Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0667/13
Data do Acordão:05/15/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:RECLAMAÇÃO GRACIOSA
GARANTIA
CADUCIDADE DE GARANTIA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário:I - O regime da caducidade da garantia estabelecido no artº 183º A nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, na redacção, da Lei nº 30-B/2002, era sancionatório da morosidade na decisão do procedimento tributário e do processo judicial pelas entidades competentes, sem deixar de salvaguardar, num justo equilíbrio, a sua não aplicação, quando o atraso resultasse de motivo imputável ao reclamante, impugnante, recorrente ou executado (cfr. nº 3 do referido normativo);
II - Por força das disposições conjugadas do referido art. 183º nº 1, e dos arts. 169º, nº1, e 103º, nº 5 do Código de Procedimento e Processo Tributário, permitia-se assim ao interessado obter a declaração de caducidade da garantia, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou o processo de impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade ou de oposição à execução fiscal não fossem decididos , em 1ª instância, no prazo de três anos.
Nessas situações o processo de execução fiscal continuava suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito, não sendo, pois, devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo.
III - Para os referidos efeitos verifica-se a decisão final do pleito com o trânsito da decisão final do processo de impugnação, ainda que seja interposto recurso judicial da decisão do tribunal de 1ª instância, ou, em caso de impugnação administrativa, quando se formar o chamado caso decidido ou resolvido, o que ocorre quando a decisão da Administração Tributária deixar de ser contenciosamente impugnável com fundamento em vícios geradores de anulabilidade.
Nº Convencional:JSTA00068260
Nº do Documento:SA2201305150667
Data de Entrada:04/26/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL - RECL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART183-A ART169 N1 ART195 ART199 ART103 N4 ART69 F
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0364/12 DE 2012/04/26; AC STA PROC01500/13 DE 2013/01/23; AC STA PROC092/13 DE 2013/02/06; AC STA PROC0162/13 DE 2013/02/20
Referência a Doutrina:VALENTE TORRÃO - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO PAG474
RUI MORAIS - A EXECUÇÃO FISCAL PAG80
JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO VOLIII PAG220
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – Vem a Fazenda Pública, recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 26 de Dezembro de 2012, que julgou procedente a reclamação deduzida pela A……….., melhor identificada nos autos, contra o despacho do Chefe de Divisão da divida Executiva, da área da justiça da Direcção de Finanças do Porto, que decidiu não suspender o processo de execução fiscal nº 34682005101000080, em virtude da garantia prestada haver caducado.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art. 276° do CPPT, do despacho proferido pelo Chefe de Divisão da Dívida Executiva, da Área da Justiça Tributária da Direção de Finanças do Porto, de 11.09.2012 e notificado em 24.09.2012, na qual decidiu não suspender o processo de execução fiscal (PEF) n.º 34682005101000080, em virtude da garantia prestada haver caducado.
B. O despacho reclamado, fundamenta a sua decisão de não manter a suspensão do PEF, com base no teor do Ofício Circulado n.º 60.090, de 15.05.2012, da DSGCT, que refere que após reconhecimento da caducidade da garantia, por não ter sido cumprido o prazo máximo de um ano para decisão da reclamação graciosa, o interessado só pode beneficiar da suspensão do PEF até à decisão do pleito, entendendo-se que a palavra “pleito” se refere, somente, ao “pleito administrativo” pelo que, respeitando a impugnação judicial a um “pleito judicial”, o PEF só ficará suspenso mediante a prestação de garantia idónea nos termos e prazos constantes dos artigos 169.º e 199.° do CPPT.
C. A douta sentença recorrida julgou então a presente reclamação procedente, com a consequente anulação do despacho reclamado, sustentando o Tribunal a quo tal conclusão nas considerações constantes da transcrição do extracto do douto acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, no processo com o n.º 1270/12, de 05/12/2012.
D. Contrariamente ao sentenciado, e com o devido respeito que nos merece a fundamentação expendida pelo STA, perfilha a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que não padece o ato controvertido de qualquer ilegalidade, padecendo a sentença recorrida de erro de julgamento de direito.
