Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01200/17
Data do Acordão:06/27/2018
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:DECISÃO ARBITRAL
RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Sumário:I - O recurso para o STA de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cfr. o n.º 2 do artigo 25.º RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido - ou sendo-o, não devendo prosseguir para conhecimento do respectivo mérito - se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. o n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, aplicável “ex vi” do disposto no n.º 3 do artigo 25.º do RJAT).
II - Não havendo entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão deste STA eleito como fundamento contradição sobre a mesma questão fundamental de direito, não deve tomar-se conhecimento do mérito do recurso.
Nº Convencional:JSTA000P23464
Nº do Documento:SAP2018062701200
Data de Entrada:11/08/2017
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:Z...., SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

Z…………………, SA, apresentou pedido de constituição do tribunal arbitral no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), com vista à declaração de ilegalidade do acto de liquidação de IRC nº 20168310034867, no montante de € 13.638,44, da liquidação de juros compensatórios nº 201600001725582 e da demonstração de acerto de contas nº 201600014659864, datados de 31 de Agosto de 2016, respeitantes ao exercício de 2012, este proferiu a seguinte decisão datada de 26 de Setembro de 2017:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 23.°, n.° 1, alínea c) do CIRC, o que consubstancia vício de violação de lei e, consequentemente, declarar ilegais o ato de liquidação de IRC n.° 2016 8310034867, no montante de € 13.638,44, a liquidação de juros compensatórios n.° 2016 00001725582, e a demonstração de acerto de contas n.° 2016 00014659864, datados de 31.08.2016, respeitantes ao exercício de 2012.
b) Condenar a Administração Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos previstos no artigo 43.° da LGT e 61.º do CPPT
c) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento das custas do processo.

A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada recorre da decisão proferida, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 25º do RJAT, por a mesma se encontrar em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o acórdão datado de 30 de Maio de 2012, proferido no processo nº 171/11 por este STA.

Alegou tendo concluído como se segue:
1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, decisão prolatada pelo tribunal arbitral no âmbito do processo n° 80/2017-TCAAD, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, uma vez que a questão referente a saber se o custo era indispensável, face ao mesmo art. 23° n° 1 do mesmo Código, foram decididas diferentemente no Acórdão recorrido e no Acórdão fundamento.
2) Quanto à questão de direito em oposição, verifica-se a identidade de situações de facto porquanto, em ambos os processos, a AT não aceitou os custos com juros de empréstimos bancários contraídos por uma sociedade, por considerar que os mesmos não eram necessários para a realização dos proveitos ou ganhos da mesma.
3) Em ambos os processos, os juros decorreram de empréstimos bancários e a sociedade que contraiu os empréstimos estava integrada numa relação de grupo, sendo certo que os empréstimos foram contraídos e investidos a favor de outras sociedades integradas na mesma relação de grupo.
4) E, também em ambos os processos, a sociedade que contraiu os empréstimos não tinha como actividade inscrita no seu objecto social a gestão de participações sociais.
5) Verifica-se a identidade da questão de direito uma vez que quer o Acórdão fundamento quer a decisão arbitral recorrida, analisaram a questão de saber se aqueles custos podiam ser aceites nos termos do art. 23° n.° 1 do CIRC e se estava demonstrada a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos/rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
6) Contudo, o Acórdão fundamento e a decisão arbitral recorrida decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.
7) Assim, enquanto para a decisão arbitral recorrida os juros contraídos por uma empresa para financiar empresas subsidiárias/associadas, quer através de empréstimos concedidos quer através de prestações acessórias, sem remuneração, ambas inseridas numa relação de grupo, insere-se no escopo social da mesma e são custos necessários à obtenção dos seus proveitos ou à manutenção da fonte produtora, já para o Acórdão fundamento, pelo contrário, não só tais juros não estão directamente relacionadas com a actividade do sujeito passivo inscrita no seu objecto social, que não é a gestão de participações sociais ou o financiamento de sociedades de risco, como, por isso, não são indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
8) Acresce ainda que, entre a emissão do Acórdão fundamento e do Acórdão arbitral recorrido, não ocorreu qualquer modificação legislativa que fosse susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida, no sentido de servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados na determinação da solução jurídica.
