Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0503/14.0BECBR 0893/17
Data do Acordão:04/07/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
PARQUE EÓLICO
BALDIOS
Sumário:I - Um parque eólico (a universalidade em que se integram os aerogeradores e demais elementos que permitem o exercício da actividade electroprodutora) possui as características necessárias para poder ser subsumido ao conceito de prédio que consta do artigo 2.º do CIMI.
II - O facto de o parque eólico estar “incorporado” ou “assente” num terreno baldio não prejudica a sua classificação como prédio para efeitos do disposto no artigo 2.º do CIMI, atendendo ao facto de existir uma “autonomia económica” deste bem fiscal em relação ao terreno e, por isso, também, autonomia jurídico-tributária, que permite que a sua tributação seja independentemente do estatuto jurídico-tributário daquele terreno.
III - Não existe dupla tributação pelo facto de um parque eólico estar sujeito a IMI e à obrigação de pagar a renda municipal pela produção de energia eólica.
IV - A tributação em IMI de um parque eólico não constitui violação do princípio da capacidade contributiva, seja porque estamos perante um bem fiscal que preenche os pressupostos legais da tributação, seja por não estar demonstrada em concreto a violação do referido princípio.
V - O refracção de poder tributário, cujo exercício a lei confere aos Municípios, para ser exercido pelas assembleias municipais, através da deliberação que fixa em concreto a taxa de IMI para os prédios urbanos, no intervalo entre 0,3 e 0,5 (artigo 112.º, n.º 1, al. c do CIMI), é configurado na lei, primeiramente, como um poder inter-institucional, que se exerce no quadro de uma relação jurídico-pública de co-gestão (estadual municipal) do IMI e não como um verdadeiro poder regulamentar municipal. Nessa medida, a referida deliberação da assembleia municipal tem como destinatário imediato o Estado através dos serviços da AT (artigo 112.º, n.º 14 do CIMI) e à falta de publicação da deliberação não pode corresponder a sua ineficácia geral em relação aos munícipes.
Nº Convencional:JSTA000P27473
Nº do Documento:SA2202104070503/14
Data de Entrada:02/20/2020
Recorrente:EÓLICA DO ............, S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I - Relatório

1 – A EÓLICA DO …………, SA., com os sinais dos autos, impugnou judicialmente, no TAF de Coimbra, em 21 de Julho de 2014, o acto de liquidação do IMI de 2013.

2 – Por sentença de 9 de Março de 2017 a impugnação foi julgada improcedente.

3 – Inconformada, a Impugnante interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 6 de Fevereiro de 2019, concedeu provimento ao recurso no segmento impugnado (ou seja, revogou o segmento decisório onde se havia decidido que a inscrição do prédio na matriz teria de ser impugnada autonomamente) e ordenou a baixa dos autos para que o TAF de Coimbra conhecesse dos restantes fundamentos da impugnação.

4 – Por sentença de 18 de Março de 2019, o TAF de Coimbra voltou a julgar a impugnação improcedente.

5 – Inconformada, a Impugnante interpôs recurso, desta vez para o TCA-Norte, que, por decisão da Relatora de 28 de Janeiro de 2020, se declarou incompetente para conhecer do mesmo e competente para o efeito a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

