Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:023/20.3BALSB
Data do Acordão:02/24/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
DECISÃO ARBITRAL
JURISPRUDENCIA RECENTEMENTE CONSOLIDADA
Sumário:I - Tendo a decisão sob recurso sido proferida depois de 1 de Outubro de 2019, data da entrada em vigor da nova redacção dada ao n.º 2 do art. 25.º do RJAT pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, é admissível o recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral de mérito por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com outra decisão do tribunal arbitral [cfr. arts. 1.º, alínea m), 17.º e 26.º, n.º 1, da referida Lei].
II - Esse recurso pressupõe que se verifique entre ambas as decisões arbitrais oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (n.º 2 do art. 25.º do RJAT), mas não deve ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada na decisão recorrida impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi do n.º 3 do art. 25.º do RJAT).
III - É de considerar que existe jurisprudência recentemente consolidada da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando o Pleno da Secção se pronunciou há cerca de seis meses sobre a questão, em acórdão proferido com um único voto em sentido contrário e, entretanto, não houve alteração alguma na composição da Secção, nem a verificação de quaisquer outras circunstâncias que permitam antever a possibilidade de alteração do sentido decisório aí consignado.
Nº Convencional:JSTA000P27264
Nº do Documento:SAP20210224023/20
Data de Entrada:02/21/2020
Recorrente:A............ - HOLDING, S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 347/2019-T
Recorrente: “A………… - Holding, S.A.”
Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 23 de Janeiro de 2020 no processo n.º 347/2019-T (Disponível em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?s_processo=347%2F2019&s_data_ini=&s_data_fim=&s_resumo=&s_artigos=&s_texto=&id=4597.), invocando oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com a decisão proferida pelo CAAD em 23 de Abril de 2019, no processo n.º 661/2018-T, já transitada em julgado (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=40&id=4108.).

1.2 Apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A. Pelo presente meio, vem a Recorrente interpor recurso da decisão arbitral proferida no âmbito do Processo n.º 347/2019-T, em 23 de Janeiro de 2020, a qual se encontra em oposição com a decisão arbitral, proferida no âmbito do Processo n.º 661/2018-T, em 23 de Abril de 2019, quanto à questão de saber se há lugar, em sede de IRC, à dedução à colecta produzida pelas taxas de tributação autónoma dos benefícios fiscais apurados no âmbito do SIFIDE.

B. A oposição de decisões em apreço tem por base a identidade substancial das situações fáticas, sem que tenha havido qualquer alteração da regulamentação jurídica, sendo certo que, em ambas as decisões arbitrais, há uma pronúncia expressa sobre a mesma questão fundamental de direito.

C. Do confronto entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento, resulta evidente que foram proferidas decisões antagónicas quanto à mesma questão fundamental de direito.

D. Na decisão arbitral recorrida julgou-se improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Recorrente, com fundamento numa breve caracterização das tributações autónomas enquanto excepção ao princípio da tributação pelo rendimento e à ratio subjacente à sua criação.

E. Em sentido inverso, a decisão arbitral fundamento veio conceder provimento ao pedido de pronúncia arbitral apresentado, com base no entendimento de que as despesas de investimento consideradas no âmbito do SIFIDE são dedutíveis à globalidade da colecta de IRC, a qual engloba, designadamente, as tributações autónomas.

F. Para o efeito, a decisão arbitral fundamento sustenta que “(...) sendo as tributações autónomas previstas no CIRC, em última análise, formas de tributar o rendimento empresarial, não se vê que haja necessariamente incompatibilidade entre elas e as regras gerais que prevêem a forma de efectuar a liquidação de IRC”.

G. Pelo que deverá considerar-se aplicável o disposto no artigo 90.º relativamente à liquidação das tributações autónomas, sob pena de violação do disposto no n.º 3 do artigo 103.º da CRP, que dispõe que a liquidação terá sempre de ser feita nos termos da lei.

H. Diversamente, resulta da decisão arbitral recorrida que a tributação autónoma é “materialmente distinta da tributação em IRC”, na medida em que incide não directamente sobre o lucro tributável da empresa, mas sobre certos gastos que constituem, em si, um novo facto tributário. E, desse modo, a tributação autónoma tem ínsita a ideia de desincentivar a realização de determinadas despesas que constituem práticas que afectam o equilíbrio da distribuição dos encargos públicos, de modo a garantir transparência fiscal e a combater a própria evasão fiscal.

I. Ora, relativamente à mesma questão de direito, a decisão arbitral fundamento deixa claro que o carácter sancionatório e de norma anti abuso que pode ser vislumbrado em algumas tributações autónomas, em nada obsta à dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE à colecta da tributação autónoma, inexistindo, aliás, qualquer disposição legal em vigor, à data dos factos, que disponha nesse sentido.

J. Mais ainda, de acordo com a decisão arbitral fundamento, os investimentos elegíveis para efeitos de SIFIDE são determinantes para a competitividade futura do país, sendo “(...) seguro que se está perante benefício fiscal cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais provenientes de IRC, seja qual for a base do cálculo, pois o que está em causa sempre prescindir ou não de determinada quantia de dinheiro para criar um incentivo ao investimento”.

K. Não bastasse isso, decorre expressamente do teor literal do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 40/2005, de 3 de Agosto, que o SIFIDE é dedutível ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, a até à sua concorrência, pelo que terá, forçosamente, de se considerar que o SIFIDE é dedutível à tributação autónoma que se integra na colecta de IRC.

L. Neste contexto, a tese subscrita na decisão arbitral recorrida colide com a orientação jurisprudencial mais recentemente consolidada do próprio tribunal arbitral, de que é exemplo a decisão arbitral fundamento, nos termos da qual se admite a possibilidade de deduzir à colecta da tributação autónoma os créditos fiscais derivados do SIFIDE;

M. Assim, tendo em consideração que a tese consagrada na decisão arbitral fundamento é a que deverá prevalecer, por ser a única que está conforme não só com a letra da lei, como com o espírito do legislador, garantindo o efectivo respeito petos princípios da legalidade e da tributação pelo rendimento real, deve ser julgado ilegal o entendimento subscrito pela decisão arbitral recorrida.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outra que julgue procedente a pretensão da Recorrente,

Assim se fazendo inteira Justiça!».

1.3 A Fazenda Pública apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A. O presente recurso para uniformização de jurisprudência, interposto por A………… - Holding, S.A (adiante somente Recorrente) tem por base alegada oposição entre decisão proferida por Tribunal Arbitral em matéria Tributária, constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no âmbito do processo arbitral que correu termos sob o 347/2019-T (doravante decisão arbitral recorrida) e a decisão prolatada no âmbito do processo arbitral n.º 661/2018-T (adiante decisão fundamento), nos termos e para os efeitos do n.º 2 do art. 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro – Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT).

B. Os dois arestos divergem no entendimento do enquadramento da seguinte questão:
É, sobre a colecta produzida pelas tributações autónomas, susceptível de efectuar qualquer dedução, em concreto dos créditos gerados pelos benefícios fiscais - SIFIDE II?

C. Desde já se adiante que, desde a criação das TA, no início da década de 90, e a sua evolução legislativa, sempre foi pacífico por parte de todos os operadores no mundo fiscal que as tributações autónomas não admitiam qualquer dedução.

D. Ora, na temática que aqui nos ocupa, estamos perante uma controvérsia que nunca existiu, aliás, só passou a existir a partir do momento em que diversos sujeito passivos, promoveram junto do CAAD teses que desafiavam a estabilidade interpretativa que sempre existiu em torno do tema, teses às quais o CAAD, embora muito minoritariamente, deu acolhimento.

E. Veja-se que desde o nascimento das Tributações Autónomas, não foi questionada a não dedutibilidade das mesmas à colecta de IRC, até que desde finais de 2013, começaram a surgir massivamente interpretações que punham em causa uma estabilidade de décadas, e não consta que tenham havido contribuintes que impugnassem a interpretação vigente e pacífica até àquela data (2013).

F. Altura em que, foi ensaiada a interpretação de que os valores pagos a título de tributação autónoma seriam dedutíveis à colecta do IRC. Pretensão que falhou por unanimidade, pois que o CAAD não acolheu tal interpretação.

G. Neste ensejo, e vetada ao insucesso de que as tributações autónomas não poderiam ser dedutíveis à colecta do IRC, novamente com a intervenção do tribunal arbitral (não há conhecimento destas temáticas serem discutidas junto dos tribunais judiciais) é que surgiu uma nova leva de processos, pugnando então, desta feita, pela dedução do PEC e dos benefícios fiscais à colecta produzida por tributações autónomas, o que levou a que em 2014 e 2015 – decisões do CAAD, umas no sentido de que o PEC e os benefícios fiscais podiam ser deduzidos à colecta das tributações autónomas e outras em sentido contrário.

