Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01359/18.9BELSB
Data do Acordão:11/19/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO A POSTERIORI
ACTO
IMPUGNAÇÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26803
Nº do Documento:SA12020111901359/18
Data de Entrada:10/06/2020
Recorrente:A........
Recorrido 1:MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

1. RELATÓRIO

A………….., residente Rua ……….., Edifício ……., …….., ……. Esquerdo, em Chaves, melhor identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC) a presente acção administrativa urgente de contencioso dos procedimentos de massa contra o Ministério da Economia, com sede na Avenida da República, nº 79, em Lisboa, doravante ME, indicando como contra-interessados, ……….., ………………, ………………, ……………., …………….., ……………., …………..e………………, peticionando:
a) a declaração da nulidade ou a anulação do acto do Inspector-Geral da ASAE que homologou a lista de classificação final do concurso interno geral de ingresso, para preenchimento de 8 postos de trabalho, na carreira de inspector superior do mapa de pessoal da ASAE, publicado, sob o Aviso nº 2476/2014, no Diário da República, 2ª série, nº 34, de 18.02.2014; bem como,
b) a condenação da Entidade Demandada no seu provimento, na primeira vaga elegível, por aplicação da regra de prioridade prevista no ponto 18 do aviso de abertura do concurso;
ou, subsidiariamente,
c) a condenação da Entidade Demandada no pagamento do montante total de €.514.741,18, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes da morosidade do procedimento concursal, acrescido de juros de mora vincendos, desde a citação até integral pagamento.”
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Por decisão do TAC, datada de 05 de Fevereiro de 2020, foi decidido: a) julgar verificada a excepção dilatória inominada de inadmissibilidade da formulação do pedido subsidiário e, em consequência, absolver a entidade demandada da instância, na parte referente ao pedido de condenação no pagamento do montante de €.514.741,18 por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da morosidade do procedimento concursal, acrescido de juros de juros de mora vincendos; e,
b) julgar a acção improcedente e, em consequência, absolver a entidade demandada do pedido de declaração da nulidade ou de anulação do despacho do Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de 08.03.2018, que homologou a lista de classificação final dos candidatos aprovados no concurso publicitado, sob o Aviso nº 2476/2014, no Diário da República, 2ª série, nº 34, de 18.02.2014, bem como do pedido de condenação no provimento do Autor na primeira vaga elegível, por aplicação da regra de prioridade de recrutamento, prevista no ponto 18 do aviso de abertura do concurso.
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O Autor apelou para o TCA Sul e este, por acórdão proferido a 14 de Maio de 2020, negou provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.
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O Autor, inconformado, interpôs o presente recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões:
«1. Tendo em consideração que estes recursos devem ser interpostos e só devem ser admitidos quando a questão jurídica sobre a qual incidirá o juízo rescindente for precisa e rigorosamente enunciada, permitindo assim aos magistrados exercer, com eficiência, acerto e clareza, o supremo munus desta sua função, passaremos a enunciar, objectivamente, as questões que pretendemos submeter à digníssima apreciação deste Alto Tribunal.
2. A primeira questão é a de perceber até que ponto assiste ou não ao Réu, a faculdade de na fase dos articulados alterar os fundamentos do acto impugnado, sem que o acompanhe pela prática de qualquer acto administrativo de segundo grau, substitutivo ou anulatório do primeiro.
3. E, neste preciso âmbito, qual o limite do princípio do pedido, até que ponto pode, ou não, o Tribunal formar o seu juízo com base nesses novos fundamentos ou essas novas razões que propugnam pela validade de um acto, já praticado e sustentado por razões totalmente distintas e, por vezes, como é o caso, até contraditórias com a tese aventada pela Administração na sua contestação.
4. Salvo o merecido respeito, os presentes autos consubstanciam um exemplo elucidativo do que vimos de expor, pois: i) no acto impugnado diz-se que o Recorrente perdeu no decurso do procedimento concursal o direito ao recrutamento prioritário, porquanto deixou de se encontrar em mobilidade especial - tenha, presente que o concurso em apreço no ponto 18 do seu aviso previa que os trabalhadores em situação de mobilidade especial seriam colocados prioritariamente na vaga elegível; ii) na contestação a Administração e, depois o próprio Tribunal, vêm sustentar que, afinal de contas, o Recorrente nunca teve esse direito de integrar prioritariamente a vaga elegível em causa, porquanto não se candidatou na qualidade de trabalhador em mobilidade especial, mas sim, em licença extraordinária.
5. Conforme veremos, entendimento semelhante ao sustentado pelo Acórdão recorrido afronta as mais liminares garantias processuais, como seja a tutela jurisdicional efectiva, a igualdade de armas, o princípio do contraditório, a proibição de decisões surpresa e da estabilidade objectiva da instância.
6. A questão em apreço tem uma clara relevância jurídica e potencialidade de repetição num número indeterminável de casos similares – tanto assim é que, com frequência outras questões relacionadas com os poderes de cognição do Tribunal e com a fundamentação a posteriori têm sido tratadas por este Supremo Tribunal, mas, e isso afigura-se-nos como certo, nenhuma como a presente.
7. De facto, a matéria que trazemos a este Alto Tribunal parece não ter sido ainda desbravada, não havendo decisões a tratá-la com potencial uniformizador, pois, pese embora existam já várias decisões e posições doutrinárias sobre a impossibilidade do Tribunal ajuizar a validade do acto originário com base em novos fundamentos, totalmente estranhos e alheios ao mesmo, estas foram produzidas em larga medida quando ainda se encontrava em vigor a LPTA.
8. Esta questão torna-se, no entanto, mais nublosa, com a entrada em vigor do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, em que, como sabemos, há uma tendencial aproximação ao processo civil, em diversos aspectos, e, concomitantemente, um alargamento do âmbito dos poderes de cognição do Tribunal.
9. Nesta vertente, a intervenção deste Alto Tribunal afigura-se fundamental para garantir uma melhor aplicação do direito, pois, no âmbito em que nos movemos, temos que o Julgador deve cingir-se à apreciação do acto administrativo impugnado.
10. Depois, a outra questão que trazemos à apreciação deste Alto Tribunal, que mais releva e torna a decisão de uma injustiça gritante, prende-se com a interpretação do art. 32º da Lei nº 53/2006, de 7 de Dezembro.
11. Como veremos, entende o Tribunal a quo, seguindo a sentença proferida em 1ª instância, que a situação de licença extraordinária, prevista no art. 32º da Lei nº 53/2006, de 7/12 é distinta da mobilidade especial, assim não gozando o Recorrente da prorrogativa de prioridade concursal.
12. Deste modo, concluiu que a prioridade prevista no ponto 18 do aviso concursal não é aplicável ao Recorrente por o mesmo se encontrar, à data da candidatura, em licença extraordinária – todavia, este entendimento estribou-se numa interpretação extensíssima do mencionado normativo, a qual se reconduz a uma autonomização de regimes jurídicos que não resulta da lei.
13. Temos pois que, também sob esta óptica, se nos afigura ser absolutamente relevante a intervenção deste Tribunal, a fim de esclarecer se, no âmbito juslaboral, são admissíveis interpretações para além da letra da lei, que se traduzam numa supressão de direitos trabalhadores.
14. Em concreto, nesta concreta circunstância, se é ou não admissível concluir que um trabalhador que em mobilidade especial requereu a licença extraordinária, não detém a prioridade concursal reconhecida a qualquer trabalhador que se encontre na dita mobilidade.
15. Como veremos, na mencionada lei não há previsão legal que determine a redução ou substração daquela garantia de prioridade concursal - efectivamente, a lei não o refere e ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus!
16. E é assim que, quanto a nós, se impõe a intervenção deste Alto Tribunal, que se revela claramente necessária para contribuir para a estabilidade, segurança, previsibilidade e eficácia na aplicação do direito e, portanto, “claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
17. Vertendo-nos no mérito da questão primeiramente suscitada, temos que a mesma é bem mais complexa do que aquela que resultou apreciada, de modo liminar, pelo Tribunal a quo - referimo-nos, pois, aos limites do princípio do pedido no âmbito da acção administrativa, sob um particular enfoque: o da possibilidade que assiste, ou não, ao Réu, de na fase dos articulados alterar os fundamentos do acto impugnado, sem que o acompanhe pela prática de qualquer acto administrativo novo.
18. Efectivamente, se atendermos ao teor do acto impugnado, facilmente se constata que o que inviabilizou, no entendimento do Recorrido, o direito de prioridade de que o Recorrente se arroga titular, foi a sua opção em regressar em 2007 ao seu posto de origem, ao abrigo do art. 10º, nº 1 da Lei nº 25/2017.
19. Deste modo, o Recorrente formulou a sua pretensão focada, naturalmente, no entendimento cristalizado no acto impugnado - defendeu, assim e entre o mais, que as legitimas expectativas formadas ao longo do procedimento pelo Recorrente ditariam que o direito ao recrutamento prioritário se mantivesse até à ordenação final.
20. Todavia, em sede de contestação, o Recorrido veio sustentar que, afinal de contas, o Recorrente jamais deteve o direito à referida prioridade concursal, por se encontrar, aquando da candidatura ao procedimento, em situação de licença extraordinária e, não, em mobilidade especial - uma novíssima abordagem da questão, portanto.
21. Abordagem esta que a sentença proferida e confirmada pelo digno Tribunal a quo, acolheu integralmente, sustentando que o Recorrente não detinha ad initio qualquer direito à prioridade.
22. Todavia, não há norma, nem lei, nem princípio que admita uma decisão nestes termos sendo, assim, a actuação do digno Tribunal absolutamente inadmissível e, por sua vez, o entendimento do Tribunal Administrativo Central Sul, absolutamente erróneo.
23. Em primeiro lugar, porquanto não pode o Tribunal, perante a constatação da invocação de um determinado fundamento como suporte na decisão administrativa impugnada, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos – desde logo, tal equivaleria à admissão de uma fundamentação posteriori do acto administrativo impugnado que, como é consabido, está vedada à Administração, devendo a mesma ser contextual ao acto.
24. Depois, com a alteração de fundamentos põe-se o problema de manter um acto, que foi praticado por determinadas razões, distintas e prejudicadas pela nova fundamentação aduzida em sede de articulados pela Administração – tudo isto sem que tenha sido praticado qualquer acto novo.
25.Sem a prática de um acto novo não é possível, nem sequer aceitável, que o digno Tribunal ajuíze a validade do acto originário com base nesses novos fundamentos, totalmente estranhos e alheios ao mesmo, como sucedeu.
26. Se assim fosse e salvo o devido respeito, estaríamos perante um absoluto caos processual, em que o Tribunal, num limite, se poderia substituir à própria Administração, em violação clara, e liminar, do princípio da separação de poderes.
27. Assim, e por consequência do que vimos de expor, temos claro que o julgamento proferido excedeu o objecto dos presentes autos, não se identificando a causa do decidido com a causa de pedir do Recorrente.
28. Por outro lado, importa sublinhar que a questão que trazemos à apreciação deste Alto Tribunal nada tem a ver e não se confunde com o princípio de resolução global do litígio, consagrado no art. 95º do CPTA e segundo ao qual cabe ao Tribunal conhecer de todos os vícios do acto, mesmo quando não invocados, pois não se conheceu nenhum novo vício do acto impugnado, mas antes, uma nova causa de validade do mesmo, designadamente.
