Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01564/15
Data do Acordão:01/07/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:PRESCRIÇÃO
FACTO
INTERRUPÇÃO
EFEITO DURADOURO
Sumário:I - Os factos interruptivos da prescrição previstos no n.º 1 do art. 49.º da LGT têm dois efeitos sobre a prescrição: para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início do novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo que provoca o efeito interruptivo.
II - Com a revogação do n.º 2 do art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, não deixaram de se verificar esses efeitos (agora sem qualquer limitação), se bem que restritos ao primeiro facto interruptivo que ocorrer.
III - O Orçamento do Estado para 2013 aditou ao n.º 1 do art. 97.º-A do CPPT uma alínea e), que veio dar resposta à questão de como se determina o valor para efeitos de custas das reclamações do órgão da execução fiscal previstas no art. 276.º e segs. do mesmo Código.
Nº Convencional:JSTA00069498
Nº do Documento:SA22016010701564
Data de Entrada:11/26/2015
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF COIMBRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART276 ART175 ART196 ART170 ART97-A N1 E.
CPTRIB91 ART34 N1 N3.
LGT98 ART48 N1 ART49 N1 N2.
DL 398/98 DE 1998/12/17 ART5 N1 ART6.
CCIV66 ART279 C.
L 53-A/2006 DE 2006/12/29 ART163 ART90 ART91.
L 66-B/2012 DE 2012/12/31.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC099/12 DE 2012/02/15.
Referência a Doutrina:LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM RODRIGUES E JORGE DE SOUSA - LGT ANOTADA E COMENTADA 4ED PAG47-48.
JORGE DE SOUSA - SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRATICAS 2ED PAG95-96 PAG57 E SEGS PAG69-72.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 700/15.0BECBR

1. RELATÓRIO

1.1 A………….. (adiante Executado, Reclamante ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que, julgando improcedente a reclamação judicial por ele interposta ao abrigo do disposto nos arts. 276.º a 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) da decisão do Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital que ordenou a venda do bem imóvel penhorado, não declarou prescritas as dívidas exequendas provenientes de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do ano de 1997.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso, o Recorrente apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«a) A admitir-se a aplicação do art. 12.º, n.º 2, do Código Civil às alterações introduzidas no art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, como entendeu a sentença recorrida, então deve aplicar-se imediatamente, a partir de 1 de Janeiro de 2007, o disposto nos n.ºs 2 e 3 da LGT, na versão dada pela Lei n.º 53-A/2006.

b) A aplicação imediata do n.º 3 do art. 49.º da LGT consequencia que, a partir de 1 de Janeiro de 2007, só é relevante o efeito interruptivo decorrente do primeiro acto de interrupção que tenha ocorrido, irrelevando-se todos os outros, mesmo que acontecidos antes da entrada em vigor da nova lei.

c) Nos termos do actual n.º 4 do art. 49.º da LGT, a reclamação, impugnação, recurso ou oposição só suspendem o prazo de prescrição legal “quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”.

d) E isso só acontece quando for constituída garantia ou efectuada penhora que garanta a totalidade da dívida exequenda e do acrescido, nos termos dos arts. 103.º, n.º 4, e 169.º, n.º 1, do CPPT.

e) Não existe fora do quadro do n.º 4 do art. 49.º da LGT qualquer efeito duradouro dos actos de interrupção da prescrição previstos no n.º 1 do preceito.

f) Não tendo sido constituída, no caso dos autos e segundo o probatório, garantia ou efectuada penhora que garantisse a totalidade da dívida exequenda e do acrescido, não se verificou a suspensão do prazo de prescrição nos termos do n.º 4 do art. 49.º da LGT.

g) Sendo assim, aquando da prolação da decisão recorrida já havia decorrido o prazo de 8 anos, 10 meses e 2 dias, a contar da entrada em vigor da actual versão do art. 49.º da LGT, pelo que as dívidas tributárias se encontram prescritas, nos termos do art. 48.º, n.º 1, da LGT.

h) Reconduzindo-se a reclamação de actos de órgão de execução fiscal a um processo impugnatório, a determinação do respectivo valor para efeitos de custas, além do mais, é aplicável o disposto no n.º 2 do art. 97.º-A do CPPT.

Termos em que, sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências (jus novit curia), deve ser dado provimento ao recurso e julgada procedente a reclamação, assim se fazendo a devida Justiça».