H. Sufragando a apreciação crítica que aqui se faz, vide o voto de vencido do Conselheiro Lino José Batista Rodrigues Ribeiro, o único dos Ilustres Conselheiros que constituíram aquele colectivo que teve assento nas jurisdição tributária, tendo exercido funções como Juiz-Conselheiro do STA, na Secção do Contencioso Tributário (2010-2013). (cf. https://www.stadministrativo.pt/tribunal/juizes-conselheiros/) o qual pela clareza e assertividade aqui expomos:
«Com efeito, se fosse possível deduzir benefícios fiscais ou o PEC à colecta das tributações autónomas neutralizar-se-ia a razão de ser dessas tributações.
Através desse tipo de tributos, o legislador visa evitar que os contribuintes utilizem para fins não empresariais bens que geraram custos fiscalmente dedutíveis ou que realizem despesas e encargos que representam ou possam configurar evasão fiscal ilegítima. Ora, o sentido anti-abuso das tributações autónomas não seria conseguido se a colecta que delas resulta fosse sujeita àquele tipo de deduções. Se a intenção é penalizar (ou prevenir) certo tipo de despesas que diminuem a matéria tributável do IRC e a respectiva colecta, não faz sentido – e até é contraditório – permitir que a colecta das tributações autónomas se esvazie com deduções que visam directa e exclusivamente o desagravamento fiscal do lucro tributável e da colecta que ao mesmo respeita. É incoerente desincentivar as empresas à realização de despesas que diminuem a medida real do imposto sobre o rendimento, através de um encargo fiscal adicional, e por outro lado, permitir que na colecta daí resultante sejam deduzidas as quantias que incentivam os lucros (benefícios fiscais) ou que pretendam garantir uma colecta mínima de IRC (PEC). A Admissibilidade destas deduções acabaria por impedir que as tributações autónomas realizassem o objectivo para que foram criadas.
Assim, a natureza e a finalidade das tributações autónomas é incompatível com a dedução à correspondente colecta de benefícios fiscais e de pagamentos efectuados por conta do imposto sobre o lucro tributável. De modo que a norma do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC, para se tornar compatível com o pensamento legislativo, deve ser interpretada no sentido de apenas permitir deduções à parte da colecta que tem por fonte o lucro tributável.
(…)
Caso fosse possível deduzir o PEC à colecta das tributações autónomas, não só se perderia o carácter anti-abuso destas como se permitiria que o sujeito passivo não pagasse imposto sobe o seu rendimento real.
(…)
Agora, pressupõe-se que a solução do direito era controvertida e incerta, comportando vários sentidos, mas considera-se que a fixação de um dos sentidos como o único admissível reveste natureza “constitutiva”, porque ficou “necessariamente excluído” o sentido diferente que os tribunais lhe imputavam.
No fundo, o que se julga é que as normas interpretativas (as «verdadeiramente interpretativas») são incompatíveis com a proibição da retroactividade em matéria fiscal, consagrado no n.º 3 do artigo 103.º da CRP. Na medida em que vinculam os tribunais a uma determinada interpretação, entre várias em abstracto possíveis, elas implicam, necessariamente, uma aplicação retroactiva de lei interpretanda.
Ora, não me parece que o princípio constitucional da proibição da retroactividade tenha um carácter tão absoluto que impeça a existência de leis fiscais interpretativas. Como resulta do texto do Acórdão, o Tribunal Constitucional exclui do âmbito aplicativo desse princípio as situações de retrospectividade ou de retroactividade imprópria, o que, desde logo, significa que a norma constitucional não afasta todo e qualquer tipo de retroactividade.
(…)
O caso dos autos é paradigmático da inexistência de expectativas jurídicas ou de manutenção do regime legal pretensamente controverso. Desde o nascimento do PEC – Decreto-lei n.º 44/98, de 3 de Março –, com as alterações que sofreu até à data, não foi questionada a não dedutibilidade da quantia adiantada na colecta das tributações autónomas. O próprio programa informático da Administração Tributária de suporte à apresentação das declarações de IRC não possibilitava tal dedução. Portanto, o n.º 2 do artigo 90.º era interpretado e aplicado pela AT – e não consta que haja contribuintes que tenham impugnado nos tribunais tributários tal interpretação – no sentido de que as deduções do PEC (e as demais) não eram deduzidas na colecta das tributações autónomas.
Apenas com a intervenção do tribunal arbitral é que surgiram – em 2014 e 2015 – decisões do CAAD, umas no sentido de que o PEC e os benefícios fiscais podiam ser deduzidos à colecta das tributações autónomas, e outras em sentido contrário.
Ora, a expectativa na manutenção de uma das interpretações efectuadas pela jurisprudência arbitral não se pode confundir com as expectativas geradas pela própria lei. Se a norma era duvidosa e se foi criada uma controvérsia quanto à dimensão aplicativa da mesma, o expectável era que o legislador viesse resolver a incerteza num dos sentidos possíveis, provavelmente no sentido com a mesma sempre foi aplicada, que, como vimos, essa era a interpretação mais correcta» Negrito e sublinhado nossos

I. Perpassemos, com a atenção devida pelo entendimento propugnado pela Recorrida e que vem vertido na decisão recorrida:

J. impõe-se desde já fazer 3 ressalvas,
1) Não obstante a convergência na forma de liquidação regulada nos artigos 89.º e 90.º do CIRC, a montante as tributações autónomas e o IRC stricto sensu provêm de geografias profundamente distintas;
2) Divergências que se reflectem nas soluções a jusante ou seja a de inexistência de unicidade de IRC e TA;
3) As tributações autónomas evidenciam disparidade teleológica e funcional

K. Os erros de julgamento apontados pela Recorrente à decisão recorrida assentam em premissas inquinadas por erros ao nível dos conceitos, mormente de benefício fiscal, e erros de interpretação das normas fiscais relevantes e da interacção entre o regime do SIFIDE II e o Código do IRC.

L. Nesta linha, o argumentário desenvolvido na decisão arbitral fundamento, tem como principal trave-mestra a inexistência de um normativo próprio aplicável ao processo de liquidação das tributações autónomas, o que levou a concluir que, ao dispor a alínea a) do n.º 1 do art. 90.º do CIRC que a liquidação é feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria colectável que delas conste, o resultado só pode traduzir numa única colecta.

M. Porém, o IRC apresenta-se como uma realidade dicotómica, em que coexistem lado a lado, (1) um IRC em sentido lato, configurado como um tributo de obrigação única, incidindo sobre operações que se produzem e esgotam de modo instantâneo, em que o facto gerador do tributo surge isolado no tempo, originando, para o contribuinte, uma obrigação de pagamento com carácter avulso, sem prejuízo de o apuramento do montante devido pelos agentes económicos sujeitos à referida ‘taxa’ ser efectuado periodicamente, num determinado momento, conjuntamente com outras operações similares, sem que a liquidação conjunta influa no seu resultado,

N. (2) e um IRC, em sentido estrito, enquanto imposto que incide sobre o lucro ou o rendimento líquido das pessoas colectivas.

O. Lembre-se, a este propósito, que o Professor Sérgio Vasques (Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2011, pág. 293, nota 470) chama a atenção para esta realidade, ao assinalar a circunstância de os impostos sobre o rendimento contemplarem elementos de obrigação única, como as taxas liberatórias do IRS ou as taxas de tributação autónoma do IRC.

P. Pois bem, comecemos então pelo disposto nos números 1 e 3 do art. 4.º do Regime do SIFIDE II:
1- Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal ou não, uma actividade de natureza agrícola, industrial, comercial e de serviços e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência, o valor correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas nos períodos de tributação de 1 de Janeiro de 2011 a 31 de Dezembro de 2015, numa dupla percentagem:
a) Taxa de base - 32,5 % das despesas realizadas naquele período;
b) Taxa incremental - 50 % do acréscimo das despesas realizadas naquele período em relação à média aritmética simples dos dois exercícios anteriores, até ao limite de (euro) 1 500 000.
(…)
3- A dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.”. (nosso destaque)

Q. Ora, os regimes de incentivos fiscais ao investimento, que estão em causa na decisão recorrida, tem em comum a modalidade técnica de efectivação do benefício, que consiste na dedução de uma percentagem das despesas de investimento relevantes “ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC” (n.º 1 do art. 3.º da Lei n.º 49/2013) ou à “colecta do IRC apurada nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 90.º do Código do IRC” (cf. n.º 1 do art. 23.º e n.º 1 do art. 38.º do CFI).

