Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0539/05.1BECBR
Data do Acordão:11/24/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P28564
Nº do Documento:SA2202111240539/05
Data de Entrada:07/07/2021
Recorrente:A............ E B............
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A………… e B……….., co-devedores solidários e subsidiários revertidos, impugnantes nos presentes autos, notificados do acórdão que lhes negou provimento ao recurso interposto, vêm nos termos do art.º 150º do CPTA, apresentar RECURSO DE REVISTA.

Alegaram, tendo apresentado as seguintes conclusões:
i) Mostram-se reunidos os requisitos de admissibilidade da presente revista, pois que nos termos do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 17-03-2011, cujos fundamentos os recorrentes fazem como seus, “o responsável subsidiário pode formular pedido de revisão da matéria colectável apurada através de métodos indirectos na sequência da sua citação no processo executivo, data a partir da qual se deve contar o prazo de trinta dias previsto para o efeito no n.º 1 do artigo 91.º da LGT”, tratando-se do melhor sentido normativo dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT que respeita a teleologia e axiologia da concepção e estruturas normativas reconhecidas, no nosso sistema jurídico: ao direito de impugnação judicial (cfr. art.ºs 268.º, n.º 4, e 20.º, n.ºs 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa, 95.º da LGT, 99º do CPPT e 91.º da LGT), ao direito de participação dos interessados na participação das decisões administrativas que lhes dizem respeito (art.º 267.º, n.º 5 da CRP), ao direito a um processo equitativo (o qual postula a possibilidade de defesa no seu mais amplo sentido material e não apenas formal) (art.º 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP), ao direito a uma tutela efectiva e eficaz dos direitos dos interessados e ao princípio material da justiça ínsito no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da nossa CRP, sendo que tais direitos saem completamente frustrados na interpretação do acórdão recorrido, o que justifica a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema, assente que se trata de uma questão de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum e de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos.
ii) Trata-se do melhor sentido normativo dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT que respeita a teleologia e axiologia da concepção e estruturas normativas reconhecidas, no nosso sistema jurídico: ao direito de impugnação judicial (cfr. art.ºs 268.º, n.º 4, e 20.º, n.ºs 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa, 95.º da LGT, 99.º do CPPT e 91.º da LGT), ao direito de participação dos interessados na participação das decisões administrativas que lhes dizem respeito (art.º 267.º, n.º 5 da CRP), ao direito a um processo equitativo (o qual postula a possibilidade de defesa no seu mais amplo sentido material e não apenas formal) (art.º 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP), ao direito a uma tutela efectiva e eficaz dos direitos dos interessados e ao princípio material da justiça ínsito no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da nossa CRP.
iii) O acórdão recorrido entendeu que a falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, efectuado pelo recorrente A………… ao abrigo do disposto no art.º 91.º, n.º 1 da LGT e cuja matéria deu como provada no n.º 14 do probatório, não constituía uma ilegalidade susceptível de inquinar a legalidade do acto de liquidação: em virtude de dever ser antes configurada como uma ineficácia do acto de liquidação revertido contra o peticionante A………… que nessa medida os não poderia impugnar (a impugnação apenas será possível em relação actos de liquidação eficazes); em virtude do pedido apresentado pelo ora recorrente A………… não poder aproveitar ao co-impugnante B………… que não formulou igual pedido; e em virtude de não poder ser aplicada agora a jurisprudência afirmada no Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.03.2011, que se pronunciou pela admissibilidade desse pedido de revisão da matéria tributável por parte do responsável subsidiário quando citado como tal no processo executivo, por a jurisprudência anterior ser “no sentido diametralmente oposto”, “sob pena de violação dos mais elementares princípios de justiça, boa-fé e tutela jurisdicional efectiva”.
iv) Este entendimento da sentença recorrida viola frontalmente os princípios consagrados nos art.ºs 11.º e 12.º da Lei Geral Tributária (LGT) e nos art.ºs 5.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º do Código Civil, subsidiariamente aplicáveis em matéria tributável nos termos do art.º 2.º alínea d) da LGT, apenas encontrando justificação numa óptica administrativa de optimização da arrecadação de receitas fiscais.
v) A não aplicação da interpretação dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT, afirmada no referido Acórdão do Pleno sob pretexto de que a jurisprudência anterior era em sentido oposto vai contra os princípios decorrentes de tais preceitos segundo os quais, ao interpretar a lei, o tribunal apenas está a determinar o sentido do preceito desde o início da sua vigência e que o deve aplicar a todos os casos ainda não julgados, como é postulado pelo princípio da igualdade na aplicação da lei.