29. Sendo certo que nem sequer poder-se-á asseverar que opera o princípio utile per inutile non vitiatur, posto que não se pode afirmar, como nos impõe a lei, que o acto praticado teria exactamente o mesmo conteúdo sem o alegado vício.
30. Por outro lado, esta matéria jamais foi expressa e transparentemente invocada, de molde a que o Recorrente se pudesse defender nos autos – pois como decorre dos mesmos, em momento algum a questão foi levantada na contestação, como se de uma excepção se tratasse, nem foi sob esta perspetivo apreciada pelo digno Tribunal.
31. Numa palavra: uma acção de impugnação de actos administrativos não pode, pura e simplesmente, alhear-se do acto cuja validade é questionada em juízo.
32. Se assim suceder, como sucedeu in casu, estar-se-á perante uma ostensiva afronta às mais liminares garantias processuais, como seja a tutela jurisdicional efectiva, a igualdade de armas, o princípio do contraditório, a proibição de decisões surpresa e da estabilidade objectiva da instância.
33. Ainda no seguimento do que vimos de expor e noutra perspectiva, conforme se sustentou em sede recursiva, o julgamento proferido pelo Tribunal de 1ª instância, refere acrescidamente, que Recorrente não tem direito à prioridade, porquanto não deveria sequer ter sido admitido a concurso.
34. Portanto, temos que o juízo proferido assacou uma ilegalidade ex novo a um acto que não foi objecto de impugnação nos presentes autos; de resto, note-se ademais que o acto de admissão em questão se encontra consolidado na ordem jurídica, tendo-se formado caso decidido, uma vez ultrapassado o prazo de impugnação judicial de três meses.
35. Pelas razões expostas, o Recorrente alegou em sede recursiva que a sentença padece de nulidade, por excesso de pronúncia; sucede, porém, que o digno Tribunal Central Administrativo Sul recorrido não se pronunciou sobre a nulidade invocada.
36. Por outro lado, sustentou-se em sede de recurso que a sentença proferida padece de nulidade, por oposição entre os fundamentos de facto e a decisão; todavia, a este propósito o Acórdão Recorrido não explicita como alcançou a sua conclusão, limitando-se a transcrever integralmente alguns trechos da sentença proferida para, logo de seguida e em passant, concluir pela inexistência da nulidade invocada.
37. Conforme se alegou, é claro e evidente que a sentença concluiu paradoxalmente que o Recorrente não detinha o direito de ser prioritariamente recrutado, porque não estava em mobilidade especial, quando, como vimos, leva aos factos assentes que o Recorrente foi o único candidato em mobilidade especial no procedimento concursal em causa; a contradição é, pois, evidente.
38. Sem prescindir do que vimos de expor, temos que, e isto mesmo que mais releva e torna a decisão de uma injustiça gritante, a alegada distinção entre o regime de licença extraordinária e mobilidade especial operada pelo digno Tribunal a quo incorre em manifesto erro de julgamento.
39. Na verdade, ao invés do que sustenta o Acórdão em análise, o facto de o Recorrente ter requerido a licença extraordinária não faz dele um trabalhador fora da situação de mobilidade especial e, por isso, não fica excluída a possibilidade de ele beneficiar da prioridade concursal a que alude o ponto 18 do aviso do concurso.
40. Como resulta do disposto no art. 32º do RCM, a licença extraordinária é uma faculdade concedida exclusivamente aos trabalhadores em mobilidade especial, sendo precisamente esta última (mobilidade especial) seu pressuposto e inexorável condição.
41. Recorde-se, pois, que esta licença apenas podia ser concedida a trabalhadores em situação de mobilidade especial, em fase de requalificação ou compensação, de acordo com o nº 1 do art. 32º do ECM.
42. Ora, ao abrigo do referido regime, os trabalhadores em mobilidade especial podiam requerer a dita licença e fazê-la cessar a todo o tempo; mas tal circunstância não determinava, porém, a perda da condição de trabalhador em mobilidade especial - ou, melhor dito, da condição de trabalhadores excedentários, que, por razões de racionalidade financeira, foram afastados dos seus postos de trabalho.
43. A licença extraordinária consubstanciava, isso sim, uma das diversas medidas ou operações que este regime de mobilidade especial previu para encaminhar os trabalhadores então afastados dos seus postos, colocados numa situação de inactividade e a receber menos.
44. E tanto assim é que o art. 26º do RCM, sob a epígrafe “Cessação e suspensão do processo”, não identifica a licença extraordinária como causa extintiva ou suspensiva do dito regime ou processo de mobilidade especial.
45. Por conseguinte, não identificando o legislador a licença extraordinária neste elenco de circunstâncias extintivas ou suspensivas da mobilidade, não se poderá considerar que, requerendo-a, o trabalhador abandona o processo de mobilidade especial ou deixa de estar abrangido pelo complexo de garantias que é assegurado a estes trabalhadores - nomeada e precisamente, a prioridade em procedimento de recrutamento.
46. Todavia, o Acórdão recorrido, seguindo a sentença proferida, estriba-se no disposto no nº 4 do art. 32º do RCM, em que é mencionado que os trabalhadores em situação de licença extraordinária não têm os direitos e deveres constantes dos arts. 28º e 29º do RCM, entre os quais se encontra o direito a candidatarem-se a procedimentos concursais, para daí concluir pela inexistência do direito ao recrutamento prioritário.
47. Salvo o devido respeito, não podemos, pois, considerar que o legislador pretendeu retirar esse fundamental direito aos trabalhadores em licença extraordinária, carecendo a referida norma de uma interpretação teleológica e conforme à Constituição.
48. Se atendermos ao teor dos arts. 28º e 29º do RCM, bem se compreende que os mesmos visam, por um lado, garantir aos trabalhadores em mobilidade especial o núcleo duro de direitos que trabalhadores no activo detém e, bem assim, reforçar certos deveres, como seja a obrigatoriedade de se candidatarem a procedimentos concursais, visando, pois, a sua reintegração em postos de trabalho.
49. Sendo que, por sua vez, o nº 4 do art. 32º do ECM pretendeu adaptar esses mesmos direitos e deveres à situação de licença extraordinária, comprimindo, designadamente, aqueles que, dado o facto dos mesmos poderem exercer funções no sector privado, deixam de se verificar ou, de certo modo, sofrem uma atenuação (como seja, o dever de exclusividade ou os direitos à remuneração ou a férias).
50. De resto, igual conclusão se alcança se entendermos às demais licenças reconhecidas no ordenamento juslaboral, as quais, por via de regra, não comportam a perda de direitos ou garantias provenientes da relação jurídica originária.
51. Deste modo, considerando a teleologia desta operada restrição de direitos, carece de sentido, naturalmente na nossa visão, a perda da garantia fundamental de concorrer a procedimentos concursais (cfr. o art. 47º da CRP).
52. A estes dados acresce que qualquer supressão desse direito fundamental redundaria numa afronta palmar ao direito de acesso à função pública e aos princípios da igualdade, da segurança e da protecção da confiança e, bem assim, aos princípios da racionalidade e eficiência.
53. Em função do exposto, impõe-se concluir que os trabalhadores que requereram licença extraordinária, como foi o caso do Recorrente: a) não deixam de se tratar de trabalhadores em mobilidade especial e, assim, visados pelos fins deste específico instituto; b) gozam do direito fundamental de apresentação a concursos; c) gozam, de igual modo, do direito de serem recrutados prioritariamente.
54. Razões estas, todas elas, a ditar o desacerto do Acórdão recorrido, que enferma de flagrante erro de julgamento por afronta ao disposto nos arts. 26º, 28º, 29º e 32º do RCM, ao ponto 18 do aviso de abertura e ao art. 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27.02 e, bem assim, do direito de acesso à função pública e aos princípios da igualdade, da segurança e da protecção da confiança e, bem assim, aos princípios da racionalidade e eficiência (cfr. os arts. 47º, 13º e 53º da CRP e 5º, 8º e, 10º do CPA).
55. Para terminar, em sede recursiva o Recorrente sustentou ainda que a sentença proferida padecia de erro de julgamento por considerar que o facto de o Recorrente ter optado em regressar ao serviço de origem e não pela passagem à situação de licença sem remuneração, o impede de beneficiar da prioridade em causa.
56. Alegou-se, entre o mais, que na situação de que cuidamos, para observar a teologia imanente à regra da prioridade concursal na sua plenitude e para assegurar a maior efectivação do direito fundamental de acesso à função pública, é necessário interpretar o ponto 18 do aviso com o sentido de que a situação procedimental do candidato se estabiliza, em definitivo, no momento da admissão, sendo este o momento em função do qual se deve apurar os candidatos em situação de mobilidade especial para efeitos de ordenação.
57. Ora, quanto a esta questão o Acórdão recorrido não se pronunciou, desconsiderando totalmente o alegado; não resultando, ademais, que esta questão tenha ficado prejudicada pelo conhecimento da anterior.
58. Assim, e em face do exposto, impõe-se também concluir que o Acórdão recorrido padece de nulidade por omissão de pronúncia (cfr. art. 615, nº 1, al. d) do CPC); ou caso assim não se entenda, sempre a para todos os efeitos incorreu o Acórdão recorrido em flagrante erro de julgamento, por violação do ponto 18 do aviso de abertura, do art. 6º da Lei nº 25/2017, de 30 de maio, do art. 54º, nº 1, al. d) da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 e, bem assim, dos princípios da protecção da confiança, da boa-fé, da proporcionalidade e da justiça e razoabilidade.
59. Em suma, o Acórdão recorrido incorreu em manifesto erro de julgamento, por violação, entre o mais, do disposto nos arts. 3º, 608º, n° 2 e 615°, nº 1, als. b), c) e d) do CPC, no ponto 18 do aviso de abertura, no art. 6º da Lei nº 25/2017, de 30 de maio, no art. 54º, nº 1, al. d) da Lei nº 12-A/2008, de 27/0, nos arts. 26º, 28º, 29º e 32º do RCM.
60. E, bem assim, por evidente afronta aos princípios da proibição da fundamentação a posteriori e da separação de poderes, da tutela jurisdicional efectiva, da igualdade de armas, do contraditório, da proibição de decisões surpresa e da estabilidade objectiva da instância (cfr. os arts. 2º, 13º e 20º da CRP e 3º do CPC e 153º, nº 1 do CPA), bem como, do direito de acesso à função pública e aos princípios da igualdade, da segurança e da protecção da confiança e, bem assim, aos princípios da racionalidade e eficiência.
61. Impondo-se, assim, a sua revogação.»
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O recorrido e os contrainteressados não contra-alegaram.
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O “recurso de revista” foi admitido por acórdão deste STA [formação a que alude o nº 5 do artº 150º do CPTA], proferido em 10 de Setembro de 2020.
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O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 146º, nº 1 e 147º do CPTA, pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.