R. Por seu turno, o artigo 90.º do Código do IRC determina:
1- A liquidação do IRC processa-se nos seguintes termos:
a) Quando a liquidação deva ser feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria colectável que delas conste;
b) Na falta de apresentação da declaração a que se refere o artigo 120.º, a liquidação é efectuada até 30 de Novembro do ano seguinte àquele a que respeita ou, no caso previsto no n.º 2 do referido artigo, até ao fim do 6.º mês seguinte ao do termo do prazo para apresentação da declaração aí mencionada e tem por base o valor anual da retribuição mínima mensal ou, quando superior, a totalidade da matéria colectável do exercício mais próximo que se encontre determinada;
c) Na falta de liquidação nos termos das alíneas anteriores, a mesma tem por base os elementos de que a administração fiscal disponha.
2- Ao montante apurado nos termos do número anterior são efectuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada:
a) A correspondente à dupla tributação internacional;
b) A relativa a benefícios fiscais;
c) A relativa ao pagamento especial por conta a que se refere o artigo 106.º;
d) A relativa a retenções na fonte não susceptíveis de compensação ou reembolso nos termos da legislação aplicável.”. (nosso destaque)

S. Da concatenação do estabelecido nestes normativos resulta que a dedução a que se refere o citado normativo opera nos termos em que as deduções, previstas no n.º 2 do art. 90.º operam, atenta a subsunção dos créditos de imposto por benefícios fiscais, como é o caso do SIFIDE II, na alínea b) – anterior alínea c) – desta norma.

T. Com a inserção das tributações autónomas no Código do IRC, pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, mediante o aditamento do art. 69.º-A (actual art. 88.º) passaram a coexistir, neste Código, dois sistemas de tributação com natureza e finalidades distintas, sem que o legislador haja introduzido as necessárias adaptações que tais diferenças impunham, não obstante tal inclusão ter constituído, “um entorse à luz das características próprias do IRC, enquanto imposto directo que incide sobre o rendimento das pessoas colectivas” (cfr., HELENA MARTINS, “O imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, in Lições de Fiscalidade, Almedina, 2012, pág. 280). Negrito nosso

U. Ou seja, a transmutação do regime legal do IRC numa realidade jurídica complexa e multifacetada acabou por relegar para o intérprete a tarefa de indagar quais as normas do CIRC que contendem com a especial forma de incidência e finalidades das tributações autónomas, socorrendo-se das normas sobre interpretação e aplicação das leis, conforme prescreve o n.º 1 do art. 11.º da LGT ao fazer uma remissão para o artigo 9.º do Código Civil.

V. A assunção de propósito é expressa nos seguintes termos em ordem a obter aquilo que seja a leitura juridicamente mais correcta do texto, seja necessário realizar determinados testes ao nível do edifício sistemático onde a norma interpretanda se enquadra, de modo a validar, face ao mesmo, e à luz dos critérios de racionalidade, congruência e razoabilidade que necessariamente norteiam aquela estrutura normativa, a interpretação literalmente sugerida.

W. Sendo as TA, uma forma especial de tributação, especialidade que advém da delimitação dos factores geradores, regras de quantificação, taxas aplicáveis, e finalidades associadas, é redutor concluir, como base numa interpretação meramente literal e simplificadora, como sucede na decisão arbitral fundamento, que, por partilharem as regras de liquidação, definidas no art. 89.º e n.º 1 do art. 90.º do CIRC, as respectivas colectas devem ter o mesmo destino da colecta do IRC stricto sensu.

X. Enquanto a liquidação da colecta do IRC consiste na aplicação das taxas previstas no art. 87.º à matéria colectável determinada segundo as regras constantes do Capítulo III do CIRC, a liquidação das tributações autónomas assenta nas taxas e nos valores tributáveis das diversas realidades contempladas no art. 88.º do mesmo Código, dualidade que reflecte necessariamente a diferente natureza e finalidades do IRC stricto sensu e das tributações autónomas.

Y. Ou seja, embora integrando o mesmo edifício legislativo – o CIRC – e partilhando de algumas regras comuns, a unicidade não é completa, conforme, aliás, afirma o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 197/2016.

Z. A coexistência do IRC stricto sensu e das TA no mesmo Código conduziu à edificação de uma estrutura de natureza dual ou híbrida, compreendendo um núcleo principal correspondente ao IRC tradicional, e uma parte adjacente, conexionada com aquele e fazendo parte da mesma realidade normativa global, com especificidades próprias das quais resulta um afastamento, em vários e substanciais aspectos, do regime principal, em termos de os princípios e soluções gerais, não obstante, por vezes, se aplicarem, por outras vezes, serem contraditórios, e como tal, inaplicáveis, com a natureza própria dessa tal “normação adjacente” que se consubstancia nas designadas TA.

AA. Estrutura dual da qual decorre o afastamento da aplicação às TA normas das normas próprias do sistema base, sempre que tal se justifique à luz da coerência do próprio sistema e das razões que justificam o seu tratamento autónomo e que, leva a qualificar as TA como IRC, mas apenas em sentido lato, constituindo um sistema periférico da tributação do rendimento das pessoas colectivas, com teleologia, finalidades e mecânicas próprias, que justificam, em determinadas situações, a sua autonomia, em relação ao referido sistema de IRC stricto sensu.

BB. Finalidades que manifestamente são inconciliáveis com a natureza das deduções previstas no n.º 2 do art. 90.º, mormente com as referentes aos benefícios fiscais em geral e ao SIFIDE em particular.

CC. É que, ao contrário do que propugna a Recorrente ao longo da sua dissertação, em concreto nos artigos 67.º e seguintes (vide em concreto o artigo 72.º), a tese por si aventada colide frontalmente com os fins intrínsecos às TA, na medida em que produz um efeito autofágico de resultado zero.

DD. Ou seja, como se nunca tivesse havido tributação autónoma.

EE. Para a Recorrente, a aplicação da disposição anti-abusiva ou anti-elisiva, que a mesma não refuta, basta-se com o mero apuramento ou quantificação do quantum num primeiro momento

FF. Postergando, depois, o seu efectivo pagamento, ou seja, a consequência da TA, o imposto adicional gerado pelas mesmas.

GG. Em bom rigor, nas palavras da Recorrente, somente o cálculo do imposto gerado pelas TA releva.

HH. Por outras palavras, só se calcula, mas não se paga, ao pretender efectuar deduções a esta colecta, que nunca o legislador quis e que contendem directamente com as finalidades das TA e, bem assim, dos próprios benefícios fiscais, como infra demonstraremos.

II. Sintetizando, as finalidades intrínsecas às TA ficam completamente esvaziadas e afastadas através desta errática tese, na medida em que a consequência pretendida por aquela norma deixa de existir, porquanto se obsta ao pagamento do montante apurado a título de TA.

JJ. Por seu turno, não é despiciendo relembrar à Recorrente, que o crédito produzido pelos benefícios fiscais, in casu, o SIFIDE II, continua a estar na esfera do sujeito passivo, através da modalidade de reporte para os anos subsequentes.

KK. O n.º 1 do art. 2.º do EBF define benefícios fiscais como «medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem», conceito que encerra como características essenciais a derrogação de natureza excepcional à tributação-regra e a prossecução de finalidade extrafiscal com relevante interesse público.

LL. Deste modo, deve estar subjacente a qualquer benefício fiscal ao investimento – como o SIFIDE II – o reconhecimento económico e social justificativo da perda de receita fiscal que o mesmo implica, in casu, as despesas de investimento em I&D estão associados à prossecução do objectivo de incremento da produtividade e consequente reforço da competitividade das empresas.

MM. Existe, portanto, uma ligação indissociável entre o benefício fiscal – SIFIDE – e as regras de determinação da matéria colectável do IRC, pelo método directo, que tomam como base o lucro revelado pela contabilidade e para cuja formação concorrem as chamadas “despesas elegíveis”.

NN. Com efeito, cabe lembrar que estão afastados deste benefício fiscal, pelo art. 5.º do Regime do SIFIDE II, aprovado pelo art. 133.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 (e art. 39.º do Código Fiscal do Investimento) os sujeitos passivos cujo lucro tributável seja determinado por métodos indirectos, regra que denuncia bem que se o legislador tivesse concebido o SIFIDE por forma a que o crédito de imposto fosse deduzido às colectas das TA, não faria qualquer sentido esta regra de exclusão.