vi) A regra constante do art.º 8.º, n.º 3, do Código Civil não opera diacronicamente, abrangendo apenas os casos ainda não julgados e respeita os casos já julgados e transitados em julgado, por mor do princípio da segurança jurídica imanente no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da CRP.
vii) As decisões dos tribunais em matéria interpretativa não têm natureza constitutivo-legislativa pelo que a sua aplicação não está dependente do tempo em que ocorreram os factos a que se aplica, antes se devendo aplicar a todos os casos ainda não julgados.
viii) Conquanto não sendo acórdão de fixação de jurisprudência, o referido Acórdão do Pleno deve ser acolhido pelos tribunais de hierarquia, por mor do princípio inserto no n.º 3 do art.º 8.º do Código Civil e do facto de constituir a última palavra actual dos tribunais administrativo-tributários sobre a interpretação da lei.
ix) Ao contrário do entendido no acórdão, o pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos apresentado pelo recorrente A………… aproveita ao codevedor B…………, em virtude de a sua responsabilidade ser solidária e de o devedor solidário pode alegar todos os meios de defesa próprios e os meios de defesa comuns, violando a decisão os art.ºs ºs 21.º, 22.º e 24.º da LGT e os art.ºs 513.º, 514.º e 524.º do C. Civil.
x) Ao contrário do entendido no acórdão recorrido, a preterição administrativa do trâmite procedimental de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos, previsto no art.º 91.º da LGT, não desemboca numa ineficácia do acto de liquidação, seja em relação ao devedor originário, seja em relação ao devedor subsidiário, mas numa ilegalidade inquinadora da legalidade e validade (anulabilidade) do acto de liquidação, porquanto o acto de liquidação praticado está enformado de eficácia jurídica e tanto assim que é título formal da exigência do seu pagamento voluntário e coercivo, e justifica a prática de actos ofensivos contra esses devedores e só pode ser invocada em processo de impugnação judicial, por mor do disposto no art.º 204.º, n.º 1, al. h) do CPPT.
xi) A preterição desse trâmite administrativo da falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos, previsto no art.º 91.º da LGT, constitui uma ilegalidade em acto interlocutório do procedimento administrativo-tributário susceptível de ser impugnada com a decisão final do procedimento, ao abrigo do disposto nos art.ºs 54.º (princípio da impugnação unitária) e 99.º, alínea d), do CPPT.
xii) O conceito de “preterição de outras formalidades legais” constante deste art.º 99.º, alínea d) do CPPT, abrange a realidade que vem de ser analisada, porquanto a mesma constitui um trâmite procedimental do processo administrativo-tributário que antecede a prolação do acto tributário.
xiii) Em caso de procedência da impugnação com base em tal vício, o que ocorre é a anulação, no momento da decisão judicial, do acto de liquidação eficaz até esse momento, e a obrigatoriedade por banda da administração de dar andamento ao pedido de revisão da matéria tributável, podendo chegar-se a final a uma solução de prática de acto de liquidação novo de conteúdo idêntico ou de conteúdo diferente ou até pela não prática do acto de liquidação.
xiv) O responsável subsidiário que formulou pedido de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos pode deduzir impugnação judicial antes de a administração indeferir esse pedido de revisão, como aconteceu neste caso em que o Director de Finanças de Coimbra proferiu esse despacho quando já estava pendente o processo de impugnação judicial, desde que tenha decorrido já o prazo de quinze dias estabelecido no art.º 91.º, n.º 2 da LGT e tenha sido proferido um acto de liquidação eficaz, pois este prazo não é um mero prazo ordenador da actividade interna da administração, mas sim um prazo com eficácia externa na medida em que sujeita o contribuinte a estar apetrechado dos meios de defesa e disponível para a reunião dentro desse prazo e não está prevista legalmente a prolação de qualquer decisão interlocutória administrativa sobre a admissibilidade do pedido de revisão quando o mesmo é tempestivo e é exercido nos termos previstos na lei.
xv) A impugnação judicial deduzida antes da prolação de uma decisão administrativa que não admite o pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos efectuado pelo responsável subsidiário não é extemporânea, sendo a hipotética apresentação antes do tempo, desde que tenha sido praticado o acto de liquidação, sanada com a prolação da decisão de indeferimento do pedido, sob pena de abuso de direito da administração (art.º 334.º do CC) e dos princípios constitucionais do acesso aos tribunais, da exigência de um processo equitativo e da consagração de processo que contemple a concessão de uma tutela eficaz e efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos do contribuinte, consagrado no art.º 20.º da CRP.
Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser recebido e a final ser proferido douto acórdão que julgue a impugnação procedente na parte recorrida, com as legais consequências.