6 – Nas alegações de recurso que apresentou, a Impugnante e aqui Recorrente concluiu do seguinte modo:
I - A Recorrente não se conforma com a sentença do Meritíssimo Tribunal a quo, que decidiu pela improcedência total da impugnação judicial, relativa à liquidação de IMI de 2013, referente à realidade inscrita como prédio urbano sob o artigo 2840, da freguesia de Vila Nova, Concelho de Miranda do Corvo, no montante de € 2.806,62, entendendo que a mesma procedeu a uma incorreta valoração da prova e uma subsunção dos factos ao direito aplicável, razão pela qual apresenta o presente recurso;
II - A Recorrente discorda da inscrição na matriz e, de igual modo, dos atos que levaram a tal inscrição, os quais considera que deverão ser anulados, porquanto é seu entendimento que tal artigo urbano não tem qualquer existência real, não se encontrando reunidos os requisitos para a consideração com “prédio” da realidade factual em apreço;
III - A inscrição na matriz dos 12 aerogeradores e edifício de comando sob o artigo 2840 na freguesia de Vila Nova, em Miranda do Corvo que corresponde ao Parque Eólico de ………, é ilegal porque os elementos constitutivos de um parque eólico não se subsumem à figura de “prédio”, em conformidade com a definição constante no Código de IMI, por falta do elemento físico;
IV - O conceito fiscal de “prédio”, para efeitos de incidência do Código do IMI, afasta-se da noção civilística, sendo que, nos termos do disposto no artigo 2.º, do conceito de “prédio” ressaltam três elementos constitutivos: o físico (“toda a fração de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com caráter de permanência”), o jurídico (“desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva”) e o económico (“e, em circunstâncias normais, tenha valor económico”);
V - Ora, nestes termos, considera-se que 12 aerogeradores e um edifício de comando, não preenchem todos os requisitos para serem considerados prédios, desde logo, porque, no que respeita ao elemento físico, tal como a AT já reconheceu, os mesmos são meros equipamentos e não construções, desde logo se concluindo pelo incumprimento do elemento físico do aerogerador, para poder ser considerado “prédio”;
VI - Efetivamente, os elementos que compõem o Parque Eólico em apreço deverão ser considerados meros equipamentos, não uma construção assente numa fração de território com caráter de permanência, não sendo tão-pouco a Impugnante, ora Recorrente, o sujeito passivo de IMI, conforme se demonstrou, pois esta detém somente o direito de superfície, uma vez que os aludidos equipamentos se situam em terrenos baldios;
VII - Os terrenos baldios nos quais estão instalados os aerogeradores e o edifício de comando da Recorrente não podem ser considerados como prédios nos termos e para os efeitos do artigo 2.º do Código do IMI, uma vez que não se verifica o elemento de natureza jurídica patrimonial (“desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva”) que aquela norma exige para definir a incidência do IMI (artigo 1.º do Código do IMI);
VIII - Mais ainda, no que se refere ao conceito de “terrenos baldios”, os mesmos nunca poderão ser considerados “prédio”, perante a ausência do elemento de natureza jurídica, cf. entendimento da própria AT veiculada no Parecer do Centro de Estudos Fiscais de 28.01.2008, sancionado pelo Senhor Diretor-Geral da AT;
IX - No mesmo sentido, decorre do entendimento do serviço que centralmente administra este imposto na AT – a Direção de Serviços do IMI –, cf. informação nº 1359/06, que, sem prejuízo de os baldios serem qualificados como bens não pertencentes a entidades públicas ou privadas e fora do comércio jurídico, as entidades a quem a sua administração pertence poderão praticar sobre os mesmos atos de gestão e de administração, sendo que tais atos não são suscetíveis de afetar a sua natureza jurídica, concluindo que os parques eólicos podem celebrar contratos de cessão de exploração com os Conselhos Diretivos dos Baldios;
X - De igual modo, a Direção de Serviços do IMI, pronunciando-se nomeadamente quanto à eventual constituição de um direito de superfície sobre os baldios ou um destaque urbanístico, considerou que no caso das construções edificadas nos baldios se qualifiquem como objeto do direto de superfície, sendo considerado sujeito passivo, relativamente às construções, o superficiário, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 2 do Código do IMI;
XI - Assim, mesmo que se entendesse que as referidas construções deveriam ser inscritas na matriz como prédios “Outros” – o que apenas se expõe por mera cautela de patrocínio, sem, todavia, conceder – a sua avaliação nunca poderia ser feita pelas regras do artigo 38.º do Código do IMI, mas somente pelo método do custo, sem adicionar o valor do terreno, na justa medida em que o terreno não pertence à Recorrente;
XII - Nesse sentido, note-se que, em condições normais, os prédios novos, em conformidade como o artigo 106.º, alínea d) do Código do IMI, são inscritos em artigos adicionais e eliminado o artigo correspondente ao terreno de implantação, na medida em que a edificação absorve o respetivo terreno;
