Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0729/15
Data do Acordão:10/12/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECLAMAÇÃO
Sumário:*
Nº Convencional:JSTA000P20977
Nº do Documento:SA2201610120729
Data de Entrada:06/08/2015
Recorrente:APL - ADMINISTRAÇÃO DO PORTO DE LISBOA, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE LISBOA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo nº: 729/15-30.-reclamação

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

APL-Administração do Porto de Lisboa, SA., apresenta reclamação para a conferência do despacho do relator que indeferiu a reclamação contra a nota discriminativa e justificativa de custas de parte.
Alega, no essencial, que o valor constante de tal nota é absolutamente desproporcionado, violando os princípios da confiança e da justiça, bem como o direito de acesso aos tribunais;
Não ocorre o caso julgado, tal como decidido no despacho reclamado, uma vez que a reforma da condenação em custas pode ocorrer no momento subsequente à elaboração da conta;
O valor de tal nota é exagerado, não se encontrando qualquer fundamentação ou justificação para os mesmos.

Respondeu o Município requerido, pugnando, tal como anteriormente havia feito, pela manutenção do despacho reclamado.

Cumpre decidir.

O teor do despacho reclamado é o seguinte:
APL - Administração do Porto de Lisboa, SA., requer que se indefira a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pelo Município de Lisboa.
Alega que a mesma não se encontra fundamentada nem tem qualquer justificação, cfr. artigos 25° e 26° do RCP, sendo que o valor das custas é desproporcionado, violando os princípios da confiança e da justiça, bem como o direito de acesso aos Tribunais.
Respondeu o Município, excepcionando a intempestividade do pedido formulado pela “APL", bem como o facto de não ter procedido ao depósito do montante respeitante ao montante das custas constantes da nota. No mais, impugnou o alegado.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência das excepções, quer porque o requerimento foi apresentado fora do prazo legalmente previsto, quer porque não se procedeu ao prévio depósito do valor das custas.
Decidindo:
Fixa-se, com interesse, a seguinte matéria de facto:
-Com data de 18.01.2016, o Município de Lisboa, juntou aos autos nota discriminativa e justificativa das custas de parte, cfr. doc. de fls. 665 a 673;
-A “APL" foi notificada de tal “nota" no dia 15.04.2016, cfr. confissão ponto 1 do requerimento apresentado em 29.04.2016;
-Em 29.04.2016 a “APL" apresentou requerimento, via fax, reagindo contra a dita "nota de custas", pedindo que seja a mesma indeferida.
Nada mais há com interesse.
A questão da extemporaneidade.
Dispõe o artigo 33°, n.º 1 da Portaria 419-A/2009, de 17.04 que, a reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes.
Como resulta dos autos, a "nota de custas de parte" de que a “APL" reclama foi-lhe notificada a 15.04 e a reclamação deu entrada no tribunal em 29.04.
Como bem se percebe, aquele prazo de 10 dias previsto naquele artigo 33°, n.º 1, contado nos termos do disposto no artigo 138° do Cód. Proc. Civil [1 - o prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes. 2 - Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1. o dia útil seguinte. 3- (...).
4- (...).], terminaria no dia 25.04, uma vez que na contagem do prazo não se inclui o dia em que ocorreu a notificação, cfr. artigo 279°, alínea b) do Código Civil.
Contudo, sendo aquele dia 25.04 feriado nacional, nos termos do n.º 2 daquele artigo 138° do CPC, o último dia do prazo transferiu-se para o dia 26.04.
Mas como se trata de um prazo processual fixado pela lei, pode ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, nos termos do disposto no artigo 139°, n.º 5 do CPC, o que, no caso implica que a “APL" pudesse praticar o acto até 29.04, como efectivamente praticou.
Assim, temos que concluir que a presente reclamação não é extemporânea.
Alegam ainda o Município de Lisboa e o Ministério Público que se impõe a rejeição da presente reclamação por não ter sido feito o depósito prévio da totalidade do valor da nota de custas de parte, nos termos do disposto no artigo 33°, n.º 2 da anteriormente referida Portaria.
Na verdade esta norma foi julgada inconstitucional na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março (redacção em vigor), de acordo com a qual a reclamação da nota justificativa fica dependente do depósito prévio da totalidade do valor da nota, cfr. acórdão do TC, n.º 189/2016, datado de 03.05, pelo que, não deverá ser atendida para efeitos da presente reclamação, improcedendo, assim, a questão suscitada.
Quanto à reclamação.
Começando pela questão da desproporção do valor das custas.
Como já anteriormente se decidiu neste Supremo Tribunal, ocorrendo a condenação em custas na sentença que põe fim à causa é contra essa condenação que as partes devem reagir caso discordem da condenação em custas, quer quanto ao sujeito, quer quanto ao concreto montante, cfr. por todos o acórdão datado de 29.10.2014, recurso n.º 0547/14.
Posteriormente ao trânsito em julgado de tal decisão, já não é mais possível discutir tal questão, a não ser que se trate de erros materiais ou de escrita que resultem de forma evidente de simples leitura da decisão.
E não sendo esta a razão de ser da reclamação apresentada pela "APL", " ... o julgamento que se fez quanto a custas nos presentes autos, que já transitou em julgado em devido tempo, impede tal modificação, mesmo que se entenda que foram desrespeitados os princípios e parâmetros constitucionais invocados pelos recorrentes, precisamente, por razões de segurança e estabilidade inerentes à própria decisão judicial. .. ", cfr. acórdão anteriormente citado.
Improcede, assim, nesta medida a questão colocada pela "APL".
Por último, quanto à falta de fundamento ou justificação dos montantes inscritos na nota de custas de parte, há apenas que dizer que tais montantes, tal como consta dos documentos de fls. 666 e ss. correspondem exactamente àquilo que o Município depositou a favor do Tribunal e do processo para poder praticar os actos processuais em juízo, bem como corresponde àquilo que lhe foi solicitado.
Assim, não poderia haver qualquer outra justificação para que pudesse peticionar os montantes que peticiona, além dos talões de depósito que se encontram juntos aos autos.
Improcede, assim, na totalidade a reclamação que nos vinha dirigida. Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada pela "APL".

