Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0306/20.2BECTB
Data do Acordão:01/21/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES
PROCESSO
AVALIAÇÃO
DOCUMENTOS NOMINATIVOS
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão que indeferiu o pedido de intimação para acesso ao conteúdo de procedimentos avaliativos, em princípio sigilosos, se for clara a correcção do aresto – já que o requerente não obteve autorizações dos funcionários avaliados nem dispõe de um interesse qualificado na obtenção das informações pretendidas.
Nº Convencional:JSTA000P27075
Nº do Documento:SA1202101210306/20
Data de Entrada:01/11/2021
Recorrente:A......................
Recorrido 1:UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DA GUARDA, E.P.E.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A………………….., identificado nos autos, interpôs a presente revista do acórdão do TCA Sul que, revogando o sentenciado no TAF de Castelo Branco, indeferiu o pedido de intimação que o recorrente deduzira contra a Unidade de Saúde Local da Guarda, EPE, para a prestação de informações.

O recorrente defende o recebimento da sua revista por nela se suscitarem questões relevantes e incorrectamente decididas.
A recorrida contra-alegou, considerando o recurso inadmissível.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
O ora recorrente, que é médico na Unidade Local de Saúde da Guarda, requereu à Presidente do Conselho de Administração dessa entidade que reproduzisse e lhe entregasse o «teor das fichas de avaliação de desempenho de todos os funcionários que, no Hospital ……….., se enquadrem na categoria de assistente técnico no período de 2017 a 2018, bem como o teor das actas do conselho coordenador da avaliação e do conselho de administração da ULSG relativas à referida avaliação de cada um dos funcionários com aquela categoria, incluindo as respectivas fundamentações efectuadas por estes órgãos».
A ULS da Guarda, EPE, aqui recorrida, não entregou oportunamente tal documento; e, mais tarde, indeferiu-o mesmo «expressis verbis» – na esteira de um parecer negativo da CADA.
O recorrente requereu «in judicio» a intimação daquela entidade para lhe prestar a informação.
O TAF deferiu a intimação. Mas o TCA Sul, através do acórdão recorrido, revogou a sentença e indeferiu o pedido – considerando que o peticionante carecia de autorizações dos funcionários em causa e de um interesse qualificado susceptível de suplantar a natureza reservada (art. 44º do DL n.º 66-B/2007, de 28/12) da informação pretendida.
Na sua revista, o recorrente começa por dizer que o recebimento do recurso se justifica porque é essencial apurar se os elementos pretendidos (extraíveis da avaliação do SIADAP) são «documentos nominativos» e porque o assunto é relevante por respeitar à «matéria de processos avaliativos».
Contudo, o assunto posto nos autos e na revista é alheio a essa «matéria», já que propriamente concerne ao direito à informação. Ao invés, o recorrente acerta ao dizer que a qualificação dos dados do SIADAP como «documentos nominativos» influía na resolução do caso – como, aliás, disseram a CADA e o acórdão recorrido; mas este tema liga-se à eventual necessidade de uma melhor aplicação do direito.
«In casu», o recorrente pretende aceder a documentos relativos ao SIADAP 3. Trata-se, porém, de documentos com «carácter confidencial» (art. 44º, n.º 2, da Lei n.º 66-B/2007) – e é significativo que, nas conclusões da sua minuta, o recorrente silencie este essencial obstáculo.
Apesar dessa confidencialidade, o n.º 4 do mesmo art. 44º admite «o acesso à documentação relativa ao SIADAP 3» – a fazer de acordo com o CPA e a legislação relativa ao acesso a documentos administrativos.
E é aqui que avulta a qualificação desses documentos como «nominativos». Os documentos desta espécie não se cingem aos que digam «respeito à intimidade da vida privada», como assevera o recorrente (cfr. a conclusão IX da revista); pois o art. 6º, n.º 9, da Lei n.º 26/2016, de 22/8 – ao dividir os «documentos nominativos» entre os que contêm os «dados pessoais» que tal norma indica e os que os não contêm – mostra bem que há «documentos nominativos» alheios àquela «intimidade».
Ora, os documentos integrantes dos mencionados procedimentos de avaliação são, para além de confidenciais, indiscutivelmente «nominativos» (art. 3º, n.º 1, al. b), da Lei n.º 26/2016), já que nomeiam e identificam os titulares dos respectivos dados – como o TCA bem explicou. Sendo assim, o acesso de terceiros a tais documentos pressupunha uma de duas coisas: ou a autorização escrita para tanto, emitida pelos funcionários avaliados; ou a detenção, por parte do peticionante, de um interesse qualificado nesse acesso (art. 6º, n.º 5, da Lei n.º 26/2016). Sucede que nenhuma dessas condições se verifica «in casu», pois, e no que respeita à segunda, o recorrente – enquanto médico – é estranho ao procedimento avaliativo sobre que incide o seu pedido de informação.
Portanto, o acórdão recorrido mostra-se essencialmente exacto. Afinal, o indeferimento, por ele imposto, flui «ex lege» e ajusta-se harmoniosamente à natureza sigilosa ou confidencial dos processos avaliativos em causa. E, tendo o TCA decidido bem a «quaestio juris» fundamental que se lhe colocava – mais simples do que o recorrente sugere e cuja singularidade a torna dificilmente repetível – não se justifica o reenvio do problema para o STA, em busca de uma melhoria da aplicação do direito.
Deve, pois, prevalecer «in hoc casu», a regra da excepcionalidade das revistas.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.
Custas pelo recorrente.

Nos termos e para os efeitos do art. 15º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/3, o relator atesta que os Exms.º Juízes Adjuntos – a Sr.ª Conselheira Teresa de Sousa e o Sr. Conselheiro Carlos Carvalho – têm voto de conformidade.

Lisboa, 21 de Janeiro de 2021
Jorge Artur Madeira dos Santos