XIII - Ora, os terrenos baldios em apreço, onde 12 aerogeradores e um edifício de comando foram instalados, não têm inscrição na matriz porque não são considerados prédios e, por outro aspeto, não são suscetíveis de apropriação pública ou privada, nos termos do disposto na Lei n.º 68/93, de 4 de setembro, que regula os baldios, pois estes não têm natureza de bens particulares nem de bens públicos, mas coletivos, razão pela qual nunca o seu eventual valor poderá ser considerado na avaliação das construções nele existentes;
XIV - Por outro lado, a definição de “prédio” não se basta com a existência de um conjunto de equipamentos para produção de energia elétrica instalados num terreno baldio, sem natureza patrimonial, como é o caso dos aerogeradores e os edifícios de comando, os quais não são efetivamente uma “construção” numa fração de território, como exige o Código do IMI para que se esteja perante um prédio relevante para efeitos de IMI;
XV - Pelo que os aerogeradores e um edifício de comando, desligados dos terrenos nos quais estão instalados, também não podem ser considerados prédio para efeitos de IMI;
XVI - Sem prescindir, refira-se que o IMI se encontra inevitavelmente condicionado por imperativos constitucionais da equivalência, eficiência justiça, igualdade e solidariedade, sendo que qualquer interpretação dos artigos 2.º, 4.º e 6.º do Código do IMI que pretenda atribuir aos aerogeradores a natureza de construção passível de ser qualificada como “prédio” para efeitos de IMI é inconstitucional, por violar o desiderato constitucional de que a “tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos”, vertido no n.º 3 do artigo 104.º da CRP;
XVII - O IMI visa tributar a riqueza exteriorizada pela propriedade ou uso e fruição de bens patrimoniais, incidindo sobre a titularidade de bens imóveis transacionáveis pelo que deve considerar-se na sua base o princípio do benefício ou da equivalência económica, implicando que a legitimidade da tributação dos aerogeradores da Recorrente, enquanto prédio, em função dos benefícios eventuais, potenciais ou virtuais que possam decorrer para o proprietário/ titular dos direitos reais de usufruto ou direito de superfície, da atuação municipal, sendo que as receitas do IMI devem ser proporcionais aos custos municipais com a manutenção e amortização de infraestruturas locais e gerais;
XVIII - A equivalência económica deve ainda ser determinada com base na contraprestação do Estado, de tal modo que a prestação pecuniária exigida ao sujeito passivo tenha correspondência com a despesa pública que legitima a exigência do tributo;
XIX - Por outro aspeto, note-se que também o princípio de igualdade sairá claramente violado, já qua a exigência do pagamento de IMI aos titulares dos aerogeradores é geradora de uma tributação desigual e desproporcionada, considerando os deveres tributários que já são impostos na macroestrutura do negócio;
XX - É, pois num quadro de definição da justa repartição dos encargos públicos, enquanto decorrência necessária do princípio da justiça, que se deverá materializar e concretizar o princípio da igualdade fiscal, em sede de IMI, e, de igual modo, a cobrança de IMI relativa aos aerogeradores, pois a fixação do VPT tem como expoente imediato a liquidação consequente de IMI sobre os aerogeradores;
XXI - Tributar aerogeradores em sede de IMI e, simultaneamente, nos termos do n.º 33 do Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, seria criar uma situação totalmente ineficiente na perspetiva da tributação e dos efeitos sociais da mesma, o que é intolerável do ponto de vista constitucional, porquanto é este princípio de eficiência funcional, de vigência constitucional, que conforma de forma decisiva a atuação do Estado no setor urbanístico e é decisivo para se alcançar a configuração necessária de um imposto como o IMI, nomeadamente no caso concreto da tributação dos 12 aerogeradores e um edifício de comando;
XXII - Sem prescindir, refira-se que a inadequação genética do IMI para se aplicar à realidade material aos parques eólicos não significa que fiquem isentos de tributação predial, pois não existe qualquer lacuna no que respeita à tributação predial dos parques eólicos – a norma sobredita prevê uma renda de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida, em cada instalação;
XXIII - Pelo que forçoso se mostra concluir que qualquer interpretação do Código do IMI, mormente dos artigos 2.º, 4.º, 6.º, 38.º e 46.º, que implique a sujeição de 12 aerogeradores e um edifício de comando a inscrição na matriz urbana e consequente fixação do VPT e posterior tributação, é inconstitucional por violação do princípio da igualdade, na perspetiva da capacidade contributiva, previsto no artigo 13.º CRP, e por outro lado, da alínea d) do artigo 9.º e do artigo 81.º da CRP;
XXIV - Por fim, refira-se que, sem prescindir, as deliberações que fixaram a taxa de IMI a aplicar no Município de Miranda do Corvo em 2013 deverão ser consideradas ineficazes por falta de publicação, nos termos do artigo 119.º, n.º 2 da CRP, pelo que sempre deverão ser anuladas.
Termos em que deve o presente recurso ser jugado totalmente procedente e, em consequência ser revogada a sentença recorrida, assim se fazendo no que é de Lei e de Justiça!


