Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01462/23.3BELSB
Data do Acordão:03/21/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:TÉCNICO SUPERIOR
TÉCNICO DE REINSERÇÃO SOCIAL
CARREIRAS
COMPLEMENTO DE REMUNERAÇÃO
SUBSÍDIO
Sumário:O suplemento do ónus de função é devido a todos os cargos e categorias enunciados no artigo 67.º, n.º 6, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 que preencham os pressupostos legais para o auferir, ou seja, sempre que exerçam funções desenvolvidas para a prossecução das atribuições previstas nas alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º do mesmo diploma legal [hoje previstas nas alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 215/2012].
Nº Convencional:JSTA000P32025
Nº do Documento:SA12024032101462/23
Recorrente:DIRECÇÃO GERAL DE REINSERÇÃO E DOS SERVIÇOS PRISIONAIS
Recorrido 1:SINDGRSP – SINDICATO DOS TÉCNICOS DA DIRECÇÃO-GERAL DE REINSERÇÃO E SERVIÇOS PRISIONAIS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

I. RELATÓRIO

1. O SinDGRSPSindicato dos Técnicos da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais instaurou acção administrativa urgente de contencioso dos procedimentos de massa contra a Direcção-Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais (DGRSP), visando a anulação do acto administrativo de abertura do concurso com vista à constituição de reserva de recrutamento para a carreira e categoria de técnico superior, do mapa de pessoal da DGRSP, publicado em Diário da República em 27/07/2021, pelo Aviso n.º 14109/2021, com a Ref.ª DGRSP 02/TS/2021, por considerar que o procedimento concursal não cumpre a legalidade no que concerne à concessão aos concorrentes a Técnicos Superiores de suplementos remuneratórios, subsídio de risco e ónus de função.

2. Por sentença de 01.09.2023, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou procedente a acção, por considerar que o ponto 13, b), do aviso do concurso viola o artigo 67.º, n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho.

3. Inconformada, a Direcção-Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul que, por Acórdão de 12.12.2023 decidiu negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

4. É dessa decisão que a Direcção-Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais veio, nos termos do disposto nos artigos 150.º do CPTA, interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, o qual foi admitido por acórdão de 08.02.2024.

5. Nas alegações que apresentou perante este Supremo Tribunal Administrativo a Direcção-Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais formulou as seguintes conclusões:

A) O presente recurso tem como objeto o Acórdão do Tribunal Administrativo Sul (TCA Sul) que negou provimento ao recurso interposto pela ora Recorrente (DGRSP) e assim manteve a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC Lisboa), que anulou o ato impugnado, entenda-se o aviso de abertura do procedimento concursal com vista à constituição de reserva de recrutamento para a categoria de técnico superior do mapa de pessoal da DGRSP, porquanto considerou que o ponto 13, b) do aviso n.º 14109/2021, com referência DGRSP n.º 02/TS/2021, publicado no DR, II série, de 27.07.2021, era ilegal por violar o artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho.

B) Os requisitos da sua admissibilidade estão elencados no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, designadamente, é admissível recurso de revista quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a sua admissão seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

C) O Acórdão do TCA Sul recorrido, no seu ponto II.2, considerou que uma adequada interpretação do artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, determina que o suplemento em questão apenas pode ser atribuído a Técnicos Superiores de Reinserção Social (TSRS) e de Reeducação (TSR), pelo ónus do exercício das funções desenvolvidas para a prossecução daquelas atribuições. Ao decidir como decidiu, incorreu a decisão recorrida em erro de julgamento, por errada subsunção dos factos ao direito aplicável.

D) Tal entendimento, sufragado pelo TCA Sul e o pelo Tribunal de 1.ª instância não tem apoio no quadro legal, nem corresponde à opção do legislador, pelo que configura erro manifesto de direito que urge, através da presente revista, ultrapassar e corrigir.

E) Com efeito, adotar como certa e correta a interpretação do artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, efetuada pelo Tribunal de 1ª Instância, e agora pelo TCA Sul, traduzir-se-ia objetivamente na criação de uma espécie de suplemento de carreira para os TSRS e TSR, e não, como efetivamente é, um suplemento de ónus de função.

F) Face ao exposto, é forçoso concluir que a posição assumida pelo TCA Sul assenta o seu argumentário falacioso de que somente os TSRS e TSR devem auferir o suplemento de ónus de função, sob pena de ao atribuir a outros Técnicos Superiores, redundaria num esvaziamento do conteúdo funcional das carreiras de TSRS e TSR, não se enquadra no espetro das soluções jurídicas plausíveis para as questões sobre que se debruçou, evidenciando que a pronúncia emitida no Douto Acórdão recorrido esteja inquinada de erro grosseiro, pelo que se justifica a revogação do Acórdão ora recorrido e da decisão do Tribunal de 1ª instância, mantendo-se em vigor o ato impugnado, em toda a sua plenitude.

G) Pelo que, no caso em apreço, se justifica a intervenção desse Venerando Tribunal para uma melhor aplicação do direito e para reparar um erro interpretativo do TCA Sul, in casu, do artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, determinando que outros técnicos superiores que não os TSRS e os TSR, que foram afetos às diferentes unidades orgânicas e cujas funções efetivamente desenvolvidas e da sua conexão com as atribuições das alíneas b) a f) do artigo 3.º do referido diploma, que agora se encontram nas atribuições constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da LODGRSP (Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro) aufiram, como é de direito, plenamente, o suplemento de ónus de função, o que já acontece desde a sua consagração em 2001.

