Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0288/12.4BEBRG
Data do Acordão:03/01/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24281
Nº do Documento:SA1201903010288/12
Data de Entrada:02/05/2019
Recorrente:A.........
Recorrido 1:IAPMEI - AGÊNCIA PARA A COMPETIDADE E INOVAÇÃO,IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A………… intentou, no TAF de Almada, contra o IAPMEI – Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação, I.P., acção administrativa especial pedindo a anulação da decisão da sua Comissão de Gestão de Incentivos, de 20/10/2004, que rescindiu o contrato celebrado entre ambos no âmbito do programa de incentivos financeiros ao comércio, e lhe ordenou a restituição do subsídio que lhe foi concedido.


Aquele Tribunal julgou a acção improcedente e o TCA, para onde o Autor apelou, negou provimento ao recurso.

É desse Acórdão que o Autor vem recorrer com fundamento na errónea aplicação do direito. (art.º 150.º/1 do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO

1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto selecionada no Acórdão recorrido.

2. Autor e Réu celebraram, em 29.05.2001, “Contrato de Concessão de Incentivos Financeiros no âmbito do Sistema de Incentivos a Projetos de Urbanismo Comercial (Urbcom)”, que envolveu um financiamento de 57.780,75 € destinado a realização de obras no estabelecimento comercial que o Município de Fafe havia concessionado ao Autor. Concessão essa que, posteriormente, foi judicialmente anulada.
O Réu intentou notificar o Autor para apresentar a documentação referente ao investimento financiado mas sem sucesso já que o aviso de notificação foi devolvido com a indicação Ausentou-se da morada”.
Insucesso que, mais tarde, se repetiu com uma nova tentativa de notificação, desta vez para lhe comunicar a rescisão do contrato - com fundamento no facto do Autor se encontrar em paradeiro desconhecido e não explorar o estabelecimento - e lhe solicitar a devolução do financiamento recebido.
Inconformado, o Autor propôs a presente acção pedindo a anulação do acto que rescindiu o contrato e lhe ordenou a devolução do financiamento já recebido alegando que o incumprimento do contrato não lhe era imputável por o mesmo ter decorrido da execução da decisão judicial que anulou a mencionada concessão. Por ser assim não só o acto de resolução contratual como a ordem de devolução do financiamento já recebido eram ilegais.
Sem êxito já que o TAF de Braga julgou a acção improcedente. Fê-lo por entender "que o que motivou a resolução, do lado do Réu, foi a circunstância de, sem motivo conhecido, o Autor ter deixado de cumprir as obrigações do contrato, mormente a de explorar o estabelecimento comercial."
Com efeito, “Da matéria de facto assente supra resulta que o Autor deixou de explorar o estabelecimento comercial (seja ou não em virtude da nova adjudicação do local a outro concorrente) e só o comunicou ao Réu cerca de quatro anos depois; mais, não resulta que o Autor tenha apresentado pedido de pagamento de saldo final nem demonstrado o cumprimento até à data do impedimento.
Pelo que, muito embora se possa ter o incumprimento ao nível da exploração do estabelecimento como não imputável ao Autor, a verdade é que o Autor não permitiu ao Réu ter conhecimento de tal situação, deixando que se consolidasse uma situação de incumprimento injustificado. O que conduz a que o ato de resolução contratual não padeça da ilegalidade que lhe vem apontada.”

Decisão que o TCA confirmou pela seguinte ordem de razões:
“Na realidade, se é certo que não é imputável ao Autor, aqui Recorrente, o cancelamento da adjudicação do espaço físico onde funcionava o estabelecimento, esse facto só por si não permite concluir que o incumprimento do contrato de financiamento não lhe será imputável, pois que a atividade comercial sempre se poderia efetivar em local alternativo, devendo, em qualquer caso, a situação ter sido de imediato comunicada ao IAPMEI, sob pena do Recorrente entrar, como entrou, em incumprimento.
...
Se é certo que o controvertido espaço foi adjudicado pelo Município ao Recorrente, para depois de alegados investimentos feitos, lhe ter sido retirada a adjudicação, independentemente das razões que o justificaram, sempre o recorrente poderia, se fosse caso disso, ter enveredado por um pedido indemnizatório junto do município, de modo a ser ressarcido, designadamente, pelo invocado investimento que havia já sido feito.
Por outro lado, nada é alegado e muito menos demonstrado, quanto ao destino dado entretanto ao equipamento que terá sido objeto do referido investimento.
Acresce ainda, e tal como precedentemente sugerido, que o contratualizado não se cingia necessariamente a ser exercido no espaço municipal adjudicado, sendo que nada obstaria certamente ao seu exercício noutro local, sendo que nada se diz quanto à eventual procura de um espaço alternativo.
...
O que é também insofismável é que o IAPMEI concedeu um financiamento para a realização de um investimento, não havendo prova que o mesmo tenha sido realizado, sendo que, em qualquer caso, o que é certo é que a atividade comercial que o justificaria, não foi efetivada seguramente.
....
No que concerne já aos vícios invocados “avulso”, sempre se dirá ainda que se não vislumbra que o ato objeto de impugnação denote qualquer falta de fundamentação, na medida em que exterioriza suficientemente os factos e o direito em que assenta.”

2. A presente revista, conforme se acaba de ver, dirige-se contra o Acórdão o TCA que confirmou a sentença do TAF que julgou a acção improcedente por ter entendido que o acto impugnado não estava ferido pelos vícios que lhe tinham sido assacados.
E tudo indica que decidiu bem uma vez que, atenta a M.F. julgada provada, era certo que o IAPMEI concedeu ao Autor um financiamento para a realização de um determinado investimento e que ele não tinha provado que o havia realizado. Sendo certo, por outro lado, que a actividade comercial que o justificou não foi iniciada e que ficou por demonstrar o destino dado ao equipamento que terá sido objecto do referido investimento.
Deste modo, tudo leva a crer que o Acórdão recorrido ajuizou acertadamente tanto mais quanto é certo que o Recorrente não conseguiu provar se fez o alegado investimento e qual o montante dispendidos com ele – prova cuja dificuldade não era grande já que lhe bastava juntar a documentação atinente.
Por outro lado, ao invés do que o Recorrente sustenta, o Acórdão recorrido não é nulo por omissão de pronúncia pois o mesmo é claro ao dizer que “se não vislumbra que o ato objeto de impugnação denote qualquer falta de fundamentação, na medida em que exterioriza suficientemente os factos e o direito em que assenta.”
Nesta conformidade, não estando em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental nem sendo a revista necessária para uma melhor aplicação do direito não se justifica a sua admissão.
DECISÃO.
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pela Recorrente.
Porto, 1 de Março de 2019. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.