Vejamos,
E. Vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, enunciado no n.º 2 do artigo 30º da Lei Geral Tributária (LGT) e aflorado no n.º 3 do artigo 85° do CPPT, para tanto, disponibilizando meios capazes de assegurar, para o credor/exequente (Estado), a garantia do pagamento (se necessário) daqueles créditos, no período em que não é possível movimentar a execução fiscal, dado o prosseguimento dos seus termos poder ser temporariamente paralisado pela apresentação de meio de reação que tenha por objeto a legalidade ou inexigibilidade da liquidação subjacente à divida exequenda, em sentido amplo.
F. Na situação sub judice, a liquidação da dívida exequenda, foi objeto de reclamação graciosa e recurso hierárquico e, perante o indeferimento dessas ações, a Reclamante apresentou impugnação judicial autuada neste Tribunal como n.º 135/09.4BEPRT.
G. Nos termos do artigo 169° do CPPT e nºs 1 e 2 do artigo 52° da LGT, a execução para cobrança coerciva do montante liquidado suspende-se até à decisão do pleito, desde que se verifique uma qualquer de três situações: (i) tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195°, (ii) haja sido prestada garantia nos termos do artigo 199°, ou (iii) exista penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, durando aquela suspensão até à verificação do caso decidido ou resolvido.
H. Por sua vez, o n.º 2 do art.º 183.° do CPPT estabelece que, uma vez prestada a garantia, esta pode ser levantada oficiosamente ou a requerimento do prestador, logo que no processo que a determinou tenha transitado em julgado decisão favorável ao garantido ou haja pagamento da dívida.
I. Ou seja, só se verifica caso resolvido ou decidido quando o ato tributário ou a dívida, cuja legalidade ou exigibilidade forem contestadas, deixarem de ser administrativamente impugnáveis.
J. No caso de meios contenciosos judiciais de reação, o pleito fica resolvido apenas quando ocorrer o trânsito em julgado da decisão judicial.
K. Acresce referir que a caducidade prevista atualmente no art.º 183-A do CPPT só ocorre em caso de falta de diligência da Administração Tributária, por não ter cumprido o prazo de um ano para proferir decisão em sede de reclamação graciosa (n.º 1 do art.º 183-A do CPPT), não ocorrendo essa caducidade se o incumprimento for da responsabilidade do reclamante (n.º 2 do art.º 183°-A do CPPT).
L. Assim, a caducidade tanto ocorre nos casos em que se trate de garantia prestada pelo contribuinte, como de garantias constituídas pela própria Administração (hipoteca legal ou penhor), nos termos do art.º 195.º do CPPT, estando aqui afastada a penhora face à revogação expressa do n.º 1 do art.º 235.º do CPPT.
M. Com efeito, o sentido da norma é incutir à Administração tributária uma tramitação célere do processo, não havendo razão para distinguir estas garantias.
N. Convém referir que a anterior redação do n.º 1 do art.º 183-A do CPPT (anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29.12) estatuía que a caducidade da garantia era aplicado, não só à reclamação graciosa, mas também à impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução, estabelecendo um prazo máximo de um ano para a decisão da reclamação graciosa e de três anos para o julgamento em primeira instância dos processos judiciais.
O. Ora, face a esta alteração, facilmente se conclui que foi intenção do legislador, com a nova redação do preceito citado, restringir o âmbito de aplicação da norma às situações de apresentação de reclamação graciosa, imputando à Administração os custos da sua própria ineficiência, devendo igualmente ser aplicada nos casos de recurso hierárquico, pois sendo este recurso um prolongamento do procedimento de reclamação graciosa, não fazia sentido a Administração solicitar nova garantia quando tudo se passa dentro da própria Administração.
P. Situação diferente ocorre no caso de eventual reação judicial ao indeferimento da pretensão do contribuinte na fase administrativa uma vez que esta lei afastou peremptoriamente a responsabilização pelas decisões dos tribunais, não sendo então, intenção do legislador, imputar à Administração os custos no atraso de decisões judiciais, dado que os tribunais são órgãos de soberania, e como tal independentes, face ao previsto na Constituição da República Portuguesa (CRP).