H) A relevância jurídica e social fundamental do caso em análise não se confina aos estritos limites do caso concreto, tendo potencialidade para abranger muitos outros casos, e reclama a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição para melhor aplicação do Direito, de molde a garantir a mais correta e uniforme aplicação do Direito e a maximizar a capacidade de previsibilidade das decisões administrativas, tendo efetiva potencialidade para abranger muitos outros casos, em matéria tão importante como a questão remuneratória, pois está em causa o recebimento dum suplemento pelo ónus de função, numa miríade de unidades orgânicas, em que coabitam TS de regime geral e TSRS.

I) Estamos pois, a falar num número relevante, superior a 150 TS da carreira geral em exercício de funções nas unidades orgânicas referenciadas no aviso de abertura do concurso aqui em análise, para além dos mais de 100 técnicos superiores da carreira geral, que exercem funções na DGRSP, por força deste procedimento concursal, pelo que é manifesto que a interpretação do artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho efetuada pelo TCA Sul, extravasa em muito os opositores do referenciado procedimento concursal e poderá afetar todos os trabalhadores de diferentes carreiras, designadamente TS da carreira geral, que exercem funções numa miríade de unidades orgânicas da DGRSP, e que auferem este ónus desde a sua criação, em 2001.

J) As questões revelam-se de complexidade técnica e de relevante interesse jurídico, especialmente pela grande probabilidade de a situação se colocar em inúmeros novos processos, designadamente decorrente de violação do princípio para trabalho igual salário igual, na vertente da igualdade de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade, e a proibição de diferenciação arbitrária, vide artigo 59.º n.º 1, alínea a) e artigo 13.º, ambos da CRP.

K) Razões pelas quais se demonstra estarem preenchidos os pressupostos legais previstos no artigo 150.º do CPTA, que permitem e justificam a admissão do recurso interposto pela Recorrente, justificando-se, in casu, a quebra da regra da excecionalidade e a admissão da presente Revista.

L) Com efeito, no caso em análise estamos na presença de procedimento concursal para constituição de reserva de recrutamento na carreira e categoria de técnico superior, do mapa de pessoal da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, a afetar aos Serviços Centrais e Serviços Desconcentrados, na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.

M) Destinando-se o procedimento concursal à ocupação de postos de trabalho nos Serviços Centrais, Estabelecimentos Prisionais, Centros Educativos, Delegações Regionais de Reinserção (Norte, Centro, Sul e ilhas), Equipas de Reinserção Social e Equipas de Vigilância Eletrónica, conforme consta do ponto 5 do aviso de abertura.

N) As carreiras de TSRS e TSR são carreiras gerais não revistas, por não terem integrado o elenco das carreiras constantes do Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de julho, diploma que identifica a extinção das carreiras e categorias, cujos trabalhadores transitaram para as carreiras gerais, identificando ainda as carreiras e categorias subsistentes, por impossibilidade de se efetuar a transição dos trabalhadores nelas integrados.

O) Não são, ao contrário do decidido pelo TCA Sul e pelo Tribunal de 1ª Instância, carreiras especiais. A decisão recorrida, ao qualificar as carreiras de TSRS e de TSR como carreiras especiais errou na aplicação do direito.

P) A atribuição do suplemento de ónus de função é regulada pelo disposto no artigo 67.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, diploma que aprovou a orgânica do então Instituto de Reinserção Social, fixando as condições de atribuição do referido suplemento, previsto no artigo 89.º do Decreto-Lei n.º 204/83, regulamentado à luz do disposto no Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho.

Q) A atribuição de tal suplemento justifica-se, conforme referido no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, pelo exercício de funções de assessoria e decisões judiciais, execução de penas e medidas cautelares, institucionais e não institucionais, o contacto permanente com delinquentes, jovens e adultos.

R) O regime do suplemento de ónus de função previsto no artigo 67.º, n.º 6, inserto no Capítulo V do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, manteve-se em vigor na DGRSP, após o processo de fusão entre a ex-DGRS e a ex-DGSP, conforme artigo 36.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro, diploma que aprovou a orgânica da atual DGRSP.

S) Da literalidade do artigo 67.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, resulta claro que a atribuição do suplemento de ónus de função pelo exercício das funções desenvolvidas para a prossecução das atribuições previstas nas alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º é reconhecida também a técnicos superiores e trabalhadores integrados em outras carreiras, afetos a centros educativos ou à utilização de meios de vigilância, e não apenas aos técnicos superiores de reinserção social.

T) Bem como a outros técnicos superiores e trabalhadores integrados em outras carreiras, afetos a equipas de reinserção social ou equipamentos residenciais e outro pessoal que exerça funções em centros educativos.

U) O artigo 67.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho manteve-se em vigor na atual DGRSP, por força do disposto no artigo 36.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro, sendo assim inquestionável que os técnicos superiores afetos a Centros Educativos e Equipas de Vigilância Eletrónica têm direito ao recebimento do suplemento pelo ónus de exercício de funções.

V) Ou seja, ao contrário da interpretação efetuada pelo TCA Sul no Acórdão Recorrido, o suplemento de ónus de função não depende das carreiras a que pertencem os trabalhadores em causa, mas, outrossim, das funções efetivamente desenvolvidas e da sua conexão com as atribuições das alíneas b) a f) do artigo 3.º do referido diploma, que agora se encontram nas atribuições constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da LODGRSP (Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro).

X) Assim, reafirma-se que, ao contrário do mencionado no Acórdão Recorrido do TCA Sul, não é devido apenas aos TSRS e TSR, mas igualmente a outros TS da Carreira geral, tal como de forma cristalina é referida no artigo 67.º n.º 6, b) do Decreto-Lei nº 204-A/2001, de 26 de julho.

