Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01174/10.8BESNT
Data do Acordão:05/12/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA
NULIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO
PRESCRIÇÃO
CONHECIMENTO OFICIOSO
MATÉRIA DE FACTO
Sumário:I - Só existe omissão de pronúncia quando se verifica a violação do dever processual que o tribunal tem em relação às partes, de se pronunciar sobre todas as questões por elas suscitadas;
II – A nulidade da falta de requisitos do título executivo – nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i);
III - A prescrição da divida exequenda trata-se de questão de conhecimento oficioso, cfr. artigo 175º do CPPT, porém, para que o Supremo Tribunal possa conhecer da mesma é essencial que disponha nos autos de todos os elementos de facto que possam ser relevantes para a contagem do respectivo prazo extintivo, independentemente da sua duração.
Nº Convencional:JSTA000P27671
Nº do Documento:SA22021051201174/10
Data de Entrada:07/07/2020
Recorrente:EUROPARQUE – CENTRO ECONÓMICO E CULTURAL
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

Europarque – Centro Económico e Cultural, inconformada interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (TAF de Sintra) datada de 25 de Novembro de 2019, que julgou improcedente a oposição judicial deduzida contra a execução fiscal que tem por alvo a cobrança coerciva de dívida ao IAPMEI, relativa ao contrato de comparticipação financeira n.º 155, incentivo reembolsável, no âmbito do Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia.

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“A. A dívida que o IAPMEI pretende cobrar ao EUROPARQUE – CENTRO ECONÓMICO E CULTURAL, resulta de um contrato de participação financeira outorgado no quadro do Direito Comunitário, concretamente no âmbito do Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 188/88, de 27 de maio, e posteriormente integrado no Programa Energia, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 195/94, de 19 de março;
B. O financiamento emergente do contrato de participação financeira ocorreu no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio (QCA), da Decisão n.º 94/366/CE, da Comissão, e do quadro legal regulamentado pelos Despachos Normativos n.ºs 11-A/95, de 6 de março, e 19/98, de 19 de março;
C. O promotor do projeto e terceiro outorgante do contrato de participação financeira foi o agrupamento complementar de empresas A………….., ACE, o qual foi integrado pela B……………, SA., e pelo EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural, a ora recorrente;
D. Em termos legais (n.º 2 da Base II da Lei n.º 4/73) e em termos contratuais, o regime de responsabilidade por dívidas vigente entre as empresas agrupadas é o de responsabilidade solidária;
E. Em face do artigo 512.º do Código Civil, existe responsabilidade solidária quando os pressupostos da obrigação jurídica se verificação em relação a mais de que uma pessoa, e o credor pode exigir o cumprimento integral da prestação devida a qualquer devedor, e este a todos libera;
F. O IAMPEI exigiu o pagamento da dívida relativo aos incentivos reembolsáveis ao EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural, em virtude da sua condição de responsável solidário, regime que lhe impõe um grau de responsabilidade igual à do devedor principal;
G. Em face das prerrogativas decorrentes do n.º 2 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 140/2007, de 27 de abril, o IAPMEI emitiu a certidão de dívida, para efeitos de cobrança coerciva, em nome do devedor principal, o A…………, ACE, entidade contra a qual foi instaurado o processo de execução fiscal;
H. No título executivo, ao arrepio do previsto nas normas da alínea j) do n.º 2 do artigo 88.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 163.º do CPPT, não foi feita qualquer menção expressa à identificação dos responsáveis solidários, o que constitui uma nulidade do título executivo;
I. Os responsáveis solidários respondem pela prestação jurídica devida com um grau de responsabilidade idêntica à do devedor principal, visto que se encontram na mesma linha de responsabilização, razão pela qual não podem deixar de constar do texto do título executivo;
J. A falta de identificação e menção dos devedores, e os responsáveis solidários são devedores em primeira linha, constituiu a falta de requisitos essenciais do título executivo que não podem ser supridos por prova documental;
K. Os devedores são os sujeitos da relação jurídica, pelo que na estrutura da obrigação jurídica, são elementos essenciais, razão pela qual a falta da sua menção expressa no título executivo não pode ser substituída por prova documental, como já se referiu;
