Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0641/06
Data do Acordão:07/12/2006
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL.
IRS.
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO GERAL.
LIQUIDAÇÃO.
COBRANÇA.
Sumário:I - Os créditos que gozam dos privilégios gerais previstos no art. 111.º do CIRS, são os de IRS relativo aos três anos anteriores ao da penhora ou acto equivalente, relevando para tal efeito os anos a que respeitam os rendimentos que justificaram a liquidação do imposto e não o momento em que foram postos a cobrança.
Nº Convencional:JSTA00063316
Nº do Documento:SA2200607120641
Data de Entrada:06/06/2006
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF COIMBRA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CIRS88 ART111.
CCIV66 ART9 ART736.
CPC96 ART868.
CPPTRIB99 ART240.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença de graduação de créditos proferida em processo de execução fiscal em que são executados ... e mulher ... .
Na alegação de recurso foram apresentadas as seguintes conclusões:
a) os créditos reclamados de IRS de 1995 e 1996 não gozam de privilégio sobre o imóvel penhorado na execução fiscal por se não reportarem aos últimos três anos, tendo em conta a data da penhora (25.6.2001),
b) incorrendo, assim, a sentença em erro de direito quando os admitiu e graduou, a par com a quantia exequenda, por violação dos artsº 111º do CIRS e do art. 736º do C. Civil,
Com efeito
c) existindo norma específica sobre os privilégios creditórios, a qual surgiu com a criação do novo imposto, afasta-se a aplicação das normas genéricas do C. Civil,
d) devendo considerar-se relevante para que o IRS beneficie do privilégio creditório, o ano a que respeita o imposto e não o ano em que foi posto à cobrança,
Termos em que
e) deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por outra que rejeite os créditos reclamados de IRS e não proceda a qualquer graduação, por forma a que o produto da venda se destine apenas ao pagamento da quantia exequenda.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Os factos referidos na sentença recorrida são os seguintes:
– A dívida exequenda diz respeito a dívidas de IRS de 1997.
– Foi penhorado em 25/6/01 um imóvel composto de casa de habitação com r/c e 1º andar, sito no ..., inscrito na matriz urbana sob o nº 3151 e com o nº do registo predial 03321/090798, para garantia da dívida exequenda sendo o registo da penhora de 26/6/01.
– Os créditos da Fazenda são IRS de 1995 e 1996 cujos prazos de pagamento voluntário ocorreram em 25/10/00 e 21/10/00, respectivamente.
– Os créditos reclamados pela FP estão devidamente documentados, tratam-se de dívidas do I.R.S. anteriores à penhora de 25/6/01 sobre bem imóvel pertencente aos executados.
3 – O art. 111.º do CIRS estabelece o seguinte:
Artigo 111.º
Privilégios creditórios
Para pagamento do IRS relativo aos três últimos anos, a Fazenda Pública goza de privilégio mobiliário geral e privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente.
Na sentença recorrida entendeu-se que para determinar o prazo de três anos aqui referido se atende ao ano em que o devedor foi interpelado para pagar e não ao ano em que a quantia deveria ter sido arrecadada.
No caso, os créditos de IRS reclamados são referentes ao ano de 1995 e 1996 e foram postos a pagamento em 2000, pelo que, no entendimento adoptado na sentença recorrida, sendo a penhora efectuada em 2001, gozam de privilégio sobre o bem imóvel penhorado.
O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público entende que deve ter-se em consideração para determinar o prazo de três anos o ano a que respeita o imposto e não o ano em que foi posto a cobrança.
No regime do art. 736.º do Código Civil, gozam de privilégio geral (aí apenas mobiliário) os créditos de impostos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores.
No referido art. 111.º não se faz referência ao ano da inscrição para cobrança, mas sim ao ano a que o IRS é relativo («IRS relativo aos três últimos anos»).
O ano a que o IRS é relativo é o ano a que respeita o imposto, aquele cujos rendimentos servem de base à tributação, não havendo o mínimo de suporte textual necessário para entender que o IRS é relativo ao ano em que é posto a cobrança.
Assim, tendo de presumir-se que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artº 9.º, n.º 3, do Código Civil), é de concluir que só gozam do privilégio previsto no artº 111.º créditos que de IRS referente aos três anos anteriores à penhora, independentemente do momento em que foram postos a cobrança.
Por outro lado, o facto de os créditos reclamados não terem sido impugnados não obsta a que pudessem ser rejeitados na sentença, por razões que deviam ter implicado rejeição liminar da reclamação, como se estabelece na parte final do n.º 4 do art. 868.º do CPC.
Um dos fundamentos de rejeição é o crédito reclamado não gozar de garantia sobre os bens penhorados, como decorre do preceituado no art. 240.º, n.º 1, do CPPT.
Por isso, deve ser rejeitada a reclamação dos créditos de IRS referidos, ficando prejudicada a graduação de créditos, por não haver créditos a graduar.
Termos em que acordam em
– conceder provimento ao recurso jurisdicional;
– revogar a sentença recorrida;
– rejeitar os créditos de IRS reclamados.
Sem custas.
Lisboa 12 de Julho de 2006. – Jorge de Sousa (relator) – Baeta de QueirozPimenta do Vale.