Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:026391
Data do Acordão:05/29/2002
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MENDES PIMENTEL
Descritores:NULIDADE DE ACÓRDÃO.
OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
REFORMA DE DECISÃO JUDICIAL.
REENVIO PREJUDICIAL.
COMPATIBILIDADE COM O DIREITO COMUNITÁRIO.
EMOLUMENTOS.
REGISTO.
Sumário:É de indeferir pedido de nulidade e de reforma de acórdão em que o reclamante, mais do que fundamentos de anulabilidade e de reforma, enuncia erros de julgamento, os quais não encontram remédio nos artigos 668° e 669° do C PC.
Nº Convencional:JSTA00057742
Nº do Documento:SA220020529026391
Data de Entrada:07/04/2001
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO E FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:RECLAMAÇÃO.
Objecto:AC STA PROC26391.
Decisão:INDEFERIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Área Temática 2:DIR PROC CIV.
Legislação Comunitária:CPC96 ART660 N2 ART668 N1 D ART669 N2 A ART684 N3 ART684 A.
LGT98 ART43 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC26392 DE 2002/02/27.; AC STA PROC26319 DE 2002/02/06.; AC STA PROC26235 DE 2002/01/16.; AC STA PROC26231 DE 2002/01/30.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do STA:
A... vem, sob a invocação dos artigos 668° e 669° do CPC, ex vi artigo 2°, e), do CPPT, "requerer a nulidade e/ou reforma do acórdão" desta formação de fls. 190-195, bem assim que os autos sejam enviados, a título prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, para que este se pronuncie sobre três questões que enuncia a final.
Devidamente notificada (artigo 670°,1, do CPC), a Rct. Fazenda Pública nada disse.
Respondeu, porém, o Rct. Ministério Público, propugnando pelo indeferimento da reclamação, com consequente prejuízo do pedido de reenvio prejudicial.
Corridos vistos suplementares, cumpre decidir .
Entende o requerente que o acórdão em referência é nulo, desde logo por não se ter pronunciado sobre a inconstitucionalidade decorrente do confisco que o acto tributário de liquidação de emolumentos registrais objecto dos presentes autos consubstancia.
Vejamos.
É sabido que, segundo o artigo 660°, 2, do CPC, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras .
E na alínea d) do n.º 1 do artigo 668° do mesmo compêndio adjectivo (aplicável aos acórdãos, ex vi artigos 716°,1, e 732° de tal diploma) se fulmina com nulidade a sentença em que postergado seja tal dever .
Pertinentemente, há que ter em conta que o objecto de recurso jurisdicional é delimitado pelas conclusões da atinente alegação, como se infere do preceituado no n.º 3 do artigo 684° do C PC, por isso que, em tal recurso, é à face das conclusões que têm de ser definidos os poderes de cognição do tribunal ad quem, sem prejuízo do conhecimento de questões ex officio e, ainda, das vertidas em ampliação do objecto do recurso a requerimento do recorrido, nos termos do artigo 684° - A do mesmo código.
Avança-se já que o recorrido ora reclamante, na contra-alegação do recurso dos autos, não lançou mão desta prerrogativa processual.
E ante as conclusões das alegações de ambos os recorrentes, as questões decidendas eram, como se consignou no acórdão reclamado, a de saber se o direito de o impugnação do acto de liquidação dos emolumentos registrais pagos pelo Banco rcd.º se mostrava caducado à data da instauração do presente processo e saber se, anulado tal acto, são devidos juros indemnizatórios nos termos do art.º 43°,1, da LGT, quando o acto tenha resultado da aplicação pela AF de norma que o tribunal veio a considerar inconstitucional.
Ora, é patente que o aresto reclamado se debruçou, detalhadamente, sobre aquela primeira questão, dando-lhe, a final, resposta afirmativa, assim ficando, sem sombra de dúvida, prejudicado o conhecimento da segunda questão decidenda.
Não se perfila, pois, omissão de pronúncia alguma, antes confusão da reclamante entre questões jurídicas e argumentos esgrimidos por ela deduzidos em vista de decisão daquelas a si favorável. Neste ponto, sintomático é o teor dos artigos 43 - "Mais uma vez, o (...) acórdão ora sindicado não faz referência aos argumentos invocados pela requerente, o que" - e 44 da reclamação em apreço - "consubstancia uma situação de omissão de pronúncia, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 668°, n.o 1, alínea d), do CPC." (sublinhado nosso).
Ora, o conceito de "questões" não é de confundir com o de "argumentos" ou "razões". Por isso, o tribunal, devendo embora "resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação", não está vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes, tal como, obviamente, também não está impedido de, na decisão, usar considerandos por ela não produzidos.