Q. Face ao exposto, deve a douta sentença ser revogada e substituída por outra que considere legal o Despacho objeto da presente Reclamação, em virtude de haver fundamento legal para exigir a prestação de nova garantia (arts. 103.º n.º 5, 169.º e 183.°-A, todos do CPPT e art.º 52.°, n.º 1 da LGT)»

2 – A A……….., S.A. apresentou as suas contra alegações com as seguintes conclusões:
«i. Ao contrário do pretendido pela Recorrente, a aludida decisão não violou qualquer preceito legal, sendo inteiramente certa e pertinente a argumentação, bem como as considerações em que se baseia.
ii. Para a Recorrente, o efeito suspensivo no processo de execução fiscal apenas se deveria manter se fosse apresentada nova garantia, já que a caducidade da garantia anteriormente prestada só teria efeito na fase administrativa do pleito.
iii. Esta argumentação da Recorrente baseia-se na sua interpretação da nova redacção legal do artigo 183.º-A do CPPT, quando restringiu a potencial caducidade das garantias à delonga apenas suscitada na decisão de reclamações graciosas.
iv. Como fonte imediata desta argumentação, a Recorrente refere o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira consubstanciado no Ofício-Circulado n.º 60090, de 15 de Maio de 2012, da Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários.
v. Sucede que em 12 de Março de 2003, a mesma Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários emitiu o Ofício-Circulado n.º 60094, que revogou expressamente o Ofício-Circulado n.º 60090.
vi. Nessa nova orientação genérica a Autoridade Tributária e Aduaneira vem adaptar a sua posição, conformando-a com a orientação jurisprudencial pacífica e constante dos Tribunais Superiores, mormente com a do Supremo Tribunal Administrativo.
vii. Desta forma, a Autoridade Tributária e Aduaneira determina também para os Serviços que verificando-se a caducidade da garantia em sede de reclamação graciosa, não é exigível ao contribuinte a prestação de nova garantia, caso prossiga com a discussão da legalidade da divida em sede de recurso hierárquico ou de impugnação judicial, mantendo-se o processo de execução fiscal suspenso até que seja proferida decisão final pela administração tributaria (caso decidido) ou pelo tribunal (trânsito em julgado).
viii. Sem prejuízo desta alteração, a verdade é que o Ofício - Circulado n.º 60090, de 15 de Maio de 2012, da Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários, era, objectivamente, doutrina administrativa que se não se limitava a ser enunciativa do regime legal, mas conformativa do mesmo, pelo que padecia de vício de violação de Lei, por ofensa do princípio da Legalidade tributária.
ix. É por esse motivo que o despacho da Divisão da Dívida Executiva, da Área da Justiça Tributária da Direcção de Finanças do Porto que revogou o efeito suspensivo no processo de execução fiscal em curso contra a Recorrida é ilegal por incorrer num vício de violação de Lei.
x. A caducidade da garantia prestada pela Recorrida ocorrida por delonga na decisão da reclamação graciosa por si apresentada permite manter o efeito suspensivo no processo de execução fiscal supra-referido até que ocorra trânsito em julgado da impugnação judicial em curso.
xi. Em conclusão, o certo é que, conforme decorre da douta Sentença a quo, a Recorrente, não apresentou, nem nesta, nem naquela sede, argumentos que permitissem sustentar a sua tese e que se alicerça numa fundamentação cuja Lei, Doutrina e Jurisprudência desacompanha, como referido anteriormente.
xii. Assim, em face de tudo quanto ficou exposto, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, determinando-se em sequência a reconstituição da situação anterior á revogação do efeito suspensivo.»
3 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu o douto parecer, com a seguinte fundamentação:
«Recorrente: Fazenda Pública
Objecto do recurso: sentença declaratória da procedência de reclamação apresentada contra decisão do órgão da execução fiscal determinando a prestação de nova garantia para manutenção da suspensão de processo de execução fiscal.
FUNDAMENTAÇÃO
Questão decidenda: apreciação da legalidade do prosseguimento do processo de execução fiscal, em caso de reclamação graciosa, recurso hierárquico e subsequente impugnação judicial para discussão da legalidade da dívida exequenda, associada à prestação de garantia idónea posteriormente declarada caducada.
A execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial (reclamação) que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda desde que tenha sido prestada garantia idónea que assegure o pagamento da quantia exequenda e do acrescido (art.52° nºs 1/2 LGT; arts. 169° n°1 e 199° nºs 1 e 4 CPPT)
A decisão do pleito, adoptada pelo legislador como termo final do período de suspensão da execução fiscal, apenas ocorre com a formação de caso decidido ou resolvido na sequência de impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), ou de caso julgado na sequência de impugnação judicial ou recurso judicial (Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume III p.220)
A declaração de caducidade da garantia pelo órgão da administração tributária com competência para decidir a reclamação graciosa não obsta à manutenção do efeito suspensivo da execução, pelo seguintes motivos:
a) inexistência de previsão da cessação do efeito suspensivo nas normas constantes do art. 183°-A CPPT;
b) a declaração de caducidade constitui uma sanção resultante da morosidade do procedimento tributário ou do processo judicial;
c) o prosseguimento da suspensão da execução sem garantia subsequente à declaração de caducidade surge como uma compensação pelo ónus que foi imposto ao contribuinte de ter de suportar a garantia durante um período de tempo que se considera adequado para ser proferida decisão.
(no sentido propugnado acórdãos STA-SCT 31.01.2008 processo nº 21/08; 20.10.2010 processo nº 1258/09; 29.06.2011 processo nº 563/11; 12.04.2012 processo nº 322/12; 26.04.2012 processo nº 364/12; 21.11.2012 processo nº 1155/12; 5.12.2012 processo nº 1270/12, na doutrina Jorge Lopes de Sousa ob. cit. Volume III p.342);
d) como consequência da premissa antecedente o efeito da caducidade da garantia declarada na pendência de reclamação graciosa prolonga-se pela subsequente impugnação judicial em que se continua a discutir a legalidade da dívida exequenda Não sendo a suspensão da execução fiscal afectada pela caducidade da garantia prestada, a exigência pela administração tributária de prestação de uma nova garantia para obtenção daquele efeito, até à decisão do pleito (segundo a interpretação da expressão antecedentemente sustentada) carece de fundamento legal.
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.»
4 – Com dispensa de vistos, dada a natureza do processo, vêm os autos à conferência.
5 - Em sede factual apurou-se em primeira instância a seguinte matéria de facto:
A. A 07 de Janeiro de 2005 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Gondomar 2, o processo execução fiscal nº 3468200501000080 contra a reclamante para cobrança coerciva de IVA e juros compensatórios dos anos de 2002 a 2004, na quantia global de € 759.098,09 (setecentos e cinquenta e nove mil e noventa e oito euros e nove cêntimos) — cfr. fls. 1;
B. Pelo oficio 002069 datado de 05 de Janeiro de 2007 e recebido a 20 de Janeiro de 2007, foi a reclamante notificada da dedução do valor de € 759.098,09 (setecentos e cinquenta e nove mil e noventa e oito euros e nove cêntimos) respeitante a dívidas de IVA, relativas aos anos de 2002 a 2004, pelo que o reembolso foi fixado em € 104.025,87 (cento e quatro mil e vinte e cinco euros e oitenta e sete cêntimos) — cfr. fls. 32 e 33;
C. A reclamante deduziu reclamação graciosa a 28 de Fevereiro de 2005 e requereu a fixação de garantia — cfr. fls. 98;
D. A 17 de Janeiro de 2006 foi proferido despacho de fixação de garantia no montante de € 1.081.990,00 (um milhão e oitenta e um mil e novecentos e noventa euros) — cfr. fls. 105;
E. A 27 de Janeiro de 2006 a reclamante apresentou garantia no montante referido em D) — cfr. fls. 109 e 110;
F. A 28 de Dezembro de 2006, a reclamante requereu a declaração de caducidade da garantia — cfr. fls. 119 a 123;
G. Por despacho de 08 de Fevereiro de 2007, o requerimento de caducidade de garantia foi deferido — cfr. fls. 196;
H. A reclamação referida em C), foi improcedente por despacho datado de 02 de Agosto de 2007, ao qual foi interposto recurso hierárquico — cfr. 207 e 208;
I. A reclamante deduziu impugnação judicial a 7 de Janeiro de 2009 que corre no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto sob o n.º 135/09.4BEPRT e na qual ainda não foi proferida sentença;
J. Por despacho de 11 de Setembro de 2012, o qual se considera aqui integralmente reproduzido, foi determinada a notificação da reclamante para prestar garantia, sem a qual não haveria lugar à suspensão do processo — cfr. fls. 240 e 241;
K. Pelo oficio nº 6877 de 19 de Setembro de 2012, registado a 20 de Setembro de 2012, a reclamante foi notificada do despacho referido em J) — cfr. fls. 258;