7. Não foram produzidas contra-alegações.

8. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

II – Fundamentação


1. Dos factos
A decisão recorrida deu como provada a seguinte factualidade concreta:
A) Em 27.06.2008, a A…………, S.A. cedeu à ora Impugnante a sua posição no contrato celebrado com a Associação de Compartes da Freguesia de Vila Nova, através do qual se adquiriu a “[…] exploração das parcelas de terrenos baldios […]”, naquele identificados (cf. docs. a fls. 44 a 65 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
B) Nos terenos baldios da freguesia de Vila Nova, a Impugnante instalou um parque eólico composto por 12 aerogeradores, um edifício de comando e subestação (cf. docs. a fls. 66 a 69 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
C) A Autoridade Tributária procedeu à inscrição oficiosa de um prédio urbano na matriz predial da freguesia de Vila Nova, sob o artigo 2840 e à respetiva avaliação nos termos do CIMI no valor de € 127.560,00 (cf. doc. a fls. 70 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
D) Em 29.06.2012, a Impugnante, através do seu Advogado, solicitou que fosse realizada a 2.ª avaliação do prédio referido na alínea anterior (cf. docs. a fls. 42 a 59 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
E) Foi realizado o procedimento de avaliação do prédio referido nas alíneas anteriores, tendo resultado um valor patrimonial tributário atribuído ao mesmo no montante de € 935.540,00 (cf. docs. a fls. 84 a 93 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
F) Os aerogeradores são equipamentos de conversão de energia cinética em energia elétrica, sendo constituídos por quatro grandes grupos (o rotor, as pás, a nacelle e a torre (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
G) O rotor corresponde ao mecanismo capaz de permitir que o disco varrido pelas pás esteja sempre em posição perpendicular ao vento, sendo constituído por 3 pás e por um eixo, unidos através de um rolamento (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
H) As pás captam o movimento do vento e o gerador contido na nacelle transforma a energia mecânica do movimento de rotação em energia elétrica para posterior injeção na rede elétrica (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
I) A nacelle é o componente que abriga o gerador, o quadro controlo balizagem, o quadro de filtros do gerador, o quadro de comando da nacelle, o quadro de ventiladores, o comando, os quadros motores de Yaw, os motores de Yaw e o retificador (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
F) A torre conecta o sistema de coroa à nacelle que permite a orientação do equipamento (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
G) A torre é composta pelo quadro de comando, o quadro de distribuição BT, esteira de cabos, o transformador de grupo, o quadro MT e os quadros de potência, integrando, ainda, os sistemas de amortecimento de vibração do equipamento, os sistemas de transporte de energia de corte e proteção e outros sistemas auxiliares de controlo e acesso (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
H) A torre é um equipamento aerogerador, sendo indispensável à produção de energia elétrica, sendo que não existe aerogerador, enquanto equipamento de produção de energia elétrica, se o mesmo não for dotado de uma torre (cf. docs. a fls. 72 a 84 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
I) Os aerogeradores da Impugnante são da marca ENERCOM, modelo E-82 e são analisados e retificados em função das normas IEC-61400, estando certificados de acordo com estas normas e foram colocados no local em obediências às normas IEC 61400-1 (cf. docs. a fls. 85 a 166 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
J) O edifício de comando é a instalação que contém os equipamentos necessários para a transmissão e distribuição de energia elétrica, bem como equipamentos de proteção e controle necessário ao funcionamento do parque eólico, sem área habitável (cf. docs. a fls. 85 a 166 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
K) A Autoridade Tributária liquidou IMI sob o prédio referido nas alíneas anteriores com referência ao ano de 2013, no montante de € 2.806,62 (cf. doc. a fls. 42 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
L) A Impugnante procedeu ao pagamento da 1.ª prestação do IMI referido na alínea anterior (cf. doc. a fls. 43 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
M) A deliberação da Assembleia Municipal que fixou a taxa de IMI a aplicar no Município de Miranda do Corvo no ano de 2013 não foi publicada em boletim municipal, não foi publicada em edital fixado nos locais de estilo e não foi publicada em jornal regional editado na área do respetivo município
Factos não provados: nenhuns»



2. Questões a decidir
As questões a decidir no âmbito do presente recurso prendem-se, primeiramente, com o alegado erro de julgamento da sentença recorrida quanto i) à classificação do parque eólico (12 torres de aerogeradores, o edifício de comando e subestação, ponto B da matéria de facto) como prédio à luz do disposto no artigo 2.º do CIMI, e abrangem ainda ii) a alegada desconformidade do montante de imposto exigido com os princípios da equivalência e da igualdade, bem como iii) a questão da eficácia da deliberação municipal que fixou a taxa de IMI.


