Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0829/12.7BELRA 0212/18
Data do Acordão:02/13/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
REQUISITOS
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Sumário:I - Não pode ser admitido o recurso interposto ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT se, no respectivo requerimento, o recorrente, incumprindo a exigência feita pelo n.º 1 daquele artigo, não indica o acórdão anterior em oposição com o acórdão recorrido.
II - A não admissão do recurso não fica sequer dependente da prévia notificação do recorrente para se pronunciar sobre a questão, pois a cominação para aquela falta está expressamente prevista na lei.
III - O despacho do relator que não admitiu o recurso pode ser sindicado pela conferência, mas essa sindicância só pode referir-se aos fundamentos que determinaram a decisão e não aos considerandos que aí foram efectuados como obiter dictum, ou seja, como «uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que motivou e estruturou a decisão», na impressiva expressão que este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a usar.
Nº Convencional:JSTA000P24223
Nº do Documento:SA2201902130829/12
Data de Entrada:02/28/2018
Recorrente:A....
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Reclamação para a conferência do despacho por que o relator não admitiu o recurso interposto ao abrigo do art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)

1. RELATÓRIO

1.1 O acima identificado Reclamante (a seguir também Recorrente) pede que recaia acórdão sobre o despacho por que o relator não admitiu o recurso que interpôs ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT.

1.2 Se bem interpretamos o requerimento, entende o Reclamante, em resumo, que não podia o recurso ser indeferido sem que previamente tivesse sido notificado para esclarecer qual o acórdão de que pretendia recorrer, notificação que, a seu ver, se impunha em face da dúvida expressa no despacho reclamado, onde ficou dito: «Antes do mais, cumpre registar que o Recorrente não identifica de modo adequado o acórdão recorrido: é o acórdão proferido em 14 de Novembro de 2018 ou o acórdão proferido em 20 de Junho de 2018?».

1.3 Cumpre apreciar e decidir, dispensando-se os vistos dos Conselheiros adjuntos, dada a simplicidade da questão a dirimir e a existência de jurisprudência uniforme sobre a matéria.


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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

Pertinentemente, cumpre ter presentes as seguintes circunstâncias processuais:

a) Em 20 de Junho de 2018, foi proferido nos presentes autos pelo Supremo Tribunal Administrativo acórdão que, negando provimento ao recurso interposto pelo ora Reclamante, manteve a sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, com fundamento em erro na forma do processo insusceptível de ser corrigido por convolação para a forma processual adequada – que seria a oposição à execução fiscal –, absolveu a Fazenda Pública da instância no processo de impugnação judicial por aquele deduzido na qualidade de responsável subsidiário;

b) Notificado desse acórdão, o Recorrente veio arguir nulidades do mesmo;

c) Em 14 de Novembro de 2018, foi proferido acórdão a indeferir as arguidas nulidades;

d) Notificado desse acórdão veio o Recorrente, «nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º, n.º 1 e 284.º, ambos do CPPT, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (2.ª Secção Contencioso Tributário)»;

e) Em 10 de Dezembro de 2018, apreciando aquele requerimento, foi proferido pelo relator despacho do seguinte teor:

«1. O Recorrente, notificado do acórdão proferido nestes autos em 14 de Novembro de 2018, que indeferiu as nulidades arguidas relativamente ao acórdão proferido em 20 de Junho de 2018, que negou provimento ao recurso por ele interposto da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, com fundamento em erro na forma do processo insusceptível de ser corrigido por convolação para a forma processual adequada – que seria a oposição à execução fiscal –, absolveu a Fazenda Pública da instância no processo de impugnação judicial por aquele deduzido na qualidade de responsável subsidiário, vem aos autos apresentar requerimento do seguinte teor:
«A………………….., recorrente nos autos supra referenciados e nos mesmos melhor identificado, tendo sido notificado do mui douto acórdão proferido em conferência e não se conformando com o mesmo vem, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º, n.º 1 e 284.º, ambos do CPPT, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (2.ª Secção Contencioso Tributário)».
2. Antes do mais, cumpre registar que o Recorrente não identifica de modo adequado o acórdão recorrido: é o acórdão proferido em 14 de Novembro de 2018 ou o acórdão proferido em 20 de Junho de 2018?
Seja como for, o recurso não pode ser admitido porque o Recorrente não cumpriu com a obrigação de «indicar com a necessária individualização os acórdãos anteriores que estejam em oposição com o acórdão recorrido», que é imposta pelo n.º 1 do art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) como elemento imprescindível do requerimento de interposição do recurso por oposição de acórdãos e com a cominação «de não ser admitido o recurso».
Não há, sequer, que notificar previamente o Recorrente para se pronunciar sobre a questão, uma vez que a cominação legal está prevista no próprio n.º 1 do art. 284.º do CPPT.
3. Em face do exposto, não admito o recurso.
Custas pelo Recorrente».