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 A Fazenda Pública não contra alegou.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso no que respeita à prescrição das dívidas exequendas, com a seguinte fundamentação (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.):

«[…] Os factos dados como provados constam a fls. 106 a 109, em termos que se podem resumir no seguinte: quanto a dívidas fiscais (I.V.A. e I.R.S. de 1997) foram apresentadas impugnações judiciais a 16-4-03, pelo ora recorrente.
Nas mesmas foram proferidas sentenças a 9-1-08, a julgá-las procedentes; no entanto, tais impugnações acabaram por ser julgadas improcedentes por acórdãos de 14-5-15 e 12-3-15 proferidos pelo T.C.A. Norte que transitaram em julgado.
Tais impugnações estiveram paradas de 30-5-06 a 9-1-08 sem ser por culpa do impugnante.
Entretanto, quanto às ditas dívidas foram instauradas execuções, respectivamente, a 23-4-03 e 13-6-03. E nas mesmas ocorreram citações do recorrente a 28-4-03 e a 16-6-03.
Tais execuções foram apensadas a 31-5-04, vindo a ser penhorado imóvel a 24-5-06 para garantia das ditas dívidas.
O valor do imóvel era inferior às ditas dívidas.
Na dita execução foi determinado a 14-7-15 que se procedesse a venda por leilão electrónico, de que foi apresentada reclamação a 23-7-15.
Ora, quanto ao direito, no que respeita ao prazo de prescrição aplicável é recorrer ao entretanto previsto no art. 48.º n.º 1 da L.G.T., em que o mesmo foi reduzido para 8 anos.
E sendo de contar o mesmo desde que iniciou vigência a L.G.T., a 1-1-99, é de considerar que o mesmo se interrompeu por efeito das reclamações [(Salvo o devido respeito, pensamos tratar-se de lapso: por certo queria dizer-se impugnações judiciais onde se escreveu reclamações.)] apresentadas em 2003, o que inutilizou todo prazo até então decorrido conforme decidido na sentença recorrida.
No caso, é irrelevante que tenha ocorrido outra causa de interrupção como a citação, pois não se pode interromper o que já estava interrompido, conforme também decidido foi.
Tal interrupção não foi posteriormente inutilizada até 1-1-07, data em que iniciou vigência a alteração ao dito art. 49.º operada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12.
Com efeito, embora tenha ocorrido paralisação dos processos sem ser por culpa do ora recorrente, a mesma não se mantinha por período superior a um ano àquela data, caindo na alçada da norma transitória constante do art. 91.º daquela Lei, a propósito da revogação do n.º 2, segundo a qual a nova lei se aplica a “todos os prazos em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem (...)”.
Acontece que, conforme defende o recorrente, o que então foi previsto no art. 49.º n.ºs 1 e 4 da L.G.T., não permite o entendimento tido de se terem mantidos desde 1-1-07 os ditos efeitos suspensivos da interrupção operada pelas reclamações [(Idem.)], os quais ficaram dependentes de ser prestada garantia ou efectuada penhora que garantisse a totalidade das dívidas em execução.
Tal o que tem sido reiterado ultimamente pela jurisprudência do S.T.A.
- “da norma contido no n.º 3 do artigo 49.º da LGT (na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12), conjugada com a norma que define o regime da suspensão da execução fiscal (art. 169.º do CPPT), resulta que o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração de reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido”.
Para além do acórdão do Pleno citado pelo recorrente, cfr., ainda, o acórdão de novo do Pleno de 21-1-15 proferido no recurso n.º 0660/14, publicado em www.dgsi.pt.
Ora, no caso, embora tenha sido efectuada penhora de imóvel em garantia das ditas dívidas, em face do valor dado inicialmente ao mesmo, inferior ao das ditas dívidas, não é de molde a considerarem-se ainda mantidos aqueles efeitos suspensivos, e pese embora o mesmo tenha sido posteriormente actualizado para valor próximo daquelas dívidas, não consta que a suspensão da execução tenha sido posteriormente declarada.
Assim sendo, quer parecer que a 1-1-07 terão cessado os ditos efeitos interruptivos/suspensivos do prazo de prescrição, correndo a partir de então o prazo de suspensão de 8 anos que às datas em que foi determinada a venda do dito imóvel, a 14-7-15, e proferida a sentença recorrida, a 2-10-15, tinha já sido ultrapassado».

Quanto à questão do valor da causa, entendeu o Procurador-Geral Adjunto que «é de manter o decidido, por estar de acordo com o previsto no art. 97.º-A n.º 1 al. e) do C.P.P.T.».

1.6 Dispensaram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos, atento o carácter urgente do processo.

1.7 As questões a apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento (i) quando considerou que as obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas, provenientes de IRS e de IVA do ano de 1997, não estavam prescritas e (ii) quando fixou o valor da causa para efeitos de custas.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

«1. Em 16.04.2003 deu entrada no então Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Coimbra impugnação judicial interposta pelo ora Reclamante, da liquidação adicional de IVA n.º 02295768 do ano de 1997, no montante de € 17.712,08, e respectivos juros compensatórios, a qual foi autuada sob o n.º 74/2003 [Cfr. folha de rosto da visada p.i. a fls. 1 dos visados autos de impugnação em apenso, do qual consta o carimbo de entrada no visado Tribunal, sendo o n.º do processo confirmado pelos documentos constantes dos visados autos];