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Sem os vistos por não serem devidos, cumpre decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO
“A) – Por despacho do Secretário de Estado da Administração Pública, de 17.05.2008, o Autor foi afecto à Secretaria-Geral do Ministério da Economia e da Inovação, na situação de mobilidade especial, em regime especial de licença extraordinária, pelo período de 10 anos – Admitido por acordo - cfr. fls. não numeradas [designadamente, a Informação nº SJC/958/2018/SG] do PA;
B) – Em 18.02.2014, foi publicado, no Diário da República, 2ª série, nº 34, o Aviso nº 2476/2014, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
1 – Fundamentação: Mantendo-se em vigor as categorias de ingresso e acesso que integram a carreira de inspetor superior, nos termos da Lei nº 83-C/2013, de 31 de dezembro, bem como as normas relativas ao ingresso na carreira até à sua revisão a operar nos termos da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro, faz-se público que, por meu despacho de 16 de janeiro de 2014, se encontra aberto, pelo prazo de 10 dias úteis, contados da data da publicação do presente aviso no Diário da República, o concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de inspetor da carreira de inspetor superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - ASAE.
2 – Prazo de validade: O concurso visa o provimento dos postos de trabalho mencionados, caducando com o seu preenchimento.
(…)
4 – Legislação Aplicável: O presente recrutamento rege-se nos termos do Código do Procedimento Administrativo, dos Decretos-Leis nºs 204/98, de 11 de julho e 112/2001, de 6 de abril, e das disposições aplicáveis da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de fevereiro, na sua redação atual, bem como da Portaria nº 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 6 de abril.
5 – Local de trabalho: Em toda a estrutura central e nas unidades regionais da ASAE.
6 – Remuneração e condições de trabalho: A carreira em causa rege-se pelas disposições normativas aplicáveis em 31 de dezembro de 2008, conforme disposto na alínea i) do nº 2 do artigo 34º da Lei nº 83-C/2013, de 31 de dezembro, e com as alterações decorrentes dos artigos 46.º a 48.º, 74.º, 75.º e 113.º, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro. O vencimento é fixado nos termos do Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6 de abril, sendo as condições de trabalho e demais regalias sociais, as genericamente vigentes para os trabalhadores que exercem funções públicas.
6.1 – Durante a fase de estágio, os estagiários poderão optar pelo vencimento correspondente ao lugar de origem.
6.2 – Os estagiários aprovados no final do período probatório serão providos nos lugares postos a concurso.
7 – Requisitos gerais de admissão ao concurso: Ser detentor de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, ou encontrar-se em situação de mobilidade especial e possuir, cumulativamente, até ao termo do prazo de entrega das candidaturas fixado no presente Aviso, os requisitos enunciados no artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de julho, conjugados com o n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6 de abril.
(…)
10 – Formalização das Candidaturas – As candidaturas são formalizadas, até ao termo do prazo fixado no presente aviso, através de formulário de candidatura preenchido de forma legível e devidamente assinado, disponível na página eletrónica da ASAE em www.asae.pt, dirigido ao Inspetor-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, o qual poderá ser entregue, pessoalmente, durante as horas de funcionamento da secção de expediente da ASAE (9h30 -12h30/14h30-17h00), sita na Rua Rodrigo da Fonseca, nº 73, 1269 -274 Lisboa, ou enviado por carta registada com aviso de receção para a mesma morada, endereçada à ASAE, Departamento de Administração e Logística, em envelope fechado com indicação exterior “Concurso Interno de Ingresso - Inspetor Superior” e o número do Aviso de abertura.
(…)
13- Classificação final: A classificação final, expressa na escala de 0 a 20 valores, resultará da média aritmética ponderada dos resultados obtidos na prova de conhecimentos, exame psicológico de seleção e entrevista profissional de seleção, considerando-se não aprovados os candidatos que obtiverem nota inferior a 9,5 (nove vírgula cinco) valores. O sistema de classificação final, incluindo a respetiva fórmula classificativa, consta da ata de reunião do júri do concurso.
(…)
18 – O recrutamento efetua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos” – cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
C) – Em 29.07.2014, foi publicado no Diário da República, 2.ª série, nº 144, o Aviso nº 8656/2014, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Na sequência da recomendação da Provedoria de Justiça para abertura de novo prazo para apresentação de candidaturas ao concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de inspetor da carreira de inspetor superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - ASAE, aberto através do Aviso n.º 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, de 18 de fevereiro de 2014, alterado pelo Despacho n.º 6645/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 97, de 21 de maio de 2014, com aproveitamento de todos os atos procedimentais já praticados, determino a publicação do aviso de abertura do referido concurso, dando novo prazo para entrega de candidaturas, mantendo-se válidas as candidaturas já apresentadas no âmbito da anterior publicitação” - cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
D) – O Autor, em data não concretamente apurada, mas anterior a 18.03.2014, apresentou candidatura no concurso publicitado pelo Aviso n.º 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, nº 34, de 18.02.2014, a qual foi registada com o nº 671 – Admitido por acordo - cfr. fls. não numeradas [“Nota de remessa nº I/1304/14/SC”] no Vol. 4 do PA;
E) – Aquando do facto descrito na alínea anterior, o Autor encontrava-se integrado na carreira de inspector-adjunto, na categoria de inspector-adjunto especialista, tendo sido o único candidato que se apresentou, em situação de mobilidade especial, no concurso publicitado pelo Aviso nº 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, nº 34, de 18.02.2014 – admitido por acordo, cfr. fls. 66 dos autos;
F) – Em 18.05.2015, o Júri elaborou as listas finais dos candidatos admitidos e excluídos no concurso publicitado pelo Aviso nº 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, nº 34, de 18.02.2014, integrando o Autor na lista final dos candidatos admitidos – cfr. fls. não numeradas [“Ata nº 07” e respectivos anexos] do PA;
G) – Por ofício do INA - Direcção-Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas, com a referência “S-INA/2017/1754-111”, de 04.07.2017, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi comunicado ao Autor o seguinte:
“Com a entrada em vigor da Lei 25/2017, de 30 de maio, que revoga o regime de requalificação, os trabalhadores em situação de licença extraordinária, como é o seu caso, devem optar, até ao próximo dia 28 de agosto, por uma das quatro opções previstas na lei, apresentadas no folheto em anexo.
Deve manifestar ao INA, a sua opção, a qual corresponde à situação em que pretende ficar após o dia 28 de agosto, preferencialmente através do formulário eletrónico, disponibilizado na página www.ina.pt
(…)
REGIME DE VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL | REQUERIMENTO
PERÍODO TRANSITÓRIO (Lei nº 25/2017, de 30 de Maio)
TRABALHADOR EM SITUAÇÃO DE LICENÇA TRANSITÓRIA
____________________________________(nome completo) com o nº de identificação fiscal nº ________________, em situação de licença extraordinária, vem requerer ao abrigo do artigo 10.º, da Lei nº 25/2017, de 13 de Maio:
꙱ Regresso da situação de licença e ocupação do posto de trabalho existente ou a prever no mapa de pessoal do serviço de origem ou do serviço que sucedeu nas atribuições, em caso de extinção de serviço;
꙱ Cessação do vínculo por mútuo acordo, nos termos regulados no artigo 30.º da Lei nº 25/2017, de 30 de Maio (apenas para que esteja a, pelo menos, 5 anos da idade legal da reforma em 1 de Junho de 2017);
꙱ Aplicação do regime especial previsto no artigo 7.º da Lai nº 25/2017, de 30 de Maio (apenas quem detenha idade igual ou superior a 55 anos em 1 de Junho de 2017);
꙱ Pela passagem à situação de licença sem remuneração
H) – No dia 28.08.2017, o Autor optou pelo regresso à actividade, na Autoridade de Segurança Alimentar e Económica – admitido por acordo;
I) – Em 06.03.2018, o Júri elaborou a lista de classificação final dos candidatos aprovados nos métodos de selecção aplicados no concurso aberto pelo Aviso nº 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, nº 34, de 18.02.2014, da qual, cujo teor que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
NOME SITUAÇÃO CLASSIFICAÇÃO FINAL
…………………………………………. Aprovado 17,58
………………………………. Aprovado 17,26
………………………………. Aprovado 16,00
…………………………………………………… Aprovado 15,76
………………………………. Aprovado 15,72
………………………………. Aprovado 15,40
………………………. Aprovado 15,38
……………………………… Aprovado 15,32
………………………………. Aprovado 15,28
………………………………. Aprovado 15,24
……………………. Aprovado 15,22
………………………………. Aprovado 14,92
…………………………. Aprovado 14,74
…………………………………………. Aprovado 14,70
…………………………………. Aprovado 14,70
…………………………………………. Aprovado 14,44
……………………………… Aprovado 14,44
…………………………. Aprovado 14,42
…………………………………………. Aprovado 14,36
………………………………. Aprovado 14,32
…………………………………………. Aprovado 14,28
…………………………… Aprovado 14,26
………………………………. Aprovado 14,24
…………………………. Aprovado 14,14
………………………………. Aprovado 14,12
…………………………………………. Aprovado 14,10
………………………………. Aprovado 14,08
…………………………………………. Aprovado 14,04
…………………………. Aprovado 14,02
………………………………. Aprovado 14,00
A……………………………………. Aprovado 13,96
J) – Por despacho de 08.03.2018, o Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica homologou a lista identificada na alínea anterior – cfr. fls. não numeradas [“Ata n.º 30”] do PA;
K) – Em 26.03.2018, foi publicado, no Diário da República, 2.ª série, nº 60, o Aviso nº 4036/2018, de cujo teor, subscrito pelo Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, com data de 12.03.2018, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Homologada por meu despacho de 8 de março de 2018, torna-se pública, para os efeitos previstos no artigo 39.º conjugado com a alínea b) do nº 1 do artigo 40.º do Decreto-Lei nº 204798, de 11 de julho, a lista de classificação final dos candidatos ao Concurso Interno Geral de Ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de Inspector da careira de Inspector Superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, aberto pelo aviso nº 2476/2014, alterado pelo Despacho n.º 6645/2014, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 97, de 21 de maio de 2014 e pelo Aviso n.º 8656/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 114, de 29 de julho de 2014. Ficam os candidatos notificados, ao abrigo do disposto nos n.ºs 2 dos artigos 40.º e 43.º do mesmo decreto-lei, que da homologação da lista de classificação final cabe recurso hierárquico, a interpor no prazo de 10 dias úteis a contar da data da publicação da presente lista para o Secretário de Estado Adjunto e do Comércio” - cfr. fls. 51-60 dos autos e fls. não numeradas (Vol. 4) do PA.
L) – Em 20.07.2018, a petição inicial do presente processo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi submetida na plataforma do sistema informático de suporte à actividade dos tribunais administrativos e fiscais – cfr. fls. 1 a 49 dos autos;
M) – No dia 26.11.2018, foi publicado no Diário da República, 2ª série, nº 227, o Aviso nº 17094/2018, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, consta o seguinte:
1 – Nos termos do disposto no nº 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 74/2018, de 21 de setembro, do artigo 33.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei nº 35/2014, de 20 de junho, na sua atual redação, e de acordo com o n.º 3 do artigo 19.º da Portaria nº 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 de abril, torna-se público que por despacho do Inspetor-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de 19 de novembro de 2018, encontra-se aberto procedimento concursal comum para o preenchimento de 133 (cento e trinta e três) postos de trabalho da carreira especial de inspeção da ASAE, categoria de inspetor, na modalidade de nomeação, previstos no mapa de pessoal de 2019 desta Autoridade.