Z) E, por outro lado, também não é verdade que tais funções, como refere o Acórdão recorrido do TCA Sul, sejam exclusivas das carreiras dos TSRS por referência as atribuições do então Instituto e agora descritas e constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da LODGRSP (Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro).

AA) Com o fundamento de que todas estas unidades orgânicas prosseguem as atribuições constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da Lei Orgânica da DGRSP, correspondentes às atribuições constantes das alíneas b) a f) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, por despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, datado de 23/03/2022, que homologou o Parecer n.º 2/2021, de 14/02/2022, elaborado pela Senhora Auditora Jurídica do Ministério da Justiça, acerca da harmonização do suplemento de ónus de função aos trabalhadores da DGRSP, concretamente aos serviços centrais de suporte à missão e atividade da DGRSP, foi reconhecido, por despacho do Senhor Diretor-Geral da DGRSP, datado de 28/03/2022, o direito ao recebimento do suplemento de ónus de função previsto no artigo 67.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, aos trabalhadores dos serviços centrais da DGRSP que, embora a ele tendo direito, ainda não o recebiam.

BB) Seria contrário ao quadro legal em vigor e ao arrepio do pretendido pelo legislador atribuir ónus de função exclusivamente aos trabalhadores TSRS e TSR sob o argumento, que não corresponde à verdade, de que pertencem a uma carreira especial e que só a estes cabe assegurar o cumprimento das atribuições constantes das alíneas b) a f) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, e não à carreira geral de Técnico Superior, o que, refirma-se é falso.

CC) Todos os trabalhadores das unidades orgânicas a quem foi reconhecido o direito ao recebimento do suplemento de ónus de função, sejam TSR, TSR, outros TS ou Assistentes Técnicos prosseguem, no âmbito das funções que lhes estão adstritas, o cumprimento das atribuições do Instituto constantes das alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, agora constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da Lei Orgânica da DGRSP, ao prosseguir as competências da unidade orgânica onde estão a exercer funções.

DD) É assim, manifesto o erro de julgamento do Tribunal de 1.ª Instância e do TCA Sul, ao considerar, sem sustentação, que somente as carreiras de regime geral não revistas de TSRS e TSR, que, erradamente, qualificou de carreiras especiais, prosseguem as atribuições constantes das alíneas b) a f) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, agora constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da Lei Orgânica da DGRSP.

EE) Todos os trabalhadores das unidades orgânicas a que se destina o procedimento concursal cujo aviso de abertura foi impugnado pelo Recorrido, independentemente das carreiras, sejam TSRS, TSR, ou outros TS, em que se inserem, prosseguem aquelas competências.

FF) Do ponto 7 do aviso do procedimento concursal impugnado decorre que o mesmo se destina à ocupação de postos de trabalho com o conteúdo funcional constantes do anexo referido no n.º 2 do artigo 88.º da LTFP, na carreira e categoria de técnico superior.

GG) Não correspondendo à verdade que os aprovados no procedimento concursal fossem desempenhar funções de TSRS ou TSR, não se pode retirar, ainda que de forma ténue, que o facto de auferirem suplemento de ónus de função, tal se traduziria, como refere o Acórdão Recorrido, num esvaziamento do conteúdo funcional das carreiras de TSRS e TSR.

HH) O Douto Acórdão Recorrido erroneamente considerou, na sua linha de fundamentação, que as funções desenvolvidas para a prossecução das atribuições previstas nas alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, que, no seu dizer, justificam a atribuição do suplemento de ónus de função, fazem parte do conteúdo funcional da carreira de TSRS e TSRS, conferindo-lhes assim o direito ao recebimento de tal suplemento.

II) Desde logo em relação à carreira de TSR, que foi criada pelo Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de setembro, no âmbito da então Direção-Geral dos Serviços Prisionais, auferindo os referidos técnicos subsídio de risco, ao abrigo do disposto nos artigos 1.º e 2.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Regulamentar n.º 38/82, de 7 de julho, conjugado com o artigo 36.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro, e considerando a regra da proibição da sobreposição do pagamento do suplementos remuneratórios constante do artigo 37.º, n.º 2 deste último diploma legal.

JJ) Estão assim os TSR abrangidos pela alínea a) do ponto 13 do aviso de abertura do procedimento concursal, e não pela alínea b), como erroneamente considera a sentença recorrida, por errado enquadramento legal, razões pelas quais, ao julgar como julgou, e pela fundamentação expressa na decisão recorrida, incorreu a mesma em erro de julgamento da matéria de direito, por incorreta interpretação e desconsideração dos preceitos legais aplicáveis. A carreira de TSRS é uma carreira não revista, porquanto não integrou o elenco das carreiras constantes do Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de julho, diploma que identifica a extinção das carreiras e categorias, cujos trabalhadores nelas integrados transitaram para as carreiras gerais, identificando “ainda, as carreiras e categorias que subsistem por impossibilidade de se efetuar a transição dos trabalhadores nelas integrados”.

KK) Ou seja, ao contrário do referido na sentença recorrida e confirmada no Acórdão Recorrido, os TSRS e os TSR não são carreiras especiais, mas antes carreiras gerais não revistas. O que existe é a densificação do conteúdo funcional, mas sem alterar em nada o facto de serem uma carreira geral, pelo que não se compreende, porque não é apoiado no quadro legal em vigor e se traduz, na realidade, na criação de uma espécie de suplemento de carreira para os TSRS e TSR, a afirmação do Acórdão Recorrido de que o direito de outros técnicos superiores auferirem o suplemento de ónus de função redundaria num esvaziamento do conteúdo funcional das carreiras de TSRS e TSR.

LL) Tal entendimento sufragado pelo TCA Sul e o pelo Tribunal de 1.ª Instância não tem apoio no quadro legal, nem corresponde à opção do legislador pelo que configura erro manifesto de direito, que urge, através da presente Revista, ultrapassar e corrigir.

