Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0105/16
Data do Acordão:12/14/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P21248
Nº do Documento:SA2201612140105
Data de Entrada:01/29/2016
Recorrente:A......., S.A.
Recorrido 1:INST DE TURISMO DE PORTUGAL, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I - O Instituto do Turismo de Portugal, IP, recorrido nos presentes autos, veio requerer a reforma do acórdão de fls. 174/192 quanto custas, pedindo a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, com os seguintes fundamentos:

1. Por acórdão de fls. 214 a 226, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu dar provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, declarando competente, em razão da matéria, para conhecer da presente impugnação judicial, o Tribunal Tributário do Porto.
2. Mais condenou o recorrido nas custas, por ter contra-alegado.
3. Nos termos do disposto no artigo 2.º do Código do Procedimento e de Processo Tributário, são de aplicação supletiva o Código do Processo nos Tribunais Administrativos e o Código de Processo Civil.
4. Nos termos do artigo 616º n.º 1 do Código do Processo Civil a parte pode requerer a reforma quanto a custas.
5. O Recorrido recebeu juntamente com o acórdão uma notificação da secretaria do Tribunal para pagamento do remanescente da taxa de justiça.
6. O Recorrido procedeu, aquando da apresentação da contestação e do presente recurso, ao pagamento das correspondentes taxas de justiça (€1.632,00 cada), impondo-se, nos termos da primeira parte do nº 7 do artº 6.º do citado diploma e em cumprimento do disposto na anotação à Tabela I anexa ao Regulamento das Custas Processuais, o pagamento do respetivo-valor remanescente.
7. A presente ação tem o valor de €2.241.880,93, sendo apenas uma de entre as mais de 100 ações que correm termos nos Tribunais Tributários, todas propostas pelas concessionárias das zonas de jogo, muitas de valor superior ao da presente ação.
8. Recentemente o Supremo Tribunal Administrativo veio a entender, nos Acórdãos proferidos nos recursos de algumas dessas ações (recursos n.ºs 862/15, de 17.02.2016, 787/15 e 1386/15), que, considerando os termos como a autora e recorrente configura a relação material controvertida, os tribunais tributários eram materialmente competentes para decidir os litígios que lhes eram colocados, uma vez que nas impugnações a concessionária não faz alusão a normas de direito administrativo, não impugna cláusulas do contrato e invoca apenas violação de normas de direito tributário.
9. Assim como no Acórdão proferido no recurso n.º 105/16, desta 2ª secção de contencioso tributário (com origem no Processo TAF do Porto UO 4, nº 1332/15.9), se diz lapidarmente «Acresce sublinhar que, aferindo-se a competência em razão da matéria pelo pedido formulado na ação e pela natureza da relação jurídica que lhe dá corpo, tal como é configurada pelo autor, e sendo essa a questão do recurso, a deliberação tomada no despacho reclamado se enquadra, numa perspetiva lógica, nas premissas ali consideradas, não estando em causa, por ora, o julgamento do mérito da pretensão da impugnante.
Até porque, o facto de em sede de apreciação de mérito do pedido se vir, eventualmente, a afirmar entendimento diverso da impugnante/recorrente, não retira às questões por ela suscitadas, a natureza de questões fiscais».
10. As decisões do Supremo Tribunal Administrativo, incluindo a que agora se pede a reforma das custas, assentaram em decisões recentes anteriores que fizeram já jurisprudência uniforme nas secções de contencioso tributário.
11. O recorrido, inconformado, insurgiu-se contra as primeiras decisões, por entender que, sem prejuízo da manifesta competência dos tribunais tributários para decidir questões do imposto especial de jogo, os mesmos já não seriam competentes para decidir sobre a contrapartida anual, invocando para esse efeito (i) que a própria autora e recorrente havia proposto ação administrativa comum nas secções de contenciosos administrativo a pedir ao tribunal a modificação dessa contrapartida anual, ergo defendendo que não era um tributo e (ii) que as contrapartidas inicial e anual devidas nos contratos de concessão da exploração de zonas de jogo foram colocadas à concorrência nos concursos públicos que precederam as adjudicações, tendo já o Supremo Tribunal Administrativo (Secção de Contencioso Administrativo) considerado as mesmas como contra prestações contratuais.
12. Não tendo o Supremo Tribunal Administrativo, Secção de Contencioso Tributário, sido recetivo à argumentação expendida pelo recorrido e entendendo dever prevalecer, em qualquer caso, para efeitos de determinação da competência, a relação material controvertida nos termos em que a autora a configura, o recorrido aceitou essas decisões.
13. Salienta-se ainda, para efeitos de determinação das custas e da conduta processual, que as decisões até agora tomadas não são decisões de mérito, pelo que não implicaram diligências processuais, tais como a inquirição de testemunhas.
14. O recorrido adotou neste processo um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os tribunais, tendo inclusive, como acima referido arguido nulidades nos primeiros acórdãos proferidos com os quais não se conformou, mas não dos demais, conformando-se com os termos em que o Supremo Tribunal Administrativo entendeu decidir as questões.
15. Caso o recorrido seja obrigado a pagar o remanescente da taxa de justiça, face ao elevado valor das ações e ao facto de as mesmas estarem a ser devolvidas aos tribunais tributários de primeira instância por se considerar serem estes os competentes, o recorrido será fortemente penalizado, em sede de custas judiciais, sendo os valores a pagar desproporcionados face à complexidade das decisões tomadas (sem decisões de mérito e sem que impliquem a audição de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas) e à conduta processual das partes.
16. Assim, solicita o recorrido que, face à especificidade da situação, à complexidade da causa e à conduta processual assumida pela parte, este Tribunal faça uso da faculdade prevista na segunda parte do nº 7 do artº 6.º do Regulamento de Custas Processuais, dispensando, assim, o recorrido do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nesta parte, o acórdão quanto a custas, ao abrigo do artigo 616º nº 1, do Código de Processo Civil.
Termos em que, com os fundamentos acima expostos, se requer seja deferido o pedido de reforma quanto a custas do Acórdão proferido nestes autos, sendo o recorrido Instituto do Turismo de Portugal, I.P. dispensado do pagamento do remanescente da taxa de justiça, assim se garantindo uma tutela efetiva e o acesso à justiça».

