosso).
Como tal, a premissa de que parte a impugnante carece de fundamento, porquanto o princípio da continuidade previsto no art.° 6.°, n.º 2, do DL n.º 414/ 87, de 31 de Dezembro, permaneceu em vigor no regime de tributação pelo lucro consolidado previsto no CIRC, pelos motivos já expostos.
Só uma interpretação do art.º 16.°, n.º 2, do diploma preambular do CIRC, feita nestes termos se compadece, aliás, como a teleologia da própria tributação de grupos, que, pretendendo assegurar a neutralidade, permite que seja possível, ao invés de se recorrer a sucursais, estruturar uma realidade empresarial por via de uma teia de sociedades, sem que essa opção estrutural seja penalizante do ponto de vista fiscal. Ora, a neutralidade também só se poderá efectivar aplicando-se o princípio da continuidade, sendo indissociáveis, sob pena de se subverter toda a neutralidade que se pretende que o regime tenha, permitindo que, através de alienações de património intra-grupo, sejam fiscalmente relevadas situações que de outra forma não o seriam, como é o caso dos autos.
Assim sendo, o regime de reintegrações aplicável teria de ser o aplicado à sociedade alienante, não sendo violada qualquer disposição constitucional, maxime o princípio de liberdade de iniciativa económica, desde logo porque a tributação pelo regime do lucro consolidado é facultativa, não sendo imposta às sociedades em causa.
Considerando que o regime de reintegrações da alienante estava sujeito à limitação prevista no art.º 6°, n.º 1, do DL n.º 22/92, de 14 de Fevereiro, essa limitação manteve-se, nos termos já enunciados e por força do n.º 2 do art.º 6.°, do DL n.º 414/87, relativamente à adquirente, tal como foi considerado no Relatório de Inspecção.
De igual modo, não enferma dos vícios invocados a correcção no valor de € 12.256.484,29 referente, porquanto, conforme supra exposto, e ao contrário do que alega a Impugnante, esta correcção não foi efectuada “em pressuposto errado”, de que aos bens em apreço (objecto da reavaliação efectuada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro) se aplica, por força do regime de tributação pelo lucro consolidado, o regime das reintegrações e amortizações previsto para os elementos do activo imobilizado adquiridos a terceiros em estado novo ou fabricados ou construídos pela própria empresa.
Face ao exposto, não se verifica quanto a estas correcções os vícios invocados pela Impugnante, pelo improcede a sua pretensão, nesta parte.

VEJAMOS:
Será que deveriam as reintegrações e amortizações ser calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo, na circunstância de ter havido uma situação de reavaliação como a que ocorreu in casu?.

Cremos que não. Aliás este STA já se pronunciou sobre a(s) questão(ões) em sentido oposto à pretensão da recorrente pelo menos em dois acórdãos. Um primeiro de 27/05/2015 tirado no recurso nº 0609/14 e um segundo de que decidiu no mesmo sentido, de 13/01/2016 tirado no recurso nº 793/11-30. Porque foi exaustiva e continua actual a resposta então dada fazemos nossa a fundamentação então expressa no primeiro daqueles arestos que para aqui aportamos. Ali se expendeu:

(…) Se bem percebemos a argumentação da recorrente neste recurso que nos dirige, a mesma entende que o disposto no artigo 59º do CIRC (na redacção à data da ocorrência do facto tributário, exercício de 1999), não previa, tal como o artigo 6º, n.º 2, al. a) do DL n.º 414/87, de 31/12, que as reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos fossem calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo, pelo que, é ilegal a liquidação impugnada e enferma de erro de julgamento a sentença que assim decidiu.

Desde já poderemos dizer que o recurso não merece provimento, pelas razões que de seguida se alinharão.

A tributação dos grupos de sociedades pelo lucro consolidado surge com a edição do DL n.º 414/87, de 31/12, ainda na vigência do regime fiscal da Contribuição Industrial e do Imposto Complementar, mas já se antevendo a reforma profunda do sistema fiscal que se aproximava a passos largos com o CIRC.

E é por essa razão que este DL n.º 414/87 é editado, tal como se surpreende do seu preambulo, foi-o acolhendo as soluções dos estudos desenvolvidos a este propósito na Comissão de Reforma Fiscal a respeito do futuro imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), de modo a assegurar que não sejam tomadas nesta altura medidas que dificultem a transição para o regime que resultará da reforma fiscal.

Menos de um ano depois, o legislador fez publicar o DL n.º 442-B/88, de 30/11, que aprovou o CIRC, podendo ler-se no preambulo desse DL, e no que se refere a este regime especial de tributação, “11 - Uma reforma da tributação dos lucros não pode ignorar a evolução das estruturas empresariais, antes há-de encontrar o quadro normativo que, obedecendo a princípios de eficiência e equidade, melhor se ajuste a essas mutações.

A existência de grupos de sociedades que constituem uma unidade económica é uma das realidades actuais que deve merecer um adequado tratamento fiscal, na esteira, aliás, do que vem acontecendo noutras legislações. Os estudos preparatórios desenvolvidos a propósito do IRC permitiram já a publicação do Decreto-Lei 414/87, de 31 de Dezembro, cuja disciplina geral, possibilitando a tributação do lucro consolidado, se reproduz neste Código e contém as virtualidades suficientes para poder ser desenvolvida à luz da experiência que for sendo retirada da sua aplicação.”.