3. De direito

3.1. A Recorrente alega que o parque eólico (ou seja, a universalidade de bens que o integram) não pode ser subsumido ao conceito de prédio para efeitos de incidência do IMI, tal como o mesmo é normativamente definido no artigo 2.º do CIMI.
Lembramos alguns pressupostos essenciais de que partimos para a decisão a tomar a este respeito.
Primeiro, que o conceito de prédio vertido no n.º 1 do artigo 2.º do CIMI abrange “construções de qualquer natureza incorporadas ou assentes numa fracção de território, integradas no património de uma pessoa singular ou colectiva e que, em circunstâncias normais, tenham valor económico”, bem como “construções dotadas de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantadas”.
Segundo, que constitui jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo (V. os acórdãos de 15.03.2017, proc. 0140/15, de 07.06.2017, proc. 01417/16, de 11.10.2017, proc. 0360/17, de 15.11.2017, proc. 01105/17, de 15.11.2017, proc. 01074/17, de 22.11.2017, proc. 0661/17, de 17.01.2018, proc. 01285/17, de 07.02.2018, proc. 01108/17, de 31.01.2018, proc. 01447/17, de 28.02.2018, proc. 01160/17, de 11.04.2018, proc. 01328/17, de 12.09.2018, proc. 0520/18) que os elementos constitutivos de um parque eólico, mais precisamente os aerogeradores (leia-se, cada aerogerador de per si), não se subsumem ao conceito fiscal de "prédio" tal como definido nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do CIMI, por não terem aptidão suficiente para, por si, desenvolverem a actividade económica, concluindo-se também do expendido nessas decisões que um parque eólico (a universalidade em que se integram os aerogeradores e demais elementos que permitem o exercício da actividade electroprodutora) já possui as características para poder ser qualificado como prédio (No acórdão de 30 de Abril de 2019 (proc. 01431/16.0BEBRG 0472/18), por ler-se a este respeito seguinte: “[…] O que significa que cada um desses elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não pode, de per si, ser considerado um prédio urbano (“outros”), na medida em que não constitui uma parte economicamente independente, isto é, não tem aptidão suficiente para, por si só, desenvolver a aludida atividade económica (A mesma razão leva a que não possam ser considerados como “prédios” (nem a AT ousa considerá-los como tal) os diversos elementos e estruturas que integram um estádio de futebol (as balizas, as bancadas, a estrutura coberta, os balneários, etc.) ou que integram um campo de golfe (o green, o tee, o fairway, os obstáculos, o edifício de atendimento, etc.), já que cada uma dessas estruturas e elementos, que se encontram interligados e conexionados com vista ao mesmo objetivo e finalidade económica, não possuem autonomia económica em relação à fração de território ocupada, pese embora seja incontroverso que tanto o estádio de futebol como o campo de golfe constituem, à luz do mencionado preceito do CIMI, prédios urbanos para efeitos de incidência objetiva de IMI.) […]”.
E no acórdão de 15 de Março de 2015 (processo n.º 0140/15), já se tinha também afirmado que “(…) Em circunstâncias normais, um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado (…)”.).
Terceiro, que o Supremo Tribunal Administrativo já afirmou diversas vezes que o “conceito fiscal de prédio” para efeitos de IMI se diferencia do conceito civilístico (veja-se o que a este propósito se afirma com toda a propriedade na sentença recorrida, assim como na jurisprudência deste Supremo Tribunal aí referida) e que considerou que outros tipos de “equipamentos” podem ser qualificados como “prédio”, na categoria de “outros”, para efeitos de IMI, como sucedeu com as praças de touros (V. acórdão de 10 de Abril de 2013 (proc. 0770/12).).
