Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0745/15
Data do Acordão:05/23/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23319
Nº do Documento:SA2201806230745
Data de Entrada:06/15/2018
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...., SGPS,SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. A Fazenda Pública, recorrente nos presentes autos, vem requerer a reforma quanto a custas do acórdão proferido por esta Secção em 24/01/2018, com os seguintes fundamentos:

1. Nos autos de Impugnação Judicial à margem referenciados, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, em 1.ª instância [processo nº 696/13·3BEAVR], julgou a acção procedente [condenando a Fazenda Pública no pagamento de Custas].
2. Em sede de recurso, a 2.ª Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (STA), negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública [condenando em custas a recorrente].
3. Ora, tendo em conta o valor da causa (€ 396.764,89 - fls. 389), impõe-se, nos termos da lei, o pagamento do respetivo remanescente, em cumprimento do disposto na anotação à TABELA I anexa ao Regulamento das Custas Processuais (RCP), de acordo com a 1.ª parte do nº 7 do art.º 6º do citado diploma legal.
4. Segundo o acórdão do TCA Sul, no processo nº 07140/14, o pagamento do remanescente é considerado na conta a final do processo, salvo casos específicos em que o juiz poderá, atendendo à especificidade da concreta situação processual, designadamente da complexidade da causa e da conduta processual das partes, dispensar o seu pagamento.
5. ln casu, o Juiz nunca se pronunciou sobre a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça [nos termos da 2.ª parte do n.º 7 do art.º 6.º do RCP], quando, claramente - atendendo à complexidade da causa e à conduta processual das partes -, a especificidade da situação o justificava.
6. No que diz respeito à complexidade da causa, é necessário analisar os pressupostos previstos no nº 7 do art.º 530º do CPC, para averiguação da existência de questões de elevada especialização ou especialidade técnica, ou, ainda, de questões jurídicas de âmbito muito diverso.
7. Quanto à conduta processual das partes, ter-se-á em consideração se esta respeita o dever de boa-fé processual estatuído no art.º 8º do CPC.
8. Para averiguação da especial complexidade de uma causa, o CPC (art.º 530º nº 7) antecipou três grupos de requisitos, a saber:
- A existência ou não de articulados ou alegações prolixas - vide al. a);
- A questão da causa ser, ou não, de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica, ou importarem questões de âmbito muito diverso - vide al. b);
- O terceiro e último grupo prende-se com a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de diligências de prova morosas - vide al. c).
9. A Fazenda Pública entende que adoptou, neste processo um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os Tribunais, não promovendo quaisquer expedientes de natureza dilatória ou praticando actos inúteis, guiando-se pelos princípios da cooperação e da boa-fé.
10. Relativamente à especificidade técnica da causa e ao assunto em discussão, consideramos que a questão da causa não é de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica, não sendo, igualmente, as questões aqui em crise, de âmbito muito diverso.
11. Como ficou plasmado no acórdão em causa "Tal questão foi já decidida nesta secção do Supremo Tribunal Administrativo nos acórdãos proferidos em (...), nos quais, com fundamentação que merece a nossa adesão (...)".
12. Assim, solicita a Fazenda Pública que este Tribunal faça uso da faculdade prevista na segunda parte do nº 7 do art.º 6º do RCP, por forma a dispensar a mesma do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nessa parte, o acórdão quanto a custas, ao abrigo do nº 1 do art.º 616º do CPC.
13. Nos termos supra expostos pronunciou-se já o TCA Sul, no acórdão nº 07373/14 de 13/03/2014, cujo teor acompanhamos e que, no nº 8 do sumário, estipula: (...)
14. Concluindo, poderemos afirmar que a inexistência de um tecto máximo a atender para efeitos de fixação da taxa de justiça e, consequentemente, a inexistência de um limite máximo para as custas a pagar, põe em causa o equilíbrio (adequação) que tem de existir entre os dois binómios a considerar por força do princípio da proporcionalidade: Exigência de pagamento de taxa versus serviço de administração da justiça.
15. Sendo certo que a taxa de justiça é fixada em função do valor da causa, não é menos certo que o valor da taxa de justiça (e consequentemente o das custas a pagar a final) fixado em função desse valor, sem qualquer tecto máximo, possibilita a obtenção de valores, como é o caso dos autos, que saem completamente fora dos parâmetros aceitáveis dentro daquela “justa medida” a equacionar entre a exigência de pagamento da taxa e o serviço (de administração da justiça) prestado.
16. Em suma, ao não estabelecerem um limite máximo para as custas a pagar, nomeadamente por não estabelecerem um limite máximo para o valor da acção a considerar para efeito de cálculo da taxa de justiça, os arts. 6º nºs 1, 2 e 7, 26º nº 3 al. c) e 25º nº 2 al. d) do RCP, por referência à tabela I anexa ao mesmo RCP, violam os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso aos tribunais.
17. Não carece de mais justificações a verificação de que ocorre uma situação em que a taxa calculada é de montante manifestamente excessivo, ou seja, em que há uma desproporção intolerável entre o montante do tributo e o custo do serviço prestado. E, justamente por ser manifestamente exorbitante o valor calculado, ocorre, também, uma violação evidente do direito de acesso ao direito e aos tribunais.
18. Desta forma, deverá ordenar-se a reforma quanto a custas, tendo em conta o máximo de € 275,000,00 fixado na TABELA I do RCP, desconsiderando-se o remanescente aí previsto.

