Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01389/06.3BESNT
Data do Acordão:10/23/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:DESPACHO DE REVERSÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Deve considerar-se fundamentado de direito um acto de reversão da execução fiscal quando ele se insere num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
II - Não é, porém, o que sucede quando o despacho de reversão incorre em omissão das razões de facto que levaram à reversão da execução contra o Oponente e de indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao executado revertido, como também tais elementos não são apreensíveis do restante contexto fundamentador do mesmo.
III - Em tais circunstâncias fica afectado de forma irreversível o direito de defesa do revertido/executado, o que constitui fundamento bastante para determinar a anulação do despacho de reversão por insuficiência de fundamentação.
Nº Convencional:JSTA000P25051
Nº do Documento:SA22019102301389/06
Data de Entrada:09/24/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1 – Vem a Fazenda Pública, recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a oposição deduzida por A……., melhor identificado nos autos, contra a execução fiscal nº 3433200101018779, por reversão de dívidas da sociedade originária, B…….., Ldª, referente a dívidas de IRC, IVA e coimas fiscais dos anos de 1998, 1999, 2000, 2001 e 2003, no montante global de € 68.562, 07.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I - Vem o presente recurso reagir contra a Sentença proferida nos presentes autos em 18-04-2018, que tem por objecto a Oposição intentada por A……., NIF…….., contra o processo de execução fiscal n.º 3433200101018779 e apensos, que corre termos no Serviço de Finanças de Cascais 2 e foi instaurado, originariamente, contra a sociedade “B………. LDA.”, com o NIF……., para a cobrança de dívidas relativas IVA, IRC e Coimas, já devidamente identificadas nos autos, no montante de € 68.562,07 (sessenta e oito mil, quinhentos e sessenta e dois euros e sete cêntimos) e acrescido.
II - É certo que a reversão da execução é um acto impositivo de deveres e encargos para o particular e como tal está sujeito a fundamentação (Cfr. n.º 3 do artigo 268.º da CRP, artigos 124.º e 125.º do CPA e em especial os n.º 4 do artigo 22.º, n.º 4 do artigo 23.º e artigo 77.º, todos da LGT).
III - Contudo, as exigências de fundamentação variam de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido bastando-se, com a expressão clara das razões que levaram a determinada decisão, não tendo de reportar, a todos os factos considerados, vicissitudes ocorridas e a todas as ponderações feitas durante o procedimento que conduziu à decisão, cfr. acórdãos do STA n.º 060/10 de 06.10.2010 e 01226/13 de 10.09.201 e do TCAN n.ºs 00035/04 de 11.11.2004 e vasta jurisprudência aí citada e 01490/06.3BEVIS de 16.10.2014.
IV - Em sede de despacho de reversão, a lei não impõe que, do mesmo, constem todos os factos individuais e concretos nos quais a administração tributária fundamenta a alegação relativa à verificação dos pressupostos legais da responsabilidade tributária subsidiária, bastando-se, aquele documento, com a alegação dos pressupostos atinentes à efectivação da responsabilidade tributária subsidiária e respectiva extensão temporal, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 23.º da LGT, cfr., neste sentido, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 16-10-2013, rec. n.º 0458/13.
V - O despacho de reversão em apreço contém a fundamentação legalmente exigida pelo n.º 1, do artigo 77.º da LGT, permitindo ao Oponente perceber as razões de facto e de direito que levaram ao órgão de execução fiscal a decidir nos moldes em que decidiu, o que lhe permitiu defender de forma cabal os seus direitos e interesses, como resulta, de forma clara, da simples leitura da petição de oposição e das alegações subscritas pelo Oponente nos termos do disposto no artigo 120.º do CPPT (destaque nosso).
VI - Contrariamente ao que foi consignado pelo Douto Tribunal a quo, o Oponente demonstra ter apreendido que a actual decisão de reversão assentou, desde logo, no exercício de facto da gerência da sociedade devedora originária, bem como na existência de culpa na falta de pagamento das dívidas ora em cobrança.