9) E que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que o art. 23° n.° 1 do CIRC foi entendido e aplicado diferentemente, quanto à indispensabilidade do custo, pelos referidos Acórdãos, sendo certo, igualmente, que a orientação perfilhada na decisão impugnada não está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
10) Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 25° n.° 2 do RJAT, 152° n°2 do CPTA e 27° n°1 al. b) do ETAF.
11) Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que a decisão arbitral recorrida, ao ter considerado que os juros contraídos por uma empresa para financiar empresas subsidiárias/associadas, quer através de empréstimos concedidos quer através de prestações acessórias, sem remuneração, ambas inseridas numa relação de grupo, insere-se no escopo social da mesma e são custos necessários à obtenção dos seus proveitos ou à manutenção da fonte produtora fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 23° n° 1 do CIRC aos factos.
12) Na verdade, tendo em conta que a requerente tem como objecto social “o desenvolvimento de projetos de concessões, designadamente de estruturas rodoviárias, ferroviárias, portuárias, desportivas, hospitalares e prisionais, envolvendo exploração e eventualmente conceção, financiamento e construção e prestação de serviços e consultadoria no âmbito de projetos da mesma natureza” o financiamento gratuito de empresas subsidiárias/associadas, como se considerou no Acórdão fundamento, foge ao escopo social da mesma, não se antevendo qualquer interesse da requerente, mas só eventualmente do grupo.
13) Ora, o critério da indispensabilidade visa também impedir a consideração fiscal de gastos que não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa, que foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios.
14) Por outro lado, como também é salientado no Acórdão fundamento, a dedutibilidade dos gastos financeiros, por força do princípio da indispensabilidade previsto no n.° 1 do art.° 23.°, e concretizado na sua alínea c), pressupõe que os capitais alheios cedidos por terceiros sejam aplicados na exploração da empresa, o que aponta para a existência de um nexo de causalidade económica entre os custos em causa e a sua realização no interesse da empresa.
15) Se é verdade que não cabe à AT fazer juízos sobre a conveniência e oportunidade da estratégia adoptada pelas empresas, também é verdade que é atribuição legal da AT escrutinar, do ponto de vista da legalidade, o apuramento do lucro tributável e o cálculo do imposto a apagar pelos sujeitos passivos e, portanto, a extrair as necessárias consequências fiscais das decisões tomadas, mormente, na sua tradução em gastos incorridos e/ou em rendimentos obtidos.
16) E assim é que os encargos financeiros suportados pela então requerente não estão directamente associados à actividade desenvolvida que consiste em actividades de engenharia e técnicas afins, e não na gestão de participações sociais.
17) Donde, como se conclui no Acórdão fundamento, a mera possibilidade de vir a obter dividendos e assim obter no futuro ganhos, não determina, só por si, que tais investimentos possam enquadrar-se no conceito de custos fiscais porque para isso era necessário que fossem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora e, no caso, não são.
18) Finalmente, como também se refere no Acórdão fundamento, citando Rui Morais, in Apontamentos IRC, Almedina, Coimbra, 2007, pag. 87, “Se a assunção do encargo que origina o custo presidiu uma genuína motivação empresarial — o entendimento dos sócios e/ou gestores da sociedade, os únicos a quem cabe decidir do interesse social -, o custo é indispensável. Quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.), então tal custo não deve ser havido por indispensável.”
Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados, conhecer-se do objecto do presente recurso e resolver-se o conflito de jurisprudência quanto à questão de direito enunciada, no sentido do deliberado no Acórdão fundamento, uma vez que a decisão arbitral recorrida fez uma incorrecta apreciação e aplicação do artigo 23° n.° 1 do CIRC, quanto à determinação da indispensabilidade do custo para a realização dos proveitos ou ganhos/rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, aos factos.