2 – Legislação aplicável: Decreto-Lei n.º 74/2018, de 21 de setembro; Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho; Portaria n.º 83 -A/2009, de 22 de janeiro, na sua redação atual e Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro.
3 – Âmbito do recrutamento: Nos termos das disposições conjugadas dos nºs 1, in fine e n.º 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 74/2018, de 21 de setembro, só podem ser admitidos ao presente procedimento concursal os trabalhadores detentores de vínculo de emprego público, na modalidade de nomeação, integrados na carreira de inspetor-adjunto da ASAE, prevista no Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6 de abril.
(…)
8 – Posicionamento remuneratório: O posicionamento remuneratório é determinado nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 31.º, aplicável por força do n.º 6 do artigo 33.º, ambos do Decreto-Lei n.º 74/2018, de 21 de setembro.
(…)
9.2 – São requisitos especiais de admissão:
a) Possuir vínculo de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecido, na modalidade de nomeação, integrados na carreira de inspetor-adjunto da ASAE;” – cfr. Diário da República;
N) – O Autor apresentou, no concurso aberto pelo aviso referido na alínea anterior, o instrumento intitulado “FORMULÁRIO DE CANDIDATURA AO PROCEDIMENTO CONCURSAL” de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:


cfr. fls – 225 – 229 dos autos.
O) – Por despacho de 27.06.2019, o Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica homologou a “LISTA UNITÁRIA DE ORDENAÇÃO FINAL” dos candidatos aprovados no concurso aberto pelo aviso referido em V), na qual o Autor consta ordenado na 46.ª posição, com a classificação final de 15,60 – cfr. fls. 215-220 dos autos;
P) – Em 16.07.2019, foi publicado no Diário da República, 2ª série, nº 134, o Aviso nº 11507/2019, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Nos termos do disposto na alínea d) do n.º 3 do artigo 30.º e do artigo 36.º da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 de abril, notificam-se os candidatos ao procedimento concursal comum com vista ao preenchimento de 133 postos de trabalho, da carreira especial de inspeção e categoria de inspetor do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), restrito a trabalhadores integrados na carreira de inspetor-adjunto da ASAE, aberto pelo Aviso n.º 17094/2018, publicado no Diário da República, 2.º série, n.º 227, de 26 de novembro, que a lista unitária de ordenação final, após homologação, se encontra disponível para consulta, nas instalações da ASAE sitas na Rua Rodrigo da Fonseca n.º 73, 1269-274 Lisboa, e na respetiva página eletrónica em www.asae.gov.pt” – cfr. fls. 215 dos autos.
Q) – Em 02.06.2015, a lista final dos candidatos admitidos, referida em F), foi publicada no Diário da República, 2.ª série, nº 106, sob o Aviso n.º 6003/2015, cujo teor, subscrito pelo Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, com data de 21.05.2015, aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
R) – Em 02.01.2018, o Júri elaborou o projecto de lista de classificação final dos candidatos aprovados nos métodos de selecção, aplicados no concurso aberto pelo Aviso n.º 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, de 18.02.2014, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai o seguinte:



- Conforme fls. não numeradas [“Ata nº 27” e respectivo Anexo II] do PA;

S) – Em 24.01.2018, foi publicado, no Diário da República, 2.ª série, n.º 17, o Aviso nº 1119/2018, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Após aplicação do método de seleção - Entrevista Profissional de Seleção aos candidatos ao Concurso Interno Geral de Ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de Inspetor da carreira de Inspetor Superior, aberto pelo Aviso n.º 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, de 18 de fevereiro de 2014, alterado pelo Despacho n.º 6645/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 97, de 21 de maio de 2014, e pelo Aviso n.º 8656/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 144, de 29 de julho de 2014, e em cumprimento do previsto no artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de julho, torna-se público o projeto de lista de classificação final relativo ao concurso supra mencionado, e que faz parte integrante do mesmo;
Os candidatos podem, no prazo de 10 dias úteis, a contar da publicação do presente Aviso no Diário da República, dizer por escrito, o que se lhes oferecer, no âmbito do exercício do direito de participação dos interessados;
(…)”.
– cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
T) – Em 07.02.2018, o Autor enviou, por correio, o requerimento dirigido ao Presidente do Júri, de cujo teor que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Eu, A……………, encontrando-me no projeto de lista de classificação final em lugar que não me corresponde, publicado pelo Aviso n.º 1119/2018, venho requerer o cumprimento conforme o legalmente estipulado no Aviso n.º 2476/2014, publicado no Diário da República, 2ª série, n.º 34, de 18 de fevereiro de 2014, alterado pelo Despacho n.º 6645/2014, publicado no Diário da República, 2.a série, n.º 97, de 21 de maio de 2014, e pelo Aviso n.º 8656/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 144, de 29 de julho de 2014, que determina todos os procedimentos e regras deste procedimento concursal, nomeadamente o do seu nº 18 na elaboração da respetiva lista de classificação final” – cfr. fls. 65 dos autos e fls. não numeradas [Anexos da “Ata nº 29”] do PA;
U) – Em 27.02.2018, o Júri elaborou a resposta constante do ofício, dirigido ao Autor, com a referência “S/5890/18/SC”, de 05.03.2018, de cujo teor que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
ASSUNTO: Participação de interessados no âmbito do concurso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho da carreira de inspetor superior, aberto através do Aviso n.º 2476/2014, de 18 de fevereiro
Em resposta ao requerido por V. Exª. no âmbito do Exercício do Direito de Participação de Interessados após a publicação do projeto de Lista de Classificação Final do concurso em epígrafe, o qual mereceu a nossa melhor atenção, cumpre informar do seguinte:
1.º É referido por V. Exª. que se encontra colocado no projeto de Lista de Classificação Final em lugar que não lhe corresponde, porquanto não foi aplicado o disposto no n.º 18 do Aviso em epígrafe onde consta: “O recrutamento efetua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos.”
2.º Com efeito, V. Exª. aquando da abertura do presente concurso encontrava-se em Situação de Mobilidade Especial-SME, presentemente denominado regime da valorização profissional e instituído pela Lei n.º 25/2017, de 30 de maio.
3.º Porém, e como V. Exª. não deveria desconhecer, tendo optado pelo regresso do período de Licença Extraordinária e pela ocupação de posto de trabalho nesta ASAE, onde presentemente se encontra a exercer funções com efeitos desde 29 de agosto de 2017.
4.º Sucede que na data da elaboração do Projeto de Lista de Classificação Final V. Exª. já não se encontrava em situação de SME, pelo que não se encontra abrangido pela prerrogativa estabelecida no ponto 18 do Aviso à margem identificado, sendo de indeferir a reclamação apresentada por V. Exª. no âmbito do exercício do direito de participação dos interessados” – cfr. fls. 61-62 dos autos e fls. não numeradas [“Ata nº 29” e ofícios anexos] do PA;
V) – Após o facto descrito K), deu entrada, nos serviços da Entidade Demandada, o requerimento de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado Adjunto e do Comércio
Com conhecimento ao Exm.º Sr.º Inspector-Geral da ASAE
A………………., inspector-adjunto especialista, (…), oponente ao procedimento concursal infra referenciado e nele melhor identificado, notificado da publicação, ocorrida em 26.03.2018, do acto de homologação da lista de classificação final proferido pelo Exm.º Sr. Inspector-Geral datado de 12.03.2018 (…) e com ele não se conformando, vem, conforme consignado neste acto e respectiva publicitação, do mesmo interpor recurso hierárquico, nos termos e com os seguintes fundamentos:
1 - Por despacho do Exm.º Sr. SEAP, de 17.05.2008, o Recorrente foi afecto à secretaria-geral do Ministério da Economia e da Inovação na situação de mobilidade especial - licença extraordinária e pelo período de 10 anos, nos termos e ao abrigo do art. 32.º da Lei n.º 53/2006, de 07.12, na redacção introduzida pela Lei n.º 11/2008, de 20.02 (…)
2 - A situação a que se vem de aludir, com início a 17.05.2008, terminaria, assim, em 17.05.2018.
3 - Em 18.02.2014 foi publicitado, através de Diário da República, o aviso n.º 2476/2014, divulgando a abertura do procedimento que nos ocupa e, assim, o concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 postos de trabalho na carreira de inspector superior do mapa de pessoal da ASAE, cuja abertura fora determinada por despacho do Exmº Sr. Inspector-Geral da ASAE de 16.01.2014 (…)
(…)
5 - O Recorrente foi oponente a este concurso (…)
6 - No dia 4 de Julho de 2017, e na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 25/2017, de 30 de Maio, o Recorrente, então em inactividade de funções, foi notificado pelo INA - Direcção-Geral de Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas para optar, no prazo máximo de 60 dias, por uma das seguintes opções constantes do art. 6.º-A do sobredito diploma:
a) Regresso à actividade através da integração em posto de trabalho na ASAE;
b) Cessação do vínculo por mútuo acordo (se tiver menos de 61 anos e 3 meses no dia 1 de Junho de 2017);
c) Manutenção da situação jurídica actual até à data legal de reforma ou aposentação - regime excepcional (se tiver idade igual ou superior a 55 anos no dia 1 de Junho de 2017);
d) Passagem à situação de licença sem remuneração (…).
7 - Tudo, claro reste, sob pena, desde logo, de passagem à situação de licença sem remuneração a partir do dia 29 de Agosto de 2017 - cfr., entre o mais, art. 10.º, n.º 3, da citada legislação.
8 - Nesta medida, no último dia do deadline fixado, e assim no dia 28 de Agosto deste ano 2017, o Recorrente optou, obviamente, pelo regresso à actividade na ASAE (…).
9 - Efectivamente, se assim não actuasse, ele pura e simplesmente não poderia permanecer no concurso.
10 - Prosseguindo:
11 - Por aviso n.º 119/2018, publicado no Diário da República, 2ª série, n.º 17, de 24.01.2018, é divulgado o projecto de lista de classificação final, figurando o Recorrente no 31 lugar e, por conseguinte, em vaga não elegível (…)
12 - E, exercido o direito de audiência prévia, temos que a pronúncia por si tecida não foi acolhida (…).
13 - Tendo, portanto, o acto recorrido mantido a graduação então projectada (…).
14 - Desacertadamente, porém - cfr. o que de seguida se procurará evidenciar.
15 - Sendo que, tivessem as regras constantes do aviso de abertura do procedimento concursal em causa sido correctamente aplicadas, como se impunha, e o Recorrente, único candidato em situação de mobilidade especial à data do terminus de apresentação das candidaturas, teria sido provido na primeira vaga concursal, assim ingressando na categoria de Inspector Superior, ao invés de ter sido graduado na 31.ª vaga e, desta feita, não provido (…).
(…)
42 - Em resenha, o acto recorrido padece de distintos erros nos pressupostos de facto e de direito, afrontando manifesta e adicionalmente os princípios da protecção da confiança, da proporcionalidade, da igualdade de oportunidades, da justiça e da boa-fé.