Percebe-se, assim, que o regime de tributação inovatório do DL n.º 414/87 (o da consolidação fiscal visando a tributação pelo lucro consolidado das sociedades que constituem o grupo) mais não foi do que uma antecipação do regime que acabaria por ser consagrado nos artigos 59º e ss. do CIRC, uma vez que havia a necessidade de rapidamente criar um regime fiscal próprio (que apoiasse) para as organizações plurissocietárias (grupos societários) que rapidamente se instalavam nos mercados, com vista a uma melhoria das condições de operacionalidade no vasto mercado global [cfr. Gonçalo Avelãs Nunes, “Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em sede de IRC”, pág. 55, Maria dos Prazeres Lousa, “O Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado”, Ciência e Técnica Fiscal, nº 355, 1989, p. 59 e Nuno de Oliveira Garcia, “Tributação pelo Lucro Consolidado”, (Comentário ao Acórdão N.º 021/12 do Supremo Tribunal Administrativo…), Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 5, Número 1, págs. 255 e ss.], no dizer do acórdão deste Supremo Tribunal, rec. n.º 021/12, de 29/02/2012, “A vantagem fiscal concedida aos grupos de sociedades através do regime da tributação do lucro consolidado, que, como vimos, implica para o Estado perda de receitas, é justificada pelos potenciais efeitos positivos do ponto de vista económico que se visam alcançar com esse mecanismo.”.

Portanto, tanto o DL 414/87, como o artigo 59º do CIRC provinham da mesma fonte comum, sendo que o regime daquele DL (Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado) acabou por ser incorporado no CIRC sem alterações relevantes a nível estrutural, “…o RTLC foi introduzido em Portugal logo em 1988 pelo Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, passando, depois, a constar do próprio Código do IRC. O regime assentava numa autorização prévia obrigatória por parte do Ministro das Finanças que permitia que o lucro tributável em IRC fosse calculado em conjunto para todas as sociedades do grupo mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados das sociedades que o integravam (desde que verificados certos requisitos definidos na lei e de outros fixados pelo próprio Ministro das Finanças). Com a Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, o RTLC seria substituído pelo RETGS actualmente em vigor, abandonando-se a tributação dos grupos com base nos resultados apurados de acordo com as contas consolidadas e passando-se a apurar o seu resultado fiscal a partir da soma algébrica dos resultados líquidos (lucro ou prejuízo) de cada uma das empresas constituintes do Grupo fiscal”, cfr. Nuno de Oliveira Garcia, mesmo local citado, pág. 257.

Tratava-se, essencialmente, de um regime de consolidação fiscal que podia ser definido como “…um regime específico de quantificação da matéria tributável aplicável… (às) …várias sociedades que integram o grupo … o qual, partindo do resultado individual de cada uma das sociedades determinado de acordo com as regras gerais, se procede em seguida às correcções aos resultados de cada uma delas, essencialmente através da eliminação das operações internas ao grupo, após o que se efectuará a soma algébrica desses resultados, quantificando a matéria tributável do grupo de sociedades, e se procederá, por fim, à liquidação e às deduções à colecta que tiverem lugar.”, cfr. Gonçalo Avelãs Nunes, “Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em sede de IRC”, págs. 97 e 98, no mesmo sentido, e fazendo a análise comparativa entre consolidação contabilista e consolidação fiscal, Carlos A. Rosa Lopes, Revista TOC, n.º 10, Janeiro de 2001, págs. 38 e ss.

Apesar de se tratar do mesmo regime, com o mesmo alcance, objectivo e conteúdo, é certo que, aparentemente e tal como refere a recorrente nas suas alegações, o texto do referido artigo 59º do CIRC e o texto do DL 414/87, quando analisados comparativamente, poderiam levar-nos a concluir que o texto do diploma original seria mais restritivo (limitativo para o contribuinte) que o do CIRC no que respeita às reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos intragrupo.

Enquanto que no DL n.º 414/87 se dispunha expressamente nos artigos 1º, n.º 1 e 6º:

Artigo 1.º

Tributação pelo lucro consolidado

1 - A sociedade que, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, tenha o domínio total de uma ou mais sociedades poderá solicitar ao Ministro das Finanças autorização para que o lucro tributável e o rendimento global para efeitos, respectivamente, de contribuição industrial e de imposto complementar, secção B, sejam determinados em conjunto para todas elas mediante consolidação das respectivas contas.

Artigo 6.º

Isenção do imposto de mais-valias

1 - Os ganhos realizados através da transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado ou de bens ou valores mantidos como reserva ou para fruição operada entre sociedades abrangidas pelo artigo 1.º, durante o período em que aplique a tributação pelo lucro consolidado, ficam isentos do imposto de mais-valias.

2 - Quando se verifique o disposto no número anterior:

a) As reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos são calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo;

b) As mais-valias ou menos-valias correspondentes aos mesmos elementos, quando se verifique a sua posterior transmissão e haja lugar a imposto, são calculadas como se não tivesse havido transmissão entre as sociedades do grupo, já no CIRC dispunha-se no n.º 1 do artigo 59º (sob a epígrafe “Âmbito e condições de aplicação” da tributação pelo lucro consolidado) que, 1 - Existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante poderá solicitar ao Ministro das Finanças autorização para que o lucro tributável em IRC seja calculado em conjunto para todas as sociedades do grupo mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados das sociedades que o integram.

Mas, lidos atentamente ambos os regimes, claramente podemos intuir que a tributação ocorre por referência ao lucro consolidado, ou seja, pela consolidação fiscal das contas; essa consolidação fiscal parte sempre do pressuposto de que os resultados decorrentes das operações efectuadas entre sociedades do mesmo grupo são eliminados na totalidade, não só os resultados imediatos, mas igualmente todos os circunstancialismos que permitam considerar para efeitos fiscais o objecto de tais operações como desligado de uma operação intragrupo (“Na eliminação dos resultados internos provenientes das operações efectuadas entre as sociedades do grupo, e que estejam incluídos nos valores contabilísticos dos activos constantes dos balanços das sociedades do grupo, na consolidação fiscal são eliminados pelo valor total, enquanto na consolidação contabilística são eliminados por inteiro nos activos, mas ao nível dos resultados e capital próprio pode efectuar-se a repartição por interesses maioritários e minoritários…”, cfr. Carlos A. R. Lopes, mesmo local citado, pág. 40).

