Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01410/17
Data do Acordão:05/30/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23365
Nº do Documento:SA22018053001410
Data de Entrada:12/12/2017
Recorrente:A...
Recorrido 1:IEFP - INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A………………. deduziu oposição à execução fiscal n.º 3590199701027182, a correr os seus termos no Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão – 2, decorrente de uma dívida ao Instituto do Emprego e da Formação Profissional I.P., no montante de € 26.187,39, motivada pelo incumprimento das obrigações assumidas, no âmbito do apoio financeiro concedido por uma Iniciativa Local de Emprego.
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1.2. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, por sentença de 30/06/2016 (fls.164/171), concluiu o seguinte:
«Pelas razões e fundamentos expostos, julgo a presente Oposição parcialmente procedente e, em consequência, julgo prescritos os juros moratórios vencidos antes de 26/04/2008, devendo o processo de execução fiscal seguir os seus termos.».
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1.3. É dessa decisão que o oponente recorre para o Supremo Tribunal Administrativo terminando as alegações com o seguinte quadro conclusivo (fls. 261 e seguintes):
«1 – O meio processual de oposição à execução é idóneo para conhecer da nulidade de citação, sendo que entendimento diverso, para além de desprovido de base legal bastante (do artigo 191º do CPC nada se postula quanto ao modo de arguição da nulidade, só quanto ao prazo), se afigura susceptível de gerar como efeito perverso a impassibilidade de arguir o referido vício, bulindo pois com o direito do recorrente a uma tutela jurisdicional efectiva, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP.
2 – Entender-se que a arguição da nulidade da citação deveria ocorrer mediante a apresentação de um requerimento autónomo equivale a sustentar que a A… teria que optar entre tal arguição e a apresentação de oposição à execução, não sendo previsível que o órgão de execução fiscal deferisse tal pretensão ordenando nova citação em tempo útil – resultando mesmo impossível que tal ocorresse caso o requerimento autónomo fosse apresentado no último dia do prazo para a sua apresentação, o qual corresponderia igualmente ao último dia do prazo para apresentação de oposição.
3 – Exigir – como parece decorrer da sentença proferida nos autos e de parte da Jurisprudência dos Tribunais Superiores – que o Recorrente escolha entre a apresentação de requerimento autónomo destinado a arguir a nulidade da sua citação e a apresentação de oposição à execução é força-lo à utilização deste último meio de reacção mesmo que haja ocorrido preterição de formalidades legais na citação a susceptíveis de gerar a respectiva nulidade nos termos do artigo 191.º do CPC.
3 – Caso se seguisse as duas linhas de reacção em paralelo (requerimento autónomo e oposição à execução), a aplicação do regime redundaria sempre na inviabilidade da marcha processual da oposição à execução, por existência de uma questão prejudicial – a nulidade da citação – cuja discussão não se operaria em sede da mesma, adivinhando-se até, além do mais, o argumento pernicioso de que, tendo sido formalmente deduzida oposição, a nulidade da citação se deveria considerar sanada.
5 – Também motivos de economia processual ditam que a questão da nulidade da citação deverá, como questão necessariamente prejudicial, ser discutida em sede de oposição à execução, não se vendo coerência, nem se concebendo vantagem, em permitir a existência de dois meios de reacção – oposição à execução e reclamação dos actos do órgão de execução fiscal – a utilizar simultaneamente em sede do mesmo processo de execução fiscal.
6 – A nulidade da citação tem enquadramento no fundamento de oposição à execução previsto na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, pois que a nulidade da citação, ao mesmo tempo que é susceptível de demonstrar por documento, não envolve e apreciação da legalidade da dívida exequenda, nem representa interferência em matéria de exclusiva competência do órgão de execução fiscal, cumprindo notar que o processo de execução fiscal se reveste, todo ele, de natureza judicial, nos termos do artigo 103.º da LGT – cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 22.882, de 24.03.1999.