MM) Em suma, desde 2001, com a entrada em vigor do Decreto Lei n.º 204-A/2001, sem qualquer divergência interpretativa, os trabalhadores das diferentes carreiras e dirigentes em exercício de funções efetivas, num conjunto de unidade orgânicas do então IRS, depois DGRS e atualmente DGRSP auferem, com o necessário enquadramento geral e que ao longo do tempo, por diferentes formas, seja em procedimentos concursais, seja por mobilidade ingressaram na DGRSP, e foram afetos às diferentes unidades orgânicas e cujas funções efetivamente desenvolvidas e da sua conexão com as atribuições das alíneas b a f) do artigo 3.º do referido diploma, que agora se encontram nas atribuições constantes das alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º da LODGRSP (Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro), auferem, com toda a justiça, o suplemento de ónus de função.

NN) Ao contrário do referido pelo Acórdão Recorrido do TCA Sul, não é a carreira a que pertencem os trabalhadores, mas as funções que desempenham, que deve ser considerada para efeitos de atribuição do suplemento de ónus de função, pelo que a interpretação efetuada de limitar e restringir o seu recebimento ao TSRS e TSR não tem qualquer apego no disposto no artigo 67.º n.º 6, b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, que incumbe agora corrigir.

OO) Razões pelas quais, ao julgar como julgou, e pela fundamentação expressa na decisão recorrida, incorreu o TCA Sul em erro de julgamento da matéria de direito, por incorreta interpretação e desconsideração dos preceitos legais aplicáveis. Trata-se, pois, de uma questão de interpretação e aplicação do quadro jurídico em que aquela norma se insere, ainda que a posteriori, consubstanciando a necessidade de uma correta aplicação do Direito.

PP) Sendo que, salvo o devido respeito e melhor opinião, a aplicação do preceito no sentido em que o faz o douto Acórdão Recorrido, constitui uma violação da lei substantiva que regula o estatuto remuneratório do pessoal da DGRSP, solução esta que seria desrazoável, não correspondo à que o legislador consagrou.

QQ) Pelo que, o Recurso agora interposto é nestes termos admissível ao abrigo do disposto no n.º 1, parte final, do artigo 150.º do CPTA, bem como no n.º 2 do mesmo preceito. Com efeito, trata-se de matéria controvertida de Direito, assente na técnica interpretativa, nada se discutindo sobre matéria de facto, e cuja solução poderá afetar um conjunto de casos semelhantes relativos a um direito fundamental dos trabalhadores da DGRSP (o direito à remuneração do seu trabalho).

Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas. requer-se:

i) A admissão do presente recurso de Revista;

ii) Seja concedido provimento ao Recurso, anulando-se Acórdão Recorrido e a decisão do Tribunal de 1.ª Instância, mantendo-se em vigor na ordem jurídica o ato impugnado em toda a sua plenitude, designadamente o disposto no ponto 13, b) do aviso n.º 14109/2021, com referência DGRSP n.º 02/TS/2021, publicado no DR, II série, de 27.07.2021.

ASSIM SE FAZENDO A ACOSTUMADA JUSTIÇA!

6. O Sindicato dos Técnicos da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais veio juntar contra-alegações, que culminaram nas seguintes conclusões:

I. O artigo 143.º, n.º 1 do CPTA prevê que, regra geral, o recurso tem efeito suspensivo da decisão proferida.

II. No entanto, o n.º 2 do mesmo artigo prevê diversas exceções a esta regra geral nomeadamente quanto a processos de natureza urgente.

III. Ora, apesar de não se encontrar expressamente consagrado no n.º 2 do artigo 143.º do CPTA, a verdade é que o contencioso dos procedimentos de massa, que se nos coloca nos presentes autos, apresenta uma tramitação em tudo semelhante à do contencioso pré-contratual, esse sim englobado nas exceções ao n.º 1 do artigo.

IV. Existe, assim, uma lacuna legal sobre o efeito suspensivo automático do ato impugnado neste tipo de contencioso, atento o impacto que pode resultar da procedência dessa impugnação.

V. Por outro lado, estamos perante um recurso, ainda que ordinário, de natureza excecional, uma vez que a sentença colocada em causa pela Recorrente manteve-se inalterada por dupla conforme.

VI. Sendo esse o caso, somos do entendimento que o n.º 2 do artigo 143.º do CPTA deve, analogicamente, ser aplicado ao presente caso.

VII. Consequentemente, deve ser atribuído ao recurso efeito meramente devolutivo.

VIII. Sem prescindir, e por cautela, como adiante se demonstrará, o presente recurso não cumpre os critérios de admissibilidade.

IX. Tais critérios encontram-se legalmente restringidos, mormente em face de situações de dupla conforme, como é o caso sub judice.

X. Sendo esse o caso, não pode ser concedida à Recorrente a vantagem de, por meios dilatórios de apresentação de recursos, ver o cumprimento suspenso até decisão do Supremo Tribunal Administrativo quando, por entendimento idêntico dos Tribunais a quo, foi o concurso anulado e a Recorrente condenada a abster-se de pagar aos TS de Carreira Geral o suplemento de ónus de função.

XI. Assim, ao abrigo do disposto no 143.º, n.º 3 do CPTA, por colocar seriamente em causa o cumprimento estrito da lei e da imagem perpassada dos tribunais e da justiça – mais uma vez se frisa a dupla conforme resultante das decisões dos Tribunais a quo –,

XII. Além de colocar seriamente em causa o adiante explanado princípio da igualdade na sua vertente positiva, por deturpação das funções exercidas pelos representados do Recorrido,

XIII. Deve, sempre e em todo o caso, ser atribuído ao presente recurso ser efeito meramente devolutivo.

XIV. Quanto à admissibilidade do recurso, entendemos que o presente viola patentemente o disposto no artigo 150.º do CPTA.

