Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0702/11
Data do Acordão:10/19/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário:I - Após as alterações introduzidas no Código de Procedimento e de Processo Tributário pela Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, os Tribunais Tributários continuam a ter competência para conhecer da matéria relativa à verificação e graduação de créditos, tendo ocorrido apenas uma alteração da via ou forma processual adequada ao seu conhecimento, que deixou de ser o processo judicial de verificação e graduação de créditos, para ser o processo judicial de reclamação da decisão proferida pelo órgão da execução sobre a matéria, passando, assim, esta reclamação a constituir a forma processual de exercer a tutela jurisdicional no que toca à verificação e graduação de créditos.
II - Quanto à aplicação no tempo da lei processual civil e tributária, a regra é a mesma que vale na teoria geral do direito: a lei nova é de aplicação imediata aos processos pendentes, mas não possui eficácia retroactiva - artigo 12.º, n.º do C.Civil e artigo 12.º, n.º 3 da LGT. Porém, da submissão a esta regra geral exceptua-se o caso de a lei nova ser acompanhada de normas de direito transitório ou de para ela valer uma norma especial, como é o caso da norma contida no n.º 2 do artigo 142º do CPC, que determina que a forma de processo aplicável se determina pela lei vigente à data em que a acção é proposta.
III - Por força dessa norma contida no n.º 2 do artigo 142.º do CPPT, que é subsidiariamente aplicável ao contencioso tributário por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, a nova lei não pode ser aplicada aos processos de verificação e graduação de créditos pendentes nos Tribunais Administrativos e Fiscais em 1 de Janeiro de 2011, os quais continuam a seguir a forma processual vigente à data da sua instauração.
IV - À mesma conclusão se chegaria pela aplicação da norma contida no n.º 3 do artigo 12.º da LGT, na medida em que a aplicação imediata da lei nova aos processos pendentes é susceptível de afectar os direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos das partes.
Nº Convencional:JSTA000P13368
Nº do Documento:SA2201110190702
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – O Ministério Público recorre para este Supremo Tribunal do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 9 de Maio de 2011, proferido nos autos de verificação e graduação de créditos n.º 1710/10.0BEBRG, que, seguindo de perto a decisão proferida no Processo 1751/10.7 BEBRG determinou que após trânsito em julgado do despacho, deviam os autos ser remetidos ao órgão de execução fiscal para aí serem tramitados.
O recorrente termina as suas alegações de recurso apresentando as seguintes conclusões:
I – Os presentes autos foram instaurados a 6/10/2010, nele tendo sido ordenadas e realizadas diversas diligências com vista a prolação da decisão final, de acordo com a competência material atribuída pelo art. 151.º, n.º 1, do CPPT;
II – A competência material dos tribunais administrativos e fiscais, tal como dos tribunais comuns, fixa-se no momento da propositura da acção, sendo irrelevantes as alterações de facto e de direito ocorridas posteriormente, conforme o disposto no art.º 5.º do ETAF;
III – Assim, o facto de a Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que entrou em vigor a 1/1/2011, ter alterado os artigos 97.º, 151.º, n.º 1 e 245.º, n.º 2 do CPPT, de modo a atribuir competência aos órgãos de execução fiscal para decidir o incidente de verificação e graduação de créditos, não poderá produzir qualquer efeito no desenrolar dos presentes autos, continuando aquela competência a caber ao tribunal administrativo e fiscal;
IV – A decisão sobre o incidente de verificação e graduação de créditos tem natureza jurisdicional, pelo que a norma do art. 126.º, da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, na parte em que atribui competência a um órgão da administração fiscal é de duvidosa constitucionalidade, uma vez que faz perigar o princípio da igualdade de meios processuais, consagrado no art.º 98.º da LGT e o princípio da equidade processual consagrado no artigo 20.º, n.º 4 da CRP. Daí que, havendo dúvidas legítimas sobre a constitucionalidade da citada norma legal, no caso dos autos, a interpretação mais sensata parece ser aquela que considera competente o tribunal tributário para decidir o presente incidente de verificação e graduação de créditos, uma vez que é no tribunal que reside o poder jurisdicional;
V – Por outro lado, não constando da citada Lei qualquer norma transitória sobre essa matéria e considerando o princípio basilar do nosso sistema jurídico de que a lei só rege para o futuro e que a competência material se fixa no momento da propositura da acção, nos termos dos artigos 12.º do C Civil e 5º do ETAF, e tendo presente que, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art.º 9.º, n.º 3 do C Civil), parece-nos que a competência do órgão de execução fiscal atribuída pelo n.º 2 do Art. 245.º, na redacção da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, se aplica apenas aos processos de reclamação de créditos entrados a partir de 1/1/2011;
VI – Decidindo como decidiu, a M.ma Juiz “a quo” não aplicou, como devia, o disposto no art.º 45.º do ETAF, e fez errada interpretação dos artigos 9.º, n.º 3 e 12.º do C Civil, 151.º, n.º 1, 245.º, n.º 2, do CPPT, 126 e 127º, da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.
Pelo que, revogando o douto despacho recorrido e ordenando o prosseguimento dos autos neste tribunal até final, VOSSAS EXCELÊNCIAS farão, como sempre, a costumada JUSTIÇA.
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.
3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal tendo vista dos autos não emitiu parecer, atento a que o recurso é interposto pelo Ministério Público.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação –
4. Questão a decidir
É a de saber se o despacho recorrido enferma de erro de interpretação e aplicação do direito ao ter julgado que, face às alterações introduzidas no Código de Procedimento e de Processo Tributário pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, os Tribunais Administrativos e Fiscais deixaram de ter competência para a apreciação e decisão dos processos judiciais de verificação e graduação de créditos e que, por isso, se impunha a remessa de todos os processos pendentes ao órgão de execução para que este procedesse à sua posterior tramitação e decisão.
5. Apreciando.
5.1 Das alterações introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro relativas aos processos judiciais de verificação e graduação de créditos
O despacho recorrido, a fls. 123 a 128 dos autos, determinou que, após trânsito em julgado do despacho, fossem os autos remetidos ao órgão de execução fiscal, para aí serem tramitados (cfr. despacho recorrido a fls. 128).
Discorda do decidido o recorrente Ministério Público, concluindo nos termos supra expostos e pedindo a revogação do despacho recorrido e que seja ordenado o prosseguimento dos autos no tribunal até final.
Vejamos.
Questão idêntica à que constitui objecto do presente recurso foi já decidida em numerosos Acórdãos deste Supremo Tribunal, todos eles em linha com o primeiramente decidido por Acórdãos do passado dia 6 de Julho, proferidos nos recursos números 362/11 e 384/11, para cuja profícua fundamentação se remete e cuja decisão – no sentido de que as alterações legislativas decorrentes da Lei n.º 55-A/2010 não são aplicáveis aos processos judiciais de verificação e graduação de créditos pendentes nos Tribunais Administrativos e Fiscais em 1 de Janeiro de 2011, os quais continuam a seguir a forma processual vigente à data da sua instauração -, também aqui se acolhe, pois que estamos integralmente convencidos quer dos argumentos, quer da decisão, o que conduz, inevitavelmente, à procedência do presente recurso.
Daí que, sem mais delongas, haverá que conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido, baixando os autos ao tribunal “a quo” para aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar.
- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e determinar a baixa dos autos ao tribunal recorrido para prosseguimento dos autos, se a tal nada mais obstar.
Sem custas.
Lisboa, 19 de Outubro de 2011. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Francisco Rothes - António Calhau.