VII - Perscrutada a petição inicial e as respectivas alegações a que alude o artigo 120.º do CPPT, dúvidas não subsistem que o Oponente apreendeu, integralmente, todos os fundamentos de facto e de direito que motivaram a actuação do órgão de execução fiscal, nos quais se incluem, naturalmente a origem ou proveniência da dívida ora em cobrança, o que lhe possibilitou o exercício pleno de todos os seus meios de defesa.
VIII - A este respeito, considere-se a matéria dos artigos constantes no segmento III da petição inicial e no segmento II das alegações do artigo 120.º do CPPT, descritas sob a égide “Da inexistência de culpa do ora opositor na existência da dívida fiscal”, onde o Oponente pugnou no sentido de imputar a responsabilidade pela falta de pagamento das dívidas ora em cobrança ao TOC da sociedade devedora originária, por este, alegadamente, não ter cumprido, como lhe competia, de cuidar das obrigações fiscais daquela sociedade.
IX - Note-se, também, que, do teor do parágrafo 32 do segmento III da petição inicial e do segmento III (Da cedência de quota em condições que garantiam a sua viabilidade e assunção de dívidas por parte do sócio C……..) das alegações a que alude o artigo 120.º do CPPT, se constata que o Oponente pretende subtrair-se à reversão com o fundamento de que renunciou à gerência daquela sociedade.
X - Desta forma, ainda que eventualmente se possa considerar que o despacho de reversão não faz referência a todas as normas legais nas quais assenta a reversão, a verdade é que não se verifica qualquer falta de fundamentação no caso em apreço, porquanto foi deduzida argumentação tendente a infirmar ou a colocar em crise os pressupostos constantes dos artigo 24.º da LGT e 8.º do RGIT.
XI - Nesta conformidade, deve valer aqui o entendimento postulado no acórdão do TCA Sul de 05-06-2012, rec. n.º 05431, segundo o qual “…se a fundamentação utilizada no despacho de reversão se revelar insuficiente face aos seus pressupostos legais, mas o revertido os apreender na sua totalidade e mesmo contra a parte omitida vier a exercer plenamente a sua defesa, então, tal insuficiência, não equivale à falta de fundamentação do acto, por o fim legal que com ela se visa atingir, ter sido, não obstante, alcançado”.
XII - Assim, com o devido e muito respeito, o Douto Tribunal a quo, ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto nas supra mencionadas disposições legais.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu, a fls. 419 e seguintes, fundamentado parecer no sentido do não provimento do recurso, que concluiu da seguinte forma: «(…..) No caso concreto, como referimos supra, dos elementos documentais levados aos pontos F), G) e H) do probatório, extrai-se que a reversão funda-se no facto de o revertido ter exercido as funções de gerente no período de 27/01/1998 a 10/05/2002. Todavia estes elementos constam de informação que precede o despacho de reversão e este não lhe faz qualquer referência, nem faz qualquer remissão para a aludida informação. Por outro lado dos elementos documentais remetidos ao responsável subsidiário aquando da sua citação não se mostra possível extrair qualquer referência aos elementos dessa informação. Pelo contrário, o responsável subsidiário foi citado para os termos da execução fiscal com base no valor integral da dívida exequenda, de cuja discriminação constam dívidas referenciadas a outros períodos, designadamente ao ano de 2003.
Assim sendo, afigura-se-nos, salvo melhor opinião, que o quadro normativo ao abrigo do qual é imputada a responsabilidade subsidiária não só foi omitido no despacho de reversão como não é apreensível do restante contexto fundamentador do despacho de reversão, o que afeta de forma irreversível o direito de defesa do revertido/executado e constitui fundamento bastante para determinar a sua anulação, por insuficiência de fundamentação.
Em face do exposto entendemos que a sentença não merece censura que lhe é assacada pela Recorrente, motivo pelo qual se impõe a confirmação do juízo de invalidade do despacho de reversão, por fundamentação insuficiente, julgando-se improcedente o recurso.»