2. Em 09.01.2008 foi proferida sentença no processo referido no ponto anterior, julgando-se a impugnação procedente e anulando-se o acto de liquidação em causa [Cfr. fls. 179 e ss. do processo n.º 74/2003, em apenso];

3. Interposto recurso da sentença pela Fazenda Pública, foi a mesma revogada por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14.05.2015, transitado em julgado em 11.06.2015, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial [Cfr. o referido Acórdão e processado posterior, a fls. 329 e ss. do processo n.º 74/2003, em apenso];

4. Em 16.04.2003 deu entrada no então Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Coimbra impugnação judicial interposta pelo ora Reclamante, da liquidação de IRS n.º 5333987732 do ano de 1997, e respectivos juros compensatórios, no montante global de € 44.771,00, a qual foi autuada sob o n.º 75/2003 [Cfr. folha de rosto da visada p.i. a fls. 1 dos visados autos de impugnação, em apenso, do qual consta o carimbo de entrada no visado Tribunal, sendo o n.º do processo confirmado pelos documentos constantes dos visados autos];

5. Em 09.01.2008 foi proferida sentença no processo referido no ponto anterior, julgando-se a impugnação procedente e anulando-se o acto de liquidação em causa [Cfr. fls. 141 e ss. do processo n.º 75/2003, em apenso];

6. Interposto recurso da sentença pela Fazenda Pública, foi a mesma revogada por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12.03.2015, transitado em julgado em 30.04.2015, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial [Cfr. o referido Acórdão e processado posterior, a fls. 313 e ss. do processo n.º 75/2003, em apenso];

7. Em 23.04.2003 o Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital instaurou contra o ora Reclamante o processo de execução fiscal n.º 0809200301001574, por dívidas de IVA do ano de 1997 no valor de € 17.712,08 e respectivos juros compensatórios no valor de € 8.399,17, cujos actos de liquidação se refere a impugnação aludida em 1. [Cfr. capa do referido PEF e certidões de dívida n.º 2003/57672, 2003/57668, 2003/57669, 2003/57670 e 2003/57671, presentes a fls. 1 a 6 do visado PEF, em apenso];

8. Em 28.04.2003 foi recepcionado pelo ora Reclamante, no seu domicílio fiscal, ofício de citação no PEF referido no ponto anterior, enviado por carta registado com aviso de recepção [Cfr. ofício de citação n.º 02027 e respectivo AR assinado, a fls. 7 e 9 do visado PEF em apenso];

9. Em 13.05.2003 o Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital instaurou contra o ora Reclamante e mulher B………………, NIF …………, o processo de execução fiscal n.º 0809200301002503 por dívidas de IRS do ano de 1997 no valor de € 35.403,96 e respectivos juros compensatórios no valor de € 12.367,14, cujos actos de liquidação se refere a impugnação aludida em 4. [Cfr. capa do referido PEF e certidão de dívida n.º 2003/38556, presentes a fls. 1 e 2 do visado PEF, em apenso];

10. Em 16.06.2003 foi recepcionado pela mulher do ora Reclamante, no domicílio fiscal de ambos, ofício de citação no PEF referido no ponto anterior, dirigido ao ora Reclamante, enviado por carta registada, com aviso de recepção [Cfr. ofício de citação n.º 2839 e respectivo AR assinado, a fls. 3 e 5 do visado PEF em apenso];

11. Em 31.05.2004 o processo executivo referido em 9. foi apensado ao processo executivo aludido em 7. [Cfr. print de aplicação informática da DGCI referente à tramitação dos visados processos, a fls. 45 do PEF 0809200301002503 e a fls. 17 do PEF 0809200301001574, ambos em apenso];

12. Em 24.05.2006 foi penhorado à ordem dos processos executivos identificados em 7. e 9. o prédio urbano sito na Rua ……………, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………… sob o Artigo 952 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Hospital sob o n.º 01085, propriedade do ora Reclamante e mulher, para garantia da quantia exequenda de € 73.239,76 e acrescidos [Cfr. auto de penhora a fls. 26 do PEF 0809200301001574 em apenso];

13. Tendo a visada penhora sido registada na mesma data [Cfr. Ap. 05/060524 - cfr. certidão do teor registral e das descrições e inscrições, emitida pela Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Hospital em 11.01.2007, referente à descrição predial n.º 01085/050592, a fls. 36 e ss. do PEF 0809200301001574 em apenso];

14. O valor patrimonial tributário do visado prédio foi determinado no ano de 2003 no valor de € 38.463,29 e, posteriormente em 2012, no valor de € 63.880,00 [Cfr. cadernetas prediais urbanas, a fls. 43 e 57 do PEF 0809200301001574 em apenso];

15. Em 14.07.2015 a Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital determinou a preparação da venda por leilão electrónico do bem imóvel referido em 11., designando o dia 17.09.2015 para aceitação e abertura de propostas de compra [Cfr. fls. 61 verso do PEF 0809200301001574 em apenso];