E se o legislador previu expressamente naquele artigo 6º, n.º 2, al. a) do DL n.º 414/87 a neutralidade das operações efectuadas intragrupo no tocante ao cálculo das reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos, sendo este um dos pressupostos estruturantes para que possa ocorrer a consolidação fiscal, também não deixou de o prever no CIRC, uma vez que o próprio conceito de lucro consolidado para efeitos fiscais pressupõe tal realidade.

“Na verdade, o regime de tributação pelo lucro consolidado (introduzido pelo Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, alterado pela Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro) proporcionava outras (além da isenção de Sisa) vantagens para o grupo societário, nomeadamente: a eliminação total da dupla tributação, em sede de IRC e de imposto sobre as Sucessões e Doações por Avença, relativamente aos lucros/dividendos distribuídos entre as sociedades do grupo, a não realização de quaisquer retenções na fonte, em sede de IRC, nas relações entre as sociedades do grupo, a possibilidade de as mais e menos-valias apuradas na transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado, assim como quaisquer ganhos e perdas realizados em transacções entre as diversas sociedades do grupo não serem consideradas ganhos/perdas na determinação da matéria colectável em sede de IRC e a possibilidade de compensação dos lucros e prejuízos gerados no mesmo ano pelas diversas sociedades do grupo”, cfr. acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 128/09, datado de 12/03/2009.

“Efectivamente, se uma sociedade do grupo integra no património um elemento do imobilizado adquirido a outra sociedade do grupo, terá de se proceder a uma série de ajustamentos recorrentes em cada processo de consolidação e durante o período em que mantiver a sua propriedade, os quais são em suma, os seguintes:

-Considerar como custo de aquisição não o registado pela sociedade adquirente mas, o que constava nos registos da entidade alienante no momento da transmissão;

-Corrigir a quota anual de reintegração ou amortização de modo a adequar o respectivo valor ao que seria calculado sobre o custo de aquisição ou de produção do elemento para o grupo. Este ajustamento reflecte-se directamente no resultado consolidado;

-Recalcular as reintegrações e amortizações acumuladas em função dos ajustamentos anteriores, como se não tivesse havido transferência do elemento entre sociedades do grupo.

No exercício em que o elemento do activo imobilizado for alienado para uma entidade exterior ao grupo, a mais ou menos valia contabilística e fiscal será calculada abstraindo das transmissões internas dentro do grupo.”, cfr. Maria dos Prazeres Lousa, O Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado, CTF, n.º 355, pág. 86, também no mesmo sentido pode-se consultar a Circular n.º 4, de 09/01/1990, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, CTF, n.º 357, págs. 267 e ss.

De resto, e ao contrário do que vem alegado pela recorrente, o disposto no artigo 16º, n.º 2 do DL n.º 442-B/88 tem aplicação no âmbito do regime de tributação previsto no artigo 59º do CIRC, por razões de lógica e coerência do regime legal próprio da tributação pelo lucro consolidado.

Dispunha o artigo 16º do DL n.º 442-B/88, de 30/11, sob a epígrafe “Tributação pelo lucro consolidado”:

1 - A autorização para a tributação pelo lucro consolidado nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei 414/87, de 31 de Dezembro, é válida, para efeitos de IRC, pelo período restante por que tenha sido concedida e nos termos e condições em que o tenha sido.

2 - Para efeitos de determinação da matéria colectável em IRC é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei 414/87, de 31 de Dezembro.

Se o n.º 1 deste artigo 16º visa salvaguardar as situações já constituídas à data da entrada em vigor do CIRC, portanto, configura-se como uma norma de direito transitório, de adaptação das situações anteriores à nova realidade, já o disposto no n.º 2 do mesmo preceito se destina a regular expressamente a tributação pelo lucro consolidado no âmbito do CIRC, cfr. Maria dos Prazeres Lousa, O Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado, CTF, n.º 355, pág. 85, tal como já acontecia no âmbito do DL n.º 414/87.

Podemos, assim, concluir que a interpretação que a recorrente faz do RTLC previsto no CIRC permite defraudar o princípio da neutralidade nas operações intragrupo, bem como o espírito com que foi editado esse regime especial de tributação [“A tributação pelo lucro consolidado constitui…uma excepção ao princípio da individualidade da tributação ou da pessoalidade tributária de cada uma das sociedades comerciais (art. 2º do CIRC)”, cfr. acórdão deste Supremo Tribunal, rec. n.º 024732, de 05/04/2000], não encontrando, assim, apoio nas regras interpretativas das leis, estabelecidas no artigo 9º do Código Civil.

Impondo tal regime de tributação que todas as operações entre empresas do mesmo grupo sejam desconsideradas (sejam neutras) para efeitos de tributação fiscal, quer enquanto lucros, quer enquanto prejuízos, ao considerar-se o objecto dessas operações como “imune” ao mesmo princípio da neutralidade, estar-se-ia a permitir, por exemplo no caso de bens sujeitos a reavaliação, que os mesmos, após a transmissão entre empresas do mesmo grupo, passassem a constar da respectiva contabilidade, e também para efeitos fiscais, como provenientes de terceiros exteriores ao grupo, permitindo, assim, retirar dos mesmos todas as vantagens fiscais que já anteriormente haviam proporcionado ao próprio grupo, duplicando a vantagem fiscal inerente ao Regime da Tributação pelo Lucro Consolidado.

