Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01244/15.6BEPNF
Data do Acordão:06/05/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24626
Nº do Documento:SA22019060501244/15
Data de Entrada:04/05/2019
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (TAF de Penafiel) datada de 15 de Janeiro de 2019, que julgou procedente a oposição deduzida por A…………, na qualidade de revertida ao processo de execução fiscal nº 1880201401040162, do Serviço de Finanças de Santo Tirso por uma dívida de IUC no valor de € 582,44, em que é devedora originária B…………, LDA. Invocou oposição entre a decisão recorrida e os acórdãos fundamento de 17/12/2015, 15/02/2012 e 18/01/2012, proferidos respectivamente nos processos nºs 2411/09, 872/11 e 724/11, o primeiro do TCA Norte e os dois últimos do STA.
Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
A. Vem o presente recurso interposto, ao abrigo do disposto no artigos 279º, 280º n.º 5, 281º, 282º e 286º, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida pela revertida A…………, NIF ………, à execução fiscal com o n° 1880201401040162, do Serviço de Finanças de Santo Tirso, por uma dívida de IUC, no montante de €582,44, em que é executada "B…………, Ld.ª", pessoa coletiva n.º ……….
B. A oponente invocou a falta de fundamentação da citação e a sua ilegitimidade (por falta do exercício da gerência de facto), no mais, a oponente alegou na petição inicial que a notificação para o exercício do direito de audição prévia à reversão não estava devidamente fundamentada, conforme artigos 31 a 34 da PI (não imputando qualquer vício ao despacho de projecto de reversão referido na sentença).
C. O meritíssimo Juiz do douto tribunal a quo, conforme facto dado como provado em C), considerou que o despacho do projeto de reversão e a notificação da oponente para o exercício do direito de audição não foram legalmente realizados de forma fundamentada e decidiu a presente oposição procedente.
D. Na sentença douta recorrida entendeu-se que "... ainda que o despacho do projeto de reversão existente no processo de execução fiscal estivesse integral e legalmente fundamentado, ao invés do que sucede com o despacho do projeto de reversão que consta da notificação para o exercício do direito de audição, o que vale é o despacho constante da notificação para o exercício do direito de audição, porque é esse o despacho que é transmitido à oponente e que chega ao seu conhecimento.(...)"
E. e nesta medida, a final considerou-se ilegal o despacho do projeto de reversão, por vício de forma, atenta a falta de fundamentação dessa decisão.
F. Ora, com o assim decidido, e salvo o devido respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se, porquanto, considera que o douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, consubstanciado na errada interpretação e aplicação da lei, e vai contra a jurisprudência pacífica e reiterada firmada pelos Tribunais Superiores.
G. A procedência da acção, derivada de supostas deficiências de fundamentação da notificação por falta de prova da FP, em detrimento da análise em concreto da suficiência da fundamentação do acto (da referida decisão) além de incorrer numa clara violação do Princípio do Inquisitório que vigora no processo tributário em oposição ao acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo do Norte no processo 02411/09.7BEPRT, de 17/12/2015,
H. encontra-se em oposição mutatis mutandis com o decidido nos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo (por todos) nos processos 0872/11, de 15/02/2012 e 0724/11, de 18/01/2012, publicados em www.dgsi.pt.
I. Da boa jurisprudência citada, retira-se em súmula, no que mais importa para efeitos do presente recurso, que "A falta de fundamentação não se confunde com a falta de comunicação dos fundamentos: enquanto aquela constitui um vício susceptível de determinar a anulação do ato que dela padeça, o ou cumprimento defeituoso do dever de comunicação dos fundamentos não se podem reflectir na validade do ato comunicando".
J. Ao ter considerado o contrário, incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento de direito, devendo a sentença ser revogada e ordenada a baixa do processo à 1.ª instância, a fim de aí serem apreciados os demais fundamentos da oposição à execução fiscal
Termos em que, e nos melhores de direito aplicáveis, deve ser dado provimento ao presente recurso, com o que se fará inteira JUSTIÇA.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se concluindo, "(...) norteando-nos pelo doutamente decidido nos acórdãos citados nos autos como fundamento, emite-se parecer no sentido do provimento do recurso, devendo revogar-se a douta decisão recorrida e ordenar-se a baixa dos autos à 1ª instância para a instrução que se mostre pertinente no sentido de colmatar as questões levantadas no que toca ao conhecimento do critério que esteve na base da decisão do acto de reversão".