Assim, não assiste razão à Recorrente nos argumentos que esgrime para afastar a classificação do parque eólico enquanto unidade económica em si como “prédio”, ou seja, a universalidade dos bens que, tal como resulta da matéria de facto assente, é integrada pelos aerogeradores e edifício de comando (ponto K da matéria de facto). E consideramos que a Recorrente não apresenta argumentos que permitam afastar aquela qualificação como “prédio” por várias razões.
Primeiro, porque esta universalidade de equipamentos, com implantação física no terreno, que constitui um parque eólico, reúne as características de “construção incorporada ou assente em fracção de território, com carácter de permanência, dotada de autonomia económica em relação a este [ao terreno] e integrada no património de uma pessoa singular ou colectiva”, o mesmo é dizer que se subsume ao conceito de prédio do artigo 2.º, n.º 1 do CIMI.
Segundo, porque o facto de o parque eólico estar “incorporado” ou “assente” num terreno baldio, não prejudica a classificação do parque eólico como prédio, atendendo ao facto de o mesmo ter “autonomia económica” em relação ao terreno onde está assente ou incorporado, i. e., em relação ao baldio, pelo que, para afeitos do disposto no artigo 2.º do CIMI existe autonomia económica e, por isso, jurídico-tributária, entre o terreno baldio e o parque eólico; uma autonomia que neste caso permite tributar o parque eólico, em si, independentemente do estatuto jurídico-tributário do terreno onde está implantado, tendo em conta que, enquanto o parque eólico “ocupar” aquele terreno, ele está funcionalizado à actividade desenvolvida pelo parque eólico, só recobrando a sua utilidade com o fim da actividade de electroprodução e o desmantelamento do parque eólico.
Terceiro, a cessão de exploração do baldio para a utilização dos terrenos para fins de produção de energia eléctrica, contratualizada com a Associação de compartes (ponto A da matéria de facto assente), constitui um negócio jurídico que, à data (a liquidação do IMI reporta-se ao ano de 2013), ainda era regulado pela Lei n.º 68/93, de 4 de Setembro. Neste diploma não se encontrava expressamente prevista uma tal possibilidade de aproveitamento económico dos baldios, nem pelos compartes, nem por terceiros (o que só viria a suceder com a Lei n.º 75/2017, de 17 de Agosto). Apesar disso, é indiferente para efeitos de determinação da tributação em IMI do parque eólico, a legalidade ou ilegalidade desse negócio jurídico (por efeito do disposto no artigo 10.º da LGT), bastando a prova de que (como resulta neste caso dos pontos A e B da matéria de facto assente) estamos perante uma construção assente ou incorporada naquele terreno e dotada de autonomia económica para que se considere, como já dissemos, preenchido o conceito de prédio do artigo 2.º do CIMI relativamente ao parque eólico.
E a autonomia jurídico-tributária do parque eólico relativamente ao terreno onde se encontre assente ou incorporado, que se retira do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI, permite explicar a improcedência dos argumentos da Recorrente a respeito da influência que sobre aquela qualificação poderia ter a qualificação ou não dos terrenos baldios como prédio, e a sua tributação ou não em sede de IMI. Por outras palavras, a tributação da construção assente ou implantada no terreno, sempre que reúna as características normativas de prédio para afeitos de subordinação à tributação em IMI (o que sucede neste caso), pode ser tributado de forma autónoma, i. e. independente da qualificação ou natureza jurídica que deva ser dada ao terreno que suporta o “assentamento” ou a “implantação” daquele “prédio”. A questão passa a colocar-se, eventualmente, em sede do valor patrimonial tributável que se há-de atribuir ao parque eólico, atento o facto de o mesmo “incorporar” ou “ocupar” aquele terreno, de forma temporária e com base num título contratual.
Em suma, improcede o argumento da Recorrente de que o parque eólico não constitui, em si, um prédio para afeitos de tributação em IMI.