16. Em 20.07.2015 foi recepcionado pela mulher do Reclamante no domicílio fiscal de ambos, ofício tendente à notificação do despacho referido no ponto anterior, dirigido à mulher do Reclamante, vindo devolvido o ofício dirigido ao próprio Reclamante com menção de “não reclamado [Cfr. ofícios n.ºs 0809/7/2015 e 0809/1981/2015, de 14.07.2015, e respectivos AR/carta devolvida, a fls. 62 (frente e verso) e 63 (frente e verso) do PEF 0809200301001574 em apenso];

17. Em 23.07.2015 deu entrada no Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital a p.i. que deu origem aos presentes autos de Reclamação [Cfr. carimbo a fls. 4 dos autos];

18. A Impugnação Judicial referida em 1. esteve parada por período superior a um ano, por razões não imputáveis ao Impugnante, entre a sua conclusão para sentença em 30.05.2006 e a prolação da mesma em 09.01.2008 [Cfr. se retira do processado dos visados autos de impugnação, em apenso];

19. A Impugnação Judicial referida em 4. esteve parada por período superior a um ano, por razões não imputáveis ao Impugnante, entre a sua conclusão para sentença em 30.05.2006 e a prolação da mesma em 09.01.2008 [Cfr. se retira do processado dos visados autos de impugnação, em apenso];

20. O processo executivo aludido em 7. esteve parado por períodos superiores a um ano, por razões não imputáveis aos executados, entre 11.07.2003 (data em que foi enviado ofício ao mandatário do ora Reclamante notificando-o de despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital de 11.07.2003) e 21.09.2005 (data em que foi ordenada a compensação do valor do IRS a devolver em 2005 nas dívidas exequendas), e entre 22.08.2006 (data em que foi efectivada a compensação do valor do IRS a devolver em 2006 nas dívidas exequendas) e 25.01.2010 (data em que foi oficiado o presente Tribunal para que informasse qual o estado das Impugnações referidas em 1. e 4.), o mesmo sucedendo com o seu apenso referido em 9., com a diferença que o início da sua primeira paragem ocorreu em 31.05.2004, data da sua apensação, conforme aludido em 11. [Cfr. se retira do processado dos visados processos, em apenso]».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

O ora Recorrente, na qualidade de executado, reclamou ao abrigo do disposto no art. 276.º e segs. do CPPT para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra do despacho que designou data para a venda do bem imóvel que lhe foi penhorado, com o fundamento de que o mesmo não deveria ter sido proferido e, ao invés, deveria o serviço de finanças ter declarado prescritas as obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra indeferiu a reclamação por considerar que não estavam prescritas as obrigações tributárias subjacentes às dívidas exequendas. Isto, se bem interpretamos a sentença recorrida e em síntese da nossa responsabilidade (em que apenas consideraremos os elementos que se nos afiguram relevantes), com a seguinte fundamentação:

· apesar de à data em que ocorreram os factos tributários (1997) estar em vigor o Código de Processo Tributário (CPT), cujo art. 34.º, n.º 1, fixava o prazo de prescrição das obrigações tributárias em 10 anos, o prazo de prescrição aplicável é o de 8 anos, previsto no art. 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), atento o disposto no n.º 1 do art. 297.º do Código Civil (CC), uma vez que à data da entrada em vigor daquela Lei – 1 de Janeiro de 1999 –, à luz do CPT faltava mais de oito anos para se completar a prescrição, uma vez que até então não se verificou qualquer facto interruptivo ou suspensivo do prazo;

· o prazo interrompeu-se em 16 de Abril de 2003, com a instauração das impugnações judiciais, nos termos do n.º 1 do art. 49.º da LGT;

· em 1 de Janeiro de 2007, data em que entrou em vigor a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007), que revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT (Que dispunha: «A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação».), as referidas impugnações judiciais ainda não tinha sofrido paragem por período superior a um ano por motivo não imputável ao impugnante, motivo por que o efeito interruptivo decorrente da instauração desses processos não cessou até ao trânsito em julgado das decisões judiciais que puseram termo aos mesmos;

· ao contrário do que sustenta o Reclamante, não releva no caso sub judice o facto de a penhora efectuada no processo executivo não ser suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido e, consequentemente, para conferir à impugnação judicial efeito suspensivo da execução fiscal, a determinar a suspensão do prazo prescricional ao abrigo do n.º 4 do art. 49.º da LGT, uma vez que este prazo se mantinha suspenso por força do efeito duradouro associado à interrupção determinada pela instauração da impugnação judicial;

· a interpretação normativa adoptada não viola os princípios constitucionais invocados pelo Reclamante, como tem vindo a decidir o Tribunal Constitucional e o Supremo Tribunal Administrativo.