Contra-alegou a recorrida tendo concluído:
1.ª A douta decisão arbitral recorrida julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela ora Recorrida com referência ao ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de IRC melhor identificada no introito, relativa ao exercício de 2012, determinando a sua anulação, com fundamento em vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do artigo 23° do Código do IRC;
2.ª Não se conformando com o decidido pelo Tribunal recorrido, a Requerida deduziu recurso de uniformização de jurisprudência alegando a contradição, quanto à mesma questão fundamental de direito, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão proferido pela 2.ª Seção do STA de 30.05.2012, no processo n.° 0171/11 (acórdão fundamento), pugnando pelo prevalecimento da posição adotada neste último acórdão;
3.ª Todavia, salvo o devido respeito, entende a Recorrida que, tanto inexiste identidade de situações de facto entre as referidas decisões, como inexiste identidade da questão de direito, que suportem a admissão do presente recurso de uniformização de jurisprudência;
4.ª De facto, enquanto no acórdão fundamento: i) a sociedade participada financia a sociedade dominante; ii) os encargos não têm qualquer relação com a atividade da sociedade; iii) o interesse do grupo era a justificação do custo; e iv) a sociedade participada tinha proveitos operacionais para os quais em nada contribuiu o financiamento feito à sociedade dominante;
5.ª Já no caso da decisão arbitral recorrida: i) a sociedade dominante aporta capital, estando vinculada a aportar esse capital sob a forma de prestações acessórias; ii) o aporte de capital à participada tem relação com a atividade porque a atividade e a forma de prossecução do lucro é feita através da detenção e gestão das sociedades concessionárias; iii) é o interesse individual que determina o aporte de capital às participadas; iv) os ganhos e proveitos individuais, operacionais, exploracionais, são os dividendos obtidos pela detenção das sociedades concessionárias.
6.ª Deste modo, resulta inequívoca a inexistência de identidade de situações de facto entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento, devendo julgar-se inadmissível o presente recurso de uniformização de jurisprudência;
7.ª Sem prescindir, refira-se que também não existe identidade da questão de direito, porquanto no acórdão fundamento afere-se da dedutibilidade fiscal de juros resultantes de empréstimos bancários contraídos com o objetivo de financiar outras sociedades do grupo e, por outro lado, na decisão arbitral recorrida afere-se da dedutibilidade fiscal de encargos financeiros vários afetos à realização de prestações acessórias, i.e., aportações de capital próprio nas sociedades participadas, realizadas por imposição do Estado Português pela adjudicação de concessões que obrigaram à constituição das sociedades participadas pela Requerida;
8.ª Acresce que, muito dificilmente pode haver uma oposição entre decisões quando a matéria se trate de dedutibilidade fiscal de custos;
9.ª Com efeito, tal deve-se à factualidade singular e diversa presente em cada caso, à peculiaridade de cada contexto empresarial em que se desenvolve a atividade da empresa e às finalidades específicas de cada custo e, por isso, à diferente valoração dos factos que é feita em cada caso concreto, que impõem bastante casuística na análise dos casos (cf., neste mesmo sentido, o Acórdão do STA, de 04.06.2014, proferido no processo n.° 01763/13, em que não se admitiu o recurso de uniformização de jurisprudência apresentado pela administração tributária);
10.ª Em face do exposto, resulta inequívoca a inexistência de identidade de questão de direito entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento, devendo julgar-se inadmissível o presente recurso de uniformização de jurisprudência;
11.ª Invoca ainda a Recorrente que o presente conflito de jurisprudência deve ser decidido no sentido do que foi decidido no acórdão fundamento, uma vez que a decisão arbitral recorrida fez uma incorreta interpretação e aplicação do artigo 23.° do CIRC;
12.ª Não procedem, no entanto, os argumentos invocados para esse efeito;
13.ª A propósito da interpretação do conceito de «indispensabilidade» vertido no artigo 23.° do Código do IRC, resulta, desde logo, da doutrina e da jurisprudência, de forma unânime e consensual, entre outras conclusões, que um custo “indispensável” será todo aquele que seja economicamente indispensável ou para a realização do proveito (de forma imediata) ou para a manutenção da fonte produtora (de forma mediata), pelo que não se pode estabelecer uma correlação direta com a obtenção de concretos proveitos nem impor uma necessária ligação causal entre custos e proveitos;