II -Notificada deste requerimento a recorrente A…………., SA, nada disse.

III - Com dispensa de vistos, dada a simplicidade da questão a apreciar, cumpre decidir.
De harmonia com o disposto no nº 7 do art. 6º do RCP nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
Trata-se de uma dispensa excepcional que, podendo ser oficiosamente concedida (à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no n.º 7 do art.º 7.º), depende sempre de avaliação pelo juiz, pelo que haverá de ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de ser omitida, mediante requerimento de reforma dessa decisão (Conforme admite Salvador da Costa, RCP anotado, 5.ª ed., 2013, em anotação ao preceito).

No âmbito do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem-se entendido que cabe a este STA apreciá-lo tão só no que respeita ao recurso (processo autónomo, na acepção do nº 2 do art. 1º do RCP) que a ele foi dirigida (Neste sentido, Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 15.10.2014, recurso 1435/12, in www.dgsi.pt.).
Por outro lado, e quanto à complexidade da causa haverá que ter em conta os parâmetros estabelecidos pelo disposto no nº 7 do art. 537º do actual CPC (art. 447º-A do CPC 1961).
De acordo com este normativo, para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as acções e os procedimentos cautelares que: (a) contenham articulados ou alegações prolixas; (b) digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou (c) impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.
As questões de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica serão, por regra, as que envolvem intensa especificidade no âmbito da ciência jurídica e grande exigência de formação jurídica de quem tem que decidir. Já as questões jurídicas de âmbito muito diverso são as que suscitam a aplicação aos factos de normas jurídicas de institutos particularmente diferenciados (neste sentido, Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2012, pág.85).
Em síntese poderemos dizer que a dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.
No caso subjudice verificam-se esses requisitos.
Por um lado a conduta processual das partes no recurso não merece censura que obste a essa dispensa.
Por outro lado, pese embora a tramitação processual tenha sido, no essencial, uma tramitação regular própria dos recursos jurisdicionais, no caso concreto dos autos, o recurso teve como objecto a questão a de saber qual a jurisdição competente para conhecer a impugnação judicial deduzida contra a liquidação operada pelo Instituto de Turismo de Portugal, I.P. relativamente à liquidação da "contrapartida anual relativa ao ano de 2014", referente à concessão da zona de jogo da Póvoa do Varzim, questão que essa que não era nova e fora já objecto de jurisprudência uniforme e reiterada desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal, a qual condicionou a decisão proferida nos presentes autos.

Em face do exposto, a questão tratada no presente recurso pode ser considerada de complexidade inferior à comum, porque assente em anterior caso julgado, justificando-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça na medida em que o montante da taxa devida se mostra desproporcionado em face do concreto serviço prestado.
Neste contexto, entendemos que estão preenchidos os requisitos exigidos pelo mencionado nº 7 do art. 6º do RCP, para que possa dispensar-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça.

IV. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em deferir o pedido de reforma, quanto a custas, dispensando-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Lisboa, 14 de Dezembro de 2016. – Pedro Delgado (relator) – Fonseca Carvalho – Isabel Marques da Silva.