O Executado interpôs recurso da sentença, sustentando que as obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas por IRS e IVA de 1997 se encontram prescritas e que a sentença recorrida, ao decidir em sentido diverso, incorreu em erro de julgamento. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, entende o Recorrente, em síntese, que

· a aplicação imediata dos n.ºs 2 e 3 do art. 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007), imposta pelo n.º 2 do art. 12.º do CC, «consequencia que, a partir de de Janeiro de 2007, só é relevante o efeito interruptivo decorrente do primeiro acto de interrupção que tenha ocorrido, irrelevando-se todos os outros, mesmo que acontecidos antes da entrada em vigor da nova lei», bem como o n.º 4 do mesmo artigo estipula que «a reclamação, impugnação, recurso ou oposição só suspendem o prazo de prescrição legal “quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”» e que «isso só acontece quando for constituída garantia ou efectuada penhora que garanta a totalidade da dívida exequenda e do acrescido, nos termos dos arts. 103.º, n.º 4, e 169.º, n.º 1, do CPPT» [(cfr. conclusões a) a d)];

· fora do quadro do n.º 4 do art. 49.º da LGT não existe «qualquer efeito duradouro dos actos de interrupção da prescrição previstos no n.º 1 do preceito» [cfr. conclusão e)];

· assim, e porque no caso não foi prestada garantida nem efectuada penhora que garantisse o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, «não se verificou a suspensão do prazo de prescrição nos termos do n.º 4 do art. 49.º da LGT» e à data em que foi proferida a decisão recorrida já tinham decorrido 8 anos, 10 meses e 2 dias do prazo prescricional, contado desde a data da entrada em vigor da nova redacção do art. 49.º da LGT [cfr. conclusões f) e g)].

Atento o teor da decisão recorrida e das alegações de recurso, afigura-se-nos que o Recorrente discorda da sentença, no que à prescrição concerne, porque não aceita que nesta se tenha continuado a conferir o efeito duradouro (de obstar ao início do novo prazo de prescrição) ao facto interruptivo decorrente da instauração das impugnações judiciais para além de 1 de Janeiro de 2007, ou seja, para além da data em que entrou em vigor a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT. Ou seja, o Recorrente não questiona que o prazo aplicável à situação sub judice seja o de 8 anos, previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT, não questiona que o prazo se interrompeu com a instaurações das impugnações judiciais, não questiona que essa interrupção não se degradou em suspensão ao abrigo do n.º 2 do art. 49.º da LGT – uma vez que aceita que à data em que este foi revogado (1 de Janeiro de 2007, quando entrou em vigor a Lei n.º 53-A/2006), ainda as impugnações judiciais não tinham parado por mais de um ano por motivo não imputável ao Impugnante –, nem questiona que após esta data apenas o primeiro facto interruptivo assume relevância. Quanto a estes aspectos, apesar de termos presente que a prescrição constitui matéria do conhecimento oficioso (art. 175.º do CPPT) – o que liberta o tribunal ad quem das amarras constituídas pelas conclusões das alegações, que delimitam o âmbito do recurso (cfr. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), permitindo-lhe uma ampla reapreciação de toda a matéria pertinente para decidir a questão –, se não encontrarmos motivo que nos leve a dissentir do decidido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, nada haverá a decidir. Se assim for, limitar-nos-emos a apreciar a argumentação do Recorrente na parte em que considera que a sentença recorrida não fez correcto julgamento quando considerou que as obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas não estavam prescritas. Isto porque considera, aí em divergência com a sentença, que o prazo da prescrição se começou a contar no dia 1 de Janeiro de 2007, uma vez que, desde então, deixou de se verificar o efeito suspensivo do prazo, que a lei após essa data apenas reconhece, nos termos do n.º 4 do art. 49.º da LGT, quando a reclamação, impugnação, recurso ou oposição determine a suspensão da execução fiscal, ou seja, quando o pagamento da dívida exequenda e do acrescido estiver assegurado, seja pela prestação da garantia ou pela sua dispensa, seja por penhora.
Assim, a única questão suscitada pelo Recorrente é a ínsita na conclusão e), ou seja, a de saber se, após a entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que revogou o n.º 2, alterou o n.º 3 e aditou o n.º 4 ao art. 49.º da LGT, a instauração da impugnação judicial mantém o potencial de obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que lhe puser termo, independentemente de haver suspensão da cobrança, para a qual seria imprescindível que fosse prestada garantia ou dispensada a prestação da mesma, nos termos do disposto nos arts. 196.º e 170.º do CPPT, ou que penhora garantisse o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, condição que não se verificou no caso sub judice.
O Recorrente suscita ainda uma outra questão, respeitante ao valor da causa, imputando à sentença erro de julgamento na fixação do mesmo.
Na verdade, na parte final da sentença, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra deixou dito: «Fixa-se o valor da presente reclamação no valor correspondente ao valor patrimonial do bem penhorado, porque inferior ao valor da dívida exequenda: € 63.880,00 (art. 97.º-A, n.º 1, al. e) do CPPT)». O Recorrente discorda; sustenta, em síntese, que «[r]econduzindo-se a reclamação de actos de órgão de execução fiscal a um processo impugnatório, a determinação do respectivo valor para efeitos de custas, além do mais, é aplicável o disposto no n.º 2 do art. 97.º-A do CPPT» [cfr. conclusão h)].
Daí que as questões a apreciar e decidir no presente recurso sejam as que enunciámos em 1.7.