L. Os presentes autos deram entrada a 02 de Outubro de 2012 — cfr. fls. 269.
6. Tanto quanto se apura das respectivas conclusões questão objecto de recurso é a de saber se Administração Fiscal pode exigir à recorrida a prestação de nova garantia fiscal para manter suspenso o processo de execução fiscal, em virtude de ter sido declarada a caducidade da garantia anteriormente prestada ao abrigo do disposto no artº 183º-A do CPPT, na redacção dada pela lei 30-B/2002 de 30/12, com vista à suspensão da execução fiscal, tendo a recorrida deduzido reclamação graciosa contra a divida exequenda e impugnação judicial contra a decisão de indeferimento daquela reclamação graciosa.

A sentença recorrida, ancorando-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente no acórdão proferido no recurso 01270/12 de 05/12/2012, concluiu que, por força do disposto no artº 169° nº 1 do CPPT, a execução fiscal mantém a sua suspensão na sequência da apresentação da garantia bancária, independentemente da caducidade daquela garantia, suspensão que se mantém até trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial, não sendo, pois, devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo.

Contra o assim decidido se insurge a Fazenda Pública sustentando que os efeitos da suspensão da execução decorrentes da caducidade da garantia apresentada na sequência de reclamação graciosa não se estendem à impugnação judicial, por se tratarem de processos de natureza distinta.
Alega para o efeito que no caso de eventual reacção judicial ao indeferimento da pretensão do contribuinte na fase administrativa a lei afastou peremptoriamente a responsabilização pelas decisões dos tribunais, não sendo então, intenção do legislador, imputar à Administração os custos no atraso de decisões judiciais, dado que os tribunais são órgãos de soberania, e como tal independentes, face ao previsto na Constituição da República Portuguesa (CRP).



6.1 A questão suscitada é, até nos pressupostos de facto, em tudo idêntica à questão foi apreciada e decidida neste Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 364/12, de 26.04.2012, subscrito pelo presente relator.
Com efeito constata-se dos presentes autos que a executada deduziu reclamação graciosa em 28.02.2005, requerendo também a prestação da garantia. E requereu em 28 de Dezembro de 2006 que a garantia fosse declarada caducada com efeitos reportados a 28 de Fevereiro de 2006, o que veio a suceder ( cf. pontos C a H do probatório).
Assim, tal como na situação fáctica em análise naquele acórdão, à data em que foi concedida a garantia era aplicável o regime de caducidade da garantia previsto pelo art.° 183.° A do CPPT na redacção da Lei 30 B/2002 de 30 de Dezembro
Por isso se acompanhará a argumentação jurídica aduzida referido Acórdão 364/12, por economia de meios e tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artigo 8.º n.º 3 do CC).
Escreveu-se nesse aresto:
«Dispõe o artº 169º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário que a execução ficará suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.
Esta suspensão está também prevista genericamente no artº 52º da Lei Geral Tributária para os casos de pagamento em prestações, reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda.

Por outro lado preceitua o artº 103º, nº 4 do Código de Procedimento e Processo Tributário (Na redacção da Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho, aplicável ao caso subjudice.) - que a impugnação tem efeito suspensivo quando, a requerimento do contribuinte, for prestada garantia adequada, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo tribunal, com respeito pelos critérios e termos referidos nos n.os 1 a 5 e 9 do artigo 199.º, estabelecendo o nº 5 do mesmo normativo que caso haja garantia prestada nos termos da alínea f) do artigo 69.º, esta mantém-se, independentemente de requerimento ou despacho, sem prejuízo de poder haver lugar a notificação para o seu reforço.

