Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0434/11
Data do Acordão:06/08/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO CALHAU
Descritores:IRC
FIXAÇÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL
MÉTODOS INDIRECTOS
PRESSUPOSTOS
Sumário:I - Em conformidade com o princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas recai fundamentalmente sobre o seu rendimento real (artigo 104.º, n.º 2 da CRP), são excepcionais e obedecem a tipificação legal (em especial a contida no artigo 87.º da LGT) os casos em que é lícito à Administração Tributária fixar a matéria tributável dos contribuintes por “avaliação indirecta”, afastando-se dos valores declarados, porque inexistentes ou fundamentadamente desmerecedores de confiança, recorrendo a outros elementos (também objecto de previsão legal) que permitem a determinação do valor tributável.
II - Assim, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT, a avaliação indirecta pode efectuar-se, designadamente, em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria colectável de qualquer imposto.
III - A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, pode resultar, nomeadamente, das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso na escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais (artigo 88.º da LGT).
Nº Convencional:JSTA000P12999
Nº do Documento:SA2201106080434
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – O Representante da Fazenda Pública, não se conformando com a decisão da Mma. Juíza do TAF de Braga que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…, SA, com sede em Viana do Castelo, contra as liquidações adicionais de IRC, dos anos de 2002, 2003 e 2004, e respectivos juros compensatórios, e, em consequência, anulou tais liquidações, dela interpôs recurso para o TCAN, formulando as seguintes conclusões:
1. A verificação pela Inspecção Tributária, documentada no respectivo relatório no item IV 1.3. e anteriores, da existência de pressupostos do recurso a métodos indirectos, permitiu, de forma justificada e motivada, a decisão de tributação do sujeito passivo por via de avaliação indirecta.
2. Avaliação indirecta essa que, in casu, foi fundamentada, face à factualidade relevante apurada pela Inspecção Tributária, na alínea b) do art.º 87.º e, assim, também na alínea a) do art.º 88.º da LGT.
3. Integra designadamente essa factualidade relevante:
- a impossibilidade de determinação com rigor os anos e os valores de aquisição dos prédios constantes da escritura de justificação (usucapião) lavrada em 19.12.2000.
- a impossibilidade de determinar com rigor os anos e os valores de aquisição dos prédios alienados pela escritura de compra e venda, de 08 de Março de 2002, relativamente aos prédios, identificados no parágrafo terceiro do n.º 5 (das alegações).
- impossibilidade de determinação dos valores de venda/realização de cada bem, objecto do contrato promessa de compra e venda de 08.03.2002.
4. Integra ainda essa factualidade relevante (pressupostos do recurso a métodos indirectos), na situação tributária do sujeito passivo, verificada pela Inspecção Tributária, o não apuramento (correcto) por banda do mesmo das mais e menos-valias, das reintegrações e amortizações, tendo em vista a determinação do valor real dos rendimentos, sendo, por isso, necessário disponibilizar à Inspecção Tributária todos os elementos contabilísticos e extra-contabilísticos referidos no n.º 7 (das alegações), o que não aconteceu.
5. Integra ainda essa factualidade relevante (pressupostos do recurso a métodos indirectos), o apuramento pelo sujeito passivo, de forma incorrecta, de menos-valias fiscais no valor de € 2.624.214,42, dada a carência de elementos (contabilísticos e extra-contabilísticos) atinentes aos anos e valores de aquisição e eventuais reintegrações efectuadas relativamente a cada uma das 12 verbas em causa, com utilização de uma regra de três simples para distribuir o valor de realização (global) por aquelas 12 verbas.
6. Integra ainda essa factualidade relevante (pressupostos de métodos indirectos) a falta de suportes contabilísticos e extra-contabilísticos das reintegrações ou amortizações operadas, relativamente a bens adquiridos em 1964, pelo sujeito passivo.
7. Integra ainda essa factualidade relevante (pressupostos de métodos indirectos), a não contabilização e o não apuramento pelo s.p. das mais e menos-valias inerentes à alienação de outros bens de investimento, face ao contrato-promessa de compra e venda, de 08.03.2002 (n.º 14 das alegações).
8. Integra ainda essa factualidade relevante (pressupostos de métodos indirectos), a falta de exibição à Inspecção Tributária, no âmbito do procedimento inspectivo, de todos os elementos necessários à correcta determinação do lucro tributável, designadamente do designado “Aclaramento do contrato promessa de compra e venda de bens móveis e imóveis e renúncia aos direitos de fornecimento”, conforme n.º 14 (das alegações).
9. Toda essa factualidade relevante (pressupostos de métodos indirectos) subsume-se nas referidas alíneas b) do art.º 87.º e na alínea a) do art.º 88.º da LGT.