E assim sendo, o recurso não merece provimento.

2. Na sentença recorrida deu-se como assente que a impugnante faz parte de um grupo de sociedades - Grupo A………. - de que é a sociedade dominante, sujeito ao regime de tributação pelo lucro consolidado (RTLC) no exercício de 1999.

Aquando da constituição do grupo e da sua passagem a sociedade gestora de participações de sociedade, a impugnante efectuou, em 31/12/1996, a alienação da quase totalidade do seu activo imobilizado corpóreo à sociedade "A…………., S.A.", o qual havia sido reavaliado ao abrigo dos regimes do Dec.-Lei nº 22/92, de 24/02, que aprovou o regime de reavaliação dos elementos do activo imobilizado corpóreo das empresas objecto de privatização, e do Dec.-Lei nº 264/92, de 24/11.

Os mesmos elementos do activo imobilizado foram posteriormente objecto de reavaliação ao abrigo do Dec.-Lei nº 31/98, de 11 de Fevereiro.

Na sequência de uma acção inspectiva tendo por âmbito o exercício de 1999, a AT procedeu a correcções à matéria tributável do grupo A…………….., à qual foi acrescido o montante de € 12.223.917,37 euros.

Nas referidas correcções à matéria tributável a AT entendeu que para efeitos do apuramento do lucro tributável consolidado havia a considerar o valor correspondente ao acréscimo de 40% do aumento das reintegrações resultante das reavaliações efectuadas nos termos dos diplomas supra referidos, no montante global de € 32.362.471,04 euros. Como o grupo havia efectuado o acréscimo de € 20.195.846,24 + € 231.006,75, a AT procedeu à correcção pelo valor diferencial de € 11.935.618,05 euros.

Posteriormente a AT emitiu a liquidação adicional de IRC, acrescida de juros compensatórios, no valor global de € 4.038.934,33 euros, contra a qual foi deduzida reclamação graciosa, que foi indeferida.

Do indeferimento da reclamação graciosa foi apresentada impugnação judicial, sobre a qual incidiu a sentença agora recorrida.

3. A questão que é suscitada pela Recorrente consiste em saber se as correcções efectuadas pela AT e respeitantes à parte correspondente a 40% do aumento das reintegrações resultante de reavaliação do ativo imobilizado alienado pela Recorrente à sociedade "A……………., S.A.", o qual havia sido reavaliado ao abrigo dos regimes do Dec.-Lei nº 22/92, de 24/02, e do Dec-Lei nº 264/92, de 24/11, padecem ou não do vício de ilegalidade.

Para a Recorrente tais correcções não têm suporte legal face ao regime de tributação pelo lucro consolidado previsto no artigo 59º do CIRC, na redacção então em vigor, já que no seu entendimento no novo regime não deve ser observado o princípio da continuidade que enformava o regime do Dec.-Lei nº 414/87, de 31/12, já que no novo regime o legislador limitou-se a estipular, em termos de determinação da matéria tributável, que o lucro tributável em IRC do grupo de sociedades seria calculado em conjunto para todas as sociedades do grupo mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados das sociedades que o integram - nº 1 do artigo 59º do CIRC.

E que por outro lado o disposto na norma de direito transitório consagrada no artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro (1. A autorização para a tributação pelo lucro consolidado nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, é válida para efeitos de IRC, pelo período restante por que tenha sido concedida e nos termos e condições em que o tenha sido. 2. Para efeitos de determinação da matéria colectável em IRC é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro.), tinha apenas por finalidade a preservação da aplicação de tal regime aos grupos de sociedades já constituídos à face da lei anterior.

Ou seja, enquanto para nesses casos a matéria colectável do IRC era determinada nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31/12, ou seja, as reintegrações e amortizações dos elementos ou valores transmitidos deviam ser calculados como se não tivesse havido transmissão entre sociedades do grupo, já no caso dos grupos constituídos ao abrigo do artigo 59º do CIRC, tal não sucedia, uma vez que o lucro tributável era calculado mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados.

Afigura-se-nos, contudo, que não lhe assiste razão.

Resulta da matéria de facto dada como assente que a Recorrente efectuou diversas reavaliações do seu imobilizado ao abrigo dos diplomas supra mencionados - Dec.s-Leis nº 264/92, de 24/11, nº 22/92, de 14/02, e nº 31/98, de 11/02 -, cujos regimes legais consagravam que as amortizações e reintegrações efectuadas em consequência dessas reavaliações não eram integralmente deduzíveis, já que 0,4 do aumento do seu montante não era susceptível de dedução.

Assim sendo e uma vez que de acordo com o princípio da neutralidade as transmissões intragrupo não relevam para efeitos fiscais, as amortizações e reintegrações efectuadas ao abrigo dos diplomas supra referidos estão sujeitas àquela limitação, ou seja, não são dedutíveis na íntegra como pretende a Recorrente. E por outro lado o facto de os bens sujeitos a reavaliação terem sido transmitidos para outra sociedade do grupo não releva para esse efeito, uma vez que essa limitação resulta do regime consagrado nos diplomas que permitiram essa reavaliação da qual resultou o aumento das amortizações e reintegrações em causa e não do regime de tributação aplicável aos grupos de sociedades.

Por conseguinte, o argumento de que o regime previsto no artigo 59º do CIRC não prevê norma idêntica à consagrada no artigo 6º, nº2, do Dec.-Lei nº 414/87, de 31/12, não se mostra pertinente para concluir pela aplicação do referido limite de 40% ao valor das amortizações a deduzir, uma vez que este limite vem previsto nos diplomas que prevêem a possibilidade de reavaliação dos bens- art. 6º, nº 1, alínea a), do DL 22/92; artigo 7º, nº 1, alínea a), do DL 264/92, de 24/11; art. 7º, nº 1, alínea a), do Dec.-Lei nº 31/98, de 11 de Fevereiro; e artigo 16º, nº2, alínea a), do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro.