2.2.2 DA PRESCRIÇÃO

Como bem decidiu a sentença e concorda o Recorrente, pese embora os factos tributários tenham ocorrido em 1997 – data à qual vigorava ainda o CPT, que fixava o prazo da prescrição da obrigação tributária em 10 anos (art. 34.º, n.º 1, do CPT) – o prazo aplicável à situação sub judice é o do art. 48.º, n.º 1 da LGT. Isto porque o n.º 1 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprovou a LGT, estabelece que «[a]o novo prazo de prescrição aplica-se o disposto no artigo 297.º do Código Civil» (Quanto à necessidade desta norma para justificar a aplicação da regra do art. 297.º do CC, que pode sustentar-se resultar sem mais da aplicação das regras gerias em matéria de sucessão de leis, vide DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, págs. 47/48. ).
Assim, como bem fez a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, há que aplicar a regra do n.º 1 do art. 297.º do CC («A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».), o que significa que é preciso indagar se à data em que entrou em vigor a lei nova, faltava menos tempo para a prescrição à face da lei antiga (JORGE LOPES DE SOUSA indica com clareza o método a seguir: «Neste momento da entrada em vigor da lei nova, à face dela falta todo o tempo que ela prevê, naturalmente. Por isso, apenas é necessário calcular o tempo que, nesse momento, falta para a prescrição à face da lei antiga. Se faltar menos tempo do que o previsto no novo prazo, é de aplicar a lei antiga. Esta contagem do prazo que falta faz-se considerando tudo o que consta da lei antiga (início, causas de suspensão e de interrupção) como se depreende do texto da parte final do n.º 1 do art. 297.º do CPPT, ao referir que o novo prazo aplica-se «a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar»; «segundo a lei antiga» significa calcular o prazo de prescrição que decorreu até à data da entrada em vigor da lei nova nos termos que a lei antiga prevê a respectiva contagem» (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, págs. 95/96).).
Porque os prazos de prescrição se iniciaram em 1 de Janeiro de 1998 (cfr. art. 34.º, n.º 2, do CPT) e porque não se verificou qualquer causa de interrupção ou suspensão dos mesmos até 1 de Janeiro de 1999 – quando entrou em vigor a LGT, nos termos do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que a aprovou –, nesta data apenas tinha decorrido um ano do prazo fixado pelo n.º 1 do art. 34.º do CPT, motivo por que, à face deste código (lei antiga), restavam ainda nove anos de prazo para que se verificasse a prescrição.
Não há dúvidas, pois, quanto à aplicação do prazo de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT, com início da contagem em 1 de Janeiro de 1999. O que significa que a obrigação tributária extinguir-se-ia, em princípio e na ausência de factos interruptivos e ou suspensivos da prescrição, no dia 31 de Dezembro de 2007, como decorre das regras estabelecidas no art. 279.º, alínea c), do CC.
Contudo, em 16 de Abril de 2003, ou seja, antes de completado o referido prazo de prescrição, foram deduzidas impugnações judiciais contra os actos de liquidação de IRS e de liquidação IVA que deram origem às dívidas exequendas, impugnações que integram um acto interruptivo do prazo de prescrição à luz do n.º 1 do art. 49.º da LGT, na redacção então vigente e que, como tal, é a aplicável (As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do art. 12.º do CC.).
Essa causa de interrupção – as impugnações judiciais – tem dois efeitos sobre a prescrição: para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início do novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo que provoca o efeito interruptivo. Na verdade, a interrupção da prescrição, como resulta expressamente do n.º 1 do art. 326.º do CC, aplicável quer às obrigações civis quer às obrigações tributárias, significa que todo o tempo decorrido até ao acto interruptivo é inutilizado para efeitos de prescrição. Mas, relativamente às obrigações de natureza tributária, a interrupção tem também um outro efeito, dito duradouro (A regra geral para as obrigações civis é a de que o facto interruptivo apenas tem efeito instantâneo, com a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente e imediato início do novo prazo, nos termos do n.º 1 do art. 326.º do CC («A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte»). A excepção, em que, a par desse efeito instantâneo, o facto interruptivo tem também um efeito duradouro (de impedir o início do novo prazo enquanto se mantiver pendente o processo) é a situação prevista no art. 327.º, n.º 1, do CC, ou seja, quando «a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral», caso em que «o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo».), quer no domínio da vigência do Código de Processo das Contribuições e Impostos (cfr. art. 27.º, § 1), quer no domínio da vigência do CPT (cfr. art. 34.º, n.º 3), quer enquanto vigorou o n.º 2 do art. 49.º da LGT, que viria a ser revogado pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro: o acto interruptivo obviava ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto se mantivesse pendente o processo que determinou a interrupção, a menos que se verificasse a «paragem do processo por período superior a um ano estivesse parado por facto não imputável ao sujeito passivo», caso em que se somava «o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação» (Para maior desenvolvimento JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, págs. 57 e segs.).
Ou seja, a eficácia do facto interruptivo prolongava-se no tempo, obviando ao imediato início de contagem de um novo prazo prescricional. Só no caso de ocorrer uma paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao contribuinte, é que o facto potencialmente interruptivo passava a ter um efeito meramente suspensivo (idêntico aos das causas suspensivas), pois se limitava então a impedir o decurso do prazo de prescrição entre a ocorrência do facto e a data em que se perfizesse um ano de paragem do processo por motivo não imputável ao sujeito passivo. Na expressiva terminologia deste Supremo Tribunal Administrativo, nesse caso o efeito interruptivo degradava-se em suspensivo.