OO. Sendo de acrescentar que o próprio legislador extraiu consequências a jusante do apuramento de duas colectas distintas, em diversos normativos que remetem para o «montante apurado nos termos do n.º 1 do art. 90.º» ou para o «o imposto liquidado nos termos do art. 90.º» sinalizando sempre de forma forma explícita ou implícita que a referência abrangia apenas a colecta do IRC stricto sensu, o que, aliás, só suscitou controvérsia desde há meia dúzia de anos, na sequência de pronúncias dos tribunais arbitrais sobre a não dedutibilidade ao lucro tributável das colectas das TA.

PP. Uma leitura holística das normas do CIRC revela a coexistência de um sistema de tributação com base no rendimento com o regime especial das TA, como já antes referido, circunstância que coloca um esforço exigente ao legislador para destrinçar os normativos que regulam aspectos que colidem com a natureza e características das TA.

QQ. Na verdade, o próprio CIRC fornece pistas orientadoras que auxiliam nesse esforço interpretativo, como se dará conta de seguida.

RR. É assim, no n.º 1 do art. 92.º, ao reportar-se ao «imposto liquidado nos termos do n.º 1 do art. 90.º, líquido das deduções previstas nas alíneas a) a c) do n.º 2 do mesmo artigo, não pode ser inferior a 90% do montante que seria apurado se o sujeito passivo não usufruísse de benefícios fiscais (...)» indica de modo expresso que se refere à colecta do IRC stricto sensu, porquanto as deduções das alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 90.º, por força do disposto no número 1 dos artigos 91.º e 91.º-A que impõem a inclusão dos rendimentos obtidos no estrangeiro na matéria colectável que serve de base à liquidação.

SS. Igualmente, o n.º 1 do art. 105.º do CIRC estabelece que «Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do n.º 1 do art. 90.º (…)», Ora, é consabido que o cálculo dos pagamentos por conta não pode senão ter por referência o apuramento do IRC baseado nas regras de determinação do lucro tributável e da matéria colectável (do Capítulo III do CIRC) e, nunca, o apuramento feito com base nas regras de incidência das taxas de tributação autónoma (do art. 88.º do CIRC).

TT. A norma do n.º 5 do artigo 90.º do Código do IRC. Uma vez que as entidades transparentes estão sujeitas a TA (cf. art. 12.º do Código do IRC) e apenas imputam aos respectivos sócios a matéria colectável determinada com base no lucro, o entendimento adoptado pela Decisão fundamento de que as deduções previstas no n.º 2 do art. 90.º são efectuadas à colecta do IRC que inclui as TA, então os sócios ou membros das entidades transparentes estariam impedidos, por via do referido artigo 90.º, n.º 5, de deduzir aos montantes liquidados a título de tributação autónoma, as deduções previstas no n.º 2 do mesmo artigo, limitação que não resulta da lei.

UU. Faz sentido aludir também ao disposto no n.º 6 do art. 90.º, ora, o «montante apurado relativamente ao grupo» só pode respeitar à colecta determinada com base na matéria colectável do grupo em conformidade com o disposto nos artigos 70.º e 71.º do CIRC, porquanto as TA são apuradas, individualmente, por cada sociedade do grupo na declaração periódica de rendimentos a que se refere a alínea b) do n.º 6 do art. 120.º, ainda que o cálculo possa ser corrigido por força do n.º 20 do art. 88.º.

VV. Os exemplos apresentados bastariam para sustentar a conclusão de que a expressão contida no corpo do n.º 2 do art. 90.º do Código do IRC «o montante apurado nos termos do número anterior» a que reportam as deduções enunciadas nas alíneas deste número, em que se inclui a dedução por benefícios fiscais (alínea b), actual alínea c)) e expressões equivalentes utilizadas noutros artigos quer do Código do IRC, quer de outros institutos legais (e.g., art. 4.º do Regime do SIFIDE II ou Código Fiscal do Investimento) devem ter um sentido unívoco e coerente, que é o do corresponder à colecta do IRC stricto sensu apurada com base na matéria colectável que tem como ponto de partida o lucro.

WW. Por conseguinte, a interpretação literal propugnada pela decisão fundamento e na qual a Recorrente escora a sua tese, encerra em si mesma uma limitação insanável, porquanto, aparentemente, apenas seria válida para as deduções previstas no art. 4.º do Regime do SIFIDE II, bem como na alínea b) (ou alínea c)) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, abstraindo por completo de uma análise de todas as consequências sistemáticas decorrentes de tal entendimento.

XX. O que vale por dizer que, à luz dos critérios de interpretação que convocam os elementos de interpretação histórico, sistemático e teleológico, as expressões «Ao montante apurado nos termos do número anterior», ou «o montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC» a que faz referência o n.º 2 do art. 90.º e o n.º 1 e o n.º 3 do art. 4.º do Regime do SIFIDE, só pode ser entendido como respeitando ao IRC liquidado mediante a aplicação das taxas previstas nos números 1 e 2 do art. 87.º à matéria colectável determinada segundo as regras enunciadas no capítulo III do CIRC e não ao montante apurado a título de TA, assim se devolvendo à norma o seu sentido original, que era o que correspondia à sua redacção textual antes da introdução das TA no CIRC.

YY. A interpretação estritamente literal daquela expressão conduziria a resultados absurdos e perversos, do ponto de vista da natureza e objectivos associados a um benefício fiscal, porquanto abriria a porta a que sujeitos passivos com prejuízos fiscais mas com TA sobre despesas não documentadas ou despesas com veículos de elevado valor ou despesas de representação, usufruíssem da dedução a título do SIFIDE.

ZZ. Sendo, assim, de rejeitar a tese interpretativa vertida na decisão fundamento porque se atém em exclusivo ao elemento literal das normas e abstrai das repercussões da mesma no quadro mais amplo da relação entre o IRC stricto sensu e as TA nesse imposto.

AAA. Posto isto, e porque a arquitectura do sistema de apuramento do IRC não sofreu alterações significativas desde a sua criação em 1989, impõe-se concluir que a norma clarificadora aditada ao artigo 88.º pela Lei n.º 7-A/2016, de 30/03 e alterada pela lei n.º 114/2017, de 29/12, veio no fundo explicitar o que já resultava da interpretação da lei, e que foi objecto de entendimento pacificamente aceite até à litigância em sede de arbitral, sobre a não dedutibilidade das TA ao lucro tributável, conforme, aliás, tem sido reconhecido por várias decisões arbitrais.

BBB. Nesse conspecto atente-se no acórdão arbitral proferido na decisão n.º 473/2017-T.

CCC. Ora, num aturado e cuidado exercício de hermenêutica jurídica paulatinamente desenvolvido, que pela sua clareza deverá ser lido com todo o cuidado, disponível para consulta em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=32&id=3319.

DDD. Sumariando, da interpretação da expressão contida no corpo do n.º 2 do art. 90.º do CIRC à luz dos critérios gerais enunciados no art. 9.º do Código Civil, resulta a não dedução às colectas das TA de benefícios fiscais, incluindo a título do crédito de imposto do SIFIDE II, porquanto aquelas colectas de TA não admitem outras deduções que não sejam a prevista no n.º 12 do art. 88.º do CIRC.

EEE. Importa ainda, e quanto ao efeito interpretativo conferido pelo artigo 135.º constante da Lei do Orçamento de Estado para 2016, apelemos à boa jurisprudência exarada, entre inúmeros outros, nos processos arbitrais n.ºs 722/2015-T CAAD; 727/2015-T CAAD; 785/2016-T CAAD e, bem assim, no voto vencido lavrado pela insigne Conselheira Fernanda Maçãs no processo n.º 5/2016-T CAAD.

FFF. E, mais importante, atente-se ao Acórdão do TC n.º 107/2018 de 22 de Fevereiro que se pronuncia, manifesta e esclarece sobre esta temática e sobre entendimento vertido no Acórdão do TC n.º 267/2017 sobre o carácter interpretativo atribuído pelo art. 135.º da Lei n.º 7-A/2016 ao disposto no n.º 21 do art. 88.º.

GGG. Posto isto, resulta que o próprio efeito interpretativo conferido por aquela Lei é, per si, desnecessário, porquanto, conforme se demonstrou, nenhuma outra interpretação seria passível de ser efectuada tendo em consideração a teleologia e hermenêutica jurídica das normas em apreço,

HHH. como aliás resulta expressamente dos acórdãos supra citados.