L. As nulidades em processo de execução fiscal podem ser insanáveis ou simples; aquelas devem ser conhecidas oficiosamente ou podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final, as últimas têm de ser arguidas pelo interessado e só o podem ser no prazo para a contestação ou aquando da primeira intervenção no processo;
M. A certidão de dívida emitida pelo IAPMEI – título executivo – visto que não fez qualquer menção expressa aos responsáveis solidários é nula, nulidade que foi arguida pela oponente, ora Recorrente, na contestação à execução fiscal, in casu, pela dedução de oposição judicial, aquando da sua chamada à execução fiscal e na sequência da sua citação em 29.09.2009;
N. A nulidade do título executivo devia ter sido conhecida pelo tribunal a quo, visto que é causa de extinção da execução fiscal, se não o for a título principal, devia sê-lo a título incidental, designadamente quando a nulidade for invocada conjuntamente na petição de oposição de judicial com fundamentos de oposição e a sua existência seja uma questão prévia relativamente a qualquer questão incluída no âmbito da oposição, conforme se refere no acórdão do TCAN, proferido no processo n.º 02356/08.8BEPRT, datado de 27.10.2016;
O. Uma vez que a nulidade por falta de requisitos do título executivo foi arguida pela interessada, o tribunal a quo devia dela ter conhecido, e não o tendo feito verifica-se, à luz dos normativos do artigo 125.º do CPPT, aplicável por força do artigo 211.º do CPPT e, ainda, da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPPC, causa de nulidade da sentença, com fundamento em omissão de pronúncia;
P. O regime de responsabilidade solidária a que a oponente está vinculada impõe que deva usufruir de condições de pagamento e de exigibilidade da dívida idênticas às aplicáveis ao devedor principal, razão pela qual a sua identificação devia constar do texto da certidão de dívida;
Q. A circunstância de a oponente, ora Recorrente, não figurar no título executivo determina a sua ilegitimidade para a execução fiscal o que, por si só, deve determinar a extinção da execução fiscal;
R. A não menção expressa da oponente, na qualidade de responsável solidário, no título executivo implica que esta não seja responsável pelo pagamento da dívida exequenda;
S. O responsável solidário está na mesma linha de responsabilidade do devedor principal, logo, responde pela dívida em condições e circunstâncias idênticas às do devedor principal, daí que quando chamado a efetuar o cumprimento da prestação devida, deva de usufruir da dispensa de acrescido, isto é, de isenção de pagamento de juros de mora e de custas processuais;
T. O responsável solidário quando chamado a cumprir a obrigação devida apenas tem de satisfazer a obrigação contratual, composta pelo dever de restituição dos incentivos reembolsáveis e pelos juros moratórios fixados no contrato, no valor total de € 452.542,73, exigibilidade que se encontra prejudicada pela nulidade do título executivo, em virtude da falta de menção na certidão de dívida do EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural;
U. Ao EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural tem de ser dada a oportunidade de proceder ao pagamento da dívida, ainda que no prazo para a oposição judicial, sem a exigibilidade de qualquer acréscimo de juros de mora e de custas processuais;
V. Se, nos termos do n.º 5 do artigo 23.º da LGT, os responsáveis subsidiários estão isentos do pagamento de juros de moras e das custas processuais, por maioria de razão, os responsáveis solidários que, nos termos do n.º 2 do artigo 23.º da LGT e do artigo 153.º do CPPT, são chamados a efetuar o pagamento da dívida em momento prévio àquele em que a dívida é exigida aos responsáveis subsidiários, têm, outrossim, de ser dispensados do pagamento do acrescido;
W. Verifica-se, assim, ilegitimidade da pessoa citada, pela circunstância de não figurar no título executivo e por não ser responsável pelo pagamento da dívida, conforme resulta, in fine, da norma da alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT;
X. O contrato de participação financeira, fundamento do financiamento dos incentivos reembolsáveis, foi outorgado ao abrigo do Direito Comunitário, em concreto, o Programa Energia no qual foi integrado o Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia, e que teve por fonte de financiamento o Quadro Comunitário de Apoio (QCA) e a decisão n.º 94/366/CE da Comissão, conforme resulta do cotejo dos normativos legais do Decreto-Lei n.º 195/94, de 19 de julho, e do Despacho Normativo n.º 11-A/95. De 6 de Março, com as alterações introduzidas pelo Despacho Normativo n.º 19/98, de 19 de março;
Y. Às dívidas com origem em programas de incentivos comunitários, cujos fundos sejam reembolsáveis é aplicável o prazo de prescrição de quatro anos previsto no n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento (CE, EURATOM) N.º 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro de 1995;