Sucede, no entanto, que a referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2007 (art. 163.º), revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT, salvaguardando apenas os casos em que, nessa data, tivesse já decorrido período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo (arts. 90.º e 91.º).
De tudo isto bem deu conta a sentença recorrida que, aplicando a lei aos factos, entendeu que, porque em 1 de Janeiro de 2007 os processos de impugnação judicial ainda não tinham parado por período superior a um ano, não ocorreu a referida “degradação” do efeito interruptivo em meramente suspensivo.
Assim, no caso sub judice, não ocorreu a cessação do efeito interruptivo, que se manteve até ao trânsito em julgado das decisões que puseram termo às impugnações judiciais. Ou seja, o efeito interruptivo decorrente da instauração das impugnações judiciais em 16 de Abril de 2003, que inutilizou todo o tempo anteriormente decorrido, só cessou com o trânsito em julgado dos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte que puseram termo a cada um dos 2 processos: um 11 de Junho de 2015, o outro em 30 de Abril de 2015 (cfr. factos provados sob os n.ºs 3 e 6). O que significa que a prescrição das obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas ainda não decorreu.
A sentença, que decidiu neste sentido, não merece censura alguma.
Como deixámos dito, na tese do Recorrente, da revogação do n.º 2 do art. 49.º da LGT resulta que a partir de 1 de Janeiro de 2007 deixou de se manter o efeito duradouro do facto interruptivo.
Mas, salvo o devido respeito, não faz sentido argumentar com a cessação desse efeito duradouro por força da revogação da referida norma legal.
Recordemos aqui os ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA: «[…] se tal paragem [do processo por mais de um ano por motivo não imputável ao sujeito passivo] não ocorreu até 31-12-2006, nos processos a que se aplica este novo regime, a interrupção da prescrição tem sempre o seu efeito próprio de inutilizar o tempo já decorrido e esse efeito não é destruído por eventual paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
Por outro lado, relativamente ao efeito suspensivo que estava associado ao acto interruptivo, numa primeira análise, parece que ele se manterá».
E explica porquê: «Na verdade, relativamente à reclamação, ao recurso hierárquico e à impugnação faz-se referência, como facto interruptivo, ao próprio processo (facto duradouro) e não à sua apresentação da peça processual que dá início àqueles meios processuais.
[…]
É certo que o facto de no novo n.º 4 se manter a referência ao efeito suspensivo da reclamação, impugnação, e recurso (para além da oposição, aditada neste n.º 4, quando comparado com o equivalente anterior n.º 3) pode sugerir a interpretação de que estes factos simultaneamente interruptivos e suspensivos só têm relevância suspensiva na situação prevista no n.º 4 de estar suspensa a cobrança da dívida [Será esta a tese do Recorrente, se bem interpretamos as alegações de recurso].
Isto é, tendo desaparecido, com a revogação do n.º 2 do art. 49.º, a cessação do efeito interruptivo que nele se previa para os casos de paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, os efeitos duradouros que o acto interruptivo produz durante a pendência do processo só terminarão com o termo do processo. Por isso, não se justificaria que, no novo n.º 4, se estabelecesse que o prazo de prescrição se suspende «enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso», pois esta suspensão já estaria assegurada, independentemente de se suspender ou não a cobrança da dívida, pelo efeito que estes mesmos meios processuais têm como factos interruptivos, que agora não cessa até ao termo do processo.
Porém, a manutenção desta referência ao efeito suspensivo da reclamação, impugnação e recurso, nos casos de determinarem a suspensão da cobrança da dívida (que é manifesto que resulta de uma intenção legislativa deliberada, pois a norma até foi reformulada, relativamente à equivalente anterior, que constava do n.º 3 do art. 49.º), explica-se pela inovação que consta da actual redacção do n.º 3 do mesmo artigo, de a interrupção ter lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar:
- o primeiro facto com efeito interruptivo produz os efeitos que produzia no domínio da redacção anterior, de eliminação do prazo decorrido anteriormente e de obstar ao decurso da prescrição, agora (com a eliminação do n.º 2) sempre, incondicionalmente, até se tornar definitiva a decisão que puser termo ao processo; [sublinhado nosso]
- os factos previstos como interruptivos que ocorram depois do primeiro, à face da nova redacção do n.º 3, não terão o referido efeito interruptivo, mas terão relevância como factos suspensivos da prescrição, desde que se verifique a condição da sua relevância a este nível, que é o processo respectivo determinar a suspensão da cobrança da dívida.
Esta interpretação é corroborada pelo próprio texto do novo n.º 3 do art. 49.º, ao estabelecer que «sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar», o que inculca que o regime do n.º 4, na parte que se refere aos factos qualificados pelo n.º 1 como interruptivos, tem o seu campo de aplicação nas situações em que esse efeito interruptivo é afastado pelo n.º 3» (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, págs. 69 a 72.).
Ou seja, sempre salvo o devido respeito, a tese do Recorrente assenta num pressuposto que não acompanhamos, qual seja o de que, após a revogação do n.º 2 do art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, a primeira causa de interrupção da prescrição (como o foi a instauração das impugnações judiciais no caso sub judice) deixou de ter (a par do efeito instantâneo, de eliminar para a prescrição o tempo anteriormente decorrido) o efeito duradouro, de obstar a que corra novo prazo de prescrição enquanto se mantiver pendente o respectivo processo.
O recurso não pode, pois, ser provido, devendo manter-se a sentença recorrida, que bem decidiu a questão.