7 – Qualquer petição de oposição – incluindo evidentemente aquela apresentada em sede dos presentes autos – tem em si implícito um requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal tendente ao acolhimento dos motivos que a fundamentam – incluindo a arguição da nulidade da citação, se esta for um deles.
8 – Atendendo a que a petição inicial é apresentada no órgão de execução fiscal onde pende a execução nos termos do artigo 207º n.º1 do C.P.P.T., este pode pronunciar-se sobre o mérito da oposição e até revogar o acto que lhe tenha dado fundamento e colmatar eventuais nulidades cometidas.
9 – Pelo que, a admissão em sede de oposição à execução fiscal da arguição da nulidade da citação consubstancia a única conduta decorrente de uma interpretação em conformidade com o disposto no artigo 96.º, n.º 1, do CPPT, em respeito pelos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP, ao mesmo passo que acautela a satisfação de interesses de economia processual também relevantes.
10 – Assim, o MM juiz do Tribunal “a quo” tinha o dever de se pronunciar no processo de oposição sobre a invocada nulidade da citação já que o meio utilizado foi o próprio.
11 – Caso assim não o entendesse, atento o preceituado no art. 97.º n.º 3 da Lei Geral Tributária e art. 98.º n.º4 do Código de Procedimento e Processo Tributário, o tribunal “a quo” ao invés de não se pronunciar quanto à invocada nulidade da citação, sempre devia ter convolado os autos de Oposição, pelo menos no que a estes argumentos respeita (nulidade de citação) em requerimento a apresentar junto do Órgão de Execução Fiscal por forma a ser por este apreciado e decidido no âmbito do Processo de Execução Fiscal.
12 – Desde logo porque, a alegada nulidade foi tempestivamente arguida e a petição de oposição não colide com qualquer exigência formal ou substancial do aludido requerimento.
13 – Pelo que a douta decisão proferida pelo tribunal “a quo” violou e ou interpretou erradamente o conjugadamente disposto nos artigos 204º nº 1 alínea i), 276º, 207 nº 1, 208 nº 2, 96 nº 1 e 98 nº 4 todos do C.P.P.T, artigo 191º do C.P.C., artigo 20 nº 1 e 268 nº 4 da CRP, artigos 97º e 103º da LGT.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas Venerandos Conselheiros doutamente suprirão deve ser julgado procedente o presente recurso revogando-se a decisão proferida e ordenando-se a baixa dos presentes autos para apreciação da invocada nulidade por ser de INTEIRA E MERECIDA JUSTIÇA.».
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1.4. O recorrido contra-alegou terminado as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«I – A Douta Sentença não merece qualquer reparo.
II – A Douta Sentença interpretou bem o artigo 204.º n.º 1, alínea i) do CPPT I).
III – A citação é o ato “destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada” — cfr. art.º 35.º, n.º 2 do CPPT.
IV – “No art.º 165.º do CPPT estão previstas as nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, que são situações de falta de citação e de falta de requisitos essenciais do título executivo quando não puder ser suprida por prova documental. Distintas são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. art. 191.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT). Estas nulidades só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados que, em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 191.º do CPC, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição (equivalente a contestação em processo declarativo) e só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, nos termos do n.º 4 do citado normativo solução que sempre resultaria do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT – cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, Áreas Editora, 5.ª edição, 2007, pág. 107 e seg.).
V – O Recorrente foi notificado do despacho proferido pelo Senhor Delegado Regional do Norte do IEFP, l.P de 17/05/1997, que determinou o vencimento imediato da totalidade da dívida e determinada a devolução das importâncias concedidas em 10 de julho de 1997.
VI – Acresce ainda que em 05 de abril de 2013 foi enviado ao Recorrente um ofício com o n.º 3590/7682/2012, ao qual foi anexo o título executivo.