Z. As medidas de execução sancionatória aplicáveis em resultado de irregularidade cometida por promotor de projeto fonte de financiamento com fundos comunitários, logo, em incumprimento do estabelecido contratualmente, têm de ser executadas no prazo de três anos a partir da prática da irregularidade, conforme decorre do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento CE, EURATOM) N.º 2988/95 do Conselho;
AA. Embora no n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento se preveja que os Estados-membros podem aplicar um prazo de prescrição mais longo, tal só é possível mediante a previsão legal expressa e específica de tal possibilidade no quadro legal nacional referente à atribuição dos referidos incentivos programáticos de matriz comunitária, o que, no caso, não se verifica;
BB. Nesta medida, não podem ser aplicados, como defende o credor (IAPMEI), os prazos de prescrição previstos no Código Civil ou noutra legislação nacional cuja finalidade seja outra, que não a regulamentação destes quadros de financiamento ou de incentivos de natureza comunitária;
CC. Não existindo norma legal específica que estabeleça prazo de prescrição aplicável às dívidas constituídas pelos incentivos reembolsáveis obtidos ao abrigo do direito comunitário tem de lhe ser, obrigatoriamente, aplicável o prazo de quatro anos estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento (CE, EURATOM) N.º 2988/95 do Conselho;
DD. É este entendimento que se encontra sobejamente firmado na jurisprudência dos Tribunais Tributários superiores, conforme emerge do acórdão do STA, proferido no processo n.º 02528/08.5BEPRT 01625/15, datado de 03.07.2010, e nos outros arestos referidos nas nossas alegações;
EE. Dado que, em face do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento, o prazo para execução da medida sancionatória traduzida na exigibilidade do reembolso dos fundos comunitários é de três anos, e que a irregularidade do promotor se verificou em Abril de 2001, é imperioso concluir que o direito à cobrança da dívida exigida pelo IAPMEI prescreveu, dado que as medidas de execução praticadas por este ocorreram em data posterior à conclusão do decurso do segmento temporal de quatro anos, com referência ao início do prazo de prescrição, ou seja, a data da irregularidade – Abril de 2001;
FF. Nesta medida, a dívida exequenda exigida ao responsável solidário – EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural, está prescrita, pelo que não lhe pode ser exigida e, em consequência, deve ser determinada a extinção da execução fiscal;
GG. A prescrição da dívida foi invocada pela oponente, quando esta se referiu de forma expressa e inequívoca à inércia do credor;
HH. Todavia, ainda que assim não se entenda, a prescrição da dívida exequenda, nos termos do artigo 175.º do CPPT, é de conhecimento oficioso e deve ser conhecida pelo juiz caso o órgão da execução fiscal que tenha intervindo no processo não o tenha feito;
II. Ora, não tendo o Tribunal a quo conhecido da prescrição e sendo esta de conhecimento oficioso, nos termos do artigo 125.º do CPPT e da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPPT, verifica se uma causa de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia;
JJ. À cautela invoca-se ainda a jurisprudência firmada no ponto 8 do sumário do Acórdão do STA, proferido no processo n.º 0179/19.8BEPNF, datado de 23.10.2019, da qual emerge a possibilidade do Tribunal ad quem conhecer da prescrição da dívida exequenda;
KK. Assim, a dívida exigida pelo IAPMEI à EUROPARQUE – Centro Económico e Cultural está prescrita, logo esta circunstância, só por si, deve determinar a extinção do processo de execução fiscal.
Por todas as razões expostas e aduzidas, e com o Mui Douto Suprimento de Vossas Excelências, Excelentíssimos Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo, deve o presente Recurso Jurisdicional ser considerado procedente, revogando-se a sentença recorrida e sendo a mesma substituída por outra que faça correcta interpretação e aplicação do Direito aos factos, assim fazendo a costumada JUSTIÇA”.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se no sentido de dever negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida na ordem jurídica.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
“A) . A 05.02.1998 disseram os representantes do “Euro Parques – Centro Económico e Cultural”, e da sociedade “B……………., S.A.”, que constituem um agrupamento complementar de empresas com a denominação “A………… ACE”, disseram ainda que “as entidades agrupadas respondem solidariamente pelas dívidas do Agrupamento Complementar de Empresas, gozando, no entanto do benefício, sendo a realização e partilha de lucros como fim acessório”.