14.ª Basta que o custo seja incorrido no interesse da empresa e na prossecução de atividades resultantes do seu escopo societário;
15.ª Ainda, que só poderão ser recusados os custos que de forma evidente sejam estranhos ou alheios ao objeto e fim económico da empresa e que a atividade de uma empresa engloba tanto atividades operacionais, como não operacionais, designadamente, a realização de investimentos e a aquisição e alienação de participações financeiras [cf. entre outros, TOMÁS CANTISTA TAVARES, «Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento tributável das pessoas coletivas: algumas reflexões ao nível dos custos» in Ciência e Técnica Fiscal, n.° 396, 1999, p. 136; ANTÓNIO MOURA PORTUGAL, «A dedutibilidade dos custos na jurisprudência fiscal portuguesa» Coimbra Editora, 2004, p. 112: VÍTOR FAVEIRO, «O Estatuto do Contribuinte: a pessoa do contribuinte no estado social de Direito» Coimbra, 2002, pp. 847-848; RUI DUARTE MORAIS, «Apontamentos ao IRC» Almedina, 2007, pp. 86-87; MARIA DOS PRAZERES LOUSA, «O problema da dedutibilidade dos juros para efeitos da determinação do lucro tributável» in Estudos em Homenagem à Dr.ª Maria de Lourdes Correia e Vale, Lisboa, 1995, p. 349; SALDANHA SANCHES, «Os limites do planeamento fiscal» Coimbra Editora, 2006, p. 215; ANTÓNIO MARTINS, «A dedutibilidade dos juros e a noção de ‘atividade’ das sociedades: a propósito do artigo 23.° do CIRC» Revista IDEFF, Vol. V, 4, 2013 e «Uma nota sobre o conceito de fonte produtora constante do artigo 23.° do CIRC: sua relação com partes de capital e prestações acessórias» Revista IDEFF, Ano 1, n.° 2, junho 2008; TCAS, 03022/09, 06.10.2009; TCAN, 00624/05.OBEPRT, 12.01.2012; STA, 1236/05, 29.03.2006; CAAD, 39/2013-T, 14.10.2013)];
16.ª Acresce, por seu turno, que os custos com encargos financeiros e, em concreto, os encargos financeiros relacionados com a aportação de capital às participadas, apresentam determinadas especificidades. Todavia, é vasta a doutrina e a jurisprudência que naturalmente conclui pelo seu cabimento empresarial e económico e pela sua aceitação fiscal [cf. entre outros, MARIA DOS PRAZERES LOUSA; ANTÓNIO MARTINS; CAAD, processos n°s 12/2013; 39/2013 (com JORGE LOPES DE SOUSA como árbitro-presidente); 113/2013; 376/2014; 549/2015; 614/2015; 695/2015; 405/2016; 81/2017; 115/2017; e, mais recentemente, 298/2017];
17.ª Conforme resulta amplamente da doutrina e jurisprudência citadas, os encargos financeiros afetos à realização de prestações acessórias, prestações suplementares, subscrição de capital social ou quaisquer aportações de capital próprio nas sociedades participadas podem ser perfeitamente enquadráveis no exercício da atividade empresarial;
18.ª Ou seja, o conceito de atividade empresarial não se esgota em meras operações produtivas e comerciais, englobando, designadamente, a gestão de participações sociais e o exercício indireto da atividade operacional;
19.ª O aportar de fundos a uma participada pela subscrição do respetivo capital ou pela realização de prestações acessórias ou suplementares é feito no interesse da participante, a fim de, garantindo a sustentação financeira do ativo adquirido, incrementar o seu potencial de fonte produtora do rendimento;
20.ª A participação financeira é um ativo cuja gestão constitui atividade da participante, da qual esta espera resultarem rendimentos, os quais, neste caso, ocorrem em função da evolução esperada dos negócios da participada;
21.ª Pelo que um investimento financeiro numa participada constitui atividade própria da participante, feito no seu interesse, inserido no seu escopo lucrativo e não constitui, contrariamente ao invocado pela administração tributária, a prossecução de atividade alheia;
22.ª Ainda, conforme igualmente realçam essa jurisprudência e doutrina citadas, mesmo quando uma sociedade efetue prestações sem vencimento de juros (acessórias ou suplementares) está, por essa forma, a atuar objetivamente dentro da sua capacidade (dentro do seu perfil lucrativo),
mesmo quando não tenha (não queira usar) fundos próprios para efetuar essas prestações, e tenha, por isso, de se socorrer de fundos de terceiros (e, com isso, tenha de pagar os correspondentes juros);
23.ª A realização de prestações (acessórias / suplementares) corresponde a um instituto previsto e regulado pelo direito comercial e as sociedades que os utilizam nas suas operações financeiras estão a efetuar negócios lícitos e inseridos na sua capacidade, ainda que não lucrativos no curto prazo, porque não geram qualquer rédito no imediato;
24ª Os investimentos em apreço não são, de todo, gratuitos, pois que, a longo prazo, eles irão gerar a ocorrência de dividendos (lucros gerados nas participadas que devem estatutariamente ser distribuídos) ou de mais-valias (por alienação onerosa, com ganho, das participações detidas);
25.ª Por outro lado, a detenção de participações financeiras em participadas pode sempre também dar lugar ao reconhecimento de réditos na esfera da participante por aplicação do método de equivalência patrimonial (MEP) e, ainda, ganhos por aumentos de justo valor em investimentos financeiros;
26.ª Refira-se, por fim, que a decisão do STA consubstanciada acórdão fundamento versa sobre situação em que os encargos correlacionados com empresas associadas não tiveram efetivamente qualquer relação com a atividade da empresa, contrariamente ao que sucede nos autos;
27.ª Pelo que, analisado à luz da melhor doutrina e da mais recente jurisprudência o conceito geral de indispensabilidade de custos e, em concreto, dos custos com encargos financeiros derivados de aportações de capital às participadas, bem se concluiu na decisão arbitral recorrida pela dedutibilidade dos encargos financeiros em apreço;
28.ª Com efeito, na situação vertida na decisão arbitral recorrida, e como já aqui foi explicado, estão em causa prestações acessórias não remuneradas, às quais é conferido o tratamento de prestações suplementares, portanto, registadas na esfera da sociedade beneficiária em contas de capital. A atividade operacional da ora Recorrida consiste na gestão das participações que detém nas concessionárias, reconduzindo-se os seus proveitos operacionais, em 100%, a essa atividade;
29.ª Não há qualquer substituição das participadas no exercício da respetiva atividade — o que há é a estruturação do grupo de forma plurissocietária, correspondendo a cada concessão uma sociedade autónoma, o que decorre imperativamente das normas sobre contratação pública;
30.ª A ora Recorrida é uma sociedade com atividade comercial direta mas também indireta, pela gestão das participações que detém nas concessionárias. A sua atividade consiste, pois, na gestão dessas participações sociais e no exercício, assim, indireto, da atividade operacional, sendo que só assim é possível o desenvolvimento das várias concessões nas diversas áreas;
31.ª Os encargos financeiros em apreço prendem-se com a realização de prestações acessórias e com a prestação de garantias do pontual cumprimento daquelas prestações — obrigações assumidas por imposição do Estado Português com a celebração dos acordos de subscrição e de realização de capital nas entidades concessionárias e, assim, imprescindíveis para a adjudicação das concessões;
32.ª Resulta inequivocamente que todos estes encargos foram incorridos no âmbito da atividade da Recorrida;
33.ª No caso em apreço, estamos perante a prossecução de uma atividade normal, com intuitos lucrativos:
34.ª Os encargos suportados são diretamente afetos a salvaguardar a operacionalização e rentabilização dos investimentos realizados pela Recorrida, os quais são o cerne da sua atividade;
35.ª Acresce ainda que, sendo certo que, como vimos, não se exige a ocorrência de um proveito concreto, mas a mera potencialidade de gerar proveitos, a verdade é que no caso da decisão recorrida, tais réditos ocorreram efetivamente;
36.ª Com efeito, resultou provados nos autos que a Recorrida registou no exercício em apreço (2012) saldo credor na conta #7851 — Rendimentos e ganhos em subsidiárias aplicação do MEP e na conta #7914 — Juros obtidos de financiamentos concedidos a subsidiárias (cf. anexo 1 ao doc. 1 da p.i.);
37.ª Pelo que não restam quaisquer dúvidas que a decisão arbitral recorrida fez uma correcta interpretação e aplicação do artigo 23.° do CIRC à situação fáctica sub judice;
38.ª Sem prejuízo do exposto, caso se entenda que o artigo 23.° do Código do IRC impede a dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros em apreço por os mesmos não serem indispensáveis, na medida em que resultam de uma atividade operacional exercida de forma indireta através da gestão de participações sociais, então a mencionada norma, com essa interpretação, enfermará de inconstitucionalidade, por violação do princípio da iniciativa privada, bem como por violação do princípio da capacidade contributiva, consagrados, respetivamente, no artigo 61.º e no artigo 104.º, n.° 2, da Constituição.
39.ª Em face de todo o exposto, bem andou a decisão arbitral recorrida quando concluiu pela dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros em apreço;
40.ª Pelo que, a admitir-se o presente recurso com vista à uniformização de jurisprudência, deve o presente conflito resolver-se no sentido da decisão arbitral recorrida.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado inadmissível, por inexistir identidade de situações de facto e por inexistir identidade de questão de direito, ou, caso assim não se entenda, firmar-se jurisprudência no sentido da decisão arbitral recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!

O Ministério Público notificado, pronunciou-se concluindo:
1) o Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Colendo Supremo Tribunal Administrativo deverá tomar conhecimento do presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência:
2) deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a decisão arbitral recorrida;
3) deverá ser proferido acórdão uniformizador no sentido firmado no douto Acórdão fundamento, de que não devem ser considerados como fiscalmente relevantes, nos termos e para os efeitos do artigo 23.º do CIRC, os custos com juros, imposto de selo de empréstimos bancários e encargos com garantias bancárias, contraídos pela impugnante com financiamentos a empresas associadas, ainda que em seu prejuízo e que não sejam estritamente necessários para a obtenção dos seus ganhos e proveitos individuais.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na decisão recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A. O objeto social da Requerente é o desenvolvimento de projetos de concessões, designadamente de estruturas rodoviárias, ferroviárias, portuárias, desportivas, hospitalares e prisionais, envolvendo exploração e eventualmente conceção, financiamento e construção e prestação de serviços e consultadoria no âmbito de projetos da mesma natureza.
B. Em sede de IRC, no período de 2012, a Requerente era sujeito passivo de imposto nos termos da al. a) do n° 1 do Artigo 2° do Código do IRC encontrando-se os lucros obtidos sujeitos a IRC nos termos da al. a) do n° 1 do Artigo 3° e do n.° 1 do artigo 17°, ambos do mesmo Código.
C. No ano de 2012, a contabilidade da Requerente revelava o registo da quantia de €6.540.685,59 na conta #25 — Financiamentos Obtidos.
D. Os contratos de mútuo, celebrados entre a Requerente e a Z…………, S.A. e a Z…………. SGPS, S.A., foram registados da seguinte forma:
EMPRÉSTIMOS OBTIDOS
ENTIDADES
ANOS
2011
2012
Z……….........….., SA
3.240.000,00
Z………….. SGPS, SA
3.300.685,59
TOTAL
6.540.685,59

E. O empréstimo à Z……………., S.A., no valor de € 3.240.000,00 contemplava uma taxa de juro EURIBOR a 6 meses + 4% de spread;
F. O empréstimo à Z…………. SGPS, S.A., no valor de € 3.300.685.59 contemplava uma taxa de juro EURIBOR a 6 meses + 4% de spread;
G. Os empréstimos destinaram-se a apoiar a tesouraria da Requerente, de forma a permitir que esta pudesse antecipar a realização de prestações acessórias à Auto Estrada do …………. (AE………..) devidas nos termos do acordo de subscrição e de realização de capital celebrado em 30 de maio de 2008, cfr. Anexo 3 ao RIT.
H. De ambos os contratos consta a obrigatoriedade de a Requerente realizar “prestações acessórias pecuniárias, devidas nos termos do acordo de subscrição e de realização de capital celebrado em 30 de maio de 2008”, “na sua qualidade de acionista da Auto- Estradas do ……….., SA (adiante AE……..) sociedade concessionária da concessão do …………..”.
I. No final do ano de 2012, a contabilidade da Requerente revela o registo, na conta #41 — Investimentos Financeiros, subconta #411300001 — Empréstimos Concedidos a Subsidiárias do saldo de €15.915.000,00.
J. De acordo com a informação prestada pela Requerente, trata-se de prestações acessórias gratuitas concedidas à sociedade X............ no valor de €9.792.000,00, e à sociedade V……… no valor e €6.123.000,00.
K. Relativamente à sociedade V……….., a Requerente, em conjunto com outros acionistas, formaram um consórcio destinado a apresentar a sua candidatura ao Concurso por Negociação para a celebração do contrato de concessão para a gestão do Edifício do Hospital da Ilha Terceira, tendo para o efeito constituído a sociedade V…………..
L. Na sequência da adjudicação, foi celebrado o contrato de concessão entre o Estado Português e a sociedade V……….., e, nesse momento, os respetivos acionistas comprometeram-se a subscrever e realizar fundos próprios além do capital social, sob a forma de prestações acessórias pecuniárias gratuitas e de empréstimos subordinados aos créditos dos Bancos financiadores.
M. Relativamente à sociedade U……………, a Requerente, em conjunto com outros acionistas, integraram o Agrupamento concorrente ao concurso público para a celebração do Contrato de Gestão referente ao Novo Hospital de Vila Franca de Xira, ao qual foi adjudicada a realização de prestações de saúde promotoras, preventivas ou terapêuticas no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, através do Hospital de Vila Franca de Xira e a gestão do Novo Edifício Hospitalar, compreendendo as actividades de concepção, projecto, construção, financiamento, conservação e manutenção do mesmo.
N. No âmbito do acordo de realização e subscrição de capital da U……………… prevê-se que os acionistas contribuam para os Fundos Próprios da Entidade Gestora do Edifício e constituam garantias bancárias para garantir as suas obrigações de subscrição.
O. Na conta #412300001 — Empréstimos Concedidos a Associadas, encontra-se inscrito o valor de €14.655.669,94, que de acordo com a informação prestada pela Requerente se refere, respetivamente, a prestações acessórias no valor de €10.000.000,00, e a financiamentos no valor de €4.655.670,00 concedidos à sociedade T…………………..
P. Na conta #69 — Gastos e Perdas de Financiamento, no decurso do ano de 2012, a Requerente contabilizou gastos de financiamento com os créditos obtidos, no montante global de €1.117.994,57, conforme se discrimina no quadro infra:

CONTADESIGNAÇÃOVALOR
691800001Juros de mora€819,49
691800099Outros juros€390.576,33
698800002Encargos garantias bancárias€726.598,75
TOTAL€1.117.994,57
Q. Da ação inspetiva realizada pelos SIT resultou uma correção ao IRC apurado pela Requerente no montante total de € 1.144.274,97.
R. O referido montante é composto pelas seguintes parcelas:

Conta
Designação
Valor
681232170IMPOSTO DO SELO – OPERAÇÕES FINANCEIRAS
26.280,40€
691800001JUROS DE MORA
819,49€
691800099OUTROS JUROS
390.576,33€
698800002ENCARGOS GARANTIAS BANCÁRIAS
726.598,75€
TOTAL
1.144.274,97€

S. Requerente efetuou o pagamento da liquidação adicional de IRC impugnada.
Nada mais se deu como provado.

No acórdão fundamento deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
“1. A Administração Fiscal, no âmbito de acção de inspecção, procedeu a correcções aritméticas, as quais deram origem a liquidação adicional de IRC;
2. A Impugnante, foi notificada da liquidação adicional nº 20058310006609 de IRC relativo ao ano de 2002, no valor de 76 782.14 €, cuja data limite de pagamento voluntário terminava no dia 15.06.2005;
3. Do relatório da inspecção, datado de 21.04.2005, e com relevância para o caso consta de fls. 20 a 44 do Processo Administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
4. A Impugnante tem por objecto social a compra e venda de bens imobiliários e está enquadrada no regime geral para efeitos de determinação do lucro tributável;
5. A Impugnante é uma sociedade anónima, com capital social de 1 247 500€, sendo detido pela sociedade B……, S.A.;
6. A Impugnante insere-se num grupo de empresas, das quais fazem parte C……, S.A. que são detidos a 100% pela B……, S.A..;
7. No decurso da inspecção foi detectado que a Impugnante contabilizou no exercício de 2002, como custo fiscal, os encargos financeiros (juros e imposto de selo) relacionados com a obtenção de crédito junto de instituições financeiras, no valor de 15 296.61 €;
8. Os encargos financeiros são derivados de juros e impostos de selo incidente sobre os financiamentos às C……, S.A. e B……, S.A..;
9. A Administração Fiscal procedeu à correcção da matéria colectável em sede de IRC do exercício de 2002, no valor de 217.706.74 €;
10. Em 28.07.2005, a Impugnante reclamou graciosamente, a qual por despacho de 12.09.2006 veio a se indeferida;
11. Em 28.09.2006 a Impugnante apresentou a presente impugnação judicial.”
Nada mais se deu como provado.
Há agora que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
Da admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos.
Dispõe o artigo 25.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), ao abrigo da qual foi o presente recurso interposto, que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Também se colhe do n.º 3 do mesmo preceito legal que ao recurso previsto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral.
Há, assim, primeiramente, saber se existe oposição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão deste STA (rec. n.º 0171/11) invocado como fundamento quanto à mesma questão fundamental de direito e, após - caso seja de reconhecer a existência de tal oposição -, se a orientação perfilhada na decisão arbitral recorrida está ou não de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, pois que apenas no caso de o não estar haverá que admitir o recurso, ex vi do n.º 3 do artigo 152.º do CPTA (aplicável por remissão do n.º 3 do artigo 25.º do RJAT).