VII – Em data posterior, o Recorrente foi notificado da Penhora/Citação pessoal, datado de 13 de abril de 2013, para proceder ao pagamento da dívida exequenda, acrescida de juros de mora, ou deduzir oposição, tendo este apresentado a oposição fiscal objeto dos presentes autos.
VIII – Ainda a acrescer o facto de, constituir jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores, que a nulidade atinente a falta de citação e a nulidade da própria citação, não constituem fundamento da oposição a execução fiscal por não estarem previstas nas diversas alíneas do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, nomeadamente na alínea i), pois a sua procedência não dão lugar a extinção da execução, mas sim à anulação dos atos subsequentes do processo, consubstanciando nulidades que devem ser invocadas e apreciadas no processo executivo em que ocorreram, tendo em vista a sua sanação e o prosseguimento do processo, com possibilidade de reclamação judicial da eventual decisão desfavorável, nos termos do disposto no art.º 276.º do CPPT.
IX – Assim, e havendo prova documental que comprova que o Recorrente foi notificado do despacho que declarou o vencimento imediato da dívida e determinada a devolução das importâncias concedidas, e o título executivo, não podia o Tribunal decidir diferente do que decidiu, ao considerar que na oposição a execução fiscal não podiam ser apreciadas as irregularidades dos títulos executivos.
X – O Recorrente poderia ter arguido a nulidade da citação mediante a apresentação de um requerimento autónomo, designadamente através de uma reclamação para o órgão de execução fiscal.
Xl – Atendendo ao exposto, a Douta Sentença não padece do vício de erro de julgamento ou de qualquer dos outros vícios que lhe são apontados.
XII – Pelo que andou bem a sentença recorrida ao julgar improcedente a oposição fiscal, mantendo a execução.
Nestes termos, e pelo muito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, mui doutamente suprirão, deverá a Douta Sentença recorrida ser mantida na íntegra, fazendo-se, assim, a costumada JUSTIÇA!».
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1.5. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia:
«1. Inconformado, veio o Oponente A…………. interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 30/06/2016, pela M.ma Juíza de Direito do TAF de Braga, que julgou a presente Oposição parcialmente procedente e, em consequência, julgou prescritos os juros moratórios vencidos antes de 26/04/2008, devendo o processo de execução fiscal seguir os seus termos legais (cfr. fls. 164 a 171 e 258 a 263 do processo em suporte físico, abreviadamente, p. f.)
2. Analisadas as conclusões formuladas a título de remate das suas alegações, constata-se que o Recorrente veio circunscrever o objeto do presente recurso jurisdicional ao específico segmento decisório que versou sobre a arguida nulidade da sua citação para os termos da execução fiscal, com fundamento na inobservância das formalidades prescritas no artigo 191.º, n.os 1 e 3 do CPPT (cfr., maxime, a conclusão 1.ª ínsita a fls. 261 e verso do p. f.)
Assim, veio o Recorrente insurgir-se contra essa concreta decisão que considerou incumbir ao juiz conhecer do pedido e fundamentos próprios do processo de oposição e, como decorrência, abster-se de apreciar e decidir os fundamentos alegados que não sejam fundamento da mesma, razão por que não analisou e julgou a questão da nulidade da citação.
Nesta vertente, o Recorrente veio imputar à sentença recorrida erros de julgamento, no que concerne à interpretação e aplicação do direito, com o que se mostraria violado o disposto nos artigos 204.º n.º 1, alínea i), 276.º, 207.º, n.º 1, 208.º, n.º 2, 96.º, n.º 1 e 98.º, n.º 4, todos do CPPT, no artigo 191.º do Código de Processo Civil (CPC), nos artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, ainda, nos artigos 97.º e 103.º, estes últimos da Lei Geral Tributária (LGT).