Vem a reclamante insistir na sua argumentação no sentido de os valores da nota de custas de parte serem exagerados e desproporcionados, violando os princípios da confiança e da justiça, bem como o direito de acesso aos Tribunais.
Da leitura atenta que se faz de tal nota de custas de parte, os únicos valores que aí são peticionados são os correspondentes às taxas de justiça pagas e depositadas pelo reclamado Município de Lisboa, nenhuns outros são peticionados.
Ora, como já anteriormente foi dito, tais valores, que correspondem às custas pagas, resultaram da condenação em custas operada nas decisões proferidas nestes autos, e não tendo sido assacado qualquer vício ou irregularidade a essas condenações no momento próprio, ou por via do recurso, ou por via da reclamação ou reforma, ficou esgotado o poder jurisdicional dos tribunais quanto a essa mesma questão, não podendo, agora este Supremo Tribunal, a propósito da impugnação da nota de custas de parte, reapreciar a legalidade de tais condenações em custas - …com tais condenações, ficou esgotado o poder jurisdicional dos juízes quanto à matéria da causa podendo, todavia, a Recorrente ter pedido a reforma de qualquer uma das decisões quanto à condenação em custas (artigo 616.º, n.º 1 do CPC). Não o tendo feito até ao trânsito em julgado do acórdão, é extemporânea a pretensão de alterar a condenação em custas após esse momento, designadamente após a notificação da conta, já que a mesma deve ser – como foi – elaborada de acordo com as condenações e estas já não podem ser alteradas (v. Acórdão n.º 60/2016), como vem salientando jurisprudência uniforme deste Tribunal (v., entre muitos outros, os Acórdãos n.ºs 83/2013, 104/2013, 211/2013, 622/2014, 60/2016 e 237/2016), cfr. Ac. do TC, 355/2016, de 07/06/2016.
Portanto, está, assim, vedado a este Supremo Tribunal o conhecimento das questões de legalidade constitucional agora suscitadas.

Quanto à falta de fundamentação dos valores peticionados, mais não resta do que reiterar o que anteriormente se disse.
Encontrando os mesmos uma correspondência directa e imediata nos talões de depósito juntos aos autos, depósitos esses que foram feitos em conta bancária do IGFEJ e por referência a esta acção, no limite o que poderia ocorrer era um depósito além do estritamente necessário, o que levaria a uma devolução dos valores pagos, não havendo por isso qualquer prejuízo da ora reclamante.
Na verdade, cabendo ao Município reclamado o direito ao reembolso de todas as quantias pagas, nos termos do disposto nos artigos 26º, n.ºs. 1, 2 e 3, al. a), 25º, n.ºs. 1 e 2, 15º, n.ºs. 2 e 6, todos do RCP, posto que a reclamante foi condenada na totalidade das custas, mais não lhe restava do que peticionar tais quantias nos precisos termos em que o fez.

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo decidem, em conferência, indeferir a reclamação apresentada pela “APL”.
Custas pela Recorrente, fixando-se a t.j. em 3 Ucs.
D.n.

Lisboa, 12 de Outubro de 2016. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.