III. Por fim, liste-se, novamente, a título meramente exemplificativo, e sem penosidade, as decisões arbitrais que à questão que ora nos ocupa, i.e., se são admissíveis quaisquer deduções à colecta produzida pelas tributações autónomas? decidiram em sentido negativo e, por conseguinte, diverso da decisão que ora se recorre 697/2014-T; 113/2015-T; 669/2015-T; 535/2015-T; 781/2015-T; 736/2015-T; 745/2015-T; 780/2015-T; 722/2015-T; 767/2015-T; 769/2015-T; 783/2015-T; 670/2015-T; 750/2015-T; 779/2015-T; 785/2015-T; 746/2015-T; 752/2015-T; 639/2015-T; 34/2016-T; 727/2015-T; 19/2016-T 774/2015-T; 122/2016-T; 174/2016-T; 443/2016-T; 567/2016-T; 629/2016-T; 504/2016-T; 524/2016-T; 302/2016-T; 506/2016-T; 612/2016-T; 587/2016-T; 670/2016-T; 575/2016-T; 627/2016-T 638/2016-T; 578/2016-T; 605/2016-T; 749/2016-T; 505/2016-T; 668/2016-T; 704/2016-T; 671/2016-T; 733/2016-T; 83/2017-T; 66/2017-T; 99/2017-T; 384/2017-T; 203/2017-T; 241/2017-T; 192/2017-T; 385/2017-T; 473/2017-T; 511/2017-T; 641/2017-T; 525/2017-T; 542/2017-T; 7/2018-T; 13/2018-T; 41/2018-T; 124/2018-T; 9/2018-T; 229/2018-T; 111/2018-T; 242/2018-T; 402/2018-T; 353/2018-T; 363/2018-T e 406/2018-T.

JJJ. Por fim, analisando criticamente a decisão fundamento,

KKK. O acórdão refere que estaria vedado à AT fazer uma interpretação restritiva, impedindo a sua dedução à colecta produzida pelas TA, concretizando que o teor expresso do n.º 1 do art. 2.º do EBF assim o impõe.

LLL. Nada mais errado

MMM. Ora, no que concerne aos BEF e à especial parcimónia com que devem ser interpretados, a lei estabelece no art. 10.º do EBF que «As normas que estabeleçam benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva»,

NNN. de onde não resulta qualquer impossibilidade de interpretar restritivamente, outrossim, quando a interpretação declarativa e literal, convocada pelo tribunal arbitral, não revela que o legislador utilizou de forma adequada e correcta todas as palavras contidas na lei, ocorrendo exacta equivalência entre os sentidos e a vontade presente na lei, impõe-se um interpretação restritiva no sentido se ali se entender apenas a colecta do IRC.

OOO. Pois que, deste modo, pospor-se-iam todos e quaisquer efeitos das TA face à sua teleologia, sendo certo que, aquando da criação destes BEF, o legislador tinha como pacífico que, dada a clara natureza das TA, à colecta por elas produzida, não poderiam ser efectuadas deduções.

PPP. Sendo que a interpretação restritiva é consentida sempre que subsistam razões ponderosas para concluir que o sentido e alcance que resultariam de considerar que as deduções referidas no n.º 2 do art. 90.º, onde se inclui o SIFIDE, poderiam ser efectuadas ao somatório das colectas das TA, apuradas nos termos da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo, atraiçoariam a ratio legis o que a torna necessária – a interpretação restritiva – por forma a conciliar os interesse conflituantes que duas normas visam tutelar.

QQQ. Sem a necessária interpretação restritiva remover-se-ia do ordenamento jurídico, por meio de mera interpretação declarativa, numa inadmissível limitação da liberdade de conformação da iniciativa do legislador, as TA com a consequência de «…o censurável ser branqueado, prejudicando-se ou eliminando-se a assepsia fiscal» garantindo que «O ring fencing é, portanto, aplicável às tributações autónomas» acrescentando não serem deste modo «…procedentes argumentos como a necessidade de prevalência do interesse que justifica o benefício, visto que a respectiva hierarquização prioritária só se colocará quando nāo seja contrastante com o intuito legal da preservação do bom agir como o legislador preceituou e não como o intérprete, substituindo inaceitavelmente este…». (Conforme o voto vencido exarado no processo n.º 216/2017-T que, pela sua clareza e influência posteriores, aqui expomos. Disponível para consulta em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listOrder=Sorter_data&listDir=ASC&listPage=30&id=3028)

RRR. O resultado oposto «…absurdo…», e para se chegar à conclusão deste absurdo, basta em abstracto comparar dois contribuintes, um (1) que cumprindo os comandos normativos disciplinadores, dissuasores, compensatórios e, acima de tudo, marcadamente anti-abusivos das TA as evitou, outro (2) que não cumprindo com aqueles comandos se veria sujeito a colecta de TA. Bastaria que os dois tivessem prejuízos fiscais para que, caso o segundo (2) aproveitando a jurisprudência arbitral que lhe permitiria exercitar o direito à dedução, tivesse direito a deduzir e o primeiro (1), cumpridor, nada pudesse deduzir, chegando ao tal resultado «…absurdo…».

SSS. Com efeito, a clareza e simplicidade do exemplo é revelador das entropias e os resultados violadores de princípios constitucionais tidos como assentes que a admissibilidade da dedução de quaisquer montantes à colecta produzida pelas TA acarreta.

TTT. Em suma, a tese propugnada pela Recorrente assenta numa pura falácia interpretativa, que não encontra respaldo quer na letra, quer na mens legislatoris e, bem assim, na mens legis conforme se demonstrou supra.

Nestes termos, nos mais de Direito e com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deve ser o presente recurso de uniformização ser julgado improcedente por não provado mantendo-se a decisão ora recorrida incólume na ordem jurídica, uniformizando-se a jurisprudência em consonância com o entendimento, na melhor aplicação do Direito, ali vertido e propugnado pela Recorrida».

1.4 Dada vista ao Ministério Público, a Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido da não admissibilidade do recurso. Isto, em síntese, porque considerou que a decisão arbitral recorrida foi proferida antes de 1 de Outubro de 2019, data da entrada em vigor na nova redacção dada ao n.º 2 do art. 25.º do RJAT – que veio admitir a possibilidade, anteriormente não prevista, de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral que tenha conhecido de mérito por oposição com outra decisão arbitral – e, por isso, esta não lhe é aplicável.

1.5 Notificada do teor do parecer do Ministério Público, a Recorrente veio salientar que a tese nele sustentada arranca de um pressuposto fáctico errado e que inquina a conclusão a que chegou, qual seja o de que a decisão arbitral recorrida foi proferida em 23 de Janeiro de 2019, quando o foi em 23 de Janeiro de 2020.

1.6 Cumpre apreciar e decidir, sendo que, primeiro, há que verificar se estão verificados os requisitos da admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência: primeiro, os requisitos processuais e, depois, os requisitos substanciais.
Só se concluirmos pela verificação desses requisitos, passaremos a conhecer do mérito do recurso, ou seja, da infracção imputada à decisão arbitral recorrida [cf. art. 152.º, n.ºs 1 a 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)].


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

2.1.1 A decisão arbitral recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«a) O Grupo A………… é composto pela A………… – Portela & C.ª, S.A., MediA………… – Produtos Médicos e Farmacêuticos, S.A., A…………far – Produtos Farmacêuticos, S.A., A…………port – Produtos Farmacêuticos, S.A., InterA………… – Produtos Farmacêuticos, S.A., A………… Aristegui – Produtos Farmacêuticos, S.A., e A………… OTC – Produtos para a Saúde e Higiene, S.A. e encontra-se sujeito ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS);

b) Na qualidade de sociedade dominante do Grupo A…………, a Requerente apurou e pagou, relativamente ao exercício de 2013, um montante de tributação autónoma de Euro 378.163,86, o qual corresponde à soma da tributação autónoma apurada individualmente pelas entidades que compõem o grupo;

c) A Requerente dispunha, em 2013, de um saldo de créditos fiscais apurados no âmbito do SIFIDE referentes aos exercícios de 2008 a 2012, no montante de Euro 55.114.953,47, bem como um crédito fiscal relativo ao SIFIDE de 2013, no montante de Euro 13.248.712,98, correspondendo ao montante total de Euro 68.363.666,46;

d) Esse crédito não foi deduzido à colecta de resultantes da tributação autónoma no período de tributação de 2013;

e) A Requerente apresentou, em 26 de Março de 2018, um pedido de revisão oficiosa em vista a ver reconhecido o direito de dedução à tributação autónoma apurada em 2013 dos créditos fiscais disponíveis a título de SIFIDE nos exercícios de 2009 e seguintes;

f) Por ofício de 10 de Dezembro de 2018, a Requerente foi notificada para exercer o direito de audição relativamente ao projecto de decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, tendo exercício esse direito mediante exposição apresentada em 20 de Dezembro de 2018;

g) O pedido de revisão oficiosa foi objecto de indeferimento, por despacho de 4 de Março de 2019, do Director adjunto da Direcção de Finanças, ao abrigo de subdelegação de competência;

h) A decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa baseou-se na não dedutibilidade de quaisquer montantes à colecta produzida pelas tributações autónomas em face da natureza específica das tributações autónomas e os seus objectivos de evitar práticas de evasão e fraude fiscal».