3. Conforme já assinalámos supra, a questão fulcral que se discute, no âmbito do presente recurso jurisdicional, resume-se a apurar se a nulidade da citação constitui – ou não – fundamento de oposição, atenta a taxatividade consagrada no proémio do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT e, na hipótese negativa, se a sua arguição, no âmbito da presente oposição, se traduziu em erro na forma de processo e, daí, se se impunha à julgadora do TAF de Braga a convolação da oposição em requerimento de arguição de nulidade, ao abrigo do n.º 4 do artigo 98° do CPPT.
Sucede que, nas conclusões que formulou, o Recorrente veio, desde logo, suscitar a questão da inconstitucionalidade da interpretação efetuada pelo tribunal a quo, por alegada afronta ao direito do Oponente à tutela jurisdicional efetiva, proclamado nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, ambos da CRP (vide a conclusão 1.ª, inserta a fls. 261 e verso do p.f.)
Todavia, o Ministério Público repudia essa alegação, porquanto é inequívoco que o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva não se mostra coartado ou cerceado, quando, como é o caso, o Recorrente se defendeu da execução que lhe foi instaurada pelo IEFP, I.P., deduzindo a presente Oposição, invocando, para além da nulidade da citação, fundamentos próprios deste meio processual, que foram devidamente apreciados e decididos pelo TAF a quo mediante decisão que, nesta parte, se mostra transitada em julgado.
Neste conspecto, a preterição do conhecimento da invocada nulidade da citação só a si próprio poderá imputar, por ter lançado mão de um meio processual impróprio para os fins que visava atingir.
Com efeito, a nulidade da citação para a execução fiscal não serve de fundamento à respetiva oposição, devendo, antes, ser arguida no processo executivo, que prosseguirá, depois de suprida a eventual nulidade (v., entre muitos outros, os doutos Acórdãos deste Colendo STA, de 28/02/2007, no Processo n.º 0803/04, de 01/07/2009, no Processo n.º 01050/08 e de 24/02/2011, no Processo n.º 0105/11, todos disponíveis in www.dgsi.pt tal como os demais a citar, de futuro).
Assim sendo, a decisão que venha a ser proferida pelo órgão de execução fiscal é que será passível de reclamação judicial, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
De resto, cumpre realçar que, apenas e somente, a falta de citação constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal, quando possa prejudicar a defesa do interessado, de harmonia com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a), do CPPT.
Acresce que só essa nulidade da citação tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dele dependam absolutamente, é de conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, conforme prescrevem os n.os 2 e 4 do já citado art.º 165.º.
Assim, em acutilante comentário, o M. Juiz Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA salienta que “(...) No art.º 165.º do CPPT estão previstas as nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, que são situações de falta de citação e de falta de requisitos essenciais do título executivo quando não puder ser suprida por prova documental. Como referido supra, distintas são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. art.º 191.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art.º 2.º alínea e) do CPPT). Estas nulidades só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados que, em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 191.º do CPC, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição (equivalente a contestação em processo declarativo) e só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, nos termos do n.º 4 do citado normativo solução que sempre resultaria do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT” (in Código do Procedimento e do Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, Áreas Editora, 5.ª edição, 2007, págs. 107 e segs.)
A ser assim, como de facto é, o Ministério Público propende no sentido de que a douta sentença em crise não merece censura, pelo menos, quanto a esta parte.
4. Pugna, ainda, o Recorrente que, a existir impropriedade do meio por si utilizado, a julgadora do TAF a quo, ainda então, errou, ao não determinar a convolação do processo de oposição na forma processualmente adequada, que seria a de requerimento de arguição de nulidade dirigido ao órgão de execução fiscal (vide as conclusões 11.ª a 13.ª, constantes de fls. 263 e verso do p. f.)