Da conjugação destas normas se pode concluir, com segurança, que esta garantia, prestada para obter o efeito suspensivo da reclamação graciosa, valerá até á decisão final do pleito, entendendo-se por decisão final do pleito o trânsito da decisão final do processo de impugnação, ainda que seja interposto recurso judicial da decisão do tribunal de 1ª instância, ou, em caso de impugnação administrativa, quando se formar o chamado caso decidido ou resolvido, o que ocorre quando a decisão da Administração Tributária deixar de ser contenciosamente impugnável com fundamento em vícios geradores de anulabilidade - cf., neste sentido, na doutrina, João António Valente Torrão, no seu Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, pag. 474, Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, pag. 80, e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário anotado , vol. III, pag. 220.

Ora, (…….) se esta garantia, prestada para obter o efeito suspensivo da reclamação graciosa, vale até ao trânsito da decisão final do processo de impugnação, não há efectivamente razões para se considerar que o mesmo não suceda nas situações em que, estando já instaurado o processo executivo, a garantia tenha caducado por facto imputável à Administração Fiscal.

Aliás, só este entendimento se concilia com a ratio do instituto da caducidade da garantia, que se prende com a necessidade de acautelar e proteger os contribuintes da demora excessiva das decisões, quer na fase administrativa, quer na fase judicial.
É isso mesmo que decorre do fim visado pelo legislador ao elaborar a norma do artigo 183-A nº1 do Código de Procedimento e Processo Tributário (redacção da Lei nº 30-B/2002, aplicável ao caso subjudice), que prevê a possibilidade de caducar a garantia que tivesse sido efectivamente prestada, por atraso na decisão do processo de reclamação graciosa ou nos processos de impugnação judicial ou de oposição à execução, mantendo-se, contudo o efeito suspensivo da execução.
Com efeito, com o intuito de « responsabilizar a a administração e os tribunais na condução célere e expedita do processo» e de prevenir a « imposição ao contribuinte de um encargo oculto por razões que lhe são alheias (Proposta de Lei nº 53/VIII que esteve na origem da Lei 15/2001, de 5 de Junho.)» o legislador aditou ao Código de Procedimento e Processo Tributário o artº 183º-A, cuja redacção, alterada pela Lei nº 30-B/2002, aplicável ao caso subjudice era a seguinte:
«1- A garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se na impugnação judicial ou na oposição não tiver sido proferida decisão em 1.ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação. 2 - Os prazos referidos no número anterior são acrescidos em seis meses quando houver recurso a prova pericial. 3 - O regime do n.º 1 não se aplica quando o atraso resulta de motivo imputável ao reclamante, impugnante, recorrente ou executado. 4 - A verificação da caducidade cabe ao tribunal tributário de 1.ª instância onde estiver pendente a impugnação, recurso ou oposição, ou, nas situações de reclamação graciosa, ao órgão com competência para decidir a reclamação, devendo a decisão ser proferida no prazo de 30 dias após requerimento do interessado. 5 - Não sendo proferida a decisão referida no número anterior no prazo aí previsto, considera-se tacitamente deferido o requerido. 6 - Em caso de caducidade da garantia, o interessado será indemnizado pelos encargos suportados com a sua prestação, nos termos e com os limites previstos nos n.os 3 e 4 do artigo 53.º da lei geral tributária».

Permitia-se assim ao interessado obter a declaração de caducidade da garantia, sem perder o efeito suspensivo da execução, se reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou o processo de impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade ou de oposição à execução fiscal não fossem decididos , em 1ª instância, no prazo de três anos.
Nessas situações, em que se enquadra, aliás, o caso em apreço, o processo de execução fiscal continua suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito (cf., adoptando este entendimento, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., vol. III, pags. 341-342)
O que bem se compreende pois o regime da caducidade da garantia estabelecido no artº 183º A nº 1 do CPPT é sancionatório da morosidade na decisão do procedimento tributário e do processo judicial pelas entidades competentes, sem deixar de salvaguardar, num justo equilíbrio, a sua não aplicação, quando o atraso resultar de motivo imputável ao reclamante, impugnante, recorrente ou executado cfr. nº 3 do artº 183º A do CPPT.
