Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01081/16.0BEALM
Data do Acordão:01/25/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
ACÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
ATRASO NA JUSTIÇA
Sumário:É de admitir a revista do acórdão afirmativo de que a CEDH não abrange nem contempla soluções indemnizatórias para atrasos na justiça tributária – o que se reflectiria nos deveres processuais dos alegados titulares de direitos de indemnização em virtude dos processos fiscais não terem findado num prazo razoável – por se tratar de questão relevante, repetível e credora de elucidação.
Nº Convencional:JSTA000P24141
Nº do Documento:SA12019012501081/16
Data de Entrada:01/09/2019
Recorrente:A...
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A…………, identificado nos autos, interpôs a presente revista do acórdão do TCA Sul que, mantendo embora a condenação do Estado, emanada do TAF de Almada, a pagar ao aqui recorrente uma indemnização a título de danos morais – na acção por ele intentada por via do atraso na resolução de um processo de impugnação que correu nos tribunais tributários – revogou a sentença no segmento em que absolvera o Estado do pedido de pagamento de honorários de advogado, acabando por condenar o réu a satisfazê-los, mas num «quantum» a liquidar ulteriormente.

O recorrente pugna pela admissão da revista para se corrigir o aresto «sub censura».
O Estado, representado pelo MºPº, considera a revista inadmissível.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
O autor e aqui recorrente intentou a acção dos autos para que se condene o Estado a pagar-lhe uma indemnização pelos prejuízos derivados da excessiva demora de um processo onde ele impugnara determinadas liquidações do IMI. E o autor dividiu tais prejuízos em dois grupos: danos morais, cujo ressarcimento computou em € 7.800,00 – por considerar que o processo fiscal se atrasara cerca de seis anos e meio relativamente ao tempo expectável; e honorários de advogado, relativos à presente acção indemnizatória, que calculou em € 1.476,00. Ademais, a esses «quanta» acresceriam juros moratórios.
As instâncias reconheceram que a acção tributária durara em excesso. Mas divergiram entre si quanto às consequências desse atraso.
Assim, o TAF entendeu que a demora reconhecível naquela impugnação fiscal era apenas de três anos. Como computou o dano não patrimonial correspondente em € 580,00 por ano, concluiu que a indemnização devida a esse título era de € 1.740,00. E o TAF entendeu ainda que, por falta de nexo causal, nenhuma indemnização era exigível no tocante aos honorários de advogado.
O TCA – para onde o autor apelara – considerou que tais honorários eram devidos. Contudo, entendeu que o montante deles não estava determinado no processo; razão por que condenou o réu a pagá-los, no quantitativo que se apurasse em incidente de liquidação. Quanto aos danos morais – cujo «quantum» indemnizatório o apelante questionava – o TCA disse que os processos tributários não se encontram abrangidos pelo art. 6º da CEDH. Assim, os danos morais invocados pelo autor só seriam indemnizáveis se estivessem provados – e, segundo o TCA, tal não sucedia. Não obstante, o acórdão «sub specie» manteve a condenação da 1.ª instância no pagamento dos referidos € 1.740,00, já que o réu não impugnara tal pronúncia condenatória.
Na presente revista, o recorrente afirma basicamente duas coisas: considera que o TCA estava em condições de liquidar já os ditos honorários; e insiste na atendibilidade dos danos morais alegados – pois a CEDH, ao aludir a atrasos na realização da justiça, não excluirá os processos tributários – e na necessidade de os quantificar de acordo com os critérios referidos na petição.
Ora, a questão de saber se o art. 6º da CEDH se aplica a atrasos ocorridos em processos de índole fiscal merece ser elucidada. Até porque se trata de um «quaestio juris» susceptível de reaparecer em múltiplos casos. E, na hipótese vertente, esse problema subjazeu à solução jurídica do TCA – que, no fundo, se absteve de conhecer da parte da apelação onde se questionavam os critérios de cálculo dos danos morais.
Justifica-se, pois, o recebimento da revista para reanálise e esclarecimento do assunto.
Ademais, constata-se que a matéria dos autos – relativa a pretensões indemnizatórias fundadas em atrasos no exercício da justiça – se assume, cada vez mais, como um tema recorrente na jurisdição. Donde flui a necessidade do Supremo emitir directrizes nesse campo.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.
Sem custas.
Porto, 25 de Janeiro de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.