Todavia, esta alegação contraria a doutrina e a jurisprudência consagrada, v. g., no douto acórdão deste Colendo STA, tirado em 28/05/2014, no Processo n.º 01086/13, que, a dado passo da respetiva fundamentação jurídica exarou o seguinte:
“(…) O que nos leva à problemática suscitada pelo erro na forma do processo em caso de cumulação de pedidos. Recordemos aqui os ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA, sob a epígrafe «Erro parcial na forma de processo» (As referências que são feitas aos arts. 193.º e 199.º do CPC devem, em face do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, retificada pela Declaração de Retificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto, considerar-se feitas para os atuais arts. 186.° e 193°, respetivamente):
«Nos casos em que tenha sido efetuada cumulação de pedidos e a forma do processo seja adequada à apreciação apenas de um deles, não poderá haver correção da forma de processo quanto aos processos para os quais a forma de processo é inadequada, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.
Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 de art. 193.º do CPC é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequada, seguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado (…)”.
Destarte, bem andou a M.ma Juíza de Direito a quo, ao abster-se de tomar conhecimento da arguida nulidade da citação, razão por que o presente recurso deverá soçobrar também, no que concerne a este específico segmento recursivo.
5. Nos termos e com os fundamentos acima sucintamente explanados, o Ministério Público emite o parecer de que deverá ser negado total provimento ao presente recurso jurisdicional mantendo-se, pois, inteiramente, a sentença recorrida.»
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1.6. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
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2. A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«1) Em 12/11/1997, foi instaurado no Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão-2 o processo de execução fiscal com o n.º 3590199701027182 contra o oponente, para cobrança coerciva da quantia de € 26.187,39, acrescida de juros de mora, em dívida ao Instituto do Emprego e da Formação Profissional Norte - cfr. fls. 1 do PEF;
2) Em 10/10/1997, o Centro de Emprego de Vila Nova de Famalicão do IEFP emitiu a certidão de dívida constante a fls. 6 do PEF apenso e da qual consta, nomeadamente, o seguinte:
“(...) certificar que o empresário em nome individual A……………, (…) deve a este Organismo a quantia de Esc. 5.109.770$00 (...), correspondente ao apoio financeiro no valor de Esc. 5.324 400$00 (...) que lhe foi concedido por despacho do Senhor Director do Centro de Emprego de Vila Nova de Famalicão deste Instituto, datado de 94/07/08, do qual reembolsou Esc. 354.960$00 (...), acrescido de juros de mora vencidos até à data da presente certidão, no montante de Esc. 140.330$00 (...), à qual serão acrescidos os juros vincendos; calculados à taxa legal do art.º 559.º Código Civil
Porque o beneficiário não cumpriu as obrigações que assumiu foi determinado pelo Senhor Delegado regional do Norte do IEFP, em despacho datado de 97/05/15, a cobrança coerciva da quantia em dívida.
Nos termos e para efeitos do disposto no art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 437/78 de 28 de dezembro, lavra-se a presente certidão (…) afim de instaurar a competente acção executiva.”- cfr. 16 do PEF;
3) Em 08/08/1994, foi outorgado um documento denominado “Termo de Responsabilidade”, o qual se mostra assinado pelo Diretor do Centro e pela entidade beneficiária, o aqui Oponente, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais – cfr. fls. 7-9 do PEF;
4) Na cláusula n.º 8 do documento referido em 3) consta que “No caso de incumprimento deste Termo de Responsabilidade, será declarado o vencimento imediato da dívida e a devolução das importâncias concedidas e obtida a cobrança coerciva nos termos do Decreto-Lei 437/78 de 28 de Dezembro” – cfr. fls. 8-9 do PEF;
5) Por despacho proferido pelo Delegado Regional do Norte do IEFP de 17/05/1997, foi declarado o vencimento imediato da totalidade da dívida e determinada a devolução das importâncias concedidas – cfr. fls. 15-16 do PEF;
6) O teor do despacho referido em 5) foi comunicado ao Oponente por carta datada de 01/07/1997 e rececionada em 10/07/1997, no qual foi concedido um prazo de 15 dias para liquidação voluntária da quantia em dívida, findo o qual seria efetuada a cobrança coerciva – cfr. fls. 65-66 do PA;
7) Em 05/04/2013, o Oponente foi notificado do teor do ofício remetido pelo IEFP com o n.º 3590/7682/2012, do seguinte teor: “(...) cumpre-nos informar que o processo de execução fiscal supra mencionado, diz respeito a uma dívida ao Instituto do Emprego e Formação Profissional instaurada no ano de 1997, cuja cópia do título executivo se anexa.” – cfr. fls. 22 a 23 do PEF;
8) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 26/04/2013, o Oponente rececionou o documento enviado pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão-2, denominado “Notificação da Penhora/Citação Pessoal”, datado de 13/04/2013 e no qual é notificado, nomeadamente, para pagar a quantia em dívida no valor global de €42.725,72, sendo €26.187,39 referente à quantia exequenda e € 16.027,80 referente a juros de mora, ou para deduzir oposição com os fundamentos previstos no art.º 204.º do CPPT – cfr. documentos n.ºs 1 e 2 juntos com a petição inicial;
9) A presente ação deu entrada no Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão-2 em 03/05/2013, via correio postal — cfr. fls. - do SITAF.».