XV. A Recorrente age como se o resultado da demanda, iniciada pelo Recorrido há já muitos anos, mas com desenvolvimento judicial desde novembro de 2021, de uma absoluta surpresa se tratasse.

XVI. O Recorrido tentou, durante anos, apelar junto da Recorrente no sentido de fazer cessar a prática indevida e ilegal de pagamento do suplemento de ónus de função em discussão nos presentes autos a todos os Técnicos Superiores de Carreira Geral (doravante TS), por oposição aos Técnicos Superiores de Reinserção Social (doravante TSRS) e Técnicos Superiores de Reeducação (doravante TSR), associados do Recorrido,

XVII. Fê-lo através de contactos com o Diretor, de interpelações extrajudiciais (as mais recentes efetuadas em julho de 2021) e, finalmente, de ações judiciais (a dos presentes autos e a que a antecedeu, com o n.º 2552/21.2BEPRT, a qual corre termos na Unidade Orgânica 3 do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, e da qual a Recorrente foi citada em 22 de novembro de 2021).

XVIII. Somente quando o Recorrido sucedeu na sua demanda, impugnando dois concursos e sucedendo, por ora, numa dessas impugnações – a que nos traz aos presentes autos – e perante uma confirmação, pelo Tribunal Central Administrativo Sul, da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a Recorrente cogitou estar perante uma questão de elevada “relevância jurídica e social”.

XIX. O caso concreto, não revela uma situação de onde emergem graves “dificuldades interpretativas derivadas da densidade jurídica existente e/ou da diversidade de regimes jurídicos em discussão”.

XX. A lei é bastante clara e o legislador foi expresso e elucidativo nos preâmbulos legais das normais em discussão nos presentes autos.

XXI. A Recorrente pretende, além de agir em notória litigância de má-fé, a qual não pode ser desconsiderada por Vossas Excelências, obter uma decisão que corrobore a sua interpretação já não extensiva, mas abusiva e ab-rogativa daquela que constituiu o espírito do legislador.

XXII. Ademais, apesar de a decisão afetar um elevado número de pessoas, ainda que não envolvidas diretamente no litígio, tal é totalmente imputável à Recorrente, que, em face da impugnação do Recorrido, em momento algum optou por suspender o concurso anulado.

XXIII. Resulta de jurisprudência recente deste Digníssimo Tribunal que “II - Não é admissível a revista deduzida ao abrigo da necessidade de uma melhor aplicação do direito, se é manifesto que não se verifica o erro de julgamento que o recorrente assaca ao acórdão do tribunal central administrativo (…)” (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 13/12/2023, Proc. n.º 01118/15.0BELRS, relatado pelo Conselheiro Francisco Rothes, disponível em www.dgsi.pt)

XXIV. Em face do exposto, jamais poderão ser tidos por cumpridos os requisitos de admissibilidade do recurso proposto.

XXV. Sem prescindir, e por cautela, a Recorrente não mais logra ocultar que os TS exercem as funções dos TSRS e dos TSR.

XXVI. A argumentação da Recorrente, que até à data, se escudava numa “interpretação extensiva” dos normativos legais para justificar a aplicação do suplemento aos TS de carreira geral, desta feita, ao ver-se depauperada de argumentos, eis que demonstra a realidade dos atos praticados no seu seio!

XXVII. Note-se que a atividade desenvolvida pelos TSRS e TSR tem carácter operativo e não meramente de apoio, como deve ser a prestada pelos TS de carreira geral.

XXVIII. A Recorrente ignora a vontade clara do legislador em não integrar estas carreiras no regime geral e olvida propositadamente o conteúdo expresso dos artigos 95.º e 106.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, o qual refere ser “impossível a transição dos trabalhadores nos termos dos artigos 95.º a 101.º em virtude do grau de complexidade funcional e, ou, do conteúdo funcional da carreira em que se encontram integrados ou da categoria de que são titulares”.

XXIX. O legislador expressa o seu espírito no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de julho: “Subsiste, contudo, um conjunto de situações em que se revelou impossível a transição dos respectivos trabalhadores para as novas carreiras, as quais se encontram abrangidas pelo disposto no artigo 106.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e se identificam num dos anexos do presente diploma.”

XXX. Por outro lado, o n.º 5 do artigo 8.º do Decreto-Lei 121/2008, dispõe que “Nos termos do n.º 5 do artigo 106.º da lei [Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro], os órgãos ou serviços não podem recrutar ou recorrer a mobilidade geral de trabalhadores não integrados nas carreiras ou não titulares das categorias referidas no n.º 1 para o exercício das funções que lhes correspondam”.

XXXI. Portanto, o que a Recorrente pretende, salvo o devido respeito, que é muito, obter deste Digníssimo Tribunal ad quem é uma decisão que venha sanar anos de comportamos ilegais e abusivos, o que jamais poderá ser admitido.

XXXII. Neste sentido, bem frisaram os Tribunais a quo, ao destacar que “se a carreira geral de técnico superior pudesse exercer estas funções ficaria totalmente esvaziado o conteúdo funcional das carreiras especiais de técnico superior de reinserção social e técnico superior de reeducação, o que não pode acontecer.”, em desrespeito pelo Anexo II do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, e o Mapa I do Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de setembro.