10. Por outra via, os fundamentos vertidos na douta sentença, justificando a ilegalidade, in casu, do recurso a métodos indirectos, não se mostram, a nosso ver, suportados em factos/situações, efectivamente concretizadas e/ou verificadas, antes, contrariamente ao decidido, constituem, em si mesmos, pressupostos de uma tributação por métodos indirectos, como, ponto por ponto, referimos nos n.ºs 13 e 14 (das alegações).
11. Assim sendo, ao decidir, como decidiu, terá a Mma. Juíza cometido erro de julgamento, na medida em que não valorou adequadamente e suficientemente os meios de prova disponibilizados atinentes à verificação in casu da existência de pressupostos do recurso a métodos indirectos, violando, pois, a al. b) do art.º 87.º e a al. a) do art.º 88.º da LGT.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmo. Magistrado do MP junto do TCAN emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, com manutenção na ordem jurídica da sentença recorrida.
Por despacho do Mmo. Juiz Relator, declarou-se o TCAN incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso e competente, para o efeito, a Secção de Contencioso Tributário do STA.
Aqui remetidos os autos, o Exmo. Magistrado do MP emite parecer no sentido de que o recurso deve improceder.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – Mostram-se provados os seguintes factos:
1. A impugnante exerce a actividade mineira de extracção e transformação de caulinos;
2. Entre 27.03.2006 a 02.05.2006, foi submetida a uma inspecção tributária, abrangendo os anos de 2002, 2003 e 2004;
3. Em 19.12.2001, no Cartório Notarial de Viana do Castelo, foi celebrada uma escritura pública de Justificação Notarial, de 30 imóveis, sitos nas freguesias de Alvarães e Vila de Punhe, aos quais foram atribuídos os valores individualizados, perfazendo o valor de 1.980.000$00 (fls. 186 a 198 do PA);
4. Em 08.03.2002, no Cartório Notarial de Coimbra, foi celebrada uma escritura pública de compra e venda na qual a impugnante vendia à B…, SA, 60 prédios rústicos (terrenos de extracção mineira), nas freguesias de Alvarães e Vila de Punhe, pelo valor de 490.068,85 € (fls. 39 a 71 do PA);
5. Em 23.05.2002, no Cartório Notarial de Barcelos, foi celebrada uma escritura pública de compra e venda na qual a impugnante vendia à B…, SA, 10 prédios rústicos (terrenos de extracção mineira), nas freguesias de Fragoso, Barcelos, pelo valor de 192.500,00 € (fls. 73 a 80 do PA);
6. Em 08.03.2002, foi celebrado um contrato promessa denominado de “Contrato Promessa de Compra e Venda de Bens Móveis e Imóveis e Renúncia de Direitos de Fornecimento”, entre a impugnante e a sociedade B…, SA, que actualmente se designa C…, SA, que aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 8 a 16 do PA);
7. No referido contrato promessa a impugnante prometia vender um conjunto de bens imóveis (cláusula 1.ª), bens móveis (cláusula 2.ª) e renunciava a direitos de fornecimento (cláusula 5.ª), conforme consta de fls. 8 a 16 do PA;
8. Na cláusula 3.ª e 5.ª a impugnante promete renunciar ao direito de fornecimento de barro vermelho pelo período de 10 anos e à fábrica de tijolo, que detinha relativamente à B…;
9. Consta da mesma cláusula a renúncia ao direito de exploração de barros não brancos em terrenos que pela B… possa vir a ser adquirido dentro do perímetro da concessão de exploração de depósito mineral de caulino a que corresponde o n.º C-49 de cadastro;
10. Em 26.06.2002, foi celebrado um “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda de Bens Móveis e Imóveis e Renúncia aos Direitos de Fornecimento celebrado em 8 de Março de 2002” no qual clarificavam os pagamentos e ainda cláusulas n.ºs 6 e 8 do referido contrato, documento que aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 370 a 374 do PA apenso);
11. Neste contrato, na cláusula 1), discrimina os valores dos pagamentos a pagar e a entrega de cheques e na cláusula 2) refere que a B… irá ocupar de imediato as partes das instalações da 1.ª que estão identificadas no croquis que consta em anexo ao referido aditamento, permitindo que nelas possa executar desde já as obras que entenda necessárias;
12. Em 23.07.2002, foi elaborada uma adenda ao contrato promessa à qual designaram por “Aclaramento do Contrato Promessa de Compra e Venda de Bens Móveis e Imóveis e Renúncia aos Direitos de Fornecimento”, na qual discriminavam os valores dos bens prometidos vender e dos direitos prometidos renunciar e que constam das cláusulas 1.ª, 2.ª e 3.ª do contrato inicial, constante de fls. 347 a 348 do PA, documento que aqui se dá por integralmente reproduzido;
13. A Inspecção Tributária apurou que a contabilidade da referida sociedade evidenciava diversas irregularidades, as quais se encontram descritas no relatório de inspecção, constante de fls. 286 a 299 do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzido. Com relevância para a decisão transcreve-se o seguinte:
(…)
IV- Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos:
(…)
IV.1.3 Avaliação indirecta – pressupostos
1. Atento o referido nos pontos anteriores, verifica-se que estamos em condições de determinar o lucro tributável com recurso à aplicação de métodos indirectos dada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, conforme prevê o art.º 87.º, alínea b) da Lei Geral Tributária, dado se verificar a insuficiência de elementos na contabilidade, conforme prevê a alínea a) do artigo 88.º do mesmo diploma legal (LGT).
2. Na verdade, de acordo com o que ficou referido, a impossibilidade de comprovação directa e exacta resulta essencialmente dos seguintes factos:
2.1. Impossibilidade de determinar com rigor os anos e valores de aquisição relativamente aos prédios constantes da escritura de justificação (usucapião) lavrada em 19.12.2000, já referida no ponto 4. do capítulo IV.1.1 do presente relatório.
2.2. Impossibilidade de determinar, concretamente, a que prédios respeitam as amortizações declaradas pelo sujeito passivo, no montante de € 40.977,80, no respectivo mapa de apuramento de mais-valias ou menos-valias fiscais (doc. n.º 3, fls. única).
2.3. Impossibilidade de determinar com exactidão o valor da venda de cada um dos bens referidos no capítulo IV.1.2 do presente relatório.
(…).
14. A impugnante requereu a revisão nos termos do art.º 91.º da LGT, a qual veio a ser decidida em 18.07.2006, não tendo havido acordo (fls. 336 a 369 do PA);
15. A presente impugnação tem por base a liquidação de IRC n.º 2006 00006542736 e 2006 00006870628 e 2006 00007655279, relativamente aos anos de 2002, 2003 e 2004, no valor global de 702.395,99 €;
16. A impugnante estava sujeita ao regime de acompanhamento cujo técnico designado era o Técnico Tributário que procedeu à Inspecção;
17. Em 2003, 2004 e 2005 não apresentou o modelo 22 do IRC;
18. A presente impugnação foi intentada em 24.11.2006.
III – Vem o presente recurso interposto pelo Representante da Fazenda Pública da decisão da Mma. Juíza do TAF de Braga que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida contra as liquidações adicionais de IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, anulando, em consequência, estas.
Para tanto, considerou a Mma. Juíza a quo que não se verificavam os pressupostos do recurso a métodos indirectos.
Alega o recorrente que, ao decidir como decidiu, terá a Mma. Juíza cometido erro de julgamento, na medida em que não valorou adequada e suficientemente os meios de prova disponibilizados atinentes à verificação in casu da existência de pressupostos do recurso a métodos indirectos, violando, pois, a alínea b) do artigo 87.º e a alínea a) do artigo 88.º da LGT.
Vejamos. A questão que constitui o objecto do presente recurso é a verificação ou não dos pressupostos de recurso à aplicação de métodos indirectos.
O artigo 52.º do CIRC determina que a aplicação dos métodos indirectos se efectua nos casos previstos nos artigos 87.º a 89.º da LGT.
Como se disse no acórdão deste Tribunal de 7/10/2009, no recurso n.º 422/09, «Em conformidade com o princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas recai fundamentalmente sobre o seu rendimento real (artigo 104.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa), são excepcionais e obedecem a tipificação legal (em especial a contida no artigo 87.º da Lei Geral Tributária) os casos em que é lícito à Administração Tributária fixar a matéria tributável dos contribuintes por “avaliação indirecta”, afastando-se dos valores declarados, porque inexistentes ou fundamentadamente desmerecedores de confiança, recorrendo a outros elementos (também objecto de previsão legal) que permitem a determinação do valor tributável.
Tal sucede, designadamente, no caso previsto nos artigo 87.º, n.º 1 alínea b) e 88.º alíneas a) … da Lei Geral Tributária, alegadamente justificantes do acto praticado pela Administração Tributária e objecto de impugnação nos presentes autos, que dispõem nos seguintes termos:
Artigo 87.º
Realização da avaliação indirecta
1 – A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de:
a) …
b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria colectável de qualquer imposto;
(…)
Artigo 88.º
Impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável
A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referidos na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso na escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;
(…)
Tendo a avaliação indirecta carácter excepcional (cfr. o n.º 1 do artigo 81.º da Lei Geral Tributária) e subsidiário em relação à avaliação directa (cfr. o artigo 85.º, n.º 1 da Lei Geral tributária), cabe à Administração tributária a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável.».
Dispõe o n.º do artigo 75.º da LGT que se presumem verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.
Tal presunção não se verifica, porém, no caso da contabilidade revelar omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflecte ou impeça o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (n.º 2 do mesmo normativo).