3.2. Alega a Recorrente que o parque eólico, a ser tributado em sede de IMI, “a respectiva avaliação nunca poderia ser feita pelas regras do artigo 38.º do CIMI, mas somente pelo método do custo, sem adicionar o valor do terreno, na justa medida em que o terreno não pertence à Recorrente” (conclusão XII). Ora, este fundamento de ilegalidade do acto de liquidação do IMI não foi suscitado perante o TAF de Coimbra e dele não conheceu a sentença recorrida, pelo que, tratando-se de uma “questão nova”, conforme decorre de jurisprudência uniforme (v., por todos, acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Novembro de 2014, proc. 01508/12), dela não se conhece no âmbito do presente recurso.

3.3. Alega também a Recorrente que a tributação do parque eólico em IMI seria inconstitucional por violação do princípio da igualdade tributária (igualdade na contribuição para os encargos públicos) e da capacidade contributiva, na dimensão da justiça fiscal. Como argumento densificador deste tratamento fiscal desigual e injusto que resultaria da tributação do parque eólico em IMI, a Recorrente alega que o mesmo já é “tributado” nos termos do disposto no n.º 33 do Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88.
O TAF de Coimbra considerou que não se verificavam tais inconstitucionalidades, atento o facto de não terem sido apresentados elementos que justificassem a alegada discriminação de tratamento fiscal desta unidade de produção face a outras congéneres, igualmente tributadas em IMI.
E nas alegações recursivas este argumento continua a não apresentar fundamentos adequados para sustentar a alegada discriminação tributária. Na verdade, as razões expendidas pela Recorrente a este propósito são todas não atendíveis: i) seja quanto à alegada necessidade (e consequente violação in casu) de correspondência entre o montante de IMI exigido e o montante da despesa municipal que poderia ser imputada àquele prédio (configurando o IMI como um tributo de estrutura bilateral quando o mesmo é um verdadeiro imposto) (conclusões XVI a XVIII); ii) seja quanto à alegada elevada carga tributária que incide sobre a actividade de produção de energia eléctrica a partir desta tecnologia (conclusão XIX); iii) seja quanto ao que parece configurar como uma injustiça em si da tributação do parque eólico em sede de IMI (conclusão XX).
E ainda nesta sede a Recorrente parece alegar que a tributação do parque eólico em IMI e o pagamento da renda municipal pela produção de energia eólica, que incide sobre o montante mensal pago pela entidade receptora da energia produzida ao titular da licença de produção (“encargo” ad valorem de 2,5% previsto no n.º 33 do Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de Dezembro), resultaria numa “duplicação de tributação a favor do município” (conclusão XXI). Porém, este é um argumento que a Recorrente constrói de forma pouco perceptível. Primeiro, não afirma que se trate de um caso de dupla tributação – e bem, pois, mesmo a admitir-se que a “renda municipal da produção eólica” fosse um tributo, estaríamos sempre perante tributos e factos tributários totalmente distintos. Segundo, também não identifica a este respeito a violação de qualquer regra ou princípio constitucional, mas apenas de “critérios económicos” (violação do princípio da eficiência funcional e existência de uma situação de “inadequação genética”), colocando assim a questão num plano de inoportunidade da tributação e não de verdadeira ilicitude da mesma, o que constitui um limite funcional ao contrato judicial, decorrente do princípio da separação de poderes – não cabe ao tribunal apreciar a oportunidade dos tributos.
Por último, alega ainda que a tributação do parque eólico em sede de IMI violaria o princípio da capacidade contributiva, argumento que também não se acolhe atento o facto de, como vimos, o parque eólico, precisamente porque preenche o critério de ser uma construção com valor económico, constitui uma realidade subsumível ao conceito de prédio do artigo 2.º do CIMI e, nessa mesma medida, um bem fiscal (um facto tributário, um facto económico que exprime capacidade contributiva). Logo, incidindo a tributação sobre um bem fiscal não se verifica a violação do princípio da capacidade contributiva.
Em suma, não procede nenhum dos argumentos expendidos pela Recorrente para sustentar a inconstitucionalidade das normas que sustentam a tributação do parque eólico em sede de IMI.