XXXIII. O suplemento do ónus de função atribuído aos TSRS e aos TSR pelo n.º 6 do artigo 67.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, tem como ratio, conforme resulta do preâmbulo do Decreto-Lei, um ressarcimento devido pelo “exercício de funções de assessoria a decisões judiciárias, execução de penas e medidas tutelares, institucionais e não institucionais, o contacto permanente com delinquentes, jovens e adultos, e a necessidade de fazer face a ocorrências imprevisíveis no quadro global do sistema de prevenção e combate à criminalidade em que o Instituto se insere.”

XXXIV. Todas estas funções, descritas no preâmbulo do Decreto-Lei, correspondem a atribuições exclusivas dos TSRS e dos TSR, pelo que o suplemento de ónus de função só a estes pode ser pago, para compensar a responsabilidade na realização de relatórios que irão apoiar decisões dos tribunais que poderão limitar as liberdade e garantias do cidadão, como ser preso ou ser internado num centro educativo.

XXXV. Note-se que, em virtude da atuação completamente desvirtuada e irresponsável da DGSRP, que deliberadamente atribui a TS de carreira geral funções que competem especificamente aos TSRS e aos TRS, muitos têm sido os casos em que os Juízes dos Tribunais de 1.ª instância se recusam a proferir sentenças por insuficiência dos relatórios ou muitos têm sido os recursos apresentados por os referidos relatórios não serem realizados por quem de Direito!!

XXXVI. Ora, o apoio ao Tribunal não se faz por meio de qualquer TS que atue em prossecução da missão da DGRSP.

XXXVII. Afirma-se uma vez mais: os TS devem receber os suplementos previstos na LGTFP e não os suplementos de outras carreiras profissionais.

XXXVIII. Aliás, os salários pagos aos TS regem-se pelo Regime Geral.

XXXIX. Com o seu comportamento, a Recorrente viola, de forma patente, a LFTFP.

XL. A Recorrente, ao assumir que TS de Carreira Geral exercem as mesmas funções que os TSRS e os TRS, assume que, de forma deliberada, não foi aberto o concurso especificamente para estas carreiras nem foi criada uma autorização de mobilidades intercarreiras.

XLI. Estes são os mecanismos legais à disposição da Recorrente e dos quais esta não fez o respetivo uso!!

XLII. A Recorrente, pretendendo substituir-se ao legislador no sentido de tentar obter a extinção das carreiras de TSRS e TRS, invoca questões de “complexidade técnica e de relevante interesse jurídico, especialmente pela grande probabilidade de a situação se colocar em inúmeros novos processos, designadamente decorrente de violação do princípio para trabalho igual salário igual, na vertente da igualdade de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade, e a proibição de diferenciação arbitrária”.

XLIII. É a própria Recorrente quem viola o princípio da igualdade, na sua vertente positiva, descorando de forma selvática a obrigação de diferenciação, de implementação de medidas que estabeleçam um tratamento desigual para as situações que sejam diferentes.

XLIV. Viola também o disposto no artigo 80.º, n.º 1 da LGTFP, segundo o qual a cada carreira, ou a cada categoria em que se desdobre uma carreira, corresponde um conteúdo funcional legalmente descrito;

XLV. O artigo 59.º, n.º 1, al. a), da CRP, conjugado com os artigos 23.º e 24.º, n.º 1 e 5, do Código do Trabalho, aplicáveis ex vi do artigo 4.º da LGTFP, quanto ao princípio de que a trabalho igual corresponde salário igual, uma vez que os quadros remuneratórios destas carreiras são substancialmente diferentes;

XLVI. E o artigo 57.º da CRP, relativo ao Direito à greve, na medida em que se os TSRS e TSR fizerem greve, haverá sempre TS de carreira geral a exercer as suas funções, esvaziando assim este direito.

XLVII. Em suma, por se recusar a acatar as decisões dos Tribunais a quo, a DGRSP pretende que veja aplicada por este Digníssimo Tribunal, não uma interpretação extensiva do artigo 67.º, n.º 6, al. b), do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, mas uma interpretação ab-rogativa da lei, totalmente alheia ao previsto no artigo 9.º do Código Civil, e em total oposição ao espírito e à letra da lei. XLVIII. Carece, assim, e presente recurso, de qualquer fundamento, devendo ser julgada a respetiva improcedência.

TERMOS EM QUE, E NOS DEMAIS DE DIREITO, REQUER-SE A VOSSAS EXCELÊNCIAS A ATRIBUIÇÃO DO EFEITO MERAMENTE DEVOLUTIVO AO PRESENTE RECURSO, ADEMAIS NÃO LHE DEVENDO SER DADO PROVIMENTO, QUER PORQUE NÃO CUMPRE OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE, QUER PORQUE INFUNDADO, MANTENDO-SE A SENTENÇA E ACÓRDÃO RECORRIDOS E A CONSEQUENTE DECISÃO PROFERIDA DE ANULAÇÃO DO ATO IMPUGNADO.

Assim se fazendo, como sempre, a habitual JUSTIÇA!

7. Notificado para se pronunciar, nos termos do artigo 146.º, n.º 1 do CPTA, o Magistrado do Ministério Público não emitiu pronúncia.

Cumpre apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. De facto

Na decisão recorrida foi reputada como relevante a seguinte matéria de facto:

A) Por Despacho da Sr.ª Subdiretora Geral da DGRSP foi determinada a abertura de um procedimento concursal com vista à constituição de reserva de recrutamento para a carreira e categoria de técnico superior, do mapa de pessoal dessa entidade, publicado em Diário da República em 27/07/2021, pelo Aviso n.º 14109/2021, com a Ref.ª DGRSP02/TS/2021, cfr. doc. 3, junto com a p.i..