Foi o que sucedeu no caso em apreço.
A Administração Tributária apurou na contabilidade do sujeito passivo, ora recorrida, irregularidades que, em seu entender, afastavam a presunção estabelecida no artigo 75.º da LGT.
Irregularidades essas que, conforme constam do ponto 13 do probatório, seriam:
- Impossibilidade de determinar com rigor os anos e valores de aquisição relativamente aos prédios constantes da escritura de justificação (usucapião) lavrada em 19.12.2000, já referida no ponto 4. do capítulo IV.1.1 do presente relatório;
- Impossibilidade de determinar, concretamente, a que prédios respeitam as amortizações declaradas pelo sujeito passivo, no montante de € 40.977,80, no respectivo mapa de apuramento de mais-valias ou menos-valias fiscais (doc. n.º 3, fls. única);
- Impossibilidade de determinar com exactidão o valor da venda de cada um dos bens referidos no capítulo IV.1.2 do presente relatório.
Ora, quanto ao primeiro dos pontos citados, entendeu-se na sentença recorrida que tendo a impugnante, ora recorrida, declarado na aludida escritura de justificação, celebrada em 2001, que os adquirira há mais de 40 anos, ter-se-ia que reportar a propriedade dos referidos prédios a 40 anos anteriores à data da escritura, ou seja, a 1961 e aceitar-se o valor aí declarado.
Todavia, contrariamente ao assim entendido, o facto é que a escritura de justificação referida não especifica os anos de aquisição nem o valor dos imóveis, limitando-se a referir apenas que se encontravam na posse da impugnante há mais de 40 anos, tendo-lhe sido atribuído, à data da celebração da escritura, um valor, sendo que, para um correcto apuramento das mais ou menos-valias, era necessário conhecer o ano e valor de aquisição, tendo em vista a determinação do valor líquido actualizado.
Já no que toca às amortizações declaradas pelo sujeito passivo, diz-se na sentença recorrida que a inspecção não explica a razão pela qual não aceita os cálculos apresentados pela impugnante, se a mesma aplica incorrectamente a lei ou não, rejeitando somente.
Ora, como ressalta do relatório da inspecção, essas amortizações não foram consideradas pela AT tendo em conta a forma de apuramento mas sim porque se desconhecia a que prédios respeitam, além de que, desconhecendo-se o ano de aquisição destes, também não era possível calcular a amortização pois para isso era necessário conhecer o valor de aquisição dos bens e respectivo ano para saber se ainda era possível a amortização do bem em causa.
Por fim, no que concerne à alienação de outros bens de investimento, entende-se na decisão recorrida que os documentos a ela referentes se encontravam na contabilidade da impugnante, podendo aí ser analisados, mas ainda que aí não estivessem sempre a AT poderia tê-los solicitado àquela e só a sua recusa em exibi-los poderia justificar o recurso à aplicação de métodos indirectos, caso não fosse possível as meras correcções aritméticas.
Contudo, o que ressalta do relatório da inspecção, é que o sujeito passivo apenas contabilizou os recebimentos, não tendo contabilizado e apurado as mais ou menos-valias inerentes, limitando-se a proceder às reintegrações e amortizações sem mais.
E que, por outro lado, apenas foi exibido durante o período em que decorreu a acção inspectiva um contrato promessa, e só mais tarde foram, então, exibidos outros documentos, nomeadamente o “Aditamento” e o “Aclaramento do contrato promessa” referidos nos pontos 10 e 12 do probatório.
Ora, tendo a acção inspectiva em causa sido acompanhado pelo TOC do sujeito passivo, não se compreende porque razão não apresentou ele, então, todos os elementos contabilísticos e extra-contabilísticos que possuía ou tinha conhecimento, de forma a esclarecer a situação tributária da impugnante.
Ao não o ter feito, evidencia-se, desde logo, com tal atitude, uma clara intenção de omitir elementos à inspecção tributária necessários à correcta determinação do lucro tributável da impugnante.
A factualidade constante do relatório da inspecção e transcrita em parte no ponto 13 do probatório fixado na sentença recorrida constituem, em si mesmos, factos integrantes do pressuposto do recurso à avaliação indirecta da matéria colectável previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º e na alínea a) do artigo 88.º, ambos da LGT.
Não o tendo assim decidido, não pode a sentença recorrida manter-se, antes deve ser revogada, baixando os autos ao tribunal recorrido para que aí se conheça das demais questões suscitadas e cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução dada à questão objecto do presente recurso.
IV – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA, em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida, e ordenar a baixa dos autos à primeira instância para conhecimento das demais questões suscitadas pela impugnante e cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução dada à questão que foi objecto do presente recurso.
Sem custas.
Lisboa, 8 de Junho de 2011. – António Calhau (relator) – Casimiro Gonçalves – Brandão de Pinho.