B) . A 10.03.1999 foi assinado um documento com a epígrafe “sistemas de incentivos à utilização racional de energia – contrato de comparticipação financeira n.º 155”, onde consta nomeadamente que a DGE obriga-se a pagar à A……………. ACE uma comparticipação financeira reembolsável no montante de Esc. 75.764.000$00, sendo o reembolso do montante da comparticipação financeira à entidade a indicar pela DGE, podendo o IAPMEI e a DGE exigir a apresentação de garantias, para cumprimento deste contrato.
C) . A 28.05.1999 foi emitida garantia bancária n.º 261980 sobre o Banco Espírito Santo, com limite para a quantia de Esc. 45.115.000$00, que abrange o valor do incentivo pago, acrescido dos juros exigíveis correspondentes ao período de utilização indevida do incentivo e de eventuais encargos que o IAPMEI venha a reclamar, emergentes da situação de incumprimento.
D) . A 24.04.2001 foi pelo IAPMEI emitido o recibo n.º 17344, por pagamento efectuada pela A………….., ACE, no montante de Esc. 1.182.728$00.
E) . A 28.01.2008 foi pelo IAPMEI emitida certidão de dívida em nome A………….., ACE, pelo montante de €348.065,78, respeitante às prestações do incentivo reembolsável não devolvidas, no âmbito do contrato n.º 155, celerado no âmbito do Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia, e €104.476,95, referente aos juros calculados sobre o incentivo não devolvido, à taxa de juro legal acrescida de dois pontos, sobre os últimos cinco anos.
F) . A 18.02.2008 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 3522200801017314, contra a sociedade A…………., ACE, instaurado no Serviço de Finanças de Oeiras 3, para cobrança da quantia exequenda no montante total de €452.542,73, e acrescido, relativo a dívida ao IAPMEI – Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação, respeitante às prestações do incentivo reembolsável não devolvidos e respectivos juros, no âmbito do contrato n.º 155, celebrado no âmbito do Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia.
G) . A 23.09.2009 foi elaborada informação no processo de execução fiscal n.º 3522200801017314, onde consta nomeadamente o seguinte:
“(…) Cumpre-me informar que o executado A…………. ACE é um Agrupamento Complementar de Empresas. Os “agrupamentos complementares de empresas estão regulados pela Lei 4/73, de 04.06, cuja Base II, n.º 2 e 3 dispõe que “… as empresas agrupadas respondem solidariamente pelas dívidas do agrupamento salvo cláusula em contrário do contrato celebrado…” e “…os credores do agrupamento não podem exigir das empresas agrupadas o pagamento dos seus créditos sem prévia excussão dos bens do próprio agrupamento”, Nos autos não está demonstrada qualquer clausula excepcionante da responsabilidade solidária das empresas, nem a existência de bens próprios do agrupamento.
Assim, face à inexistência de bens penhoráveis e ao facto de a executada ter a actividade encerrada para efeitos de IVA e de não apresentar elementos contabilísticos que indiciem a continuação da sua actividade comercial/laboral, parece-me que se encontra excutido o património do executado A………….. ACE, pelo que parece-me ser de acionar a responsabilidade solidária prescrita nos termos da base II, n.º 2 da citada Lei n.º 4/73 e n.º 2 do artigo 22.º da LGT, contra as empresas agrupadas constantes do contrato celerado para constituição do agrupamento A……….. ACE, NIPC ………..
De acordo com informação constante na certidão do Registo Comercial de Cascais, o contrato de ACE foi inscrito na referida conservatória em 29-04-1998 pela Apresentação 22. E consta como Agrupados ao referido ACE, EUROPARQUES CENTRO ECONÓMICO E CULTURAL, NIPC 502781092, com uma participação no capital de 2% e B………….., SA, NIPC …………, com uma participação de 98% do capital. (…)”
H) . Por despacho de 23.09.2009 do Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 3, foi determinado “[f]ace à informação supra e de acordo com o disposto nos normativos do n.º 2 do artigo 22.º da Lei Geral Tributária e base II, n.º 2 da Lei n.º 4/73, de 04/06, accione-se a responsabilidade solidária contra as empresas agrupadas de A…………. ACE, NIPC …………../De acordo com o disposto nos normativos do n.º 4 do art.º 22.º da Lei Geral Tributária, proceda-se à citação das empresas agrupadas”.