B) No ponto 5 do aviso referido em A) consta o seguinte:

“5 — Local de trabalho: Serviços Centrais (SC), Estabelecimentos Prisionais (EP), Centros Educativos (CE); Delegações Regionais de Reinserção (DRR Norte, DRR Centro e DRR Sul e Ilhas), Equipas de Reinserção Social e Equipas de Vigilância Eletrónica.”

C) No ponto 7 do aviso referido em A) consta o seguinte:

“7 — Caracterização dos postos de trabalho: aos postos de trabalho a ocupar corresponde o conteúdo funcional no anexo referido no n.º 2 do artigo 88.º da LTFP, na carreira e categoria de técnico superior.”

D) No ponto 13 do aviso referido em A) consta o seguinte:

“13 — Suplementos Remuneratórios:

a) Subsídio de risco, previsto na alínea b) do n.º 4, do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 38/82, de 7 de julho, na sua redação atual, em vigor por força do disposto no n.º 2 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro, devido nos termos do artigo 159.º da LTFP, para os Estabelecimentos Prisionais;

b) Ónus de função, previsto na alínea b) do n.º 6 do artigo 67.º do Decreto-Lei n.º 204-A/201, de 26 de julho, em vigor por força do disposto no n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de setembro, e devido nos termos do artigo 159.º da LTFP, pelo exercício de funções em Delegação Regional, Centro Educativo, Equipas de Vigilância Eletrónica e algumas unidades orgânicas dos Serviços Centrais da DGRSP.”

2. De Direito

2.1. O objecto do presente recurso circunscreve-se à questão de saber se os actos impugnados [o acto que determina a abertura do procedimento concursal com vista à constituição de reserva de recrutamento na carreira e categoria de Técnico Superior, área de psicologia, do mapa de pessoal desta entidade, publicado em Diário da República em 14/05/2021, pelo Aviso n.º 9079/2021 e o acto que determina a abertura do procedimento concursal com vista à constituição de reserva de recrutamento para a carreira e categoria de técnico superior, do mapa de pessoal dessa entidade, publicado em Diário da República em 27/07/2021, pelo Aviso n.º 14109/2021], que prevêem a concessão aos concorrentes a Técnicos Superiores do suplemento remuneratório de ónus de função violam as alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 de 26 de Julho, aplicáveis por determinação do artigo 67.º, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho.

2.2. As instâncias – o TAC de Lisboa e o TCA Sul – entenderam ambas que sim, que se verificava a alegada violação dos dispositivos legais.

Ambas assentam a fundamentação daquela decisão no facto de qualificar o complemento remuneratório do ónus de função, previsto no artigo 67.º, n.º 6, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho (norma que mantém a sua vigência ex vi do disposto, sucessivamente, no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 126/2007, de 27 de Abril e artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro) como uma prestação remuneratória devida pelo exercício das funções desenvolvidas para a prossecução das atribuições previstas nas alíneas b) a f) do artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 (hoje previstas nas alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 215/2012).

E por reconduzirem o exercício daquelas funções, em exclusivo, ao conteúdo funcional das carreiras de Técnico Superior de Reinserção Social e de Técnico Superior de Reeducação.

Com efeito, a sentença do TAC concluiu taxativamente que: “(…) Ora, o suplemento remuneratório de ónus de função só pode ser atribuído a quem possa exercer estas funções, que, no caso, serão os técnicos superiores de reinserção social e técnicos superiores de reeducação, consoante a função em causa. Caso contrário, se a carreira geral de técnico superior pudesse exercer estas funções ficaria totalmente esvaziado o conteúdo funcional das carreiras especiais de técnico superior de reinserção social e técnico superior de reeducação, o que não pode acontecer (…)”.

E o acórdão recorrido secunda aquela conclusão, complementando a argumentação ao afirmar que “(…) Distinto entendimento, de um técnico superior da carreira geral poder exercer estas funções, e receber o suplemento em questão, redundaria, como sublinha a Mma. Juiz a quo, num esvaziamento do conteúdo funcional das carreiras de técnico superior de reinserção social e técnico superior de reeducação (…)”.

Assim, no essencial, a decisão recorrida sustenta a tese da ilegalidade dos actos de abertura do concurso no segmento interpretativo que retira da interpretação sistemática do artigo 67.º, n.º 6, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 (norma que prevê a atribuição daquele suplemento remuneratório) por conjugação com o disposto no Anexo II do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho e no Mapa I do Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de Setembro (onde se descreve o conteúdo funcional, respectivamente, dos técnicos superiores de reinserção social e dos técnicos superiores de reeducação).

2.3. E é esta interpretação normativa que a Recorrente DGRSP qualifica como erro de julgamento, alegando diversos argumentos, que passamos a analisar.