Entendemos, assim, que a sentença recorrida não padece do vício que lhe é assacado pela Recorrente, motivo pelo qual deve ser confirmada e o recurso ser julgado improcedente.(…)

Exposta a fundamentação exarada em caso similar, que para aqui se aporta, cumpre dar a devida atenção ao presente caso.
E adiantamos já que deve decidir-se do mesmo modo no caso dos autos em que está em causa o exercício de 2003.
Acresce que o artº 16º do diploma preambular do CIRC não estipula que o regime do artº 6º do D.L. 414/87 de 31/12 seja aplicável apenas às situações abrangidas por este diploma. O seu nº 2 vem reforçar que o regime do mencionado artº 6º e o princípio da continuidade que encerra é aplicável a todas as situações de determinação de matéria colectável, quer as constituídas ao abrigo do D. L. 414/87 quer as novas abrangidas já pelo CIRC, relativas à tributação pelo lucro consolidado, que é o caso dos autos.
Por isso, concordamos com a decisão recorrida quando expressa que o regime de reintegrações aplicável teria de ser o aplicado à sociedade alienante, não sendo violada qualquer disposição constitucional, maxime o princípio de liberdade de iniciativa económica, desde logo porque a tributação pelo regime do lucro consolidado é facultativa, não sendo imposta às sociedades em causa e que considerando que o regime de reintegrações da alienante estava sujeito à limitação prevista no art.° 6.°, n.° 1, do DL n.° 22/92, de 14 de Fevereiro, essa limitação manteve-se, nos termos já enunciados e por força do n.° 2 do art.° 6.°, do DL n.° 414/87, relativamente à adquirente, tal como foi considerado no Relatório de Inspecção, o que determina a improcedência do alegado quanto a esta questão e a bondade da correcção efectuada.
E, sobre a aplicação do regime transitório estabelecido pelo artº 7º da Lei 30-G/2000 de 29 de Dezembro à alienação a terceiros de bens adquiridos intra-grupo em 1996 importa considerar o teor do seu nº 2 alínea a) ponto 2 (supra destacado na reprodução da parte de direito da decisão recorrida). Não vemos razões para dissentir da decisão recorrida porquanto tendo sido diferida a tributação no momento da transmissão de bens intra grupo e tendo sido apenas tributada a alienação desses bens a entidades externas ao grupo nesse momento o grupo realizou resultados que devem ser considerados para efeitos do regime transitório acabado de referir. Pela clarividência reiteram-se aqui os dizeres da decisão recorrida que permitem compreender, a criação da regra excepcional do nº 8 do artº 59º do CIRC (“os resultados realizam-se em regra, no seio do grupo, quando haja alienação dos bens. Tal é a regra, inerente e subjacente ao próprio sistema de consolidação. O problema com que o legislador se deparou teve a ver não com estas situações, mas sim com o tratamento a dar a situações de resultados internos não considerados, em virtude de ainda não ter havido a tal venda a entidade externas. Daí que tenha havido a necessidade de criar a regra excepcional do art.° 59.°, n.° 8, do CIRC, que tem por base e ponto de partida a regra de consolidação de que, com a alienação dos bens a entidade terceiras, o resultado se realiza no seio do grupo”).

Concordando com a fundamentação da sentença recorrida, afirmamos que também aqui não sofrem de ilegalidade, por erro sobre os pressupostos, as correcções efectuadas, enunciadas supra em a) e b) improcedendo a pretensão da impugnante nesta parte.
Quinta questão:
A Administração tributária acresceu, por último, ao resultado do GRUPO A……… o valor global de € 47.962,74, relativo à incorporação, no exercício de 2003, dos resultados internos obtidos em transmissões efectuadas entre a recorrente e a A……… INDÚSTRIA DE …………., S.A., durante o regime de tributação do lucro consolidado.

Esta correcção assentou no pressuposto de que os resultados eliminados aquando da transmissão intragrupo de bens do activo imobilizado se consideram realizados nos exercícios em que tais bens sejam transmitidos a entidades estranhas ao grupo, nos termos afirmados na Circular 15/94, de 6 de Maio;
A impugnante alegara e alega erro sobre os pressupostos de direito, considerando que, o regime transitório constante da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, prevê, para os grupos que optem pela transição para o regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS), a incorporação, no lucro tributável do grupo, dos resultados que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime, à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo, tal não implica que os resultados eliminados se considerem realizados no exercício em que os elementos a que respeitem forem transmitidos a entidades estranhas ao grupo, resultando este entendimento da Administração Fiscal não da lei, mas de uma circular administrativa. Ainda segundo a impugnante, uma venda para fora do grupo deve implicar apuramento de mais ou menos-valias, não devendo ser sujeita ao regime excepcional do então art.º 59°, n.º 8, do CIRC.
Ora, como se anota no Relatório de Inspecção, as transacções em causa respeitavam a bens adquiridos pela A…….Indústria de ……., S.A. à sociedade dominante, no exercício de 1996, bens esses que, posteriormente, foram alienados pela A……..Indústria a entidades externas ao grupo, tendo-se entendido que o grupo não repôs a totalidade dos resultados eliminados no decurso de transmissões intra-grupo.
E a sentença recorrida equacionou a questão como consistindo em saber qual o tratamento a dar para efeitos de mais ou menos valias nas situações de alienação a terceiros de bens adquiridos intra-grupo.
Passou depois em revista a lei vigor que interessa para a solução da questão suscitada:
Artigo° 59.º, n.º 8, do CIRC, em vigor no final de 2000, o qual dispunha:
“Na determinação do lucro tributável do último exercício em que seja aplicável o regime de tributação pelo lucro consolidado deverão ser considerados os resultados provenientes das transmissões efectuadas entre as sociedades do grupo de elementos do activo constante do balanço consolidado desse exercício que tenham sido eliminados no decurso das operações de consolidação, observando-se ainda o seguinte:
a) Aos resultados respeitantes aos bens do activo reintegráveis transmitidos entre sociedades do grupo durante a aplicação do regime deduzir-se-á ou adicionar-se-á, conforme seja, respectivamente, positiva ou negativa, a diferença entre o total das reintegrações praticadas pela sociedade para a qual os bens foram transmitidos e o total das reintegrações tidas em consideração no apuramento do lucro tributável consolidado;
b) Sempre que uma ou várias sociedades deixarem de fazer parte do grupo os resultados a incluir no lucro tributável consolidado do exercício anterior àquela saída respeitarão apenas às operações em que essas sociedades tiverem participado”.