3.4. Por último, a Recorrente alega que as deliberações que fixaram a taxa de IMI são ineficazes por falta de publicação (violando o artigo 119.º, n.º 2 da CRP) e constituem fundamento de anulação da liquidação.
Esta questão não é nova na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo e sobre ela já se pronunciaram os acórdãos de 13 de Março de 2019 (proc. 0425/15.7BEMDL) e de 14 de Outubro de 2020 (proc. 029/16.7BEMDL 0814/18) no sentido de que a alegada falta de publicação da referida deliberação municipal não afecta a validade do acto de liquidação.
E reiteramos aqui a solução propugnada nos arestos anteriores, pois se é verdade: i) que a Constituição impõe, como condição da respectiva eficácia jurídica, a publicação de qualquer acto de conteúdo genérico do poder local (artigo 190.º, n.º 2 da CRP); e ii) que o artigo 49.º da Lei das Finanças Locais (à data ainda a Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro) impunha a publicação em formato papel em local visível nos edifícios da câmara municipal e da assembleia municipal e na página principal do respectivo sítio electrónico dos valores em vigor relativos às taxas do IMI; também é verdade que a deliberação que fixa em concreto (entre o mínimo e máximo legal) a taxa de IMI não constitui um acto necessariamente reconduzível ao universo dos actos abrangidos pelo artigo 190.º, n.º 2 da CRP, e que o artigo 49.º da Lei das Finanças Locais não cominava com ineficácia as deliberações que não estivessem publicadas nos termos aí indicados.
Em outras palavras, e como se decidiu na jurisprudência precedente, uma eventual falta de publicação da deliberação que aprove a taxa do IMI não determina ipso facto a invalidade do acto de liquidação daquele imposto.
E percebe-se que assim seja, pois a garantia de publicidade dos actos de conteúdo normativo, que determina a sua ineficácia até que essa publicação tenha lugar, visa salvaguardar os direitos dos destinatários das normas (a protecção da confiança jurídica e, em última instância, a proibição de pré-efeitos dos actos normativos, que é um subprincípio do princípio do Estado de Direito), para que eles possam conhecer o seu conteúdo antes de serem confrontados com a produção dos respectivos efeitos jurídicos.
Ora, a deliberação que fixa em concreto a taxa do IMI partilha com os actos de conteúdo regulamentar algumas características de acto regulamentar (acto de conteúdo geral) de natureza executiva ou operativa da norma legal, no sentido de que é ela que torna operativa uma tributação de IMI a uma taxa superior a 0,3% na referida circunscrição municipal (até esse percentual a tributação tem sempre lugar, como resulta expressamente do n.º 14 do artigo 112.º do CIMI). Porém, a referida deliberação municipal já não partilha com aqueles actos (com os actos regulamentares do poder local), quer a característica de “acto de conteúdo inovador” (que é inerente a um acto normativo), quer a de acto normativo dotado de eficácia externa, ou seja, resulta do n.º 14 do artigo 112.º do CIMI, como, a seu modo, também se afirma na sentença recorrida, que o destinatário imediato daquela deliberação é o Estado (através dos serviços da AT), e que os munícipes são, em boa verdade, destinatários mediatos do acto aos quais deve também ser dado conhecimento do mesmo através da previsão da respectiva publicação, pese embora a omissão dessa publicação não seja sancionada com a respectiva ineficácia.
E a questão configura-se assim no plano jurídico atendendo à complexidade da relação jurídica subjacente ao IMI, segundo a qual o titular do poder tributário é o legislador (logo, o poder legislativo estadual) e o titular da capacidade tributária activa (de exigir o imposto) é a AT. O município é, essencialmente e apenas, o titular da receita, reconhecendo-lhe a lei, além disso, a possibilidade de exercer uma refracção do poder tributário num quadro legislativo legal e totalmente “conformado” (i. e., o poder de fixar em concreto a alíquota a aplicar aos prédios urbanos, dentro do mínimo e do máximo legalmente estipulado). Com isto queremos dizer que aquele “poder legalmente conformado” de fixação em concreto da taxa de IMI aplicável aos prédios urbanos é configurado na lei, primeiramente como um poder inter-institucional, que se exerce no quadro de uma relação jurídico-pública de co-gestão (estadual municipal) do IMI e não como um verdadeiro poder regulamentar (leia-se, como poder de tornar operativa ou executiva uma norma legal por meio da aprovação de uma norma regulamentar municipal). Sem o exercício do poder regulamentar pelo órgão competente, a norma legal não pode produzir efeitos para os respectivos destinatários, sem a fixação por deliberação municipal da alíquota do IMI aplicável aos prédios urbanos, nos termos do n.º 5 do artigo 112.º do CIMI, a liquidação daquele imposto, nos termos daquela norma, far-se-á igualmente, mas apenas pela taxa mínima de 0,3%. O poder tributário reservado pela lei ao município é assim, apenas um poder de agravar a alíquota legal do IMI até ao máximo fixado na lei e não o poder em si de fixar a alíquota, pois esta está fixada pelo legislador no mínimo de 0,3%e no máximo de 0,5%.
Por isso, a deliberação da assembleia municipal que “agrava” a alíquota do IMI tem como destinatário imediato o Estado através dos serviços da AT – só assim se explica que o n.º 14 do artigo 112.º do CIMI disponha que, para ser eficaz, esta deliberação tem de ser comunicada à AT até 30 de Novembro. Se o não for, a tributação terá lugar pela regra supletiva da taxa mínima de 0,3%.
Pergunta-se: e então isto significa que aquela deliberação não tem de ser publicitada? Já vimos que sim, que tem, que a lei (a lei das finanças locais, numa solução que hoje tem consagração no artigo 79.º da Lei n.º 73/2013, de 3 de Setembro) impõe a sua publicação e que ela é essencial no quadro do correcto funcionamento de um Estado de Direito. Porém, por causa destas especificidades que caracterizam o IMI (um imposto estadual de receita municipal, no âmbito do qual se reconhece ainda aos municípios o poder de sob conformação legalmente mediada agravar a alíquota legalmente fixada a aplicar aos prédios urbanos), não pode cominar-se a falta de publicação da deliberação com a sua ineficácia geral em relação aos munícipes, determinando, consequentemente, a invalidade de todos os actos de liquidação do imposto. Não pode porque não estamos, pelas razões antes aduzidas, perante um típico acto regulamentar do poder local, integrado na previsão do n.º 2 do artigo 119.º da CRP; e não pode porque a censura que a falta de publicidade neste caso merece é de outro tipo, ou seja, degrada-se em irregularidade não invalidante dos actos subsequentes.
Claudica por isso, também, o último argumento da Recorrente para sustentar a invalidade do acto de liquidação.


III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.


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Custas pela Recorrente [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e), do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário].
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Lisboa, 7 de Abril de 2021. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.