2.3.1. Alega a DGRSP, em primeiro lugar, que as carreiras dos técnicos superiores de reinserção social e dos técnicos superiores de reeducação são carreiras gerais não revistas e não carreiras especiais, o que significa que são carreiras subsistentes nos termos e para os efeitos do regime previsto no artigo 106.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro. Por outras palavras, são carreiras que serão extintas e os respectivos trabalhadores integrados nas carreiras gerais, algo que estava até previsto no ponto I.II.1. do Programa do XXIII Governo Constitucional (2022-2026) “Concluir a revisão das carreiras não revistas, com uma discussão alargada e transparente para harmonizar regimes, garantir a equidade e a sustentabilidade, assegurando percursos profissionais assentes no mérito dos trabalhadores” e é depois repetido no preambulo do Decreto-Lei n.º 84-F/2022, de 16 de Dezembro que aprova medidas de valorização dos trabalhadores em funções públicas. É verdade que, de acordo com o n.º 5 do referido artigo 106.º da Lei n.º 12-A/2002, os órgãos ou serviços não podem recrutar ou recorrer a mobilidade geral de trabalhadores não integrados nas carreiras ou não titulares das categorias das referidas carreiras subsistentes para o exercício das funções que lhes correspondam. Mas também é verdade que o aviso n.º 14109/2021 [ponto A) do probatório] não se destinava a recrutar técnicos superiores para o exercício de funções correspondentes àquelas categorias, pois no seu ponto 7 pode ler-se a descrição do conteúdo funcional do recrutamento “Caracterização dos postos de trabalho: aos postos de trabalho a ocupar corresponde o conteúdo funcional no anexo referido no n.º 2 do artigo 88.º da LTFP, na carreira e categoria de técnico superior”, ou seja, “Funções consultivas, de estudo, planeamento, programação, avaliação e aplicação de métodos e processos de natureza técnica e ou científica, que fundamentam e preparam a decisão. Elaboração, autonomamente ou em grupo, de pareceres e projetos, com diversos graus de complexidade, e execução de outras atividades de apoio geral ou especializado nas áreas Grau de complexidade funcional de atuação comuns, instrumentais e operativas dos órgãos e serviços. Funções exercidas com responsabilidade e autonomia técnica, ainda que com enquadramento superior qualificado. Representação do órgão ou serviço em assuntos da sua especialidade, tomando opções de índole técnica, enquadradas por diretivas ou orientações superiores” , que se distingue do descrito no Anexo II do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho e no Mapa I do Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de Setembro. Procede este argumento recursivo.

2.3.2. Em segundo lugar, a DGRSP alega que a decisão do TCA Sul também erra quando considera que só os técnicos superiores de reinserção social e dos técnicos superiores de reeducação exercem as funções previstas nas alíneas b) a f) do artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 (hoje previstas nas alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 215/2012). E também neste caso assiste razão à Recorrente. É que a decisão recorrida não fundamenta uma tal ilação de direito. Com efeito, limita-se a invocar o elemento sistemático da interpretação jurídica para depois concluir, da conjugação do disposto nas normas que descrevem o conteúdo funcional daquelas carreiras [Anexo II do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de Julho, e no Mapa I do Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de Setembro) com o teor dos artigos 67.º, n.º 6, alínea b) e 3.º alíneas b) a f) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001], que tais atribuições são um “exclusivo funcional” destas carreiras, aderindo assim à da tese da A., a qual não tem suporte no texto da lei orgânica da DGRSP, como a Recorrente bem destaca.

É óbvio que o teor das alíneas do artigo 3.º se refere à descrição das atribuições da DGRSP, as quais são prosseguidas pelos respectivos órgãos no respeito pelas respectivas competências e conteúdos funcionais, e executadas pelos funcionários, no quadro da organização funcional dos serviços. É juridicamente insustentável, seja em regras, seja em princípios jurídicos, pretender fazer corresponder, a título de exclusivo, a descrição do conteúdo funcional de certas carreiras da função pública, às atribuições e competências de uma determinada entidade administrativa.

2.3.3. Por último, a Recorrente alega que a formulação textual do artigo 67.º, n.º 6, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, onde está legalmente fixada a obrigação de pagamento do suplemento remuneratório do ónus do exercício das funções (o qual está na origem do presente litígio), incluiu expressamente no universo subjectivo dos respectivos beneficiários os técnicos superiores, a par com os técnicos superiores de reinserção social. E com base neste elemento, a Recorrente alega que o pagamento daquele suplemento remuneratório aos técnicos superiores é uma opção do legislador, que a decisão do acórdão recorrido pretende afastar, sem qualquer fundamento juridicamente válido, designadamente, sem apontar qualquer inconstitucionalidade à referida norma. E também neste ponto assiste razão à Recorrente.

O suplemento do ónus de função é devido a todos os cargos e categorias enunciados no artigo 67.º, n.º 6, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 que preencham os pressupostos legais para o auferir, ou seja, sempre que exerçam funções desenvolvidas para a prossecução das atribuições previstas nas alíneas b) a f) do n.º 1 do artigo 3.º do mesmo diploma legal (hoje previstas nas alíneas b), c), i) e o) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 215/2012). O preâmbulo do Decreto-Lei n.º 204-A/2001 esclarece que este suplemento remuneratório visa compensar o “ónus relacionado com o exercício de funções de assessoria a decisões judiciárias, execução de penas e medidas tutelares, institucionais e não institucionais, o contacto permanente com delinquentes, jovens e adultos, e a necessidade de fazer face a ocorrências imprevisíveis no quadro global do sistema de prevenção e combate à criminalidade em que o Instituto se insere”. Ou seja, como bem sublinha a Recorrente, o subsídio é devido a todos os que estão afectos ao cumprimento das atribuições enunciadas e na medida em que o estejam, sempre que se integrem no universo dos beneficiários enunciados no artigo 67.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 204-A/2001. Não resulta do regime jurídico-legal, nem de outros elementos da interpretação jurídica, qualquer solução que possa contrariar o que aquela norma estipula de forma expressa (que os outros técnicos superiores também podem ser beneficiários daquele suplemento remuneratório), sendo infundada e juridicamente insustentável a solução vertida no acórdão recorrido, que não se pode manter.

2.3.4. Assim, concluiu-se que não existe a apontada ilegalidade ao aviso de abertura do concurso n.º 14109/2021.

III – DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e julgar improcedente a acção.

Custas pelo Recorrido neste Supremo e nas instâncias, não se verificando a isenção do artigo 4.º, alíneas f) e h) do RCP conforme ac. deste STA de 17.05.2013.

Lisboa, 21 de Março de 2024. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) – José Augusto Araújo Veloso – José Francisco Fonseca da Paz.