Por sua vez, a Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, estabelecia, no seu art.º 7°, um regime transitório, nos seguintes termos:
“2 - É estabelecido o seguinte regime transitório relativo à tributação dos grupos de sociedades:
a) Os grupos de sociedades a que foi concedida autorização para aplicação do regime de tributação pelo lucro consolidado, cujo período de validade ainda esteja em curso à data da entrada em vigor da presente lei, podem optar por uma das alternativas seguintes:
1) Renunciar ao regime para o qual foram autorizados com efeitos a partir do período de tributação que se inicie no ano de 2001, devendo a sociedade dominante, na determinação do lucro tributável do último exercício em que o regime for aplicado, proceder às correcções, nos termos estabelecidos nos n.ºs 8 e 12 do artigo 59.º do Código do IRC, na redacção anterior, no que respeita aos resultados internos que tenham sido eliminados nas operações de consolidação e às diferenças entre os prejuízos fiscais que foram integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados se as sociedades do grupo tivessem sido tributadas autonomamente, sem prejuízo do estabelecido na alínea c) do artigo 60.º do mesmo Código e redacção;
2) Passar a aplicar o regime especial de tributação dos grupos a partir do período de tributação que se inicie no ano de 2001, não obstante não serem verificados alguns dos requisitos exigidos às sociedades do grupo na nova redacção do artigo 59.º do Código do IRC, devendo a sociedade dominante incorporar no lucro tributável do grupo os resultados internos que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo tendo como limite temporal o exercício da caducidade da autorização, excepto quando a sociedade dominante optar pela renovação do regime de acordo com as regras em vigor, situação em que aos resultados internos ainda pendentes de incorporação no lucro tributável pode continuar a ser concedido o tratamento que vinha sendo adoptado podendo ser deduzidos ao lucro tributável do grupo os prejuízos fiscais consolidados apurados em exercícios anteriores;
b) Nos casos em que a opção dos grupos de sociedades for a prevista no n.º 2) da alínea anterior, a sociedade dominante deve incluir no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 104.º do Código do IRC, documentos comprovativos do apuramento dos resultados internos eliminados durante o período de aplicação do regime de tributação do lucro consolidado, a indicação dos exercícios a que se reportam e a identificação das sociedades que intervieram nas operações que os originaram, abrangendo tanto os que, em cada exercício, são considerados realizados pelo grupo e incluídos no lucro tributável como aqueles cuja tributação continua diferida.”

Ponderou-se que, como resulta do Relatório de Inspecção, o tratamento fiscal que foi dado passou pelo diferimento da tributação, no momento em que foram transmitidos intra-grupo os bens em causa, sendo que não veio a ser realizada a reposição relativa a essa transacção intra-grupo, tendo sido apenas tributada a operação de alienação a entidades externas ao grupo.
E considerou-se que atentando no regime transitório supracitado, este refere que a sociedade dominante deve “... incorporar no lucro tributável do grupo os resultados internos que tenham sido eliminados durante a vigência do anterior regime à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo”, tendo como limite a caducidade da permanência no regime.
Como tal, é central nesta questão a determinação do sentido da expressão “à medida que forem sendo considerados realizados pelo grupo”. E expressou-se:
“No caso em concreto, há que ter em conta, desde logo, que não é uma situação expressamente enquadrável no então art.º 59º, nº8, do CIRC porquanto os activos já não se encontravam no balanço consolidado, uma vez que foram alienados a uma entidade externa ao grupo. Com efeito, o regime do art.° 59.°, n.º 8, do CIRC, ficciona, de certa forma, a realização de resultados, considerando que o fim da aplicação do regime de tributação pelo lucro consolidado conduz a tal realização.
Ora, in casu, com a alienação dos imóveis em causa, foram efectivamente realizados os resultados, para efeitos do regime transitório. Se assim não se entendesse, ou seja, se se entendesse que com a alienação não ocorria a realização de resultados, poder-se-ia chegar a uma situação de diferimento injustificada da incorporação dos resultados internos, nomeadamente se, como previsto no regime transitório, fosse autorizada uma renovação do regime.
Com a alienação dos bens em causa a entidades fora do grupo, este, enquanto tal, realiza tais resultados.
Sendo certo que a interpretação em causa consta de circular administrativa, tal interpretação encontra-se em consonância com a lógica do sistema de consolidação e com o regime excepcional do art.º 59.°, n.º 8, do CIRC, reflectindo o entendimento que, aliás, está vertido no preâmbulo do DL n.º 251- A/91, de 16 de Julho, onde o legislador refere: “Durante o processo de consolidação dos balanços e das demonstrações dos resultados das sociedades de um grupo são eliminados, na sua totalidade, os resultados gerados nas operações efectuadas entre aquelas entidades. Em consequência disso, opera-se um deferimento na tributação daqueles resultados, porquanto só serão considerados na determinação do lucro tributável do exercício em que os elementos do activo a que respeitem sejam alienados a entidades estranhas ao grupo.
Tendo presente, porém, que o regime de tributação pelo lucro consolidado tem uma vigência temporal limitada, podendo até a caducidade da autorização ocorrer antes de terminar o período de três anos, torna-se necessário definir o tratamento fiscal a dar aos resultados ainda não considerados realizados à data da concessão do regime. Tomando em certa medida como linha orientadora o disposto em legislações estrangeiras sobre esta matéria, estabelece-se que os resultados provenientes de operações efectuadas entre as sociedades de um grupo tributadas pelo lucro consolidado e ainda não integrados no lucro tributável se considerem realizados no último exercício em que o regime for aplicável. Aproveita-se ainda para definir a situação dos prejuízos fiscais verificados durante a vigência do regime e clarificar outros aspectos do mesmo.”
Portanto, como supra evidenciado, os resultados realizam-se em regra, no seio do grupo, quando haja alienação dos bens. Tal é a regra, inerente e subjacente ao próprio sistema de consolidação. O problema com que o legislador se deparou teve a ver não com estas situações, mas sim com o tratamento a dar a situações de resultados internos não considerados, em virtude de ainda não ter havido a tal venda a entidade externas. Daí que tenha havido a necessidade de criar a regra excepcional do art.º 59.°, n.º 8, do CIRC, que tem por base e ponto de partida a regra de consolidação de que, com a alienação dos bens a entidade terceiras, o resultado se realiza no seio do grupo.
Como tal, não padece de erro sobre os pressupostos a correcção efectuada, improcedendo a pretensão da impugnante nesta parte”.