43- Ou, se se preferir, existe vício de violação de lei decorrente da norma concursal que só exige que os requisitos se cumpram aquando da apresentação da candidatura; existe violação de lei, porque não há norma que, prevendo a situação concreta de que cuidamos, tenha como conteúdo ou consequência o que a Administração retira;
há violação de lei por violação de distintos princípios jurídicos fundamentais, avultando, desde logo, o princípio da protecção da confiança;
há violação de lei, equacionado ainda este princípio, na medida em que a suposta opção que o Recorrente fez não foi livre, no sentido de se poder retirar qualquer consequência lesiva em virtude desse comportamento, posto que ele estava compelido a actuar como actuou, verificando-se assim que o comportamento da Administração viola ainda, e nesta medida, os princípios da justiça e da boa-fé.
44 - Devendo, pois, o Recorrente, aliás único candidato em sujeição a mobilidade especial à data do terminus de apresentação das candidaturas, ser provido em vaga elegível (aliás, na primeira vaga, portanto),
45- equacionando-se até, e se necessário for - visto o Recorrente não pretender prejudicar ninguém e isto apesar de ele ter direito a tal vaga, estando a Administração no momento ideal para tudo compor, mormente atenta a eficácia suspensiva do presente recurso -, a criação de uma vaga adicional.
Termos em que, deve o presente recurso ser provido, com todas as consequências legais” – cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
W) – Em 07.08.2018, foi emitida, pelos serviços jurídicos da Entidade Demandada, a Informação nº SJC/958/2018/SG de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Assunto: Recurso hierárquico apresentado por A……………….
- Introdução
No âmbito do concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de inspetor da carreira de inspetor superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - ASAE, aberto através do Aviso 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, de 18 de fevereiro de 2014, alterado pelo Despacho 6645/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 97, de 21 de maio de 2014, e pelo Aviso n.º 8656/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 144, de 29 de julho de 2014, o candidato R…, vem impugnar a homologação da lista de classificação final, ao abrigo do n.º 2 do art. 43.º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de julho, que cumpre apreciar.
1. Por despacho do Secretario de Estado da Administração Pública, datado de 17.05.2008, o recorrente foi afeto à Secretaria-Geral do Ministério da Economia e inovação, na situação de mobilidade especial e em regime especial de licença extraordinária, por um período de 10 anos, ao abrigo do art. 32.º da Lei n.º 53/2006, de 7.12. na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 11 /2008, de 20.02.
2. O recorrente foi opositor ao concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de inspetor da carreira de inspetor superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - ASAE, aberto através do Aviso 2476/2014, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, de 18 de fevereiro de 2014 (…).
(…)
8. Pelo Aviso n.º 4036/2018, tornou-se pública no Diário da República, 2.ª série, n.º 60, de 26 de marco de 2018, a lista de classificação final, homologada por despacho Inspetor-Geral de 8 de março de 2018.
9. O recorrente ficou aprovado, em 31.º lugar, com uma classificação final de 13.46 valores - fls. 1 e ss. do p.a.
III - Do Direito
A) Questão prévia: da legislação aplicável
10. Antes de mais, importa observar que a criação e desenvolvimento das carreiras de inspecção da ASAE é matéria de elevada complexidade jurídica, cuja sede de análise não cabe na economia da apreciação do presente recurso.
11. Para o que agora importa, é patente que a carreira de inspecção da ASAE, qualquer uma que ela seja, é uma carreira de regime especial não revista, pois não foi abrangida pelo DL n.º 121/08, de 11 de julho.
12. Assim sendo, dispõem as subalíneas i) e ii) da alínea b) do n.º 2 e nº 6 do artigo 34.º da Lei 33-C/2013, de 31 de dezembro, que mantêm-se as carreiras que ainda não tenham sido objeto de extinção, de revisão ou de decisão de subsistência, designadamente as de regime especial e as de corpos especiais, bem como a integração dos respetivos trabalhadores, sendo que:
b) Até ao início de vigência da revisão:
i) As carreiras em causa regem-se pelas disposições normativas aplicáveis em 31 de dezembro de 2008, com as alterações decorrentes dos artigos 46.º a 48.º, 74.º, 75.º e 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro;
ii) Aos procedimentos concursais para as carreiras em causa é aplicável o disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 54.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, bem como no nº 11 do artigo 28.º da Portaria nº 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 6 de abril.
6 - O regime fixado no presente artigo tem natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas legais ou convencionais, especiais ou excecionais, em contrário, não podendo ser afastado ou modificado pelas mesmas.
13. Assim, à partida, a legislação imperativamente aplicável ao procedimento concursal em análise é a seguinte: Decreto-Lei nº 204/98, de 11 de julho, alínea d) do nº 1 do artigo 54º e 46º a 48º, 74º, 75º e 113º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro; nº 11 do artigo 28º da Portaria nº 83-A/2009 de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 6 de abril e, supletivamente, o Código do Procedimento Administrativo, na redacção do DL nº 442/91, de 15 de Novembro, na versão do DL nº 6/96, de 31 de janeiro (CPA).
14. Ora, os artºs 46º a 48º, 74º, 75º e 113º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro e nº 11 do artigo 28º da Portaria nº 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 6 de abril, não são aplicáveis à selecção de candidatos ao procedimento concursal.
15. No entanto, dispõe a alínea d) do nº 1 do artigo 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro:
O recrutamento efectua-se pela ordem decrescente da ordenação finai dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos.
16. De todo o modo, não é a Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro que estabelece o regime da mobilidade especial.
17. Sendo certo que a norma contida na alínea d) do nº 1 do artigo 54.º do referido diploma legal refere expressamente e apenas «mobilidade especial».
18. Com efeito, o regime jurídico da mobilidade especial, para a qual remete a alínea d) do nº 1 do artigo 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro, encontra-se consagrado na Lei nº 53/2006, de 7.12., na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12, aplicável à data de abertura do concurso.
19. Nestes termos, é também legislação imperativamente aplicável ao procedimento concursal em análise a Lei n.º 53/2006, de 7.12, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12.
B) Do mérito
20. Determina a alínea d) do n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, para a qual remete a subalínea ii) da alínea b) do n.º 2 e nº 6 do artigo 34º da Lei 83-C/2013, de 31 de dezembro, que «O recrutamento efectua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos.
21. O Capítulo III da Lei n.º 53/2006, de 7.12, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12, aplicável à data de abertura do concurso, estabelece o regime aplicável à mobilidade especial.
22. A Secção V daquele Capítulo II, estabelece um regime especial para a licença extraordinária.
23. Assim, o art. 32.º daquela Secção V, dispõe para o caso que agora nos importa:
1 - O pessoal em situação de mobilidade especial que se encontre nas fases de requalifícação ou de compensação pode requerer licença extraordinária nos termos dos números seguintes.
2 - A duração da licença é fixada caso a caso, em conformidade com o requerido, não podendo ser inferior a um ano.
3 - Independentemente da sua duração, o funcionário ou agente pode fazer cessar a situação de licença passado o primeiro ano, sendo, nesse caso, colocado na fase de compensação,
4 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, na situação de licença o pessoal não goza dos direitos e não está sujeito aos deveres previstos, respectivamente, nos artigos 28.º e 29.º.
8 - Na situação de licença, o funcionário ou agente apenas pode exercer qualquer actividade profissional remunerada fora das modalidades previstas nos artigos 33.º a 35.º.
9 - O exercício de qualquer actividade profissional remunerada nas modalidades previstas nos artigos 33.º a 35.º constitui infracção disciplinar grave, punível com pena de demissão, a aplicar mediante procedimento disciplinar.
13 - A concessão da licença extraordinária compete aos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela Administração Pública.
24. Assim, relativamente aos direitos que os trabalhadores em situação de licença extraordinária não gozam encontra-se o direito de «apresentação a concurso para provimento em cargo, categoria ou carreira para que reúna os requisitos legalmente fixados (cfr. alínea f) do n.º 2 do art. 28.º, por remissão do n.º 4 do art. 32.º).
25. Quantos aos deveres de que estão dispensados os trabalhadores em situação de licença extraordinária, nos termos do art. 29.º, elencam-se os seguintes:
1- Os deveres inerentes ao funcionalismo público, com excepção dos que se relacionem directamente com o exercício de funções.
3 - Ao referido pessoal é vedado o exercício de qualquer actividade profissional remunerada, excepto nas modalidades e condições previstas na secção VI ou quando tenha sido previamente autorizado, nos termos legais aplicáveis.
5 - O pessoal tem o dever de ser opositor ao procedimento concursal e dele não desistir injustificadamente,
7 - Aquele pessoal tem ainda o dever de aceitar o reinício de funções, a qualquer título e em qualquer das modalidades previstas na secção VI, verificadas as condições referidas no n.º 5.
26. Deste modo, o pessoal em licença extraordinária pessoal não tem o dever de ser opositor ao procedimento concursal e dele não desistir injustificadamente.
27. Pelo exposto, os traços principais do regime jurídico especial das licenças extraordinárias face ao regime geral da mobilidade especial, acima exposto, são os seguintes:
28. É uma licença que pode ser requerida pelo pessoal em situação de mobilidade especial que se encontre nas fases de requalificação ou de compensação, cuja duração não pode ser inferior a um ano.
29. Na situação de licença extraordinária os trabalhadores em SME não incorrem no dever de ser opositores aos procedimentos de selecção ou de comparecer à aplicação de métodos de selecção tendo em vista o reinício de funções.
30. Os trabalhadores em licença extraordinária podem exercer qualquer actividade profissional remunerada privada, mas ficam impedidos de exercer qualquer actividade profissional remunerada em serviço da Administração Pública, associação pública e entidade pública empresarial (art.º 33.º a 35.º).
31. Assim, apesar da licença extraordinária não integrar o elenco de situações susceptíveis de fazer cessar ou suspender a situação de mobilidade especial, enquanto a mesma durar, por opção do trabalhador, este não tem os mesmos direitos, nem os mesmos deveres, dos trabalhadores do regime geral, da mobilidade especial.
32. Entre esses direitos que os trabalhares em licença extraordinária não têm está a situação de «cativação de lugar» nos procedimentos concursais na administração pública, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, por força da alínea f) do n.º 2 do art. 28.º, por remissão do n.º 4 do art. 32.°.
33. Mas, dir-se-á que este regime é penalizador para os trabalhadores em licença extraordinária face aos trabalhadores do regime geral da mobilidade especial, violando, assim, o princípio da igualdade.
34. Só que os trabalhadores em licença extraordinária apenas estão nessa situação jurídica porque optaram voluntariamente por ela (n.º 1 do art. 32.º) e permanecem voluntariamente nessa situação (n.º 3 do art. 32.º).
35. No caso do recorrente, tivesse o mesmo requerido a cessação da sua licença extraordinária entre 17.05.2009 (passado um ano em licença) e 29 de julho de 2014 (data de abertura do concurso) teria regressado ao regime geral da mobilidade especial na fase da compensação, nos termos do segmento final do nº 3 do art 32.º (por isso se diz que a licença extraordinária não faz cessar ou suspender a situação de mobilidade especial).
36. E, deste modo, já se poderia prevalecer do privilégio concedido pela alínea d) do nº 1 do artigo 54.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
37. O grande argumento do recorrente para procedência deste recurso hierárquico é que a legislação aplicável à sua situação concursal deveria ser aquela que estivesse vigente - Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro e não a legislação em vigor à data da elaboração da lista final de classificação - Lei nº 25/2007, de 30 de maio.
