Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01638/13
Data do Acordão:05/28/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:NULIDADE DE ACÓRDÃO
OBSCURIDADE E AMBIGUIDADE
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário:I - Foi intenção do legislador na Reforma do Processo Civil operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho eliminar o incidente de aclaração ou esclarecimento de pretensas e, nas mais das vezes, ficcionadas e inexistentes obscuridades ou ambiguidades da decisão reclamada – apenas se consentindo ao interessado arguir, pelo meio próprio, a nulidade da sentença que seja efetivamente ininteligível.
II - Tal nulidade não se verifica se a decisão, interpretada à luz da respectiva fundamentação, é inteira e efectivamente compreensível.
Nº Convencional:JSTA000P17572
Nº do Documento:SA22014052801638
Data de Entrada:10/24/2013
Recorrente:A............
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA, notificado do nosso Acórdão do passado dia 6 de Março, proferido nos presentes autos, vem, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, arguir a nulidade do douto acórdão de fls. 402, por a decisão perfilhada no mesmo se revelar ambígua e obscura, em termos que a tornam ininteligível, alegando a tal propósito que:
«Como se depreende do referido acórdão, a questão que se impunha ao tribunal decidir consistia em saber quem é responsável pelo pagamento das custas da oposição, à qual foi posto termo por inutilidade superveniente da lide, decorrente da extinção da execução fiscal, na sequência do pagamento da dívida exequenda por parte da executada originária.
No douto acórdão de fls. 403 entendeu-se não poder o Recorrente/oponente ser responsabilizado pelo seu pagamento, mas sim a executada originária.
E na parte decisória do acórdão, revogou-se a sentença recorrida, que tinha decidido em sentido contrário, determinando-se a substituição do segmento daquela sentença nessa parte pelo seguinte: «Sem custas, pois estas foram ou deviam ter sido consideradas para efeitos de extinção da execução».
Ora, uma coisa parece resultar clara do acórdão: que o Recorrente/oponente não é responsável pelas custas da oposição. O que não resulta claro da decisão é se deve ser alguém responsabilizado pelas custas e no caso afirmativo quem. Na verdade ao juiz ou ao tribunal impõe-se decidir as questões que lhe sejam colocadas pelas partes, não podendo deixar a solução numa espécie de limbo “non liquet”.
Ora, o segmento da decisão “sem custas” parece apontar que no caso dos autos não há lugar a custas. Mas o segmento seguinte: “pois estas foram ou deviam ter sido consideradas para efeitos de extinção da execução” aponta no sentido contrário, mas em duas vertentes. Ou seja, que há lugar a custas, devendo as mesmas ser imputadas na conta a pagar pela executada originária; Ou que embora haja lugar a custas, a sua liquidação está precludida, pois deviam ter sido atendidas aquando da liquidação da responsabilidade da executada originária.
Ora, na decisão sobre a questão colocada pelo recorrente/oponente não deve ficar apenas claro se o mesmo é responsável pelas custas, como se há ou não lugar a custas e no caso afirmativo que é responsável pelas mesmas. Só assim a decisão produz os seus efeitos úteis na questão a dirimir (designadamente para efeitos de as partes que liquidaram a taxa de justiça puderem reclamar a mesma ao responsável pelo seu pagamento).
Afigura-se-nos, assim, que o segmento da decisão exarada no douto acórdão de fls. 403, padece do vício de nulidade, por se mostrar ambíguo e obscuro, não se descortinando do mesmo se há ou não responsabilidade pelas custas e no caso afirmativo quem é o responsável, motivo pelo qual deve o acórdão ser revogado nessa parte e substituído por outro que esclareça os termos da decisão quanto a custas.».

2 – Com dispensa dos vistos, dada a simplicidade da questão, vêm os autos à Conferência.