2.2.3 DO VALOR DA CAUSA

O Recorrente discorda também da sentença quanto ao valor da causa, fixado pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, mediante a invocação da alínea e) do n.º 1 do art. 97.º-A do CPPT, em montante correspondente ao valor patrimonial do bem penhorado – € 63.880,00 – «porque inferior ao valor da dívida exequenda» (que ascendia a € 73.239,76, de acordo com o facto vertido sob o n.º 12). Alega o Recorrente, que chamou em favor da sua posição a doutrina do acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Fevereiro de 2012, proferido no processo n.º 99/12 (No Apêndice ao Diário da República de 18 de Abril de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32210.pdf), págs. 392 a 395, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/92fad9504383cc0a802579ba003e4cd9.), que estamos perante um processo impugnatório de acto do órgão da execução fiscal, pelo que é aplicável o regime do n.º 2 do art. 97.º-A do CPPT.
Recordemos o teor do art. 97.º-A do CPPT (Aditado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro e aplicável a processos (e respectivos incidentes, recursos e apensos) iniciados a partir de 20 de Abril de 2009 (cfr. os arts. 26.º e 27.º do referido diploma legal, na redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro).), na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2013):
«1- Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes:
a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende;
b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado;
c) Quando se impugne o acto de fixação dos valores patrimoniais, o valor contestado;
d) No recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, o do valor da isenção ou benefício.
e) No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, excepto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior.
2- Nos casos não previstos nos números anteriores, o valor é fixado pelo juiz, tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais.
3- Quando haja apensação de impugnações ou execuções, o valor é o correspondente à soma dos pedidos».
Salvo o devido respeito, o Recorrente parece não ter atendido ao facto de a doutrina fixada pelo acórdão que invocou em abono da sua tese se referir à redacção anterior do art. 97.º-A. Ulteriormente, quando do Orçamento de Estado para 2013, o legislador veio pôr cobro às dúvidas que se suscitavam relativamente ao valor das reclamações dos actos do órgão da execução fiscal, aditando uma alínea e) ao n.º 1 daquele artigo.
Sendo que a presente reclamação foi deduzida em 2015, bem andou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra ao aplicar a regra consagrada naquela alínea, motivo por que, quanto a esta questão, a sentença não merece censura, pelo que o recurso também não pode ser provido neste segmento.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Os factos interruptivos da prescrição previstos no n.º 1 do art. 49.º da LGT têm dois efeitos sobre a prescrição: para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início do novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo que provoca o efeito interruptivo.
II - Com a revogação do n.º 2 do art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, não deixaram de se verificar esses efeitos (agora sem qualquer limitação), se bem que restritos ao primeiro facto interruptivo que ocorrer.
III - O Orçamento do Estado para 2013 aditou ao n.º 1 do art. 97.º-A do CPPT uma alínea e), que veio dar resposta à questão de como se determina o valor para efeitos de custas das reclamações do órgão da execução fiscal previstas no art. 276.º e segs. do mesmo Código.


* * *

3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.


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Lisboa, 7 de Janeiro de 2016. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Casimiro Gonçalves.