38. Ora, foi exactamente o pretendido pelo recorrente que acabámos de fazer.
39. Aliás, se tivéssemos que aplicar o art. 10.º da Lei n.º 25/2007, de 30 de maio, concluiríamos que o recorrente não tinha legitimidade para interpor o presente recurso, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 186.º do CPA.
40. Com efeito, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 10.º da Lei n.º 25/2007, de 30 de maio, os trabalhadores que, à data da entrada em vigor da presente lei, se encontrem na situação de licença extraordinária ao abrigo do disposto no artigo 13.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, podem optar, no prazo de 60 dia pelo regresso da situação de licença e ocupação de posto de trabalho existente ou a prever no mapa de pessoal do serviço de origem ou do serviço que sucedeu nas atribuições em caso de serviço extinto.
41. E, conforme confessa o recorrente, no dia 28.08.2017, exerceu essa possibilidade de optar pelo regresso para ocupação de posto de trabalho existente ou a prever no mapa de pessoal da AAE.
42. Sendo assim, tendo o recorrente exercido o seu direito a ocupar um posto de trabalho existente ou a prever no mapa de pessoal da ASAE, não existem os alegados direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos que o recorrente considera lesados pela prática do ato administrativo.
IV - Da Conclusão
Em face do que precede, propõe-se indeferir o presente recurso, confirmando-se o ato impugnado constante da lista de classificação final, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 197.º do Código do Procedimento Administrativo” - cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
X) – Sobre a informação referida na alínea anterior, foi exarado, pela Directora dos Serviços Jurídicos, o “PARECER Nº SJC/187/2018/SG”, de 08.08.2018, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Em face do que precede, propõe-se o indeferimento do presente recurso, confirmando-se o ato impugnado, de acordo com o previsto no nº 1 do artigo 197º do Código do Procedimento Administrativo” – cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA;
Y) – Em 27.12.2018, o Secretário de Estado da Defesa do Consumidor proferiu o “DESPACHO N.º 44/XXI/SEDCO/2018” de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
Nos termos do nº 1 do artigo 197.º do Código do Procedimento Administrativo e ao abrigo da competência delegada pela alínea b) do ponto 10.1. do Despacho n.º 10723/2018, de S. Exa. o Ministro Adjunto e da Economia de 9 de novembro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 223, de 20 de novembro, indefiro o recurso hierárquico apresentado por R... do Ato de homologação da lista de classificação final no âmbito do concurso interno geral de ingresso para o preenchimento de 8 (oito) postos de trabalho na categoria de inspetor da carreira de Inspetor-Superior, constante do Aviso nº 4036/2018 de 26 de março, confirmando o ato recorrido, nos termos e com os fundamentos vertidos na informação n.º SJC/958/2018/SG da Secretaria-Geral da Economia, e da informação n.º 62/2018-DAJC - 1/2742/18/SC, da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, para as quais se remete e que aqui se dão por integralmente reproduzidas” – cfr. fls. não numeradas (Vol. 4) do PA.”
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2.2. O DIREITO.
Como supra já se deixou enunciado, o Autor, intentou no TACL, acção urgente de contencioso dos procedimentos de massa, contra o ME e os contrainteressados devidamente identificados, peticionando a declaração de nulidade ou a anulação do ato do Inspector-Geral da ASAE que homologou a lista de classificação final do concurso interno geral de ingresso, para preenchimento de 8 postos de trabalho, na carreira de inspector superior do mapa de pessoal da ASAE [publicado, sob o Aviso n.º 2476/2014, no DR, 2.ª série, n.º 34, de 18.02.2014] e a condenação do R. no seu provimento, na primeira vaga elegível, por aplicação da regra de prioridade prevista no ponto 18 do aviso de abertura do concurso.
*
Para fundamentar a improcedência da apelação, o TCAS, socorrendo-se da sentença proferida no TAC de Lisboa, designadamente do quadro normativo ali aplicado, que adoptou, julgou a presente acção administrativa totalmente improcedente [cfr. fls. 240/295], assentou a sua decisão, em síntese, no facto de o A. se encontrar «por força do disposto no artigo 32º, nº 4, da Lei nº 53/2006 ... excluído do âmbito subjectivo de aplicação da norma do artigo 28º, nº 2, alínea f), do mesmo diploma, não gozando, por isso, da faculdade de se apresentar ao procedimento em causa e não podendo, por falta desse pressuposto, beneficiar do critério de prioridade na ordenação, previsto no artigo 54º, nº 1, alínea d), da Lei nº 12-A/2008», que «não tendo ... exercido a faculdade - prevista no artigo 32º, nº 3, da Lei nº 53/2006 ... – de fazer cessar a situação de licença extraordinária, verifica-se que o mesmo não reunia, à data do termo do prazo fixado para apresentação das candidaturas, os pressupostos da aplicação da norma do artigo 54º, nº 1, alínea d), da Lei nº 12-A/2008» e que «notificado para exercer a faculdade de opção por uma das situações previstas no artigo 10º, nº 1, da Lei nº 25/2017 ...optou, em 28.08.2017, pelo regresso à actividade, na Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, quando poderia ter optado pela passagem à situação de licença sem remuneração e, nessa sequência, requerer - nos termos dos artºs. 10º, nº 4, 9º, nº 1, da Lei nº 25/2017 e 31º, nº 1, do RVP - o regresso dessa situação, o que lhe permitiria, no procedimento concursal, beneficiar de prioridade no recrutamento», sendo que do facto de o mesmo haver sido «admitido ao concurso ... não se mostra possível concluir no sentido de que a sua expectativa - na aplicação da norma de prioridade prevista no artigo 54º, nº 1, alínea d), da Lei nº 12-A/2008 ... - constitua uma expectativa legítima, atento o que dispõe o artigo 32º, nº 4, da Lei nº 53/2006», razões pelas quais a «acção não pode proceder» - cfr Acórdão que admitiu a Revista.
Nesta sede recursiva, o A. reitera os fundamentos que tem vindo a alegar ao longo dos autos, no sentido de se decidir se assiste ou não à recorrida a faculdade de, na fase dos articulados, alterar os fundamentos do acto impugnado sem que o acompanhe pela prática de qualquer acto administrativo de segundo grau, substitutivo ou anulatório do primeiro [acto impugnado] e ainda a questão de saber se o tribunal, em sede de conhecimento da pretensão impugnatória deduzida, pode manter o acto na ordem jurídica com aquela nova fundamentação, para além de imputar ao acórdão recorrido a nulidade por omissão e excesso de pronúncia (ou caso assim se não entenda, erro de julgamento).
Mais alega que por estar em situação de mobilidade especial (SME) gozava da prioridade prevista no art. 54º, nº 1, al. d), da Lei nº 12-A/2008 e no ponto 18º do aviso do concurso realidade essa que lhe teria sido reconhecida existir no momento da abertura do concurso pelo acto impugnado e que veio a ser desatendida no mesmo pelo facto de o A. ter «optado pelo regresso do período de Licença Extraordinária e pela ocupação de posto de trabalho nesta ASAE, onde presentemente se encontra a exercer funções com efeitos desde 29 de agosto de 2017» termos em que «na data da elaboração do Projecto de Lista de Classificação Final … já não se encontrava em situação de SME, pelo que não se encontra abrangido pela prerrogativa estabelecida no ponto 18 do Aviso …».
*
Atentando na factualidade provada, impõe-se uma atenção especial ao ponto B) que transcreve parcialmente o Aviso de Abertura do Concurso, para preenchimento de 8 postos de trabalho na categoria de inspector superior, do mapa de pessoal da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica [ASAE] a que o recorrente se candidatou e donde resulta a legislação aplicável [ponto 4], os requisitos gerais de admissão ao concurso [ponto 7] e a forma como se efectua o recrutamento [ponto 18].
Mais resulta da factualidade provada que o recorrente desde 17.05.2008 se encontrava na situação de mobilidade especial, em regime especial de licença extraordinária, pelo período de 10 anos, e que antes de 18.03.2014 apresentou candidatura ao referido concurso, tendo sido o único que se apresentou em situação de mobilidade especial [pelo que beneficiaria desde logo da regra de recrutamento prevista no ponto 18 do ponto B) dos factos provados].
Em 18.05.2015 o júri do concurso elaborou a lista final dos candidatos admitidos e excluídos, tendo integrado o recorrente na respectiva lista.
Na sequência do ofício constante do ponto G) dos factos provados, o recorrente optou em 28.08.2017, ou seja, antes de terminar o período de mobilidade especial em que se encontrava, pelo regresso à actividade na ASAE.
Aquando da elaboração da lista de classificação final dos candidatos, e respectiva homologação e publicação, o recorrente foi graduado, sem que tivesse sido tida em consideração a situação de mobilidade especial em que se encontrava, ou seja, sem que tivesse beneficiado da prioridade prevista no ponto 18 do Aviso de Abertura do Concurso, sendo que a fundamentação constante da contestação apresentada nos autos pelo recorrido, foi a sufragada no acórdão recorrido, ou seja, fruto da alteração legislativa ali referida e que na pendência do concurso entrou em vigor.
Importa, pois, analisar do acerto da decisão recorrida, que na essência consiste em apurar da legalidade ou não, da não consideração da prioridade na ordenação aquando da homologação da lista final do concurso e da valia da fundamentação a posteriori do acto impugnado.
Compulsados os autos, verifica-se que o recorrente logo no exercício do direito de audiência prévia, foi confrontado com a resposta da recorrida que o esclareceu que, na perspectiva desta, não lhe foi aplicado o disposto no ponto 18 do Aviso de Abertura do Concurso, devido ao facto daquele ter optado, no decurso do mesmo, pelo regresso do período de Licença Extraordinária e pela ocupação de posto de trabalho na ASAE, onde se encontra desde 29 de Agosto de 2017; e mais lhe foi dito que na data da elaboração do projecto de lista de classificação final, o recorrente já não se encontrava em situação de SME, pelo que não se encontrava abrangido pela prerrogativa estabelecida no ponto 18 do Aviso em causa, sendo de indeferir a “reclamação” apresentada.
Depois, já nos presentes autos, em sede de contestação, a recorrida apresentou a sua defesa, fazendo apelo à entrada em vigor da Lei nº 83-C/2013, de 31.12, alegando que aos procedimentos concursais para as carreiras do regime especial não revista [onde integrou a carreira de inspecção da ASAE], é aplicável o disposto na al. d) do nº 1 do artº 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27.02, bem como o nº 11 do artº 28º da Portaria nº 83-A/2009, de 22.01, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 06.04.
Mais refere em termos de quadro normativo a aplicar aos presentes autos qual a legislação que entende ser aplicável.
E ainda que, os artºs 46º a 48º, 74º, 75º e 113º da Lei nº 12-A/2008, de 27.02 e nº 11 do artº 28º da Portaria nº 83-A/2009, de 22.01, alterada e republicada pela Portaria nº 145-A/2011, de 06.04, não são aplicáveis à selecção de candidatos ao procedimento concursal.