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2.2 DE DIREITO

2.2.1 DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO

O ora Reclamante veio requerer que recaia acórdão sobre o despacho por que o relator não admitiu o recurso que interpôs ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT. Considerando que no despacho ora reclamado se deixou dito «Antes do mais, cumpre registar que o Recorrente não identifica de modo adequado o acórdão recorrido: é o acórdão proferido em 14 de Novembro de 2018 ou o acórdão proferido em 20 de Junho de 2018?», entendeu que não podia ter-se decidido, como se decidiu, pela inadmissibilidade do recurso sem previamente notificá-lo a fim de esclarecer qual o acórdão recorrido.
Salvo o devido respeito, o Reclamante não atentou no fundamento por que o recurso não foi admitido ou, pelo menos, não o questiona na presente reclamação. É que o fundamento que levou à não admissão do recurso não foi a falta de identificação do acórdão recorrido; foi, isso sim e como claramente ficou dito no despacho reclamado, o não cumprimento da obrigação de «indicar com a necessária individualização os acórdãos anteriores que estejam em oposição com o acórdão recorrido», obrigação «imposta pelo n.º 1 do art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) como elemento imprescindível do requerimento de interposição do recurso por oposição de acórdãos».
Ora, quanto ao (único) fundamento que determinou a não admissão do recurso, o ora Reclamante nada diz, reduzindo toda a sua alegação a um putativo fundamento, qual seja a dúvida quanto ao acórdão recorrido.
É certo que no despacho reclamado se deixou dito «Antes do mais, cumpre registar que o Recorrente não identifica de modo adequado o acórdão recorrido: é o acórdão proferido em 14 de Novembro de 2018 ou o acórdão proferido em 20 de Junho de 2018?».
No entanto, há que tê-lo bem presente, esse considerando não determinou a não admissão do recurso, não assumiu relevância no sentido decisão proferida. Que assim é resulta do teor do próprio despacho. Esse considerando não constitui um fundamento da decisão (uma ratio decidendi), uma questão que tenha sido apreciada e decidida pela sentença, mas antes se limita a dar conta de uma irregularidade do requerimento da qual se não extraiu consequência alguma, ou seja, constitui aquilo que a jurisprudência caracteriza como um obiter dictum ou, de modo mais impressivo, como «uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que motivou e estruturou a decisão» (Cfr. os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 25 de Setembro de 2013, proferido no processo n.º 511/13, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5d5a0bbcf303621780257bf8005550d6;
- de 11 de Março de 2015, proferido no processo n.º 197/13, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/51f17429bfd53bf580257e0b004b4e3b;
- de 3 de Maio de 2018, proferido no processo n.º 328/18, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/594bf363046f2ee98025828700402b2a.).
O motivo por que o despacho decidiu pela inadmissibilidade do recurso foi, e foi apenas, o de não ter sido indicado o acórdão anterior em oposição com o acórdão recorrido, como o impõe o n.º 1 do art. 284.º do CPPT.
Essa decisão não enferma de nulidade ou erro de julgamento, motivo por que é de confirmar.

2.2.2 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Não pode ser admitido o recurso interposto ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT se, no respectivo requerimento, o recorrente, incumprindo a exigência feita pelo n.º 1 daquele artigo, não indica o acórdão anterior em oposição com o acórdão recorrido.
II - A não admissão do recurso não fica sequer dependente da prévia notificação do recorrente para se pronunciar sobre a questão, pois a cominação para aquela falta está expressamente prevista na lei.
III - O despacho do relator que não admitiu o recurso pode ser sindicado pela conferência, mas essa sindicância só pode referir-se aos fundamentos que determinaram a decisão e não aos considerandos que aí foram efectuados como obiter dictum, ou seja, como «uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que motivou e estruturou a decisão», na impressiva expressão que este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a usar.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em indeferir a reclamação.

Custas pelo Reclamante.


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Lisboa, 13 de Fevereiro de 2019. - Francisco Rothes (relator) - Aragão Seia - Dulce Neto.