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3.1. A sentença recorrida identificou como questões a apreciar e decidir as seguintes:
- Da falta de citação pessoal;
- Da falta de título executivo;
- Da inexigibilidade da dívida por falta de notificação do tributo;
- Da falta de notificação do tributo no prazo de caducidade;
- Da prescrição da dívida exequenda e dos juros moratórios.
Concluiu pela improcedência parcial da oposição e, em consequência julgou prescritos os juros moratórios vencidos antes de 26-04-2008.
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3.2. Nas conclusões das alegações o recorrente questiona a sentença recorrida apenas na parte em que apreciou a questão relativa à invocada nulidade da sua citação para os termos da execução fiscal, com fundamento na inobservância dos n.ºs 1 e 3 do artigo 191.º, do CPPT.
Abandonou as demais questões decididas pela sentença agora em apreciação.
Questiona o recorrente a sentença uma vez que entendeu que compete ao juiz conhecer do pedido e fundamentos próprios do processo de oposição e não apreciar e decidir os fundamentos alegados pelo oponente e relativos à questão da nulidade da citação.
Como refere o MP “Nesta vertente, o Recorrente veio imputar à sentença recorrida erros de julgamento, no que concerne à interpretação e aplicação do direito, com o que se mostraria violado o disposto nos artigos 204.º n.º 1, alínea i), 276.º, 207.º, n.º 1, 208.º, n.º 2, 96.º, n.º 1 e 98.º, n.º 4, todos do CPPT, no artigo 191.º do Código de Processo Civil (CPC), nos artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, ainda, nos artigos 97.º e 103.º, estes últimos da Lei Geral Tributária (LGT).”.
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3.3. No que respeita à questão da falta de citação escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
“Alega o Oponente que a citação para os termos da execução não obedeceu ao disposto no art.º 191.º, n.ºs 1 e 3 do CPPT, o que conduz a um vício de forma que determina a nulidade da citação.
Não obstante o Oponente enquadrar este fundamento na falta de citação, verdadeiramente o que está em causa, atenta a causa de pedir, é uma eventual nulidade de citação pela não observância das formalidades prescritas na lei.
A citação é o ato “destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada” – cfr. art.º 35.º n.º 2 do CPPT.
No art.º 165.º do CPPT estão previstas as nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, que são as situações de falta de citação e de falta de requisitos essenciais do título executivo quando não puder ser suprida por prova documental. Como referido supra, distintas são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. art.º 191.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art.º 2.º alínea e) do CPPT). Estas nulidades só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados que, em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 191.º do CPC, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição (equivalente à contestação em processo declarativo) e só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, nos termos do n.º 4 do citado normativo (solução que sempre resultaria do disposto no art.º 165.º, n.º1, alínea a) do CPPT – cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, Áreas Editora, 5.ª edição, 2007, pág.107 e seg.).