Não foram produzidas contra-alegações.

Cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

Dá-se aqui por reproduzida a matéria de facto levada ao probatório do acórdão recorrido.

O presente recurso foi interposto como recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 150º do CPTA, sendo certo que no momento em que foi interposto já se encontrava em vigor o disposto no artigo 285º do CPPT, em tudo idêntico, pelo que, há, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do CPPT.
Dispõe o artigo 285.º do CPPT, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 - Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
4- O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5- Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.
6- A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Tributário.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

Vejamos, pois.
Como claramente resulta do disposto no artigo 285º, n.º 3 do CPPT, neste recurso de revista, apenas é permitido ao Supremo Tribunal Administrativo aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, não devendo o recurso servir para conhecer, em exclusivo, de nulidades da decisão recorrida ou de questões novas anteriormente não apreciadas pelas instâncias.
Os recorrentes colocam no presente recurso diversas questões que entendem ter sido decididas de forma contrária a jurisprudência anterior deste Supremo Tribunal, pelo que pugnam pela admissão do respectivo recurso.
No essencial os recorrentes discordam do acórdão recorrido pelas razões que elencam na conclusão iii), a saber:
-a falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, efectuado pelo recorrente A………… ao abrigo do disposto no art.º 91.º, n.º 1 da LGT e cuja matéria deu como provada no n.º 14 do probatório, não constituía uma ilegalidade susceptível de inquinar a legalidade do acto de liquidação:
1-em virtude de dever ser antes configurada como uma ineficácia do acto de liquidação revertido contra o peticionante A………… que nessa medida os não poderia impugnar (a impugnação apenas será possível em relação actos de liquidação eficazes);
2-em virtude do pedido apresentado pelo ora recorrente A………… não poder aproveitar ao co-impugnante B………… que não formulou igual pedido;
3-e em virtude de não poder ser aplicada agora a jurisprudência afirmada no Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.03.2011, que se pronunciou pela admissibilidade desse pedido de revisão da matéria tributável por parte do responsável subsidiário quando citado como tal no processo executivo, por a jurisprudência anterior ser “no sentido diametralmente oposto”, “sob pena de violação dos mais elementares princípios de justiça, boa-fé e tutela jurisdicional efectiva”.
Estas questões foram já apreciadas em outros acórdãos proferidos por este STA, nomeadamente, proc. n.º 01163/15, acórdão de 24-02-2016, proc. n.º 0732/14, acórdão de 13-07-2015 e proc. nº. 0876/09, acórdão de 17-03-2011.
Tratando-se de questões que já vinham suscitadas na petição inicial da impugnação e face à argumentação expendida para a não procedência das mesmas pelas instâncias, afigura-se-nos que se impõe a admissão do presente recurso de revista para que este Supremo Tribunal possa reapreciar as mesmas, aferindo da bondade do decidido, uma vez que contendem com o exercício dos direitos de defesa dos recorrentes.