4 – Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

5 – O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra considerou como provados os seguintes factos com interesse para a decisão:
A. Contra a sociedade B………., Lda., com o NIPC ……….., foi, pelo Serviço de Finanças de Cascais 2 (Carcavelos), em 20 de Junho de 2001, instaurado o processo de execução fiscal n.º 3433200101018779, para cobrança coerciva de dívidas referentes a IRC do exercício de 1998, no montante de € 742.81 (cf. fls. 37 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
B. O referido processo de execução fiscal foi eleito o processo principal em 4 de Março de 2005 (cf. fls. 40 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido; cf. ainda fls. 96 e segs.);
C. Por Ofício n.º 01202, de 14 de Agosto de 2006, foi o ora Oponente notificado no seguintes termos essenciais (cf. doc. 1, junto com a p. i. a fl. 19, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, igualmente junto a fl. 91):



D. Na sequência do que, o ora Oponente apresentou requerimento com o seguinte teor (cf. fls. 130 segs. cujo teor se dá por integralmente reproduzido):


E. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos docs. juntos a fls. 131 e segs, com o requerimento referido na letra anterior, designadamente do “contrato promessa de cessão de quotas”, celebrado em 10 de Maio de 2002 pelo ora Oponente e por C………, na qualidade de cedente e cessionário, respectivamente, em cuja cláusula segunda se lê:


F. Com base em informação de 4 de Setembro de 2006, na qual consta que, “face às diligências de fls. 98 a 108”, o Oponente “só é responsável subsidiário pelas dívidas da empresa, que dizem respeito ao período de 1998-01-27 a 2002-05-10, período este em que exerceu as funções de gerente”, foi, pelo Chefe de Finanças, na mesma data, “face às diligências de fl. 109”, proferido despacho para audição (reversão) do responsável subsidiário, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 141 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

G. Na mesma data, foi remetido ao Oponente Ofício de notificação audição prévia (reversão) n.º 012584, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 148 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

H. Em 13 de Outubro de 2006, o Chefe de Finanças proferiu despacho de reversão contra o ora Oponente, na qualidade de responsável subsidiário, com o seguinte teor essencial (cf. despacho (reversão), a fls. 152 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

I. Na mesma data, foi remetido ao Oponente Ofício de citação (reversão) n.º 014166, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 158 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

J. Foi também enviado Ofício de citação (reversão) n.º 012585 a C………… (cf. fls. 160 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
K. A p. i. da presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Cascais 2 (Carcavelos), via telecópia, em 13 de Novembro de 2006 (cf. fl. 163, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
L. Pela Ap. 52/000410, foi registada a nomeação do Oponente e de C……. como gerentes da sociedade devedora originária, sendo a forma de obrigar com a assinatura de dois gerentes ou de um gerente e um procurador da sociedade (cf. certidão junta a fls. 223 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
M. Em 10 de Maio de 2002, foi deliberada a proposta de renúncia do ora Oponente “com efeitos imediatos ao cargo de gerência que ocupa na sociedade, em consonância com a cláusula quarta do contrato promessa de cessão de quotas celebrado nesta data por ele próprio e o sócio C…….” (cf. acta número sete, junta a fls. 140 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
N. Em 27 de Maio de 2002, foi, em processo-crime, deduzida acusação contra ………… , com o seguinte teor essencial (cf. doc. 3, junto com a p. i. a fls. 129 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):




O. ………….., condenada no processo-crime referido na letra anterior, emitiu, em 15 de Maio de 2002, declaração em que se declarou (cf. doc. 10, junto com a p. i. a fls. 32 e 33, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e alegação 12.º da Fazenda Pública):

P. Em 3 de Junho de 2003, foi outorgada escritura de “cessões de quotas, renúncia à gerência, nomeação de gerente e alteração parcial do contrato social”, na qual consta, entre o mais, que o ora Oponente “cede, com todos os direitos e obrigações” a sua quota a ……….. e que renuncia à gerência (cf. fls. 136 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
Q. Pela Ap. 26/20040602, foi registada a cessão da quota referida na letra anterior (cf. certidão junta a fls. 223 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
R. Pela Ap. 27/20040602, foi registada a alteração do contrato com designação de gerente do cessionário.