*

2.1.2 A decisão arbitral fundamento deu como provada a seguinte factualidade:

«a) No ano de 2014, a Requerente era a sociedade dominante de um grupo de sociedades (“Grupo A…………”) a que foi aplicável o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (“RETGS”), e que era composto, no aludido período de tributação, por si e pelas sociedades:




b) Por referência ao período de tributação de 2014, a ora Requerente procedeu, em 29 de Maio de 2015, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 120.º e do artigo 70.º do Código do IRC, à entrega da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC consolidada, identificada sob o número 4219-C3595-12 (documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

c) No seguimento da entrega da aludida Declaração, foi emitida a liquidação de IRC n.º 2015 2500441359, de 09 de Setembro de 2015 (Documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

d) Na referida liquidação de IRC foi apurado um montante total de colecta de Euro 111.732,52 (cento e onze mil setecentos e trinta e dois euros e cinquenta e dois cêntimos), relativo ao exercício de 2014, sendo que, no âmbito da referida liquidação de IRC foi ainda apurado e pago, a título de tributação autónoma, o montante de 704.280,85 (setecentos e quatro mil duzentos e oitenta euros e oitenta e cinco cêntimos);

e) Resulta do Quadro 07 do Anexo D (relativo a benefícios fiscais que operam por dedução à colecta) da declaração de rendimentos Modelo 22 do grupo submetida pela Requerente, referente ao exercício de 2014, que esta possuía um saldo de benefícios fiscais apurado em exercícios anteriores e ainda não caducado, no montante total de Euro 67.327.391,68 (sessenta e sete milhões trezentos e vinte e sete mil trezentos e noventa e um euros e sessenta e oito cêntimos), passível de dedução à colecta no exercício em apreço, o qual respeita a créditos fiscais apurados no âmbito do SIFIDE referentes aos exercícios de 2009 a 2013, nos termos do quadro que segue:

f) O crédito fiscal relativo ao SIFIDE de 2014, no montante de Euro 12.365.891,26 (doze milhões trezentos e sessenta e cinco mil oitocentos e noventa e um euro e vinte e seis cêntimos) não consta da respectiva Declaração Modelo 22, pelo facto de, à data de submissão da mesma, ainda não ter sido submetida a respectiva candidatura ao SIFIDE;

g) A Requerente entendeu que os créditos referidos podem ser deduzidos à colecta de tributações autónomas em IRC apuradas nesse mesmo ano, no montante de € 704.280,85;

h) Com esse fundamento a Requerente apresentou, no dia 29-12-2017 um Pedido de Revisão Oficiosa, com vista à correcção do montante indevidamente pago, a título de tributação autónoma, no exercício de 2014;

i) A Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu um projecto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa nos termos que constam do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), em que se refere, além do mais o seguinte:
2 – Parecer
2.1 – Não se vislumbrou que, com o mesmo fundamento, tivesse sido deduzida Reclamação Graciosa (Art. 68º e seguintes do CPPT), ou mesmo Impugnação Judicial (Art. 99º e seguintes do CPPT).
2.2 – A sociedade / exponente, em questão em questão [A………… - Holding, S.A. (NIF:………)], tem legitimidade para apresentar, o Pedido de Revisão, ora em análise, nos termos previstos nos Art. 9º, do CPPT e Art. 65º, da LGT.
2.3 – Agora quanto à legalidade e tempestividade, do mesmo / presente Pedido de Revisão [enquadrado pela sociedade em questão (recorde-se), no nº 1, do Art. 78º, da LGT], cumpre-nos expor o seguinte:
2.3.1 – O Art. 78º, nº 1, da LGT, determina que a Revisão dos Atos Tributários, pela entidade que os praticou, pode ser efectuada, por iniciativa do sujeito passivo, no Prazo de Reclamação Administrativa e com fundamento, em qualquer “Ilegalidade”, ou ainda, pode ser efectuada, por iniciativa da Administração Fiscal / Tributária (mesmo que, a pedido do contribuinte), no prazo de 4 anos, após a liquidação, ou a todo o tempo, se o tributo não estiver pago, com fundamento em “Erro Imputável aos Serviços”, sendo contudo que:
2.3.1.1 – Desde logo será de referir que, na data da apresentação do pedido de revisão, ora em análise (recorde-se: 29/12/2017), o prazo de reclamação administrativa, da liquidação “IRC/2014”, também ora em análise (recorde-se: Liquidação n.º 2015 2500441359 de 09/09/2015), tanto aquele resulta do Art. 70º, conjugado com a alínea b), do nº 1, do Art. 102º, do CPPT (sensivelmente: 20/01/2016), como aquele que resulta do Art. 131º, do CPPT (sensivelmente: 29/05/2017), já se encontravam abundantemente ultrapassados;
2.3.1.2 – Agora, tendo em conta a posição da AT, em situações semelhantes, aquela que ora se analisa [posição da AT à qual (como é sabido), este Serviço se encontra vinculado], não vislumbramos, relativamente à Liquidação (e preenchimento), da já referida D.R. “IRC/M.22-2014”, referente à sociedade / exponente, em questão (repita-se: “4219-2015-C3595-12”, submetida em 29/05/2015), qualquer “Ilegalidade”, ou mesmo “Erro Imputável aos Serviços” (contrariamente ao invocado / alegado, pela sociedade / exponente em questão), senão vejamos:
A.3 – Para a AT, a colecta proveniente de tributações autónomas, afasta-se da restante colecta de IRC, na medida em que aquela (“colecta proveniente de tributações autónomas”), prossegue vários objectivos bastante específicos, como seja o propósito de evitar práticas de evasão e de fraude (quer através de despesas confidenciais, ou não documentadas, quer através de pagamentos realizados, a entidades localizadas em jurisdições, com regimes fiscais privilegiados, quer disfarçando / encobrindo, pagamentos / atribuições de vantagens / remunerações acessórias, sob a forma de despesas de representação, ou através da atribuição de viaturas, a trabalhadores e/ou membros de órgãos sociais);
B.3 – Para a AT, os “Benefícios Fiscais – IRC/2014” (Créditos Fiscais “SIFIDE”), apenas são dedutíveis à colecta de IRC/2014, baseada na matéria colectável, que se identifica com o lucro / rendimento do exercício, sujeito (por sua vez), às “taxas gerais” (digamos assim), do Art. 87º, do CIRC/2014 [em oposição, portanto, à colecta de IRC/2013, baseada nos montantes das despesas / encargos / pagamentos, sujeitos às “Taxas de Tributação Autónoma” (Art. 88º do CIRC/2014), pois estes, são uma espécie de realidade à parte, devido às suas finalidades muito específicas (conforme aliás, já se referiu)];
C.3 – Para a AT, o disposto no Art. 12º, do CIRC/2014 (“As sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal, não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas”), como que reforça o já referido carácter específico / à parte, da colecta de tributações autónomas, a qual [como aliás o próprio nome indica, bem como também o indica, a respectiva representação / localização, ao nível do Quadro 10 (“Cálculo do Imposto”), da D.R. “IRC/M.22-2014” (representação / localização essa, aliás, pacificamente aceite, pelo menos de uma forma geral, por todos os utentes, das mesmas D.R. M.22)], não é susceptível de qualquer tipo de dedução;
D.3 – Para a AT, portanto, a regra contida no já referido, nº 21, do Art. 88º, do CIRC/2016 (“às tributações autónomas de IRC, não são efectuadas quaisquer deduções”), já era (conforme já se referiu), pelo menos de forma genérica (apesar de não unânime), aceite e adoptada, aquando da vigência da anterior redacção, do mesmo Art. 88º, do CIRC [nomeadamente, aquando da vigência, da respectiva redacção, ao longo do ano em análise (2014)], pelo que não se trata, de qualquer “regra nova” (isto é, vigente apenas, para o ano de 2016 e seguintes), mas sim de uma regra / lei interpretativa, ou seja, com carácter de retroactividade (aliás, constitucionalmente permitida, em situações como a que ora se descreve), sendo que (acrescente-se ainda):
D.3.1 – O Art. 135º, da Lei do Orçamento de Estado para 2016 (Lei nº 7-A/2016, de 30/03), ao qualificar, como “Lei Interpretativa” [portanto com carácter de retroactividade, permitida constitucionalmente (conforme já se referiu)], o já referido nº 21, do Art. 88º, do CIRC/2016, não vem fazer mais, do que sedimentar / consolidar, um entendimento que no fundo, já era anteriormente adoptado e aceite, pelo menos de forma genérica (conforme já se referiu);
E.3 – A AT reforça ainda que:
E.3.1 – Embora em matéria fiscal, os princípios constitucionais da legalidade e da proibição, da retroactividade da lei [prevista (conforme já se referiu) no Art. 103º, da CRP], imponham algumas restrições ao legislador, não existe uma proibição constitucional genérica, de leis fiscais interpretativas [portanto, com carácter de retroactividade (conforme já se referiu)];
E.3.2 – A admissibilidade constitucional, de leis interpretativas, em matéria fiscal (tal como relativamente, a quaisquer normas, de natureza fiscal), deverá ser aferida em função das matérias, sobre as quais versam e do respectivo, conteúdo normativo, uma vez que a proibição constitucional, da retroactividade da lei fiscal, se cinge (apenas) às matérias de incidência (objectiva, subjectiva, temporal e territorial), do imposto [matérias estas (aliás), que não se afigura, estarem propriamente em questão, na presente análise];
E.3.3 – Desde a criação, da figura jurídico-fiscal das “Tributações Autónomas”, no início da década de 90, passando pela respectiva evolução legislativa, sempre foi pacífico que as “Tributações Autónomas”, não admitiam (nem admitem), qualquer dedução, sendo que (e enfatize-se), o já referido, Art. 135º, da Lei do OE/2016, ao qualificar, como “Lei Interpretativa” (portanto, com carácter de retroactividade), o já referido nº 21, do Art. 88º, do CIRC/2016, não se afasta (o mesmo Art. 135º, da Lei do OE/2016), das soluções, que já antes se viam firmadas, quer pela Lei, quer pela prática jurídico-tributária, pelo que o teor, do mesmo / já referido, nº 21, do Art. 88º, do CIRC/2016, não se poderá classificar / qualificar, de forma alguma, como uma “solução inovatória”, sendo ainda que (acrescente-se também):
E.3.3.1 – É inquestionável, que o julgador e o intérprete, em face dos “textos antigos” (leia-se: versões anteriores a 2016), não podiam sentir-se autorizados, a adoptar outra solução, que não a solução / regra, preconizada pelo teor, do já referido, nº 21, do Art. 88º, do CIRC/2016;
E.3.3.2 – Assim, isto é, tendo em conta o exposto até aqui (isto é, no ponto 2.3.1.1, 2.3.1.2 e respectivos sub-pontos, da presente informação), entendemos que o mesmo / referido disposto, no nº 1, do Art. 78º, da LGT, não poderá ser invocado, pela sociedade em questão, no Pedido de Revisão, ora em análise.
3 – Conclusão
3.1 – Deste modo, é nosso entendimento propor o indeferimento, do presente Pedido de Revisão, na medida em que o mesmo não se enquadra, no invocado (pelo contribuinte), nº 1 do Art. 78º, da LGT.
3.2 – Propõe-se ainda, que a mesma sociedade em questão [A………… – Holding, S.A. (NIF:………)], seja notificada da presente Informação / Projecto de Indeferimento, no sentido de exercer (se assim o entender, naturalmente), o respectivo Direito de Audição, conforme disposto na alínea b), do nº 1, do Art. 60º, da LGT.