E que, de todo o modo, pese embora, a redacção da al. d) nº 1 do artº 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27.02 [que prevê a prioridade dos candidatos em mobilidade especial] não é esta Lei nº 12-A/2008 que estabelece o regime jurídico da mobilidade especial, mas sim a Lei nº 53/2006, de 07.12, na redacção dada pela Lei nº 64-A/2008, de 31.12, aplicável à data de abertura do concurso.
E mais alega que é no Capitulo III da Lei nº 53/2006, de 07.12 na redacção dada pela Lei nº 64-A/2008 que se estabelece o regime especial para a licença extraordinária, designadamente, no seu artº 32º que se refere à situação de mobilidade especial.
E, desta forma, conclui que os trabalhadores em situação de licença extraordinária não gozam do dever de ser opositores a procedimento concursal nem dele podem desistir injustificadamente, que na óptica da recorrida foi o que sucedeu ao recorrente.
E que no caso do recorrente, tivesse este requerido a cessação da sua licença extraordinária entre 17.05.2009 (passado um ano em licença) e 29.07.2014 (data da abertura do concurso) teria regressado ao regime geral da mobilidade especial na fase da compensação, nos termos do segmento final do nº 3 do artº 32 (por isso se diz que a licença extraordinária não faz cessar ou suspender a situação de mobilidade especial).
Deste modo, já se podia ter prevalecido do privilégio concedido pela alínea d) do nº 1 do artº 54º da Lei nº 12-A/2008, de 27.02.
E que o grande argumento do recorrente para a procedência da acção é que a legislação aplicável à sua situação concursal deveria ser aquela que estivesse vigente (Lei nº 12-A/2008, de 27.02) e não a legislação em vigor à data da elaboração da lista final de classificação final (Lei 25/2007, de 30.05), que foi precisamente o que a recorrida fez; aliás se tivesse que aplicar o artº 10º da Lei nº 25/2007, de 30.05, ter-se-ia de concluir que o recorrente não teria interesse em agir no âmbito dos presentes autos.
Com efeito, nos termos da al. a), do nº 1, do artº 10º da Lei nº 25/2007, de 30.05, os trabalhadores que, à data da entrada em vigor da presente lei, se encontrassem na situação de licença extraordinária ao abrigo do disposto no artº 13º da Lei nº 35/2014, de 20.06, podiam optar, no prazo de 60 dias pelo regresso da situação de licença e ocupação de posto de trabalho existente ou prever no mapa de pessoal do serviço de origem ou do serviço que sucedeu nas atribuições em caso de serviço extinto.
E conforme confessa o recorrente, no dia 28.08.2017, exerceu essa possibilidade de optar pelo regresso para ocupação de posto de trabalho existente ou a prever no mapa de pessoal da ASAE, pelo que, ao assim optar, não pode vir sustentar os alegados direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que assaca ao acto impugnado.
*
Vejamos:
Com efeito, o A/ora recorrente intentou a presente acção com base na fundamentação do acto que obteve aquando da resposta da recorrida em sede de audiência prévia; e nessa resposta [cfr. al. U) dos factos provados], apenas se refere que a sua argumentação não procede porque à data da elaboração do projecto de classificação final o recorrente já não se encontrava em situação de mobilidade especial, pelo que não se encontrava abrangido pela prerrogativa estabelecida no ponto 18 do aviso de abertura do concurso.
E foi com base nesta fundamentação [cfr. alínea U) a Y) da factualidade assente] assumida pelo acto homologatório que o A/ora recorrente estribou a sua petição inicial e invocou as ilegalidades que assacou ao acto, invocando que a situação procedimental do candidato se estabiliza em definitivo no momento da admissão ao concurso, sendo este o momento em função do qual se deve apurar os candidatos em situação de mobilidade especial para efeitos de ordenação.
Porém, em sede de contestação, o A. é surpreendido com “uma aditada fundamentação jurídica” do acto impugnado, que ao fim e ao cabo, consiste em buscar dentro do mesmo quadro jurídico que a recorrida invoca, disposições jurídicas de onde resulta que o recorrente não podia ter beneficiado da prerrogativa da mobilidade especial, até porque de acordo com a lei aplicável, nunca deveria ter sido sequer admitido ao concurso.
E foi essa a tese que veio a obter êxito no acórdão recorrido.
Porém, esta tese, mesmo a considerar-se uma fundamentação a posteriori, como infra veremos, limita-se a tirar outra ilação do enquadramento jurídico aplicável, não se podendo, por isso, falar em nulidade por excesso de pronúncia.
E, nem se pode dizer que existiu violação do princípio do contraditório, uma vez que o A./recorrente é conhecedor desta nova argumentação desde que foi notificado da contestação apresentada nos presentes autos pela recorrida ASAE, tendo-se pronunciado em sede de audiência prévia e tendo produzido alegações orais.
É aliás isso mesmo que consta do acórdão recorrido, quando a propósito da alegação das mesmas nulidades de sentença e processuais, se consignou:
«Ao contrário do alegado pelo autor, as questões que o mesmo identificou, enquanto fundamento das nulidades arguidas, não foram suscitadas apenas na sentença, tendo sido, ao invés, alegadas pela entidade demandada, na contestação, designadamente nos artigos 24º a 42º deste articulado, como questões centrais da sua defesa.
E, quanto à nulidade secundária, a qual, de resto, consubstancia uma diferente abordagem relativamente ao mesmo vício, na audiência prévia realizada foi efectivamente facultada ao autor a possibilidade de se pronunciar sobre tais questões, em sede de discussão de facto e de direito, tendo o mesmo produzido as respectivas alegações orais. Não se alcança, deste modo, o alegado a este propósito.
Nestes termos, não se verifica a nulidade por excesso de pronúncia suscitada pelo recorrente, nem as nulidades secundárias arguidas, por alegada violação dos princípios do contraditório, da igualdade de armas, da proibição de decisões surpresa e da tutela jurisdicional efectiva».
E cremos, que esta fundamentação se justifica adoptar nesta sede de revista no sentido de julgar improcedente a alegada nulidade de acórdão por excesso de pronúncia, uma vez que, tendo este novo enquadramento surgido em sede de contestação apresentada nos presentes autos, ao julgador incumbia conhecer das questões que se mostravam suscitadas nos autos, sob pena de não o fazendo incorrer em omissão de pronúncia.
E igualmente não se verifica a nulidade por omissão de pronúncia, segundo o recorrente por não ter sido analisado o ponto 18º do aviso de abertura do concurso, uma vez que, o que decorre do acórdão recorrido é que o mesmo foi desconsiderado juridicamente, pelo enquadramento jurídico que veio ser adoptado em termos de decisão de mérito.
Questão diferente e que o recorrente também suscita, é se nestes tocantes não estaremos perante um erro de julgamento, questão que se analisará.
*
DO ERRO DE JULGAMENTO:
Neste tocante, o Acórdão em crise ponderou, o seguinte:
“(…)
Comecemos por deixar esclarecido que, como alegado pela Entidade Demandada e identificado na sentença recorrida, a carreira de inspecção da ASAE é uma carreira de regime especial não revista, pois não foi abrangida pelo Decreto-Lei nº 121/2008 de 11 de Julho.
Assim sendo, dispõem as subalíneas i) e ii) da alínea b) do n° 2 e n° 6 do artigo 34.° da Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (que aprovou o Orçamento de Estado para 2014), que se mantêm as carreiras que ainda não tenham sido objeto de extinção, de revisão ou de decisão de subsistência, designadamente as de regime especial e as de corpos especiais, bem como a integração dos respetivos trabalhadores, sendo que:
“b) Até ao início de vigência da revisão:
i) As carreiras em causa regem-se pelas disposições normativas aplicáveis em 31 de dezembro de 2008, com as alterações decorrentes dos artigos 46.º a 48.º, 74.º, 75.º e 113.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro;
ii) Aos procedimentos concursais para as carreiras em causa é aplicável o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 54.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, bem como no n.º 11 do artigo 28.º da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de janeiro, alterada e republicada pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 de abril;
iii) O n.º 3 do artigo 110.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, não lhes é aplicável, apenas o sendo relativamente aos concursos pendentes na data do início da referida vigência.
3 - A revisão das carreiras a que se refere o número anterior deve assegurar:
a) A observância das regras relativas à organização das carreiras previstas na secção i do capítulo ii do título iv e no artigo 69.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, designadamente quanto aos conteúdos e deveres funcionais, ao número de categorias e às posições remuneratórias;
b) As alterações de posicionamento remuneratório em função das últimas avaliações de desempenho e da respetiva diferenciação assegurada por um sistema de quotas;
c) As perspetivas de evolução remuneratória das anteriores carreiras, elevando-as apenas de forma sustentável.
4 - Até à revisão do sistema remuneratório das carreiras dos conservadores, notários e oficiais dos registos e do notariado, aos vencimentos daqueles trabalhadores aplicam-se as regras sobre a determinação do vencimento de exercício fixadas, transitoriamente, pela Portaria n.º 1448/2001, de 22 de dezembro, e mantidas em vigor nos anos subsequentes.
5 - Durante o ano de 2014 o Governo procede a uma avaliação da aplicação da tabela remuneratória única, com o objetivo de determinar, designadamente, da sua coerência no contexto das carreiras e políticas remuneratórias do setor público e da sua abrangência sobre trabalhadores em funções públicas, de forma a habilitar às ações mais adequadas ao aperfeiçoamento da mesma.
6 - O regime fixado no presente artigo tem natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas legais ou convencionais, especiais ou excecionais, em contrário, não podendo ser afastado ou modificado pelas mesmas”.
Assim, a legislação imperativamente aplicável ao procedimento concursal em análise é a seguinte: Decreto-Lei n° 204/98, de 11 de Julho, alínea d) do n° 1 do artigo 54.° e 46.° a 48.°, 74.°, 75.° e 113.° da Lei n° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro; n° 11 do artigo 28.° da Portaria n° 83-A/2009 de 22 de Janeiro, alterada e republicada pela Portaria n° 145-A/2011, de 6 de abril e, supletivamente, o Código do Procedimento Administrativo, na redacção do Decreto-Lei n° 442/91, de 15 de Novembro, na versão do Decreto-Lei n° 6/96, de 31 de Janeiro (CPA).
E dispõe a alínea d) do n° 1 do artigo 54.° da Lei n° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que: “[o] recrutamento efectua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos”.
Por outro lado, o Capítulo III da Lei n° 53/2006, de 7 de Dezembro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro, aplicável à data de abertura do concurso, estabelece o regime aplicável à mobilidade especial. A Secção V daquele Capítulo estabelece um regime especial para a licença extraordinária.
Assim, o art. 32° daquela Secção V, dispõe para o caso que agora nos importa:
1-O pessoal em situação de mobilidade especial que se encontre nas fases de requalificação ou de compensação pode requerer licença extraordinária nos termos dos números seguintes.
2- A duração da licença é fixada caso a caso, em conformidade com o requerido, não podendo ser inferior a um ano.
3- Independentemente da sua duração, o funcionário ou agente pode fazer cessar a situação de licença, passado o primeiro ano, sendo, nesse caso, colocado na fase de compensação.
4- Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, na situação de licença o pessoal não goza dos direitos e não está sujeito aos deveres previstos, respectivamente, nos artigos 28.° e 29.°
8- Na situação de licença, o funcionário ou agente apenas pode exercer qualquer actividade profissional remunerada fora das modalidades previstas nos artigos 33.° a 35.°.