Não obstante a questionação efectuada pela impugnante, ora recorrente, nas suas conclusões de recurso, cremos que não lhe assiste razão por tudo quanto já ficou dito supra e ainda porque decisivo é que foi criada a regra excecional do art.º 59.°, n.º 8, do CIRC, que tem por base e ponto de partida a regra de consolidação de que, com a alienação dos bens a entidade terceiras, o resultado se realiza no seio do grupo, o que é inultrapassável e que ponderados os respectivos factos atinentes a esta questão e que determinaram a correcção no montante de € 47.962,74, relativo à incorporação, no exercício de 2003, dos resultados internos obtidos em transmissões efectuadas entre a recorrente e a A……… INDÚSTRIA DE …….., S.A.. Tal regra tem de ser seguida, como o foi, e a sua aplicação determina o acerto da correcção efectuada pela AT.

Resultam ainda duas conclusões de recurso inseridas na questionação que a recorrente faz das verbas de 12.256,484,29 Euros (correção realizada pela AT com referência aos ajustamentos do consolidado (conclusão XXIII) e ainda a verba de 3.605.788,40 acrescida ao resultado do grupo A……… devido à reavaliação dos bens do activo imobilizado ainda antes da sua transmissão intragrupo na consideração de que deveriam ter sido acrescidos pelo mesmo grupo 40% decorrentes das reavaliações efectuadas ao abrigo do D.L. nº 22/92 de 14/02 (conclusão XXVII), sendo que nessas duas conclusões é autonomizado àquilo que a recorrente apelida de correcção referente à reposição dos resultados suspensos, consistindo esta questão no seu dizer em saber se a alienação para fora do grupo de elementos do activo imobilizado, previamente transaccionados intragrupo, constitui a verificação de um resultado sujeito a tributação efectiva em termos equivalentes aos previstos na fórmula constante do n.º 8 do artigo 59º do Código do IRC, em conformidade com o previsto no artigo 7°, n.º 2, alínea a), 2), da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, e na Circular n.º 15/94, de 6 de Maio.
Cumpre observar que a sentença recorrida não autonomizou qualquer questão referente a aludida correção de resultados suspensos e, igualmente, não se referiu em especial à não utilização pela AT de um coeficiente de desvalorização monetária ou diverso (negrito nosso). Também aqui não se dará uma resposta autónoma a estas questões que “artificialmente” a recorrente apresentou como individualizadas e autónomas (vide conclusões xxix e lxxvi) e ainda lxxxi); pois que não pode este STA, enquanto tribunal de revista fazê-lo, uma vez que estaria a efectuar um conhecimento em 1ª instância o que não é consentido pela lei (ETAF). A resposta dada, para considerar estas duas correções nas duas verbas acabadas de referir supra, é elucidativa e correcta como noutro passo deste acórdão já se deixou expresso pelo que nada mais se nos oferece dizer.
Aqui chegados, somos levados a concluir que o recurso da Fazenda Pública improcede na totalidade enquanto que o recurso da impugnante apenas procede na questão das correcções atinentes à prestação de garantia/conforto às suas associadas. Esta correcção tem o valor de 3.681.542,38 Euros e haverá que, como requerido, conceder à mesma impugnante, ora recorrente o direito a ser ressarcida com o pagamento a título indemnizatório dos prejuízos que lhe foram causados com a prestação da garantia apresentada, em 28 de Dezembro de 2007, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º 3247200701155571, na parte correspondente ao valor supra referido, desde a data da sua emissão até à data do seu cancelamento.
Concluímos ainda que, com as diversas correções efectuadas ao abrigo dos normativos indicados nos respectivos lugares não ocorre a violação de qualquer preceito constitucional de entre os indicados pela recorrente A……. designadamente a invocada violação do princípio da liberdade de iniciativa económica, plasmados na Constituição da República Portuguesa, decorrente da interpretação que foi efectuada do artº 59.º do Código do IRC o qual impõe, não só pela resposta quanto a esta questão já dada pela sentença recorrida, cuja fundamentação por concordância para aqui se aporta, mas ainda porque efectivamente, determinadas condutas às sociedades abrangidas pelo Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado as quais são no entanto de âmbito universal no universo societário congénere ao objecto social/actividade da ora recorrente que o legislador entendeu como razoáveis e racionais para a aplicação daquele regime e os benefícios daí decorrentes para as empresas sendo certo que em matéria de benefícios estamos numa área reservada ao poder legislativo que através da sua implementação persegue a realização de finalidades sociais e societárias consideradas necessárias para o bem comum que o Estado tem o dever de proporcionar.
Do mesmo modo, e ainda a propósito da tributação pelo lucro consolidado previsto no artigo 59.º do Código do IRC, não ocorre violação da constituição decorrente da correção efectuada e andou bem a sentença recorrida, quando considerou que a alínea a) do nº 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, se aplica às transmissões do activo imobilizado, ocorridas no âmbito do regime de tributação previsto no artigo 59º do Código do IRC, por força do disposto no artº 16º nº 2 do D. L. 442-B/88 de 30 de Novembro (norma transitória) e para o efeito de determinação da matéria colectável em consonância com o decidido no acórdão do TCA Sul de 30/09/2008 processo 02350/08. Não vemos como sai ferido o princípio da legalidade plasmado nos artigos 103 e 165 da CRP ao ser considerado que o apuramento da matéria tributável do grupo sujeito ao regime previsto no artº 59º do CIRC deveria ser feito por efeito da referida norma transitória nos mesmos termos que se encontravam consagrados no Decreto-Lei nº 414/87, de 31 de Dezembro pois que tal regime foi instituído por lei para ser aplicado de forma geral para situações exactamente como a dos autos, não vindo sequer questionada qualquer falta de autorização legislativa para a emissão do referido regime transitório ou de outros normativos conexos.