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na decisão recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) O Serviço de Finanças de Santo Tirso instaurou, contra a executada originária, o processo de execução fiscal n.º 1880201401040162, para execução duma dívida de IUC de 2010, no montante de €582,44.
B) O processo de execução fiscal foi revertido contra a oponente pelo despacho de reversão ínsito na nota de citação, que tem o seguinte teor:


C) O despacho do projeto de reversão e a notificação da oponente para o exercício do direito de audição não foram legalmente realizados de forma fundamentada.
Nada mais se deu como provado.

Recorre a Autoridade Tributária e Aduaneira da sentença proferida pelo TAF de Penafiel, ao abrigo do disposto no artigo 280º, n.º 5 do CPPT -a existência de alçadas não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior- invocando a oposição do ali decidido com dois acórdãos deste Supremo Tribunal e um outro do TCA norte que identifica por referência ao número do processo em que foram proferidos e respectiva data.
Na sentença recorrida julgou-se procedente a oposição, se bem se percebe, com o seguinte fundamento, em síntese: No caso dos autos o despacho do projeto de reversão e o despacho que consta da notificação realizada à oponente para o exercício do direito de audição não estão cabalmente fundamentados, porquanto, como se disse, a oponente invocou a sua falta de fundamentação e a Fazenda Pública não alegou, nem demonstrou, que o despacho do projeto de reversão existente do processo e/ou o que consta da notificação para o exercício do direito de audição estavam cabalmente fundamentados, razão pela qual foi julgada provada a matéria de facto da alínea C), pelos motivos invocados na motivação da matéria de facto, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Acresce que a liquidação também não consta da nota de citação e a Fazenda Pública não comprovou que a demonstração da liquidação constava da citação, nem que foi remetida e efetivamente notificada à oponente, o que obsta a que a oponente conheça a liquidação da dívida exequenda.
Em síntese, a Fazenda Pública não alegou, nem demonstrou, a regularidade e legalidade do projeto de despacho de reversão e da sua notificação à oponente, bem como da regularidade e da legalidade da notificação da oponente para o exercício do direito de audição.
Resulta, assim, que foi julgada procedente a presente oposição porque a Fazenda Pública não alegou, nem demonstrou, que o despacho do projeto de reversão existente do processo e/ou o que consta da notificação para o exercício do direito de audição estavam cabalmente fundamentados.

Como resulta do probatório destes autos o Sr. Juiz incluiu aí uma alínea com o seguinte teor, que foi determinante para a solução jurídica encontrada para o litígio: C) O despacho do projeto de reversão e a notificação da oponente para o exercício do direito de audição não foram legalmente realizados de forma fundamentada.
Lido atentamente o teor desta alínea do probatório surpreende-se com alguma facilidade que aí não foi incluído qualquer facto da vida real, como deveria, antes se trata de uma conclusão fáctico-jurídica que deveria constar da fundamentação da decisão recorrida e não do rol dos factos provados.
Tal como bem explica o legislador no artigo 123° do CPPT, na sentença o juiz identificará os factos objecto do litígio e discriminará a matéria provada da não provada e seguidamente apreciará as questões colocadas pelas partes, cfr. artigo 124°. Ou seja, primeiro identificará de forma isolada quais os factos que se devem considerar provados e não provados e só posteriormente apreciará juridicamente as diversas questões colocadas pelas partes dando-lhes a solução que entender mais conveniente.
Não é legalmente admissível que no segmento da sentença destinado à enumeração dos factos provados ou não provados o juiz emita juízos de valor, isto é, apreciações conclusivas de direito e/ou de facto.
Na verdade, ao ter levado ao probatório uma alínea com tal teor, o Sr. Juiz impede este Supremo Tribunal, desde logo, de emitir uma pronúncia segura quanto ao mérito do presente recurso.
Impõe-se, assim, a anulação da decisão recorrida e o regresso dos autos à instância para que se leve ao probatório a matéria de facto necessária à solução das questões colocadas pelas partes, expurgada de quaisquer conclusões de facto ou de direito de modo a que este Supremo Tribunal possa aquilatar do mérito do recurso.

Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos ao tribunal a quo para que seja instruída a causa com os fundamentos de facto necessários à decisão das questões colocadas pelas partes.
Sem custas.
D.n.

Lisboa, 5 de Junho de 2019. – Aragão Seia (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva.