Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:020/17
Data do Acordão:05/10/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO
EXECUÇÃO
APENSAÇÃO
Sumário:A apensação de diversas execuções que corram contra o mesmo executado, nos termos do disposto no artigo 179º do CPPT, deve ser conhecida pelo órgão de execução fiscal oficiosamente, ou logo que tal questão seja suscitada pelo executado no processo de execução fiscal ou num dos seus apensos.
Nº Convencional:JSTA000P21818
Nº do Documento:SA220170510020
Data de Entrada:01/10/2017
Recorrente:A................,LDA.
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório-
1 – A………….., Lda, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 11 de Outubro de 2016, que rejeitou liminarmente a oposição por si deduzida a 12 (doze) execuções fiscais não apensadas que lhe foram instauradas pelo Serviço de Finanças de Penacova para cobrança coerciva de coimas e custas de processos de contra - ordenação relativos a taxas de portagem, apresentando para tal as seguintes conclusões:

1. O Tribunal “a quo” violou a regra da competência por conexão subjectiva resultante do disposto no art.º 25º do CPP.

2. Seja na fase administrativa, o que incumbe ao órgão da administração determinar, seja na fase judicial, o que incumbe ao juiz competente, o que, desde logo, é imposto pelo disposto no n.º 2 do art.º 24.º, a conexão só opera relativamente aos processos que se encontrarem simultaneamente na fase de inquérito, de instrução ou de julgamento. Portanto, encontrando-se o juiz, a quem compete o julgamento da impugnação da decisão administrativa que aplicou a sanção, perante uma multiplicidade de processos, em que o infractor é o mesmo, que lhe foram distribuídos a si, ou a outros juízes do mesmo Tribunal, deve averiguar da possibilidade de ordenar a apensação de todos os processos àquele que for o determinante da competência por conexão, de modo a que realize im só julgamento.

3. Sendo certo que, o facto de não se ter ordenado a apensação de todos os processos na fase administrativa, face ao preceituado no art. 24.º n.º 2, não impede que seja ordenada essa mesma apensação na fase judicial, cfr. art.º 29.º n.º 2, no despacho liminar ou em qualquer momento, antes de ser designada data para o julgamento ou antes da prolação da decisão por mero despacho.

4. Assim, incumbe ao juiz a quem compete o julgamento das decisões administrativas, apreciar da aplicabilidade do disposto no art. 25.º do CPP, configurando-se, assim, o reconhecimento da conexão de processos e a determinação da apensação dos mesmos como um dever e não como uma faculdade que é concedida ao juiz, tudo em vista da melhor realização da justiça e da economia de meios.

5. Ainda que se entenda que o Tribunal não pode oficiosamente determinar a apensação dos processos, por tal acto ser da competência própria da Autoridade administrativa, deveria o Tribunal ter devolvido à Autoridade Administrativa respectiva os processos de contra - ordenação para que se procedesse ao cúmulo material das coimas aplicadas à recorrente/arguida, nos termos do artº 25º do RGIT.

6. Acresce que a posição defendida na sentença recorrida, no sentido de que a recorrente deveria ter deduzido oposições autónomas contra as execuções, constitui uma manifesta violação doa princípios da adequação e proporcionalidade.

Nestes termos, e sobretudo naqueles que V. Exas, doutamente suprirão,

Deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que ordene a requerida apensação dos processos, seguindo-se os ulteriores termos,

Com o que V. Exas. farão seguramente JUSTIÇA.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto emitiu o douto parecer de fls. 54/55 dos autos, concluindo no sentido de que o recurso não merece provimento.

Notificadas as partes do parecer do Ministério Público (fls. 59/61 dos autos) nada vieram dizer.


Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação -
5 – Questão a decidir
É a de saber se bem andou a decisão recorrida ao indeferir liminarmente a petição de oposição deduzida contra 12 (doze) execuções fiscais não apensadas, identificadas no intróito da petição inicial de oposição e na qual se requeria, no final, a apensação de todos os processos executivos supra identificados

6– Apreciando.
6.1 Do indeferimento liminar da petição de oposição
A decisão recorrida, a fls. 25 a 28 dos autos, rejeitou liminarmente a oposição deduzida pela ora recorrente a 12 (doze) execuções fiscais contra si instauradas pelo Serviço de Finanças de Penacova para cobrança coerciva de coimas e custas de processos de contra - ordenação relativos a taxas de portagem, pelo facto de ter sido deduzida uma única oposição a execuções fiscais que não se encontram apensadas o que se configuraria como uma situação excepção dilatória de ilegal cumulação de oposições.
Fundamentou-se o decidido no Acórdão deste STA e 5 de Dezembro de 2007, rec. n.º 795/07.
Discorda do decidido a recorrente, nos termos supra transcritos, pedindo que seja ordenada a requerida apensação dos processos.
Vejamos.
A decisão recorrida sufraga jurisprudência deste STA, no sentido de que não é admissível a dedução de uma única oposição a diversas execuções fiscais que não se encontrem apensadas, e que tal constitui uma excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito.
Foi, contudo, recentemente sufragada posição algo diversa por esta Secção – cfr. acórdãos prolatados em 11-01-2017, no recurso nº 054/16, e em 22-03-2017, no recurso nº 0895/16 – e que também aqui acolheremos, convictos da bondade da respectiva argumentação jurídica e que, por isso, se passa a reproduzir.

Assim, escreveu-se no acórdão de 11-01-2017, no recurso n.º 054/16:

«É sabido que a apensação dos processos de execução fiscal, nos termos do disposto no artigo 179º do CPPT, deve seguir uma lógica economicista, isto é, devem ser apenas praticados os atos estritamente necessários para o bom andamento dos processos, devendo, por isso, reunir-se num único todos os processos em que seja previsível que sejam praticados no mesmo espaço temporal os mesmos atos processuais relativamente ao mesmo sujeito, e por outro, uma lógica de eficácia do julgamento, se é previsível que o mesmo sujeito discuta a “legalidade” da própria execução, cfr. artigo 204º do mesmo CPPT, invocando razões que, inerentes a si próprio se estendem e são idênticas nas diversas execuções e sua tramitação, o “bom” julgamento só se obterá se for uno e abranger as diversas execuções, cfr. acórdão datado de 30.11.2016, recurso n.º 01233/16.

Tendo em conta estas razões que impõem a apensação, naturalmente que se trata de um ato a praticar no(s) processo(s) de execução fiscal ex officio pelo órgão de execução fiscal, ou seja, deve ser praticado independentemente de o interessado particular formular um pedido expresso nesse sentido (ou de existir uma ordem expressa nesse sentido por parte do juiz), e terá que existir uma pronúncia sobre tal questão sempre que a mesma seja suscitada no processo, de forma direta ou indireta, o que é imposto pelo disposto no n.º 1 do artigo 179º do CPPT - correndo contra o mesmo executado várias execuções, nos termos deste Código, serão apensadas, oficiosamente ou a requerimento dele, quando se encontrarem na mesma fase.

Permitir-se que o órgão de execução fiscal omita por completo a pronúncia sobre a questão da apensação de execuções fiscais, depois de suscitada pelo interessado directo na mesma, constituiria uma violação grosseira dos princípios da legalidade e da igualdade que enformam todo o direito fiscal, quer substantivo, quer processual, uma vez que a sua intervenção está sempre condicionada por tais princípios, o que afasta, desde logo, qualquer tipo de discricionariedade de actuação, que poderia, em última instância, ser o fundamento para a omissão de tal pronúncia.

Tratando-se, como se trata, o processo de execução fiscal de um processo judicial, cfr. artigos 103º da LGT, 151º e 276º do CPPT, as questões aí colocadas, direta ou indiretamente, devem ser decididas pelo juiz ou pelo órgão de execução fiscal, com possibilidade de o juiz sindicar tal apreciação, não se formando, em qualquer circunstância, um deferimento ou indeferimento tácito a exemplo do que se passa no procedimento administrativo/tributário; ou seja, no âmbito do processo judicial o silêncio do titular do processo, por si ou por intermédio do coadjuvante, não tem valor de ato, não tem valor jurídico, antes constituindo uma falta ou omissão que deve ser suprida logo que seja detetada, tanto mais que a pronúncia expressa sobre as questões suscitadas no processo ou conhecidas oficiosamente adquirem o valor de caso julgado, nos termos do disposto nos artigos 619º e ss. do CPC.