O processo de oposição à execução é um meio processual que visa a extinção, total ou parcial da execução (podendo, no entanto, ter também por objeto a suspensão da execução) e que, como referido supra, só pode ter por fundamento factos enquadráveis no disposto nas várias alíneas do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT.
Como constitui jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores, à qual se adere, a nulidade atinente à falta de requisitos essenciais do título executivo, a nulidade por falta de citação e a nulidade da própria citação, não constituem fundamento da oposição à execução fiscal por não estarem previstas nas diversas alíneas do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, nomeadamente na alínea i), pois a sua procedência não dá lugar à extinção da execução, mas sim à anulação dos atos subsequentes do processo, consubstanciando nulidades que devem ser invocadas e apreciadas no processo executivo em que ocorreram, tendo em vista a sua sanação e o prosseguimento do processo, com possibilidade de reclamação judicial da eventual decisão desfavorável nos termos do disposto no art.º 276.º do CPPT (cfr. entre outros, Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso do STA de 28/02/2007, rec. n.º 0803/04, Acórdão do STA de 26/04/2012, proc. n° 01058/11, Acórdão do STA de 07/05/2014, proc. n.º 0198/14 e Acórdão do STA, de 08/07/2015, proc. n.º 0512/14).
Assim, deduzido em processo de oposição pedido próprio desse mesmo processo, aliado à arguição de fundamentos, uns próprios de oposição e outros próprios de outro meio processual, incumbe ao juiz conhecer do pedido e fundamentos próprios do processo de oposição, abstendo-se de apreciar e decidir os fundamentos alegados que não sejam fundamento da mesma, pelo que, o Tribunal não se apreciará este argumento invocado pelos Oponentes, passando à apreciação dos demais fundamentos aduzidos pelo Oponente na petição inicial.”.
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3.4. Acompanha-se a sentença recorrida quando afirma que a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição pois que é taxativo o n.º 1 do artigo 204.º do CPPT quando afirma que “a oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos”.
Nem cabe na alínea i) do mesmo nº 1 do referido artigo 204º como parece pretender o recorrente.
A nulidade da citação pode ser arguida no processo executivo que, como refere o MP, prosseguirá, depois de suprida a eventual nulidade (v., entre muitos outros, os doutos Acórdãos deste Colendo STA, de 28/02/2007, no Processo n.º 0803/04, de 01/07/2009, no Processo n.º 01050/08 e de 24/02/2011, no Processo n.º 0105/11) sendo, a decisão que venha a ser proferida pelo órgão de execução fiscal passível de reclamação judicial, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
É que, conforme refere, ainda o MP, apenas e somente, a falta de citação constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal, quando possa prejudicar a defesa do interessado, de harmonia com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a), do CPPT pois que só essa nulidade da citação tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dele dependam absolutamente e é de conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, conforme prescrevem os n.ºs 2 e 4 do já citado art.º 165.º.
É esta também a posição de JORGE LOPES DE SOUSA quando afirma o seguinte:
“(...) No art.º 165.º do CPPT estão previstas as nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, que são situações de falta de citação e de falta de requisitos essenciais do título executivo quando não puder ser suprida por prova documental. Como referido supra, distintas são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. art.º 191.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art.º 2.º alínea e) do CPPT). Estas nulidades só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados que, em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 191.º do CPC, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição (equivalente a contestação em processo declarativo) e só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, nos termos do n.º 4 do citado normativo solução que sempre resultaria do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPI” (in Código do Procedimento e do Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, Áreas Editora, 5.ª edição, 2007, págs. 107 e segs.).
Neste mesmo sentido pode consultar-se, por mais recente, o acórdão do STA de 08-07-2015, proc. 0512/14, em cujo sumário se escreveu o seguinte:
“II - Uma invocada nulidade do acto de citação também não constitui, no regime do CPPT, fundamento de oposição à execução fiscal, podendo ser arguida no processo de execução fiscal, que prosseguirá depois de suprida aquela.”.