3 - Cumpre apreciar e decidir.
Alega o Ministério Público que é nulo o Acórdão proferido nos presentes autos porquanto o seu segmento decisório – “Sem custas, pois que estas foram ou deviam ter sido consideradas para efeitos de extinção da execução” – se mostra ambíguo e obscuro, não se descortinando do mesmo se há ou não responsabilidade pelas custas e no caso afirmativo quem é o responsável, motivo pelo qual deve o acórdão ser revogado nessa parte e substituído por outro que esclareça os termos da decisão quanto a custas.
Dispõe a parte final da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do (novo) Código de Processo Civil que: É nula a sentença quando: para além do mais, (…) ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Trata-se de uma causa de nulidade da sentença não prevista na Lei Processual Civil precedente, que admitia, ao invés, a possibilidade, perante obscuridades ou ambiguidades da decisão, de dedução de pedido de esclarecimento ou aclaração do decidido.
Na Exposição de Motivos da Reforma (in Novo Código de Processo Civil, Porto Editora, 2013, p. 38) esclarece-se que foi intenção do legislador na Reforma do Processo Civil operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho eliminar o incidente de aclaração ou esclarecimento de pretensas e, nas mais das vezes, ficcionadas e inexistentes obscuridades ou ambiguidades da decisão reclamada – apenas se consentindo ao interessado arguir, pelo meio próprio, a nulidade da sentença que seja efetivamente ininteligível.
Uma decisão ininteligível é uma decisão incompreensível, inacessível ao intelecto, o que manifestamente não é o caso da decisão cuja nulidade vem arguida.
Dela resulta claro, parece (inclusive ao arguente), que, contrariamente ao decidido em 1.ª instância, o oponente não é responsável pelas custas da oposição extinta em razão da inutilidade superveniente da lide motivada pelo pagamento do devedor originário, como por elas não é responsável a Fazenda Pública, daí que no segmento decisório do Acórdão proferido nos presentes autos e cuja nulidade vem arguida se tenha consignado: “Sem custas, (…)”.
O segundo segmento decisório questionado, - “(…), pois estas foram ou deviam ter sido consideradas para efeitos de extinção da execução” -, alegadamente em contradição com o primeiro e em duas vertentes, poderá suscitar algumas dúvidas interpretativas se lido isoladamente, ou seja, abstraindo da fundamentação que antecede o segmento decisório, mas parece-nos que tais dúvidas interpretativas facilmente se dissipam lendo a longa transcrição de JORGE LOPES DE SOUSA a que se procede no Acórdão e os três parágrafos do acórdão que a seguem, do seguinte teor:
«Resulta do exposto que no cálculo do pagamento a satisfazer pelo devedor originário para extinguir a execução devem ser consideradas as custas devidas pela oposição deduzida e que se torna superveniente impossível com o pagamento integral da dívida exequenda, aí se incluindo os juros e as custas, da execução e das oposições a esta deduzida.
Daí que, na decisão judicial que declare a extinção da instância de oposição por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide em razão do pagamento da dívida exequenda comunicado pelo Serviço de Finanças não haverá, em tais casos, lugar à condenação em custas do oponente, pois estas se devem encontrar já pagas.
Por esta razão, não pode manter-se o decidido na sentença recorrida quanto à responsabilidade do oponente pelas custas da oposição, sendo de a julgar “sem custas”, pois que estas se encontram, ou deveriam encontrar, pagas pelo devedor originário.» (sublinhados nossos).

Resulta, pois claro, que as custas da oposição extinta por inutilidade superveniente da lide ou foram já consideradas e pagas pelo devedor originário aquando da extinção da execução por pagamento voluntário, ou se o não foram, deveriam tê-lo sido, daí que se no Acórdão se tenha consignado, no provimento do recurso, a revogação da sentença recorrida no segmento impugnado e a sua substituição por “Sem custas, pois que estas foram ou deviam ter sido consideradas para efeitos de extinção da execução”.

Improcede, pois, a arguida nulidade do Acórdão.
- Decisão -
4 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em indeferir a arguida nulidade.

Sem custas.

Lisboa, 28 de Maio de 2014. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Dulce Neto – Casimiro Gonçalves.