1.2 Notificada do requerimento, a Requerida nada disse.

1.3. O Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido do deferimento da requerida dispensa, tendo em conta: «a) conduta processual da requerente pautada pela observância dos princípios da colaboração e da boa fé, designadamente sem suscitação de incidentes anómalos ou expedientes dilatórios (arts. 7° e 8° CPC); b) no caso concreto, decisão da causa com menor complexidade, induzida pela remissão para anterior acórdão do STA onde fora apreciada idêntica questão jurídica (art. 530º nº 7 al. b) CPC a contrario».

1.4. Com dispensa de vistos dos Exmºs Conselheiros Adjuntos, dada a simplicidade da questão, cumpre decidir.

2. Como se viu, a Fazenda Pública pretende, por via do presente pedido, que face ao valor da causa e ao montante de taxa de justiça que se mostra devida à luz do Regulamento das Custas Processuais (RCP) e da Tabela I anexa, este Tribunal proceda à reforma do acórdão quanto a custas, por forma a dispensá-la do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida, em conformidade com o disposto no nº 7 do artigo 6º do RCP.
Vejamos.
Segundo o referido preceito legal, nas causas de valor superior 275.000,00 € o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundamentada e atendendo, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
Trata-se, pois, de uma dispensa excepcional que, à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no nº 7 do artigo 7º, depende de uma concreta e casuística avaliação pelo juiz e deve ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de aí ser omitida, mediante requerimento de reforma da decisão - cfr., neste sentido, o acórdão do Pleno desta Secção de 15/10/2014, no processo nº 01435/12.
E como também aí se deixou explicado, «tem-se entendido que cabe a este STA apreciá-lo tão só no que respeita ao recurso (processo autónomo, na acepção do nº 2 do art. 1º do RCP) que a ele foi dirigido (...).».
Por outro lado, como este Tribunal tem vindo reiteradamente a explicitar, a dispensa do remanescente da taxa de justiça pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.
No caso vertente, julgamos que se verificam os enunciados requisitos, uma vez que, por um lado, a conduta processual das partes no recurso não merece censura que obste a essa dispensa e, por outro lado, não se pode olvidar a menor complexidade do recurso tendo em conta que a única questão em (re)apreciação fora já objecto de análise e de decisão noutros recursos desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, cuja motivação jurídica foi acolhida e transposta para o acórdão cuja reforma se pretende.
Neste contexto, entendemos que se encontram preenchidos os requisitos exigidos para que possa dispensar-se totalmente o pagamento desse remanescente.

3. Face ao exposto, acorda-se em deferir o pedido de dispensa total do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso.
Sem custas.
Lisboa, 23 de Maio de 2018. - Dulce Neto (relatora) - Ascensão Lopes - Ana Paula Lobo.