É, por isso, de confirmar a sentença que neste sentido se pronunciou.
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3.5. Sustenta o recorrente que deveria a sentença em apreciação, a existir impropriedade do meio por si utilizado, determinar a convolação do processo de oposição na forma processualmente adequada e que seria a de requerimento de arguição de nulidade dirigido ao órgão de execução fiscal.
Escreveu-se na sentença recorrida (cfr. última parte do ponto 3.3.) o seguinte:
“…
Assim, deduzido em processo de oposição pedido próprio desse mesmo processo, aliado à arguição de fundamentos, uns próprios de oposição e outros próprios de outro meio processual, incumbe ao juiz conhecer do pedido e fundamentos próprios do processo de oposição, abstendo-se de apreciar e decidir os fundamentos alegados que não sejam fundamento da mesma, pelo que, o Tribunal não se apreciará este argumento invocado pelos Oponentes, passando à apreciação dos demais fundamentos aduzidos pelo Oponente na petição inicial.”
Não podia a decisão recorrida ordenar, por isso, a questionada convolação.
Acompanha-se, novamente, o MP quando afirma que a pretensão do recorrente contraria a doutrina e a jurisprudência consagrada, nomeadamente o acórdão deste STA, de 28/05/2014, Processo n.º 01086/13, em cuja fundamentação jurídica se afirma o seguinte:
“(…) O que nos leva à problemática suscitada pelo erro na forma do processo em caso de cumulação de pedidos. Recordemos aqui os ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA, sob a epígrafe «Erro parcial na forma de processo» (As referências que são feitas aos arts. 193.º e 199.º do CPC devem, em face do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, retificada pela Declaração de Retificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto, considerar-se feitas para os atuais arts. 186.° e 193°, respetivamente):
«Nos casos em que tenha sido efetuada cumulação de pedidos e a forma do processo seja adequada à apreciação apenas de um deles, não poderá haver correção da forma de processo quanto aos processos para os quais a forma de processo é inadequada, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.
Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 de art. 193.º do CPC é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequada, seguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado (…)”.
Não podia, nos termos expostos, a sentença recorrida ordenar a convolação da oposição em requerimento de arguição de nulidade, nos termos do n.º 4 do artigo 98° do CPPT.
É, por isso, também de confirmar a sentença recorrida nesta parte.
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3.6. Se bem entendemos o pensamento do recorrente parece suscitar a questão da inconstitucionalidade da interpretação efetuada pela sentença recorrida pois quem estaria em causa o direito do recorrente à tutela jurisdicional efetiva tal como resulta dos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, ambos da CRP.
Não descortinamos qualquer violação do direito de acesso e tutela jurisdicional efectiva pois que, como defende o MP, é inequívoco que o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva não se mostra coartado ou cerceado, quando, como é o caso, o Recorrente se defendeu da execução que lhe foi instaurada, deduzindo a presente oposição, invocando, para além da nulidade da citação, fundamentos próprios deste meio processual, que foram devidamente apreciados e decididos pela sentença recorrida mediante decisão que, nesta parte, se mostra transitada em julgado até porque a preterição do conhecimento da invocada nulidade da citação só a si próprio poderá imputar, por ter lançado mão de um meio processual impróprio para os fins que visava atingir.
Improcede também esta alegação.
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A nulidade da citação pode ser arguida no processo executivo sendo a decisão, que venha a ser proferida pelo órgão de execução fiscal, passível de reclamação judicial, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
Cumulados diversos pedidos, se a forma do processo é adequada à apreciação de apenas um deles, prosseguirá o processo quanto a este, não podendo haver correção da forma de processo quanto aos demais pedidos, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.
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4. Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 30 de maio de 2018. – António Pimpão (relator) – Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.