Termos em que, face ao exposto, acorda-se em admitir o presente recurso de revista.
Custas a final.
D.n.
Lisboa, 24 de Novembro de 2021. – Aragão Seia (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes.Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A………… e B……….., co-devedores solidários e subsidiários revertidos, impugnantes nos presentes autos, notificados do acórdão que lhes negou provimento ao recurso interposto, vêm nos termos do art.º 150º do CPTA, apresentar RECURSO DE REVISTA.

Alegaram, tendo apresentado as seguintes conclusões:
i) Mostram-se reunidos os requisitos de admissibilidade da presente revista, pois que nos termos do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 17-03-2011, cujos fundamentos os recorrentes fazem como seus, “o responsável subsidiário pode formular pedido de revisão da matéria colectável apurada através de métodos indirectos na sequência da sua citação no processo executivo, data a partir da qual se deve contar o prazo de trinta dias previsto para o efeito no n.º 1 do artigo 91.º da LGT”, tratando-se do melhor sentido normativo dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT que respeita a teleologia e axiologia da concepção e estruturas normativas reconhecidas, no nosso sistema jurídico: ao direito de impugnação judicial (cfr. art.ºs 268.º, n.º 4, e 20.º, n.ºs 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa, 95.º da LGT, 99º do CPPT e 91.º da LGT), ao direito de participação dos interessados na participação das decisões administrativas que lhes dizem respeito (art.º 267.º, n.º 5 da CRP), ao direito a um processo equitativo (o qual postula a possibilidade de defesa no seu mais amplo sentido material e não apenas formal) (art.º 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP), ao direito a uma tutela efectiva e eficaz dos direitos dos interessados e ao princípio material da justiça ínsito no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da nossa CRP, sendo que tais direitos saem completamente frustrados na interpretação do acórdão recorrido, o que justifica a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema, assente que se trata de uma questão de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum e de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos.
ii) Trata-se do melhor sentido normativo dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT que respeita a teleologia e axiologia da concepção e estruturas normativas reconhecidas, no nosso sistema jurídico: ao direito de impugnação judicial (cfr. art.ºs 268.º, n.º 4, e 20.º, n.ºs 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa, 95.º da LGT, 99.º do CPPT e 91.º da LGT), ao direito de participação dos interessados na participação das decisões administrativas que lhes dizem respeito (art.º 267.º, n.º 5 da CRP), ao direito a um processo equitativo (o qual postula a possibilidade de defesa no seu mais amplo sentido material e não apenas formal) (art.º 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP), ao direito a uma tutela efectiva e eficaz dos direitos dos interessados e ao princípio material da justiça ínsito no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da nossa CRP.
iii) O acórdão recorrido entendeu que a falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, efectuado pelo recorrente A………… ao abrigo do disposto no art.º 91.º, n.º 1 da LGT e cuja matéria deu como provada no n.º 14 do probatório, não constituía uma ilegalidade susceptível de inquinar a legalidade do acto de liquidação: em virtude de dever ser antes configurada como uma ineficácia do acto de liquidação revertido contra o peticionante A………… que nessa medida os não poderia impugnar (a impugnação apenas será possível em relação actos de liquidação eficazes); em virtude do pedido apresentado pelo ora recorrente A………… não poder aproveitar ao co-impugnante B………… que não formulou igual pedido; e em virtude de não poder ser aplicada agora a jurisprudência afirmada no Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.03.2011, que se pronunciou pela admissibilidade desse pedido de revisão da matéria tributável por parte do responsável subsidiário quando citado como tal no processo executivo, por a jurisprudência anterior ser “no sentido diametralmente oposto”, “sob pena de violação dos mais elementares princípios de justiça, boa-fé e tutela jurisdicional efectiva”.
iv) Este entendimento da sentença recorrida viola frontalmente os princípios consagrados nos art.ºs 11.º e 12.º da Lei Geral Tributária (LGT) e nos art.ºs 5.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º do Código Civil, subsidiariamente aplicáveis em matéria tributável nos termos do art.º 2.º alínea d) da LGT, apenas encontrando justificação numa óptica administrativa de optimização da arrecadação de receitas fiscais.
v) A não aplicação da interpretação dos art.ºs 22.º, n.º 4, e 91.º, n.º 1, da LGT, afirmada no referido Acórdão do Pleno sob pretexto de que a jurisprudência anterior era em sentido oposto vai contra os princípios decorrentes de tais preceitos segundo os quais, ao interpretar a lei, o tribunal apenas está a determinar o sentido do preceito desde o início da sua vigência e que o deve aplicar a todos os casos ainda não julgados, como é postulado pelo princípio da igualdade na aplicação da lei.
vi) A regra constante do art.º 8.º, n.º 3, do Código Civil não opera diacronicamente, abrangendo apenas os casos ainda não julgados e respeita os casos já julgados e transitados em julgado, por mor do princípio da segurança jurídica imanente no princípio material do Estado de direito consagrado no art.º 2.º da CRP.
vii) As decisões dos tribunais em matéria interpretativa não têm natureza constitutivo-legislativa pelo que a sua aplicação não está dependente do tempo em que ocorreram os factos a que se aplica, antes se devendo aplicar a todos os casos ainda não julgados.
viii) Conquanto não sendo acórdão de fixação de jurisprudência, o referido Acórdão do Pleno deve ser acolhido pelos tribunais de hierarquia, por mor do princípio inserto no n.º 3 do art.º 8.º do Código Civil e do facto de constituir a última palavra actual dos tribunais administrativo-tributários sobre a interpretação da lei.
ix) Ao contrário do entendido no acórdão, o pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos apresentado pelo recorrente A………… aproveita ao codevedor B…………, em virtude de a sua responsabilidade ser solidária e de o devedor solidário pode alegar todos os meios de defesa próprios e os meios de defesa comuns, violando a decisão os art.ºs ºs 21.º, 22.º e 24.º da LGT e os art.ºs 513.º, 514.º e 524.º do C. Civil.
x) Ao contrário do entendido no acórdão recorrido, a preterição administrativa do trâmite procedimental de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos, previsto no art.º 91.º da LGT, não desemboca numa ineficácia do acto de liquidação, seja em relação ao devedor originário, seja em relação ao devedor subsidiário, mas numa ilegalidade inquinadora da legalidade e validade (anulabilidade) do acto de liquidação, porquanto o acto de liquidação praticado está enformado de eficácia jurídica e tanto assim que é título formal da exigência do seu pagamento voluntário e coercivo, e justifica a prática de actos ofensivos contra esses devedores e só pode ser invocada em processo de impugnação judicial, por mor do disposto no art.º 204.º, n.º 1, al. h) do CPPT.
xi) A preterição desse trâmite administrativo da falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos, previsto no art.º 91.º da LGT, constitui uma ilegalidade em acto interlocutório do procedimento administrativo-tributário susceptível de ser impugnada com a decisão final do procedimento, ao abrigo do disposto nos art.ºs 54.º (princípio da impugnação unitária) e 99.º, alínea d), do CPPT.
xii) O conceito de “preterição de outras formalidades legais” constante deste art.º 99.º, alínea d) do CPPT, abrange a realidade que vem de ser analisada, porquanto a mesma constitui um trâmite procedimental do processo administrativo-tributário que antecede a prolação do acto tributário.
xiii) Em caso de procedência da impugnação com base em tal vício, o que ocorre é a anulação, no momento da decisão judicial, do acto de liquidação eficaz até esse momento, e a obrigatoriedade por banda da administração de dar andamento ao pedido de revisão da matéria tributável, podendo chegar-se a final a uma solução de prática de acto de liquidação novo de conteúdo idêntico ou de conteúdo diferente ou até pela não prática do acto de liquidação.
xiv) O responsável subsidiário que formulou pedido de revisão da matéria tributável determinada por métodos indirectos pode deduzir impugnação judicial antes de a administração indeferir esse pedido de revisão, como aconteceu neste caso em que o Director de Finanças de Coimbra proferiu esse despacho quando já estava pendente o processo de impugnação judicial, desde que tenha decorrido já o prazo de quinze dias estabelecido no art.º 91.º, n.º 2 da LGT e tenha sido proferido um acto de liquidação eficaz, pois este prazo não é um mero prazo ordenador da actividade interna da administração, mas sim um prazo com eficácia externa na medida em que sujeita o contribuinte a estar apetrechado dos meios de defesa e disponível para a reunião dentro desse prazo e não está prevista legalmente a prolação de qualquer decisão interlocutória administrativa sobre a admissibilidade do pedido de revisão quando o mesmo é tempestivo e é exercido nos termos previstos na lei.
xv) A impugnação judicial deduzida antes da prolação de uma decisão administrativa que não admite o pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos efectuado pelo responsável subsidiário não é extemporânea, sendo a hipotética apresentação antes do tempo, desde que tenha sido praticado o acto de liquidação, sanada com a prolação da decisão de indeferimento do pedido, sob pena de abuso de direito da administração (art.º 334.º do CC) e dos princípios constitucionais do acesso aos tribunais, da exigência de um processo equitativo e da consagração de processo que contemple a concessão de uma tutela eficaz e efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos do contribuinte, consagrado no art.º 20.º da CRP.
Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser recebido e a final ser proferido douto acórdão que julgue a impugnação procedente na parte recorrida, com as legais consequências.