Como se deixou consignado no acórdão do Pleno desta secção do STA de 4 de Junho de 2014, rec. n.º 01763/13, para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento é exigível «que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica e que se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos: o que, como parece óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos. Sendo que a oposição também deverá decorrer de decisões expressas, que não apenas implícitas. (Cfr., neste sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 25/3/2009, rec. nº 598/08 e do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, de 22/10/2009, rec. nº 557/08; bem como Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 1004 e ss.; e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 44 ao art. 279º pp. 400/403.)».

Vejamos se tais pressupostos se verificam no caso dos autos.
Na decisão recorrida identificou-se do seguinte modo a questão a decidir: A questão fundamental a apreciar no presente processo é acerca da dedutibilidade fiscal dos gastos incorridos com encargos financeiros (juros de empréstimos e encargos com garantias bancárias) suportados pela Requerente com financiamentos a empresas subsidiárias/associadas, quer através de empréstimos concedidos, quer através de prestações acessórias, nos dois casos sem remuneração; por sua vez no acórdão fundamento identificou-se a questão relevante nos seguintes termos: No caso em apreço, resulta da factualidade dada como provada que a ora recorrente contabilizou, no exercício de 2002, como custo fiscal, os encargos financeiros com juros e imposto de selo, derivados da obtenção de financiamento bancário, com vista a fazer face a necessidades financeiras das empresas do grupo, sendo que a recorrente suportou na íntegra os referidos encargos, uma vez que não os debitou às sociedades beneficiárias.
A questão central está em saber se tais encargos podem relevar como custos fiscais, nos termos e para os efeitos do art. 23º do CIRC.
Enquanto que na decisão recorrida se concluiu pela admissibilidade e relevância fiscal de tais gastos no âmbito de aplicação do disposto no artigo 23º do CIRC, já no acórdão fundamento se concluiu que à luz do art. 23º do CIRC, não devem ser considerados como fiscalmente relevantes os custos com juros e imposto de selo de empréstimos bancários contraídos pela impugnante, ainda que em seu prejuízo e não sejam estritamente necessários para a obtenção dos seus ganhos e proveitos individuais, sendo certo que entre a impugnante e as empresas beneficiárias existe uma relação de domínio total.
Enquanto no acórdão fundamento a questão da dedutibilidade fiscal reportava-se a juros resultantes de empréstimos bancários contraídos por uma sociedade com o objetivo de financiar outras sociedades do grupo, sem que tenha ficado provado qualquer dado justificador para essa operação e sobretudo para ser a impugnante a fazer o empréstimo e a suportar o respectivo custo, já na decisão arbitral a questão da dedutibilidade fiscal reporta-se a encargos financeiros vários afetos à realização de prestações acessórias, ou, como diz a recorrida, a aportações de capital próprio nas sociedades participadas, realizadas por imposição do Estado Português pela adjudicação de concessões que obrigaram à constituição das sociedades participadas pela Requerida.
E, na verdade, consta da factualidade provada (alíneas G. e H.) que os empréstimos se destinaram a apoiar a tesouraria da própria Impugnante, de forma a permitir que ela pudesse antecipar a realização de prestações acessórias à Auto Estrada do ……….. (AE…………) devidas nos termos do acordo de subscrição e de realização de capital celebrado em 30 de maio de 2008, sendo que em ambos os contratos consta a obrigatoriedade de a Impugnante realizar “prestações acessórias pecuniárias, devidas nos termos do acordo de subscrição e de realização de capital celebrado em 30 de maio de 2008”, “na sua qualidade de acionista da Auto-Estradas do ………., SA (adiante AE………….) sociedade concessionária da concessão do ………….”.
Portanto, para além da diferença das realidades fácticas em presença (que a recorrida evidencia e que resultam dos probatórios de ambas as decisões), a questão colocada e decidida na decisão arbitral tem contornos específicos e distintos da questão colocada no acórdão fundamento, contornos que são aptos a ditar soluções distintas, afastando, por essa razão, a identidade da mesma questão fundamental de direito apreciada por ambas as decisões.

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário em não tomar conhecimento do objecto do presente recurso para uniformização de jurisprudência.
Custas a cargo da recorrente.
D.n.

Lisboa, 27 de junho de 2018. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – António José Pimpão – Dulce Manuel da Conceição Neto - José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Ana Paula da Fonseca Lobo – Pedro Manuel Dias Delgado.