Improcede, assim, a alegação deste fundamento de nulidade do acórdão.
Mas o requerente alega ainda que o acórdão é nulo por "excesso de pronúncia", posto que conheceu e apreciou questões que se prendem com a interpretação a dar a actos adoptados pelas instituições comunitárias, ao arrepio do estipulado no artigo 234° do Tratado de Amsterdão.
Falece também aqui razão ao reclamante, como bem se demonstra no acórdão deste STA de 27 de Fevereiro último, incidente sobre idêntica reclamação deduzida contra o aresto proferido no recurso 26392, citado no de fls. 190-195.
É que "a questão concreta a decidir se cingia à caducidade do direito de impugnação do acto de liquidação, respeitando ,a apreciação feita à correcção ou bondade dos respectivos pressupostos jurídicos da decisão. O acórdão desenvolveu a tese de que os comandos directa e imediatamente aplicáveis da referida Directiva, conquanto de fonte comunitária, constituem direito interno e que, delegando o direito comunitário para o mesmo direito interno o problema da impugnação das taxas indevidamente pagas ou reclamadas, o tribunal poderia conhecer em toda a sua extensão, como o faz relativamente ao direito interno, se o prazo de impugnação previsto na nossa lei interna, com base nos diversos fundamentos jurídicos, cumpria os princípios da equivalência e da efectividade também vigentes no direito interno e, na sequência dessa análise, conclui que tal acontecia. O tribunal não interpretou, pois, o direito comunitário, mas apenas o direito interno que o direito comunitário assumiu como critério de decisão relativamente à matéria do prazo de impugnação. Mas, ainda que se admita que o tenha feito, não há aqui qualquer excesso de pronúncia, podendo haver, apenas, quando muito, um erro de julgamento. Segundo essa óptica, o que teria, então, acontecido é que o tribunal nacional teria conhecido, sob pressuposto errado quanto à sua competência, de matéria da competência do tribunal comunitário, erro esse - diga-se já, na perspectiva da análise do pedido de reforma - que jamais poderá ser tido por manifesto, atento o que vem de dizer-se como constante do acórdão reclamado."
Consequentemente, improcede, outrossim, esta alegação de nulidade do acórdão de fls. 190-195.
Por outro lado, pretende o reclamante que o acórdão em causa seja reformado, nos termos do artigo 669°, 2, a), do CPC, em virtude de, não procedendo os fundamentos nele invocados, existir manifesto lapso na determinação das normas aplicáveis.
Segundo tal normativo (aplicável aos acórdãos ex vi artigos 716°,1, e 726° do CPC), é lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz na determinação ou na qualificação jurídica dos factos a decisão tenha sido proferida com violação de lei expressa.
Ora, é patente que tal situação não se perfila no sobredito aresto, em que se seguiu jurisprudência pacífica e reiterada deste STA na matéria sub judicio - além do acórdão aí citado e parcialmente transcrito, vide os acórdãos de 06 de Fevereiro e 16 e 30 de Janeiro últimos, tirados nos recursos 26319, 26235 e 26231, respectivamente. O reclamante pode discordar do entendimento uniforme deste Supremo, mas não afirmar que ele é fruto de menor reflexão da problemática da caducidade do direito de impugnar liquidação de emolumentos registrais ou notariais, conducente a "manifesto equivoco na determinação da norma aplicável."
Seguramente, não ocorre o sobredito pressuposto legal de reforma do acórdão, por isso que se indefere o atinente pedido e, em consequência, também o de reenvio prejudicial.
Em suma: como muito bem nota o distinto PGA, "mais que fundamentos de anulabilidade ou de reforma do acórdão, o que o Reclamante alinha são alegações de erros de julgamento (como, aliás, diz explicitamente nos n.ºs 9, 35 e 59 do requerimento) - mas, erros de julgamento não encontram remédio nos arts. 668° e 669° do CPC."
Por todo o exposto, acorda-se em indeferir, integralmente, a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em € 99,76.
Lisboa, 29 de Maio de 2002
Mendes Pimentel – Relator – Almeida Lopes – Jorge de Sousa (votei a decisão mas por entender que o reenvio não era obrigatório, relativamente à questão de saber se o prazo de 90 dias para impugnação judicial é compatível com o princípio da efectividade do direito comunitário, por não ser esse o único meio de que a impugnante dispunha para reaver o que pagou e ser à face da globalidade dos meios disponíveis que deva ser apurada a satisfação daquele princípio; quanto ao prazo de 4 anos de que a impugnante dispunha para revisão do acto tributário (artigo 78º do CGT) que era aplicável pelo que refiro no voto de vencido proferido no acórdão reclamado, há já jurisprudência comunitária pelo que o reenvio não era obrigatório).