j) A Requerente exerceu o direito de audição sobre o projecto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa nos termos que constam do documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

k) Por despacho de 11-10-2018, a Autoridade Tributária e Aduaneira indeferiu o pedido de revisão oficiosa (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), em que se refere, além do mais o seguinte:
2.1 - Insistimos que, a colecta proveniente de tributações autónomas, afasta-se da restante colecta de IRC (e por esse facto não esta sujeita a quaisquer deduções, bem entendido), na medida em que aquela colecta (de tributações autónomas), prossegue vários objectivos bastante específicos, como seja o propósito de evitar práticas de evasão e de fraude (quer através de despesas confidenciais, ou não documentados, quer através de pagamentos realizados, a entidades localizadas em jurisdições, com regimes fiscais privilegiados, quer disfarçando/encobrindo, pagamentos/atribuições de vantagens/remunerações acessórias, sob a forma de despesas de representação, ou através de atribuição de viaturas, a trabalhadores e/ou membros de Órgãos sociais):
2.1.1 - Daí alias o termo “Autónomas”, bem como a respectiva localização, ao nível da DR. “IRC/M.22” [Quadro 10»»» Campo 365 (não sujeito a qualquer dedução, note-se)];
2.2 - De referir também que, para além de continuarmos a invocar (conforme já se viu), a “Posição da AT”, no nosso entendimento, de que relativamente ao “Pedido de Revisão Oficiosa”, ora em análise, não se aplica o nº 1, do Art. 78º, da LGT (“Erro Imputável aos Serviços”), invocamos ainda a mesma “Posição da AT”, no nosso entendimento, de que não se aplicam, igualmente, os nºs 4 e 5, do Art. 78º, da LGT (“injustiça Grave ou Notória”), sendo ainda de acrescentar, para este mesmo efeito (justificação, da não existência / não aplicação, da designada “injustiça Grave e Notória”), o seguinte:
2.2.1 - Não tendo a sociedade em questão, relativamente à liquidação “IRC/2014”, cuja contestação / pedido de revisão, ora se analisa (recorde-se: Liquidação nº 2015 2500441359, de 09/09/2015), exercido a competente reclamação administrativa, tendo sido, portanto, ultrapassado o prazo para o exercício de tal direito, a AT entende que tal facto, configura um “comportamento negligente”, por parte da sociedade em questão (daí também, repita-se, a impossibilidade de aplicação, dos já referidos, nº 4 e 5, do Art. 78º, da LGT, ao Pedido de Revisão, ora em análise);
2.3 - Em suma, a AT considera que a referida liquidação (cujo Pedido de Revisão, ora se analisa), está correta, isto e não enferma de qualquer “ilegalidade”, ou “Erro imputável aos serviços” (nº 1, do Art. 78º, da LGT), ou mesmo de “injustiça Grave ou Notória” (nº 4 e 5, do Art.78º, da LGT), pelo que (e finalmente):
2.3.1 - Propomos que o “Pedido de Revisão Oficiosa”, ora em questão (referido, nomeadamente, no ponto 1.1 e respectivos sub-pontos, do já referido “Projecto de indeferimento”, anexado à presente informação), deverá ser, agora em definitivo, objecto de indeferimento.

l) O sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira para apresentação da declaração modelo 22 não permite deduzir os montantes de benefícios fiscais à colecta derivada de tributações autónomas;

m) Em 21-12-2018, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo»


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO

2.2.1.1 Antes do mais, cumpre averiguar da admissibilidade do recurso, atenta a posição assumida pela Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal Administrativo.
No caso dos autos, o recurso vem interposto ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 25.º do RJAT, por oposição do acórdão recorrido com anterior acórdão do CAAD, transitado em julgado, relativamente à mesma questão fundamental de direito.
Note-se que, até 1 de Outubro de 2019, o recurso de decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral para o Supremo Tribunal Administrativo por oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, só estava previsto quando essa oposição fosse com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo e já não quando a oposição fosse com decisão proferida pelo CAAD. Após 1 de Outubro de 2019, data em que entrou em vigor a redacção dada ao n.º 2 do art. 25.º do RJAT pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, o legislador alargou o âmbito do recurso de modo a nele passar a admitir a oposição entre decisões do CAAD [cf. arts. 1.º, alínea m), 17.º e 26.º, n.º 1, da referida Lei]. O n.º 2 do art. 25.º do RJAT passou a dizer: «A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo».
Porque a decisão recorrida foi proferida em 23 de Janeiro de 2020, ou seja, depois da entrada em vigor da nova redacção do n.º 2 do art. 25.º do RJAT, nenhuma dúvida subsiste quanto à sua admissibilidade.
Assim, só por manifesto lapso se compreende a posição assumida nos presentes autos pela Procuradora-Geral-Adjunta junto deste Supremo Tribunal.