Não se quer com isto dizer que todas as questões de conhecimento oficioso devam ser oficiosamente apreciadas de forma expressa mesmo que se entenda não se verificarem, na verdade apenas devem ser conhecidas por iniciativa do titular do processo quando o mesmo entenda que se verifiquem, porém, logo que suscitadas pela parte, ainda que o titular do processo já tenha interiorizado a sua não verificação, devem ser conhecidas sem mais demora, sob pena de omissão ilegal de um ato processual devido, cfr. artigo 13º do CPPT.

E isto é assim, quer a questão seja suscitada no processo principal, processo de execução fiscal, quer seja suscitada na oposição à execução fiscal que corre por dependência daquela, cfr. artigos 207º e 208º do CPPT; independentemente do processo onde seja suscitada a questão, a mesma é de conhecimento obrigatório uma vez que tem influência direta e imediata na tramitação de ambos os processos.

De todos os modos, a questão da apensação das execuções fiscais, nos termos do disposto no artigo 179º do CPPT, apenas se coloca para o órgão de execução fiscal a partir do momento em que as execuções são instauradas e para o interessado a partir do momento em que é citado para as execuções.

E, portanto, este apenas pode requerer ou introduzir nos autos a questão da apensação de várias execuções após a sua citação, e deve fazê-lo no momento em que deduz a oposição à execução fiscal, uma vez que é nesse momento que tem a primeira intervenção processual, cfr. acórdão proferido no recurso n.º 01233/16, e quanto a si todas as execuções estarão na mesma fase processual.”

Na concreta situação dos autos, a exemplo da situação verificada no acórdão acima referido, os executados/oponentes requereram a apensação dos diversos processos de execução fiscal na petição de oposição, ou seja, na primeira intervenção processual legalmente prevista que ocorre após a citação, que dirigiram e entregaram nos serviços do órgão de execução fiscal.

Sendo certo que o órgão de execução fiscal nada disse a esse respeito (…).

Porém, a Sra. Juíza a quo indeferiu liminarmente a petição de oposição com o fundamento em que as oposições não se encontravam apensas, o que não poderia fazer sem que previamente o órgão de execução fiscal se pronunciasse quanto a tal questão, como se assinalou no acórdão citado. (…)». [nosso sublinhado]


É este julgamento que aqui se reitera.

Ou seja, a presente oposição não pode ser julgada, de mérito ou de forma, até que o órgão de execução fiscal decida a questão da apensação das execuções, o que se lhe impõe por dever de ofício. Razão por que o Mmº Juiz deve solicitar ao órgão de execução fiscal que se pronuncie sobre a requerida apensação, devendo estes autos de oposição aguardar por tal decisão. Só depois de se concluir, com decisão transitada em julgado, que tal apensação não é possível ou viável (o que significa que se houver reclamação de eventual decisão de improcedência haverá que aguardar pelo trânsito em julgado dessa decisão) é que poderá ser decidida a questão suscitada pela Fazenda Pública no tocante à não apensação das execuções. E caso o órgão de execução fiscal não se pronuncie sobre a questão da apensação (por negligência ou por se recusar a fazê-lo), então deverá o próprio Juiz certificar-se da verificação dos requisitos previstos nos nsº 1 e 2 do artigo 179º do CPPT e ordenar o prosseguimento da oposição relativamente a todas as execuções, incumbindo o órgão de execução fiscal de posteriormente adequar a tramitação das diversas execuções entre si.

Termos em que se impõe a revogação da decisão recorrida.


- Decisão -

7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal “a quo”, para que seja solicitado ao órgão de execução fiscal pronúncia sobre a requerida apensação das diversas execuções, fixando-lhe um prazo peremptório para o fazer se ainda não tiver sido proferida tal decisão, seguindo-se, se necessário, a tramitação anteriormente descrita.

Sem custas.

Lisboa, 10 de Maio de 2017. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro Delgado – Dulce Neto.