6. Do objecto do recurso
A questão objecto do recurso reconduz-se a saber se padece de erro de julgamento a sentença do TAF de Sintra, que julgou procedente a oposição deduzida contra a execução fiscal nº 3433200101018779, instaurada para cobrança da quantia de € 68.562,07 euros, e determinou a anulação do despacho de reversão, com base no vício de falta de fundamentação.

A sentença recorrida deu como assente que o oponente e aqui recorrido foi citado no âmbito do processo de execução fiscal nº 3433200101018779 e apensos, para responder pela dívida exequenda, no valor de € 68.562.07 euros, na qualidade de responsável subsidiário.
E conhecendo da primeira questão suscitada pelo oponente, que se prendia com a falta de fundamentação do despacho de reversão, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou procedente tal arguição, com base na seguinte fundamentação:
«…considerando a factualidade considerada provada, designadamente a especificada nas letras F e H do probatório, constata-se que o despacho de reversão (e o despacho para audição que o antecedeu) não contém, em termos suficientes, a explicitação dos motivos fácticos e jurídicos que o motivaram e que constituíram a sua fundamentação. Na verdade, visto o campo “Fundamentos da reversão” em branco, fácil é concluir que a Administração Tributária não esclareceu suficientemente as razões de facto que levaram à reversão da execução contra o Oponente, nem, por outro lado, fez qualquer referência às disposições legais em que se alicerçou para considerar que o Oponente é responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, sendo absolutamente ambíguo e insuficiente para determinar o possível enquadramento da situação numa das alíneas previstas no n.º 1 do artigo 24.º da LGT».
Mais se considerou que: «Por outro lado, a dívida revertida contra o ora Oponente inclui montantes respeitantes a Coimas fiscais, sendo que, face aos termos do despacho de reversão (e respectivo despacho para audição), não vem aí indicado o normativo legal ao abrigo do qual se pretendeu efectivar tal responsabilidade subsidiária por coimas…».
Concluiu, desta forma o Tribunal recorrido que se verifica «in casu, o invocado fundamento de oposição previsto na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, situação da qual resulta a ilegalidade do despacho de reversão decorrente da sua falta de fundamentação».

Não conformada com o assim decidido invoca a Fazenda Pública que o despacho de reversão contém, ainda que de forma sucinta, todos os elementos que permitiam ao revertido apreender os motivos de facto e de direito pelos quais foi chamado ao processo.
Alega para o efeito que «O despacho de reversão em apreço contém a fundamentação legalmente exigida pelo n.º1, do artigo 77.º da LGT, permitindo ao Oponente perceber as razões de facto e de direito que levaram ao órgão de execução fiscal a decidir nos moldes em que decidiu, o que lhe permitiu defender de forma cabal os seus direitos e interesses, como resulta, de forma clara, da simples leitura da petição de oposição e das alegações subscritas pelo Oponente nos termos do disposto no artigo 120.º do CPPT».
E conclui o Tribunal recorrido «ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto nas supra mencionadas disposições legais».

6.1 Da falta de fundamentação do despacho de reversão
A questão que se coloca consiste, pois, em saber se o despacho de reversão contém os elementos necessários e suficientes que permitam ao respectivo destinatário apreender os motivos de facto e de direito pelos quais é chamado à execução fiscal para responder por dívida de terceira pessoa.
Vejamos, pois.
A reversão, sendo um acto administrativo tributário, deve conter a sua fundamentação.
A exigência legal e constitucional de fundamentação do acto administrativo, decorrente dos arts. 268º da CRP e 125º do CPA, visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.
A fundamentação do acto administrativo deverá assim obedecer a três requisitos essenciais: deverá ser clara, deverá ser suficiente e deverá também ser lógica.
Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina o acto encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática.

Ponto é que a fundamentação responda, às necessidades de esclarecimento do contribuinte informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto administrativo permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática.
No que concerne à fundamentação do despacho de reversão da execução fiscal, a lei é expressa a determinar, no n.º 4 do art.º 23.° da LGT, que: «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».
Como bem nota o Exmº Magistrado do Ministério Público no seu parecer, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem abordado a temática da fundamentação do despacho de reversão em diversos acórdãos (Cfr., entre outros, os acórdãos de 31/10/2012, proc. 0580/12, de 23/01/2013, proc. 0954/13, de 18/02/2015, proc. 01860/13, de 08/04/2015, proc. 0345/14 e o acórdão do Pleno de 16/10/2013, proc. 0458/13).
Fazendo uma síntese da doutrina defendida nestes arestos assim se sublinhou no Acórdão 458/13 do Pleno «…são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT). Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)».
E especificando o âmbito dessa fundamentação e reportando-se à jurisprudência deste tribunal, reiterou-se no Acórdão 354/14 que «Em relação à fundamentação de direito, a jurisprudência do STA (cfr., entre outros, o ac. de 27/5/2003, proc. nº 1835/02) tem vindo a considerar que tal fundamentação se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível, impondo-se a verificação de duas condições: que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto e que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra».
Também do acórdão de 09/04/2014, proc. 0954/13, se subentende que nos casos em que não conste a indicação do quadro normativo à luz do qual se atribui a responsabilidade subsidiária, a mesma pode extrair-se do «… restante contexto fundamentador do despacho de reversão…», designadamente por indicação do «período em que o revertido exerceu a gerência da sociedade devedora originária – se no período da constituição das dívidas, se no período do pagamento ou entrega do tributo, se em ambos os períodos».

Porém, no caso vertente, os elementos constantes dos autos e a materialidade vertida no probatório da sentença permitem concluir que estas condições não se encontram reunidas.

É certo que dos elementos documentais levados aos pontos F), G) e H) do probatório, se extrai que a reversão se funda no facto de o revertido ter exercido as funções de gerente no período de 27/01/1998 a 10/05/2002.
Todavia estes elementos constam de informação que precede o despacho de reversão e este não lhe faz qualquer referência, nem faz qualquer remissão para a aludida informação. Do mesmo modo não se mostra possível extrair dos elementos documentais remetidos ao responsável subsidiário aquando da sua citação qualquer referência aos elementos dessa informação.
Pelo contrário, o responsável subsidiário foi citado para os termos da execução fiscal com base no valor integral da dívida exequenda, de cuja discriminação constam dívidas referenciadas a outros períodos, designadamente ao ano de 2003.
Aliás é de notar, como bem se salienta na sentença recorrida, que o campo "Fundamentos da reversão" encontra-se em branco, sendo fácil concluir que a Administração Tributária não esclareceu suficientemente as razões de facto que levaram à reversão da execução contra o Oponente, nem, por outro lado, fez qualquer referência às disposições legais em que se alicerçou para considerar que o Oponente é responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, sendo o despacho em causa absolutamente ambíguo e insuficiente para determinar o possível enquadramento da situação numa das alíneas previstas no nº 1 do artigo 24º da LGT.

Assim sendo, forçoso é concluir que ocorre omissão de alegação do exercício efectivo do cargo e de indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao executado revertido, como também tais elementos não são apreensíveis do restante contexto fundamentador do despacho de reversão, o que afecta de forma irreversível o direito de defesa do revertido/executado e constitui fundamento bastante para determinar a sua anulação, por insuficiência de fundamentação.

A decisão recorrida, que assim entendeu, não merece censura pelo que se impõe a confirmação do juízo de invalidade do despacho de reversão, por fundamentação insuficiente.

7. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.


Lisboa, 23 de Outubro de 2019. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes.