Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:045/16
Data do Acordão:02/08/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA
VALOR DA CAUSA
RECURSO PER SALTUM
INCOMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Sumário:Seguindo a execução de sentenças dos Tribunais Tributários as regras do CPTA, a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo é incompetente em razão da hierarquia por o valor da causa ser inferior ao valor da alçada fixada para este Supremo Tribunal.
Nº Convencional:JSTA00070013
Nº do Documento:SA220170208045
Data de Entrada:02/26/2016
Recorrente:A...... SGPS, S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:DECL INCOMPETÊNCIA.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXECUÇÃO DE JULGADO.
Legislação Nacional:CPTA02 ART13 ART151 N1 ART31 N2 C.
LGT98 ART102 N1.
CPPTRIB99 ART2 C ART279 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01847/13 DE 2014/02/12.; AC STA PROC01495/12 DE 2014/01/15.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório
1. A………SGPS, S.A., identificada nos autos, vem interpor recurso da sentença proferida em 04/02/2014, que julgou extinta a presente instância, por inutilidade superveniente da lide.
2. Apresentou as seguintes conclusões das suas alegações:
1. A sentença recorrida conclui pela declaração de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide.
2. Conclui o Tribunal a quo que a pretensão executória da exequente já estaria plenamente satisfeita, e que, por isso, a lide seria inútil.
3. A recorrente não concorda com esta decisão, uma vez que, como sempre invocou, quer à data da prolação da sentença, quer hoje, a AT ainda está em dívida para consigo, não tendo assim cumprido o julgado.
4. No momento da decisão o Tribunal a quo sabia e não podia desconhecer, desde logo, que a AT não cumpriu a decisão transitada em julgado no âmbito do processo de impugnação que correu termos sob o n.° 52/95/22 — ou, pelo menos, que não a cumpriu na íntegra, nos termos que decorrem da lei e que vinham peticionados pela ora recorrente
5. A sentença em crise, na parte em que considera ter havido cumprimento pleno do julgado por parte da AT, em prejuízo dos interesses peticionados pela exequente, erra e deve por isso ser revogada.
6. A decisão em apreço é ilegal por manifesto erro de julgamento do direito aplicável, maxime das regras que dispõem sobre a obrigação de cumprimento dos julgados e de reconstituição da legalidade violada, mormente os artigos 40.°, 43.° e 100.° da Lei Geral Tributária (LGT) e 160.° e 170.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
7. O raciocínio que conduziu o juiz a quo a concluir pela extinção da lide, padece de petição de princípio e corporiza uma inexorável violação destas normas, consolidando um manifesto vício por erro de julgamento.
8. Admitir o contrário implicaria coarctar o direito da recorrente à sua tutela jurisdicional efectiva, tutelada constitucional no n.° 4 do artigo 268.° da Constituição da República Portuguesa, e mais concretamente, o direito à reconstituição da legalidade, decorrente de uma decisão judicial que lhe é favorável, conforme resulta expresso do disposto no artigo 100.º da LGT.
TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO, SE REQUER A V. EXAS. A ANULAÇÃO E REVOGAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE, A REVOGAÇÃO DA DECISÃO QUE PÕE TERMO À CAUSA, POR ALEGADA INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONDENE A AT AO INTEGRAL CUMPRIMENTO DO JULGADO.

3. Não houve contra-alegações.

4. O magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
1. O meio processual acessório de execução dos julgados é regulado pelas normas sobre o processo nos tribunais administrativos (art. 146° n°1 CPPT)
No contencioso tributário a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos para o conhecimento de recursos jurisdicionais de decisões dos tribunais tributários é regulada pelas normas constantes dos arts.26° e 38° ETAF 2002, e não pelas das normas constantes do art. 151° CPTA (Jorge Lopes de Sonsa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 pp. 389/390).
A norma remissiva constante do art. 297° n°2 CPPT aplica-se à tramitação processual dos recursos, não podendo prevalecer sobre as normas imperativas do ETAF que estabelecem as competências dos tribunais.
2. Não obstante, a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA-SCT tem-se pronunciado no sentido da aplicação dos requisitos cumulativos previstos no art. 151° n°s 1 e 2 CPTA aos recursos per saltum interpostos de sentenças proferidas pelos tribunais tributários (acórdãos STA-SCT 10.09.2014 processos n°s 486/14 e 1283/13; 9.07.2014 processo n° 1007/12; 15.01.2014 processo n° 1495/12)
3. São requisitos para o conhecimento do recurso per saltum para o STA (art. 151° CPTA):
- fundamento exclusivo em violação de lei substantiva ou processual;
- valor da causa superior a 3 milhões de euros ou indeterminável;
- incidência sobre decisão de mérito;
- inexistência de apreciação de questões respeitantes a funcionalismo público ou segurança social.
4. No caso concreto os requisitos cumulativos enunciados não estão preenchidos, considerando:
a) o valor da causa indicado pela autora na petição (€ 442 960,14), não impugnado pela parte contrária;
b) a inexistência de decisão de mérito, na medida em que a decisão recorrida absolveu o Réu da instância por inutilidade superveniente da lide.
5. Pelo exposto deve ser declarada a incompetência do STA-SCT para o conhecimento do recurso, em razão da hierarquia, e ordenado o envio do processo ao TCA Norte-SCT, para julgamento do recurso como apelação (art. 151º n°3 CPTA).
Notificadas as partes para querendo se pronunciarem sob a excepção da incompetência do STA em razão da hierarquia nada disseram
5. Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentos:
Dá-se aqui por reproduzido o teor da sentença de folhas 118 dos autos, na qual foi julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide por se considerar que a quantia objecto do pedido de execução se encontrava paga


De direito:
A recorrente A……..SGPS SA não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, relativamente ao pedido de execução de sentença que deduzira contra a Fazenda pública, a fim de obter o pagamento da quantia de €442.960,14, acrescido de juros indemnizatórios contados a partir de 27 de Dezembro de 2002 até efectivo e integral pagamento, veio dela interpor recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Alega, em síntese, que não considera, ao contrário do decidido, satisfeita a sua pretensão pelo que foi violado o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrada no artigo 268/4 da CRP.
Não houve contra alegações.
O Mº Pº junto deste Supremo Tribunal suscitou no seu douto parecer a excepção da incompetência em razão da hierarquia deste Supremo Tribunal, para conhecer do recurso, dado o valor da causa ser apenas de €442 960,14, valor esse indicado pela autora na sua petição inicial.
Cumpre assim conhecer desde já da questão prévia suscitada pelo Mº Pº., por a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies ser de ordem pública e o seu conhecimento preceder o de outras matérias - cfr artigo 13 do CPTA aplicável “ex vi” do artigo 2.º al.c) do CPPTributário.
A execução de sentenças proferidas nos tribunais tributários é, como já tem sido por várias vezes decidido nesta secção do Supremo Tribunal Administrativo, regulada pelas normas do Código de Processo Administrativo por força do disposto no artigo 102/1 da LGT que assim prescreve:
“A execução de sentenças dos tribunais administrativos e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos“.
O regime da execução de sentenças dos tribunais administrativos é regulado no CPTA nos artigos 157 e segs.
O recurso dos actos jurisdicionais praticados no processo judicial tributário em processo tributário e em processo de execução fiscal são regulados nos termos dos artigos 279 e segs do CPPT.
E o nº 2 do mesmo artigo 279 estipula que os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.
Constituindo a execução de julgados um meio comum à execução administrava e tributária é forçoso concluir que são as regras do CPTA que deverão regular este processo, até por força de aplicação subsidiária nos termos da alínea c) do artigo 2º do CPPT
Este entendimento tem sido sufragado pela jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal, entre outros, nos acórdãos datados de 12/02/2014 e 15/01/2014, respectivamente, recursos n.ºs 01847/13 e 01495/12.
De acordo como disposto no artigo 151 do CPTA, mesmo que o recurso suscite apenas questões de direito, apenas cabe recurso per saltum para o STA se o valor da causa for superior a três milhões de euros.
O presente recurso é interposto da sentença proferida nestes autos que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide por considerar que a pretensão da recorrente havia sido já satisfeita pela Fazenda Publica.
Todavia face ao disposto no art. 151.º, n.º 1, do CPTA, o recurso per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo só pode ocorrer «quando o valor da causa seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável e as partes, nas suas alegações, suscitem apenas questões de direito (...)».
No caso, o valor da execução é de 442.960,14€, sendo este o valor que foi o indicado na petição inicial.
Ora tendo em conta o disposto no art. 31.º, n.º 2, alínea c) do CPTA que prescreve dever atender-se ao valor da causa para determinar se face a tal valor a decisão é passível de recurso e qual o tribunal para onde se pode recorrer, fácil é de constatar que o valor da causa exclui desde logo o recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, sendo competente para dele conhecer, como recurso de apelação, a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte nos termos do nº 3 do artigo 151 do CPTA.

Decisão

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário acordam, em conferência, em declarar este Supremo Tribunal Administrativo incompetente para conhecer do presente recurso e ordenar a baixa dos autos ao competente Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para que o recurso aí seja julgado como apelação (n.º 3 do art. 151.º do CPTA).

Custas pela recorrente, com t. j. em 1 UC.


Lisboa, 8 de Fevereiro de 2017. - Fonseca Carvalho (relator) - Isabel Marques da Silva - Pedro Delgado.