O prosseguimento da suspensão da execução sem garantia subsequente à declaração de caducidade surge assim (……) como uma compensação pelo ónus que foi imposto ao contribuinte de ter de suportar a garantia durante um período de tempo que se considera adequado para ser proferida decisão (….)
Ora, sendo este o espírito da lei, não se compreende nem se aceita a tese da Fazenda Pública quando defende a existência da obrigação de prestação de nova garantia no âmbito do processo de impugnação judicial precisamente no caso de a garantia prestada na pendência da reclamação graciosa ter caducado por culpa unicamente imputável à Administração Fiscal, nomeadamente por não ter cumprido o prazo que o legislador considera razoável para decidir o mencionado procedimento.»

Tal é, aliás, o entendimento acolhido de forma unânime pela jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo podendo concluir-se hoje que constitui jurisprudência consolidada na Secção que decorre do art. 169º, nº 1, do CPPT, que a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, sendo que, em relação à reclamação graciosa, a decisão do pleito só ocorrerá quando se formar o caso decidido ou caso resolvido, quando a liquidação se puder considerar estabilizada na ordem jurídica, por a decisão da reclamação graciosa já não ser susceptível de impugnação administrativa (recurso hierárquico) ou contenciosa (impugnação judicial) com fundamento em vícios geradores de anulabilidade - cf. neste sentido, para além dos acórdãos citados pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, os Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário de 23.01.2013, recurso 1500/13, de 06.02.2013, recurso 92/13, e de 20.02.2013, recurso 162/13.
Acresce dizer, como ficou escrito no Acórdão 92/13, de 20.02.2013, que «a este entendimento não obsta a circunstância de, face à actual redacção do nº 1 do art. 183º-A do CPPT, a caducidade da garantia operar apenas no caso de a reclamação graciosa não estar decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição.
Com efeito, aceitando que (….) a caducidade da garantia se destina a devolver à AT os custos da sua própria ineficiência, não vemos que daí resulte que, pelo facto de a nova redacção daquele normativo não contemplar a caducidade para os casos de impugnação judicial, recurso judicial ou oposição, se deva concluir (….) que no caso de ser deduzida impugnação judicial da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, aquele atraso deixa de ser imputável à administração (sendo certo que eventuais atrasos na decisão da impugnação judicial não podem ser imputáveis à AT, também é certo que a caducidade da garantia não decorre destes atrasos (….) mas, antes, do facto de a reclamação graciosa não ter sido decidida no prazo de um ano).
Por isso, se a manutenção da suspensão da execução sem garantia subsequente à declaração de caducidade surge como uma compensação pelo ónus que foi imposto ao contribuinte de ter de suportar a garantia durante um período de tempo que se considera adequado para ser proferida decisão, então, também não colhe a alegação da recorrente no sentido de que existe obrigação de prestação de nova garantia no âmbito do processo de impugnação judicial (ainda que esta impugnação seja deduzida na sequência da decisão da reclamação graciosa), quando a garantia prestada na pendência da mesma reclamação graciosa haja caducado, por culpa unicamente imputável à AT, nomeadamente por não ter cumprido o prazo que o legislador considera razoável para decidir tal procedimento».
Trata-se jurisprudência que também aqui se acolhe e se reitera, não tendo a recorrente apresentado novos e melhores argumentos, nem existindo razões para se seguir diverso entendimento sobre esta mesma questão.
Em face de tudo o exposto forçoso é concluir que, no caso subjudice, a execução fiscal mantém a sua suspensão na sequência da apresentação da garantia bancária no âmbito da reclamação graciosa, independentemente da caducidade daquela garantia, suspensão que se mantém até trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial, não sendo, pois, devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo.
A sentença recorrida, que assim decidiu, deve pois ser confirmada, pelo que improcede o recurso.
7. Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente Fazenda Pública.

Lisboa, 15 de Maio de 2013. - Pedro Delgado (relator) - Valente Torrão - Ascensão Lopes.