Preparando a decisão formulam-se as seguintes conclusões:
1) Nos termos do disposto no artigo 31.º/2 (actual artigo 32.º) do EBF os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, por parte das SGPS, não concorrem para formação do lucro tributável, decorrendo da letra e espírito do citado normativo que apenas não concorrem para a formação do lucro tributável os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, sendo que o critério a ter em conta para a determinação dos encargos financeiros só pode ser o critério da afectação/imputação directa ou real.
2) A aplicação pela AT da Circular 7/2004, sem que tenham sido avançados fundamentos que conduzam à demonstração da inadequação do método utilizado pela recorrente, determina a ilegalidade da correção efectuada, pois que a invocada impossibilidade prática em distinguir os encargos financeiros, efectivamente, suportados com a aquisição de partes de capital, dos restantes encargos, não pode servir de fundamento para a utilização de um outro critério determinativo da correção sindicada.
3) Estando em causa contratos de mútuo em que ambas as sociedades se obrigaram conjunta e solidariamente na satisfação do crédito nos exactos termos contratuais, a sua responsabilidade é determinada pelo próprio contrato (princípio da liberdade contratual) sendo que ainda que uma das mutuárias seja dominante da outra, a sua posição contratual é própria, nos termos contratuais, e não pode ser transmutada em garantia atípica de obrigações sujeita ao regime de preços de transferência, por falta de verificação dos seus pressupostos.
4) Os conceitos de colocação à disposição e recebimento de rendimentos são distintos como resulta da ordem natural das coisas e dos procedimentos, e o momento relevante para a verificação dos pressupostos para a dedução de 95% dos dividendos atribuídos por uma empresa brasileira à sua participante empresa portuguesa é, claramente, o do recebimento, decorrente da expressão legal “receber dividendos”, contida no artº 23º nº 2 da ADT Portugal-Brasil e não o momento da sua colocação à disposição.
5) O regime da consolidação fiscal parte sempre do pressuposto de que os resultados decorrentes das operações efectuadas entre sociedades do mesmo grupo são eliminados na totalidade, não só os resultados imediatos, mas igualmente todos os circunstancialismos que permitam considerar para efeitos fiscais o objecto de tais operações como desligado de uma operação intragrupo – princípio da neutralidade;
6) - Tanto o regime consagrado no DL 414/87, de 31/12, como o artigo 59º do CIRC provinham da mesma fonte comum, sendo que o regime daquele DL (Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado) acabou por ser incorporado no CIRC sem alterações relevantes a nível estrutural, nomeadamente quanto ao princípio da neutralidade fiscal.

4- DECISÃO:
Pelo exposto acordam os Juízes deste STA em:
a) Negar provimento ao recurso da Fazenda Pública.
b) Conceder parcial provimento ao recurso da impugnante A……., anulando, por ser ilegal, a liquidação, na parte correspondente à correcção indevidamente efectuada pela AT no montante de 3.681.542,38 Euros e, ainda, conceder parcial provimento ao pedido de indemnização por prestação de garantia que foi indevida no montante em que suportou e garantiu a liquidação decorrente desta correcção.
c) No mais confirmam a sentença recorrida.
Custas por ambas as partes na proporção do seu decaimento, não sendo no entanto, devida, em relação ao recurso da Impugnante/A………, taxa de justiça neste STA pela Fazenda Pública porque não contra-alegou.
A Impugnante em relação ao recurso apresentado pela Fazenda Pública não deve taxa de justiça neste STA porque não obstante ter contra-alegado obteve vencimento de causa.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2019. – Ascensão Lopes (relator) – José Gomes Correia – Joaquim Manuel Charneca Condesso.