I) . A 29.09.2009 foi a oponente citada na qualidade de responsável solidária, em sede do processo de execução fiscal n.º 3522200801017314 instaurado contra a A………… ACE, Agrupamento Complementar de Empresa, por dívida ao IAPMEI, pela quantia exequenda de €452.542,73, e acrescido.
J) . A 28.10.2009 foi pela oponente apresentada a petição que deu origem à presente acção.”.

Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
Vem sindicada a sentença do TAF de Sintra, que julgou improcedente a oposição judicial deduzida contra a execução fiscal que tem por escopo a cobrança coerciva de dívida ao IAPMEI, relativa ao contrato de comparticipação financeira n.º155, incentivo reembolsável, no âmbito do Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia.
A sentença julgou improcedente a oposição, no entendimento de que a alegada nulidade do título executivo não constitui fundamento de oposição à execução; foi dado cumprimento ao benefício da excussão prévia, uma vez que o recorrente só foi revertido no PEF, enquanto devedor solidário depois de constatado que o ACE do qual a oponente fazia parte não dispunha de quaisquer bens que pudessem responder pelo pagamento da dívida exequenda; a oponente não tinha que ser notificada para pagamento voluntário da divida exequenda, mas antes o ACE enquanto primeiro responsável, o que aconteceu, tendo sido devidamente citada em sede de reversão e que não tinha que ser notificada para o exercício do direito de audição prévia.
Este Supremo Tribunal apenas pode reapreciar as questões apreciadas pelo tribunal a quo, suscitadas pela oponente, e não questões novas, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, como é o caso da prescrição.

Quanto à nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Além do mais, o recorrente assaca à sentença recorrida o vício formal de omissão de pronúncia, por não ter conhecido da invocada nulidade do título executivo e da prescrição da obrigação exequenda, que é de conhecimento oficioso.
Vejamos.
Existe omissão de pronúncia quando se verifica a violação do dever processual que o tribunal tem em relação às partes, de se pronunciar sobre todas as questões por elas suscitadas.
Para se estar perante uma questão é necessário que haja a formulação do pedido de decisão relativo a matéria de facto ou de direito sobre uma concreta situação de facto ou de direito sobre que existem divergências, formuladas com base em alegadas razões de facto e de direito.
Nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 1 do CPC a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica, sendo certo que nos termos do nº 2 o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
O Tribunal não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir o conhecimento oficioso de outras (artigo 608.º, n.º 2 do CPC), sob pena de nulidade por excesso de pronúncia.
Nos termos do estatuído no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC e 125.º, n.º 1 do CPPT a sentença é nula quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Ora, tendo o tribunal recorrido sustentado que a nulidade do título executivo não constitui fundamento, não tinha, certamente, que apreciar tal pretensa nulidade.
No que diz respeito à invocada prescrição da dívida exequenda, a recorrente não suscitou, expressamente, essa questão, cfr. artigos 69º e ss. da petição de oposição, pelo que o seu não conhecimento não constitui nulidade da sentença mas eventualmente erro de julgamento.
Não se verifica, pois, nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia.

A questão da nulidade do título executivo.
A nulidade do título executivo, como muito bem decidiu a sentença recorrida, não constitui fundamento de execução, na senda, aliás, da jurisprudência do STA (entre outros, acórdão do PLENO da SCT, de 06/05/2009-P. 0632/08 e da SCT, de 28/05/2014-P. 01086/13, disponíveis em www.dgsi.pt)
De facto, como se diz no citado acórdão do PLENO, “Todavia há outros parâmetros a considerar.
Dispõe o artigo 2.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que «a todo o direito (…) corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo».
E, em termos semelhantes, preceitua o artigo 97.º, n.º 2, da Lei geral Tributária, que «a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo».
Assim, a cada direito corresponde uma só acção: unidade, que não pluralidade.
Ora, o artigo 165.º do CPPT, considera nulidade insanável em processo de execução fiscal «a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental”.
E estabelece o respectivo regime, e efeitos: a anulação dos termos subsequentes do processo que do acto anulado dependam absolutamente, sendo (a nulidade) de conhecimento oficioso e podendo ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão.
A lei elegeu, pois, tipicamente, o respectivo regime legal: trata-se de uma nulidade.
E, como tal, estabelece-se igualmente o seu regime de arguição.
Assim sendo, foi propósito legal desconsiderá-lo como fundamento de oposição, ainda que seja a mesma, substancialmente, a consequência resultante: a extinção da execução consubstanciada na nulidade do próprio título.
Por outro lado, a tutela jurídica concedida à nulidade é, até, mais consistente do que a resultante da oposição, na medida em que pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, que não apenas no prazo de 30 dias contados da citação, cfr. artigo 203.º, n.º 1, do CPPT.
Aliás, a entender-se dever ser conhecida pelo Chefe do Serviço de Finanças (ou, porventura, pelo juiz, cfr. o artigo 151.º, n.º 1, do CPPT), sempre o respectivo processo seria urgente, cfr. artigo 278.º, n.º 5 – o que é mais consentâneo com a celeridade querida para o processo de execução fiscal, atenta essencialmente a sua finalidade de cobrança de impostos que visam «a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas» e a promoção da justiça social, da igualdade de oportunidades e das necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, cfr. artigo 5.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.
Nada, pois, parece justificar a apontada dualidade -em termos de nulidade processual da execução fiscal e de fundamento de oposição à mesma- aliás, proibida nos termos do artigo 2.º do Código de Processo Civil.
Conclui-se, assim, que a nulidade da falta de requisitos do título executivo – nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i).

A questão da alegada ilegitimidade.
Como bem se decidiu na sentença recorrida foi cumprido o benefício da excussão prévia, uma vez que a recorrente só foi citada, como devedora solidária, nos termos do estatuído da Base II, nº 2 e 3 da Lei 4/73, de 04/06, depois de se ter apurado que o ACE não dispunha de quaisquer bens penhoráveis, sendo certo que a recorrente não indicou um único bem penhorável.
Assim sendo, a recorrente é responsável pelo pagamento da dívida pelo que é parte legítima na execução.

A questão da prescrição da dívida exequenda.
É certo que se trata de questão de conhecimento oficioso, cfr. artigo 175º do CPPT, porém, para que este Supremo Tribunal possa conhecer da mesma é essencial que disponha nos autos de todos os elementos de facto que possam ser relevantes para a contagem do respectivo prazo extintivo, independentemente da sua duração.
Como é sabido, o Supremo Tribunal não conhece de matéria de facto, apenas aprecia questões de direito, cfr. artigo 280º do CPPT, e para a contagem do prazo de prescrição das dívidas é essencial que estejam devidamente estabelecidos os factos atinentes ao início do prazo e eventuais vicissitudes que possam ter ocorrido ao longo do tempo que possam ter influenciado o decurso desse prazo, seja por via da interrupção ou da suspensão.
Como claramente resulta dos autos, no que respeita à matéria de facto, há um hiato entre Abril de 2001 e Janeiro de 2008 sem que se saiba que diligências foram efectuadas pelo credor da dívida, sem certo que aparentemente algumas foram feitas tal como resulta do documento de fls. 49 e 50 junto pela oponente –requerimento de execução dirigido pelo IAPMEI ao Chefe de Finanças-, cfr. artigo 5º: “Acontece que a executada apenas procedeu ao pagamento de parte da primeira prestação no valor de €5.899,42, apesar das inúmeras solicitações e propostas para apresentarem um novo plano de reembolso, veja-se a última comunicação efectuada, à qual nem se obteve resposta…”, sendo certo que o prazo para o pagamento prestacional terminaria em Outubro de 2005.
Assim, à míngua de matéria de facto relevante para a decisão desta questão não pode o Supremo Tribunal conhecer da mesma uma vez que não lhe é licito ampliar a matéria de facto constante do probatório da sentença recorrida, restando sempre a possibilidade à oponente de invocar a prescrição da dívida no próprio processo de execução fiscal, onde deverá ser conhecida.


Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
D.n.

Lisboa, 12 de Maio de 2021. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Gustavo André Simões Lopes Courinha.