2.2.1.2 Constituem requisitos de admissibilidade do presente recurso à data em que o mesmo foi interposto:

i) que a decisão arbitral se tenha pronunciado sobre o mérito da pretensão deduzida e tenha posto termo ao processo arbitral (art. 25.º, n.º 2, primeira parte, do RJAT);

ii) que esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (art. 25.º, n.º 2, segunda parte, do RJAT);

iii) que a orientação perfilhada na decisão arbitral não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo [art. 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do n.º 3 do art. 25.º do RJAT].

iv) que a decisão arbitral fundamento tenha transitado em julgado [art. 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do disposto no art. 140.º, n.º 3, do CPTA e no art. 281.º do CPPT].
Quanto ao requisito enunciado em ii), entende-se que a questão fundamental de direito é a mesma quando as situações fácticas em ambas as decisões arbitrais sejam substancialmente idênticas, entendendo-se, como tal, para este efeito, as que sejam subsumidas às mesmas normas legais e o quadro legislativo seja também substancialmente idêntico, o que sucederá quando seja o mesmo o regime jurídico aplicável ou quando as alterações legislativas a relevar num dos acórdãos não interfira, nem directa nem indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida; entende-se também que as duas decisões arbitrais estão em oposição entre si quando se opõem as decisões respectivas, não bastando que se oponham os seus fundamentos.
Atenta a complexidade destes requisitos o legislador impõe, além do mais, que na petição do recurso sejam identificados, de forma precisa e circunstanciada, os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada – n.º 2 do art. 152.º do CPTA, aplicável por força do n.º 3 do art. 25.º do RJAT (e que reproduz o que actualmente consta do n.º 2 do art. 284.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário).

2.2.2 DA OPOSIÇÃO

Da leitura das alegações de recurso verifica-se que a Recorrente cumpriu o ónus de identificação precisa e circunstanciada dos aspectos de identidade que determinam a contradição alegada e que existe uma efectiva oposição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento no que respeita à questão da admissibilidade ou não da dedução dos benefícios fiscais previstos no SIFIDE - Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE) à colecta de IRC derivada de tributações autónomas. Vejamos:
A oposição refere-se à mesma questão fundamental de direito, uma vez que em ambos os arestos estamos perante: i) a admissibilidade de dedução à colecta (resultado da liquidação) de tributações autónomas de montantes provenientes de benefícios fiscais de SIFIDE; e ii) as normas aplicáveis são as mesmas, pois apesar de na decisão arbitral recorrida estar em causa a liquidação de IRC do ano de 2013 e na decisão arbitral fundamento o acto em causa ser a liquidação de IRC do ano de 2014, ambas as liquidações se regem, no que interessa para este efeito, pela mesma redacção do disposto nos arts. 88.º e 90.º do CIRC, a redacção prévia à modificação introduzida pelo art. 133.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março (Orçamento do Estado para o ano de 2016) (ELI: https://data.dre.pt/eli/lei/7-a/2016/03/30/p/dre/pt/html.), e ambas são abrangidas pela alegada norma interpretativa do art. 135.º da mesma Lei.
Existe, pois, identidade quanto ao quadro legislativo aplicado.
Sobre a questão da dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE ao montante global apurado em sede de tributações autónomas as decisões arbitrais em confronto decidiram em sentido oposto:
Na decisão recorrida não se admitiu a dedução das despesas de investimento que beneficiam do SIFIDE às quantias devidas a título de tributações autónomas em IRC relativas ao exercício de 2013; isto porque tais deduções não eram admissíveis, atendendo à própria natureza jurídica das tributações autónomas, que é diversa do IRC.
Por seu turno, na decisão fundamento admitiu-se o direito à referida dedução à colecta; isto, em síntese, porque se considerou que o imposto cobrado com base em tributações autónomas previstas no CIRC tem a natureza de IRC.
Concluímos, portanto, que existe identidade substancial entre as questões fácticas, uma vez que em ambos os arestos está em causa a admissibilidade ou não da dedução à colecta das tributações autónomas de montantes respeitantes ao benefício fiscal SIFIDE II e que o quadro legislativo aplicado é o mesmo, bem como que existe contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento.

2.2.3 DA ORIENTAÇÃO DE ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA MAIS RECENTEMENTE CONSOLIDADA

Antes, porém, de concluir pela admissibilidade ou não do recurso importa ainda verificar se se encontra preenchido, in casu, o requisito do art. 152.º, n.º 3, do CPTA, aplicável ex vi do n.º 3 do art. 25.º do RJAT (e hoje, igualmente, consagrado no n.º 3 do art. 284.º do CPPT), ou seja, importa verificar se existe ou não jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo que seja coincidente com a decisão arbitral impugnada. Um requisito que, quando está em causa a divergência entre duas decisões arbitrais adquire especial relevância, pois visa assegurar a uniformidade da jurisprudência em matéria tributária a partir do parâmetro fixado por este Supremo Tribunal Administrativo (art. 284.º, n.º 3 do CPPT e art. 8.º, n.º 3 do Código Civil), o que é, também, pedra angular da igualdade tributária, rectius, da igualdade perante os encargos públicos.
De acordo com os critérios que têm vindo a ser definidos pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no preenchimento do conceito de jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, esta «deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o art. 17º, nº 2, do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção» (Vide, por todos, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, 12 de Dezembro de 2012, proferido no processo com o n.º 932/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/49948aac0e4e5dec80257ae80057f692.).
A questão da natureza jurídica das tributações autónomas tem vindo, desse há muito, a ser objecto de apreciação por este Supremo Tribunal (Vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 6 de Julho de 2011 proferido no processo com o n.º 281/11, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/ba7837d0a2a6ca1f802578cb0037cf09;
- de 27 de Setembro de 2017, proferido no processo com o n.º 146/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/67be49041750e222802581aa003f5cca.), sempre no sentido de que «[e]stas tributações autónomas […] embora liquidadas no âmbito do IRC, constituem uma imposição fiscal materialmente distinta deste». A concreta questão que se suscita nos presentes autos foi também ela já apreciada por este Supremo Tribunal, que, pelo recente acórdão do Pleno de 8 de Julho de 2020, proferido no processo com o n.º 10/20.1BALSB (ELI: https://data.dre.pt/eli/acsta/5/2020/12/16/p/dre.
Também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/941442b2062cf485802585a40048e9bd.) – que foi votado por todos os 12 Conselheiros que integram actualmente a Secção, com um único voto de vencido –, uniformizou jurisprudência no sentido de que: «Não são admitidas deduções à colecta das tributações autónomas relativas aos montantes apurados a título do benefício fiscal SIFIDE II, aprovado pelo artigo 133.º da Lei n.º 55-A/2010».
O que significa que a decisão recorrida está em conformidade com aquela que é a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo e, assim, que não se encontra preenchido o requisito de admissão do recurso previsto no n.º 3 do art. 152.º do CPTA, o que determina que dele não se conheça (Quanto à não verificação desse requisito e sua consequência, vide, entre muitos outros e por mais recentes, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 20 de Janeiro de 2021, proferido no processo com o n.º 71/20.3BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9b2beb93661d86ea8025866600491bab;
- de 20 de Janeiro de 2021, proferido no processo com o n.º 108/20.6BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dad02b6cf38c1ac780258668004da7f4.).

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Tendo a decisão sob recurso sido proferida depois de 1 de Outubro de 2019, data da entrada em vigor da nova redacção dada ao n.º 2 do art. 25.º do RJAT pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, é admissível o recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral de mérito por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com outra decisão do tribunal arbitral [cfr. arts. 1.º, alínea m), 17.º e 26.º, n.º 1, da referida Lei].

II - Esse recurso pressupõe que se verifique entre ambas as decisões arbitrais oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (n.º 2 do art. 25.º do RJAT), mas não deve ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada na decisão recorrida impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi do n.º 3 do art. 25.º do RJAT).

III - É de considerar que existe jurisprudência recentemente consolidada da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando o Pleno da Secção se pronunciou há cerca de seis meses sobre a questão, em acórdão proferido com um único voto em sentido contrário e, entretanto, não houve alteração alguma na composição da Secção, nem a verificação de quaisquer outras circunstâncias que permitam antever a possibilidade de alteração do sentido decisório aí consignado.


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3. DECISÃO

Em face ao exposto, os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em não tomar conhecimento do mérito do recurso.

Custas pela Recorrente [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT], com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, uma vez que o recurso não passou a fase da verificação dos pressupostos substanciais, o que integra a menor complexidade da causa para os efeitos previstos no n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais.

Comunique-se ao CAAD.


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Assinado digitalmente pelo relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros integrantes da formação de julgamento.

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Lisboa, 24 de Fevereiro de 2021. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Paulo José Rodrigues Antunes – Gustavo André Simões Lopes CourinhaPaula Fernanda Cadilhe RibeiroPedro Nuno Pinto Vergueiro - Anabela Ferreira Alves e Russo.