9- O exercício de qualquer actividade profissional remunerada nas modalidades previstas nos artigos 33.° a 35.° constitui infracção disciplinar grave, punível com pena de demissão, a aplicar mediante procedimento disciplinar.
Assim, relativamente aos direitos que os trabalhadores em situação de licença extraordinária não gozam encontra-se o direito de «apresentação a concurso para provimento em cargo, categoria ou carreira para que reúna os requisitos legalmente fixados (cfr alínea f) do n° 2 do art. 28.°, por remissão do n° 4 do art. 32.°).
Facto é que, apesar de a licença extraordinária não integrar o elenco de situações suscetíveis de fazer cessar ou suspender a situação de mobilidade especial, enquanto a mesma durar, por opção do trabalhador, este não tem os mesmos direitos, nem os mesmos deveres, dos trabalhadores do regime geral da mobilidade especial.
Desde já se diga que este regime, tendo presente o princípio da igualdade, não se apresenta como penalizador para os trabalhadores em licença extraordinária face aos trabalhadores do regime geral da mobilidade especial. É que os trabalhadores em licença extraordinária apenas estão nessa situação jurídica porque optaram voluntariamente por ela (n° 1 do art. 32.°) e permanecem voluntariamente nessa situação (n° 3 do art. 32.°).
No caso do Autor, como alegado na contestação, “tivesse o mesmo requerido a cessação da sua licença extraordinária entre 17.05.2009 (passado um ano em licença) e 29 de julho de 2014 (data de abertura do concurso) teria regressado ao regime geral da mobilidade especial na fase da compensação, nos termos do segmento final do n° 3 do art. 32.° (por isso se diz que a licença extraordinária não faz cessar ou suspender a situação de mobilidade especial)”.
Como salientado, com a entrada em vigor da Lei nº 25/2017, de 30 de Maio, o legislador, no artigo 10.º, nº 1, deste diploma, concedeu a este universo de trabalhadores a faculdade de exercerem opção entre o regresso à actividade, a cessação do vínculo por mútuo acordo, a aplicação do regime excecional previsto no artigo 7.º da mesma Lei – i.e., a manutenção situação adquirida em virtude da aplicação do regime da requalificação até à idade legal de reforma ou aposentação – ou a passagem à situação de licença sem remuneração, estabelecendo, como consequência do não exercício da faculdade de opção, a passagem à situação de licença sem remuneração.
No caso dos autos, conforme resulta da factualidade assente em A) a E), o ora Recorrente candidatou-se ao procedimento concursal em litígio, encontrando-se, no termo do prazo fixado para apresentação de candidaturas, colocado na situação de mobilidade especial, em regime de licença extraordinária. E embora tenha sido admitido ao concurso – matéria que aqui não está em discussão -, no caso concreto, não se poderá aplicar a prioridade prevista no artigo 54º, nº 1, alínea d), da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro – e vertido no ponto 18 do aviso de abertura – por tal aplicação ofender o princípio da legalidade (questão distinta será a tutela jurídica da posição do A. derivada da conduta administrativa concretamente seguida e das expectativas jurídicas criadas, designadamente a nível de responsabilidade civil, o que extravasa o âmbito do que pode ser conhecido, como aliás vem decidido, através do meio processual em uso).
Também como se evidenciou na sentença recorrida e que aqui se reitera, “de resto, notificado para exercer a faculdade de opção por uma das situações previstas no artigo 10.º, nº 1, da Lei n.º 25/2017, de 30 de Maio, o Autor optou, em 28.08.2017, pelo regresso à actividade, na Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, quando poderia ter optado pela passagem à situação de licença sem remuneração e, nessa sequência, requerer – nos termos dos art.s 10.º, n.º 4, 9.º, n.º 1, da Lei nº 25/2017, de 30 de Maio, e 31.º, n.º 1, do RVP – o regresso dessa situação, o que lhe permitiria, no procedimento concursal, beneficiar de prioridade no recrutamento”.
Com efeito, contrariamente ao que sustenta o Recorrente, a verdade é que, como demonstrado, atento o quadro normativo vigente, apesar de a licença extraordinária não integrar o elenco de situações susceptíveis de fazer cessar a situação de mobilidade especial, enquanto a mesma durar, por opção do trabalhador, este não tem os mesmos direitos, nem os mesmos deveres, dos trabalhadores do regime geral da mobilidade especial. No caso concreto, não pode prevalecer-se do direito concedido pela alínea d) do nº 1 do art. 54.º da Lei 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
Insiste o Recorrente, porém, que a sua situação era igual a outras licenças especiais e que, por essa via, não lhe podia ser coartado o direito a que se arroga. Porém, os casos que invocam são de realidades absolutamente distintas, não se podendo aqui invocar uma interpretação com recurso à teoria dos casos paralelos ou análogos. As situações objectivas e o regime normativo das licenças de maternidade ou das licenças sem remuneração previstas no art. 280.º da LGTFP não são aqui transponíveis.
E no que concretamente se relaciona com a alegada violação do direito de acesso à função pública (art. 47.º da CRP), assim como dos princípios da igualdade e da justiça, da proporcionalidade e da racionalidade e eficiência, também não se vê que o tribunal a quo tenha efectuado uma interpretação normativa não autorizada constitucionalmente.
Com efeito, de acordo com o artigo 47º do Texto Fundamental (Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública), “[t]odos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade” (n.º 1). E “[t]odos os cidadãos têm direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”. Significa isto que a liberdade de escolha pode sofrer restrições, nos termos do artigo 47º, n.º 1, impostas pelo “interesse colectivo” ou inerentes à “própria capacidade”.
(…)
Ora, a sujeição do ora Recorrente a regimes jurídicos distintos, resulta precisamente da sua situação estatutária ou funcional, sendo, portanto, objectiva e com respaldo na lei. Ou seja, a sua discriminação jurídica assenta e é correlacional da sua divergente situação jurídica de base.
Sendo que os trabalhadores em licença extraordinária apenas estão nessa situação jurídica porque optaram voluntariamente por ela e assim nela permanecem - art. 32.º, nºs 1 e 3 da Lei nº 53/2006, de 7 de Dezembro, na redacção conferida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, aqui aplicável, e que estabelece regime aplicável à mobilidade especial. Diploma que visou precisamente o aproveitamento racional dos trabalhadores da Administração Pública e no qual o legislador elegeu as opções normativas no caso também aplicadas.
Razões que determinam a improcedência do alegado pelo Recorrente relativamente à violação dos princípios constitucionais invocados.
Pelo exposto, não incorrendo o tribunal a quo no erro de julgamento de direito que lhe vem apontado, na improcedência do recurso, tem a sentença recorrida que ser mantida na ordem jurídica».
*
O assim decidido não pode manter-se.
Ao recorrente foi transmitida uma fundamentação do acto impugnado [tendo sido com base nela que intentou a presente acção e que consistia unicamente no facto de, por já não se encontrar em SME, já não poderia beneficiar da prerrogativa estabelecida no ponto 18 do Aviso], sendo que, mais tarde, em sede de contestação, foi confrontado com uma outra fundamentação completamente inovatória que consistiu em não ter beneficiado da prerrogativa, porque de acordo com a legislação que a recorrida entende ser de aplicar aos autos, o recorrente nunca deveria, sequer, ter sido admitido ao concurso, por não estar em SME. [arts 32º, nº 4 e 28º, nº 2, al. f) da Lei nº 53/2006, de 07.12 (Regime Comum da Mobilidade). Ora esta fundamentação a posteriori que não é contemporânea do acto [e que nem pode afirmar-se ser contextual] é legalmente inadmissível, pois, não cumpre as exigências do dever legal de fundamentação, não podendo considerar-se como fazendo parte integrante do acto impugnado [artºs 152º e 153º do CPA].
Na verdade, nos termos do disposto no artigo 152º do CPA “… devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente: a) Neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções”; e do artigo seguinte, 153º do CPA resulta ainda, que a “… fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo ato ...” (nº 1), sendo que equivale “… à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato …” (nº 2).
Assim como também não pode a fundamentação ser extemporânea do acto, ou seja, tem dele constar, pois só deste modo se concedem ao administrado os motivos que conduzem à decisão tomada e não a qualquer outra, que o administrado ignora.
Tais normas, correspondem ao cumprimento de directiva constitucional decorrente do actual artigo 268º, nº 3 da CRP no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjectivo do administrado à fundamentação, sendo que, com a enunciação de tal dever se visa harmonizar o direito fundamental dos cidadãos a conhecerem os fundamentos factuais e as razões legais que permitem a uma autoridade administrativa conformar-lhes negativamente a sua esfera jurídica com as exigências que a lei impõe à Administração de actuar, na realização do interesse público, com presteza, eficácia e racionalidade.
Em termos de prática administrativa, como é sabido, fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado acto, acto este que terá de conter expressamente os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão, para que se conheçam as premissas do acto e se refiram todos os motivos determinantes do conteúdo resolutório; mas também não pode ser omissa e vir a ser completada mais tarde em sede de impugnação judicial do acto.
Ou seja, a Administração não pode, pelos motivos expostos, fundamentar um acto a posteriori, pois ao fazê-lo está a impedir o administrado de adequar e preparar devidamente o seu o direito de reacção contenciosa, quando este apenas foi notificado de parte da fundamentação ou de uma fundamentação estranha ao acto que impugnou e que é o único a manter-se na ordem jurídica se não for anulado.
Neste sentido, o que importa e se impõe é que a decisão contenha os preceitos legais aplicados e que conduziram a tal decisão, ou seja, visa-se captar a transparência da actividade administrativa, sendo certo que tal dever, nos casos em que é exigido, constitui um importante sustentáculo da legalidade administrativa e um instrumento fundamental da respectiva garantia contenciosa, para além de um elemento fulcral para a interpretação do acto administrativo.
É contextual a fundamentação quando se integra no próprio ato e dela tem de ser contemporânea, o que no caso sub judice não sucede.
Deste modo, não podia o acórdão recorrido ter considerado no julgamento da pretensão deduzida aquilo que constitui a fundamentação do acto impugnado invocada a posteriori na contestação, e, por via disso, ter julgado a acção improcedente, por a mesma não integrar o acto impugnado e não ser dele contemporânea, pelo que, procede o alegado erro de julgamento imputado pelo recorrente ao acórdão recorrido.
Nestes termos, procede o presente recurso, impondo-se a baixa dos autos ao TCA/S, para conhecimento da pretensão deduzida nos autos, para tal aferindo à luz da fundamentação que efectivamente consta do acto impugnado porquanto o conhecimento em substituição desta questão se mostra excluída do âmbito da presente revista de acordo com a conjugação do disposto no nº 2 do artº 665º e 679º ambos do CPC.
*
3. DECISÃO
Face ao exposto, acordam os juízes que compõem este Tribunal em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e determinar a baixa dos autos ao TCAS para conhecimento da pretensão, de acordo com o supra exposto.
Custas a cargo do recorrido neste Supremo.
Lisboa, 19 de Novembro de 2020.

[A relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL nº 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, Conselheiro Cláudio Ramos Monteiro e Conselheiro Carlos Carvalho].