Não foram produzidas contra-alegações.

Cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

Dá-se aqui por reproduzida a matéria de facto levada ao probatório do acórdão recorrido.

O presente recurso foi interposto como recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 150º do CPTA, sendo certo que no momento em que foi interposto já se encontrava em vigor o disposto no artigo 285º do CPPT, em tudo idêntico, pelo que, há, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do CPPT.
Dispõe o artigo 285.º do CPPT, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 - Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
4- O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5- Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.
6- A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Tributário.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

Vejamos, pois.
Como claramente resulta do disposto no artigo 285º, n.º 3 do CPPT, neste recurso de revista, apenas é permitido ao Supremo Tribunal Administrativo aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, não devendo o recurso servir para conhecer, em exclusivo, de nulidades da decisão recorrida ou de questões novas anteriormente não apreciadas pelas instâncias.
Os recorrentes colocam no presente recurso diversas questões que entendem ter sido decididas de forma contrária a jurisprudência anterior deste Supremo Tribunal, pelo que pugnam pela admissão do respectivo recurso.
No essencial os recorrentes discordam do acórdão recorrido pelas razões que elencam na conclusão iii), a saber:
-a falta de apreciação do pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, efectuado pelo recorrente A………… ao abrigo do disposto no art.º 91.º, n.º 1 da LGT e cuja matéria deu como provada no n.º 14 do probatório, não constituía uma ilegalidade susceptível de inquinar a legalidade do acto de liquidação:
1-em virtude de dever ser antes configurada como uma ineficácia do acto de liquidação revertido contra o peticionante A………… que nessa medida os não poderia impugnar (a impugnação apenas será possível em relação actos de liquidação eficazes);
2-em virtude do pedido apresentado pelo ora recorrente A………… não poder aproveitar ao co-impugnante B………… que não formulou igual pedido;
3-e em virtude de não poder ser aplicada agora a jurisprudência afirmada no Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.03.2011, que se pronunciou pela admissibilidade desse pedido de revisão da matéria tributável por parte do responsável subsidiário quando citado como tal no processo executivo, por a jurisprudência anterior ser “no sentido diametralmente oposto”, “sob pena de violação dos mais elementares princípios de justiça, boa-fé e tutela jurisdicional efectiva”.
Estas questões foram já apreciadas em outros acórdãos proferidos por este STA, nomeadamente, proc. n.º 01163/15, acórdão de 24-02-2016, proc. n.º 0732/14, acórdão de 13-07-2015 e proc. nº. 0876/09, acórdão de 17-03-2011.
Tratando-se de questões que já vinham suscitadas na petição inicial da impugnação e face à argumentação expendida para a não procedência das mesmas pelas instâncias, afigura-se-nos que se impõe a admissão do presente recurso de revista para que este Supremo Tribunal possa reapreciar as mesmas, aferindo da bondade do decidido, uma vez que contendem com o exercício dos direitos de defesa dos recorrentes.

Termos em que, face ao exposto, acorda-se em admitir o presente recurso de revista.
Custas a final.
D.n.
Lisboa, 24 de Novembro de 2021. – Aragão Seia (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes.