Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02415/20.9BEPRT
Data do Acordão:05/26/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:AVALIAÇÃO INDIRECTA
ACRÉSCIMOS PATRIMONIAIS
Sumário:I - Para determinar, em primeira linha, se, casuisticamente, pode (ou não) efetuar-se avaliação indireta, por ação do disposto no art. 89.º-A da Lei Geral Tributária (LGT), só é relevante, para o respetivo afastamento, a comprovação/justificação, exigida ao sujeito passivo, nos termos e para os efeitos do seu n.º 3, se for total, isto é, de que o montante apontado como manifestação de fortuna e/ou incremento patrimonial, corresponde, na íntegra, à realidade e de que é outra (não sujeita a declaração).
II - Não produz nesse quadrante qualquer efeito excludente, quer a justificação parcial, quer, entre outras, com a mesma matriz, um, eventual, ocorrido achamento e enquadramento, pela autoridade tributária e aduaneira (AT), de rendimentos não declarados e suscetíveis de avaliação por métodos diretos (desde logo, mediante correções aritméticas/técnicas).
Nº Convencional:JSTA00071156
Nº do Documento:SA22021052602415/20
Data de Entrada:04/16/2021
Recorrente:A....... E OUTROS
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:LGT ART87 ART89-A N3
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.


A……………. e B………….., …, recorrem da sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 5 de março de 2021, que julgou improcedente “recurso das decisões de avaliação indireta da matéria coletável de IRS dos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, da autoria da Diretora de Finanças Adjunta do Porto, que fixaram como rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, os montantes de € 92 497,02, € 46 669,73, € 36 328,39, € 37 003,30, € 41 507,32 e € 9 703,36, respetivamente”.
Os recorrentes (rtes) apresentaram alegação, finalizada com estas conclusões: «

01. A Sentença de que se recorre aderiu à tese da Oposição na interpretação do substrato fáctico e jurídico em que assenta o Relatório de Inspecção, segundo a qual o que releva para avaliar a legalidade do recurso à disciplina da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT é a globalidade dos movimentos a crédito em contas bancárias co-tituladas pelos recorrentes - incluindo os movimentos que foram considerandos para efeitos de correcções aritméticas (que foram erradamente tidas como justificações parciais).

02. Os Recorrentes não se conformam com a conclusão de que existiu uma justificação parcial da fonte dos acréscimos de património; quando a AT enquadra e tributa por métodos directos e à luz de diversas categorias de rendimentos, os valores assim considerados não são, na lógica do artigo 89.º-A da LGT, passíveis de ser “justificados” na medida em que não podem ser considerados como acréscimos patrimoniais.

03. Na verdade, se a AT conhece a fonte do rendimento e o submete ao tratamento tributário que tem por adequado (no caso enquadrando-o e liquidando, por métodos directos, em diversas categorias de imputação de rendimento, com especial significado na categoria A) tais valores não podem ser tidos como acréscimos carecidos de justificação.

04. A justificação dos acréscimos implica, pela teleologia do instituto das “manifestações de fortuna”, que os mesmos não tenham sido objecto de enquadramento tributário.

05. O erro que se imputa à Sentença é, pois, a confusão entre enquadramento de rendimentos tributados por métodos directos e justificação parcial de acréscimos patrimoniais.

06. A questão decidenda reside assim em saber se os movimentos a crédito nas contas bancárias tituladas pelos Recorrentes que a AT qualificou e tributou por métodos directos devem entrar no cômputo dos acréscimos patrimoniais para efeitos de aferir da legalidade da aplicação do regime previsto na alínea f) do artigo 87º e no artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.

07. A resposta só pode ser negativa, pois que a qualificação e tributação por métodos directos de tais rendimentos excluí-os da tipificação de “acréscimos patrimoniais não justificados”, não se confundido tais actos tributários com a justificação a que se refere o regime presuntivo em foco nos presentes autos.

08. A justificação não equivale a (nem significa) enquadrar rendimentos numa categoria tributável distinta da categoria G, antes corresponde à demonstração de que determinado acréscimo patrimonial não constitui rendimento omitido à tributação por ter como fonte outro meio de fortuna ou rendimento tributado - o que na lógica do RIT não é, manifestamente, o caso.

09. A AT “detectou” movimentos bancários a crédito e, findo o procedimento, determinou a existência de valores que não haviam sido sujeitos a IRS que, em seu critério, decidiu enquadrou em diferentes categorias.

10. Ora, os rendimentos que a AT subsumiu e tributou nas diferentes categorias de IRS não são acréscimos patrimoniais - pelo que os valores que careceriam de justificação nos termos e para os efeitos da disciplina das manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais são apenas aqueles que não foram adstritos, pela própria AT, a outra categoria de rendimentos.

11. O artigo 89.º-A e a alínea f) do artigo 87.º da LGT cuidam da tributação de rendimentos omitidos e cuja proveniência seja desconhecida (rendimentos ocultos), pelo que quando a própria AT afirma que determinados rendimentos não declarados têm como fonte o trabalho dependente, juros, rendimentos prediais, etc, os montantes em causa estão, logicamente, fora desta figura legal.

12. A tributação das manifestações de fortuna, visa e permite a reintegração tributária de rendimentos que, face ao património ostentado pelo contribuinte, presumivelmente terão sido subtraídos à tributação em IRS e não devam ser enquadrados nas específicas categorias de rendimento através de métodos directos por se desconhecer a respectiva fonte.

13. Ora, foi a própria AT quem afirmou conhecer, e assim determinou a fonte, da maior parte dos supostos “acréscimos patrimoniais” que detectou (a totalidade dos créditos nas contas bancárias do “paralelo” e parte dos créditos das contas “particulares”), subsumindo-os - de forma coerente como itinerário que percorreu - a diversas categorias e tributando-os por métodos directos.

14. Ou seja, o enquadramento nas diversas categorias de rendimentos e inerentes correcções aritméticas em sede de IRS nos anos de 2011,2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 (nos montantes, respectivamente, de € 165 883,90, € 133 751,23, € 152 788,82, € 135 438,46 € 229 310,46 e € 59 612,17) não correspondem a “justificação parcial” dos montantes imputados aos recorrentes, antes verdadeira e própria correcção tributária de rendimentos que a AT entendeu terem sido auferidos em cada um dos anos em mérito.

15. Acresce que incumbe à Administração Tributária o dever de demonstração da ocorrência dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), sendo que no caso dos autos a AT não logrou sustentar os pressupostos inscritos na alínea f) do n.º 1 do artigo 87º da LGT.

16. Com efeito, e ao contrário do afirmado na Sentença recorrida não existe coincidência entre o conceito de acréscimo patrimonial não justificado e os “valores depositados nas contas bancárias” quando, destes valores, parte substancial não tem, nos termos do RIT, fonte desconhecida (tanto assim que foi enquadrado em diferentes categoriais e tributado por métodos directos).

17. Na verdade, após o enquadramento e correcções aritméticas levadas a cabo pela AT, detecta-se, na totalidade dos seis anos em causa, uma divergência não justificada entre os rendimentos tributados e o acréscimo de património no valor total de € 263.709,12 sendo que em nenhum dos anos em causa (2011 a 2016) existe um acréscimo superior a 100.000 € - pelo que o regime da alínea f) do artigo 87.º e do artigo 89.º-A da LGT não cobra aplicação.

18. A favor da procedência do recurso milita um argumento adicional: os rendimentos dos Recorrentes (quer antes, quer após as correcções aritméticas perpetradas) não são, de acordo com os critérios legais, incompatíveis com os valores não justificados.

19. Por fim: ressuma da Sentença que o enquadramento em sede das categoria A (rendimentos de trabalho dependente), E (juros), F (rendimentos prediais) e G (mais valia imobiliária) do IRS e correspondente correcção e tributação através de métodos aritméticos que operou relativamente a grande parte das entradas em contas bancárias investigadas nos autos se subsume à lógica da justificação parcial dos acréscimos patrimoniais, e, dessa sorte, que, de acordo com o Acórdão do Pleno do STA de 19/05/2010 (tirado no processo 734/09) não está afastado o recurso ao regime das “manifestações fortuna”.

20. Não se ignora a relevância da “justificação parcial” nem se desconhece a jurisprudência invocada. Porém, a mesma não se confunde nem tem conexão com o objecto dos autos.

21. Em primeiro lugar porque o referido Acórdão do Pleno do STA debruça-se sobre a justificação parcial da fonte da disponibilidade inerente a uma operação, única e isoladamente considerada que seja, à partida, enquadrada pela AT no regime das manifestações de fortuna - situação bem diversa da que se trata nos presentes autos: o que aqui está em causa é uma multiplicidade de operações (vários movimentos a crédito em conta bancária) cuja soma a AT entende ser acréscimo patrimonial não justificado.

22. Em segundo lugar porque, repete-se, não ocorre uma justificação (parcial) dos “acréscimos patrimoniais”; o que a AT fez no procedimento - e é coisa bem diferente de justificar os acréscimos - é enquadrar em diversas categorias de imputação de rendimentos valores que entendeu terem sido omitidos à tributação pelos Recorrentes.

23. Ou seja, a AT não se substituiu ao contribuinte para justificar a licitude de incrementos não patrimoniais potencialmente subsumíveis à categoria G, antes enquadrou e tributou por métodos directos movimentos bancários no pressuposto de que os contribuintes não declararam os rendimentos respeitantes a essas categorias.

24. A AT, ao entender que os Recorrentes não declararam rendimentos cuja fonte determinou, enquadrando-os em diferentes categorias (com especial incidência na categoria A) diferencia clara e decisivamente o “restante” que imputou à categoria G como acréscimo patrimonial não justificados.

25. Sabendo-se que só constituem acréscimos patrimoniais não justificados com relevo para aplicação do regime legal em causa nos autos aqueles que exprimirem um desvio, em cada ano, superior a 100.000 € e verificando-se que in casu, tal assimetria não se verifica, conclui-se que a Sentença andou mal ao decidir nos termos em que decidiu,

26. violando, eventualmente entre outras normas e princípios jurídicos, a alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º e o artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.

Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exas. suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por fundado, e consequentemente ser revogada a Sentença recorrida e anulado o acto de fixação adicional de IRS por métodos indirectos em causa nos autos, como que V. Exas. farão a habitual e sã

JUSTIÇA! »


*

A recorrida (rda), autoridade tributária e aduaneira (AT), formalizou contra-alegação, onde conclui: «

a) A AT, ora Recorrida, entende que a sentença não está ferida de erro de julgamento, pugnando pela sua manutenção na ordem jurídica.

b) Os Recorrentes entendem que o facto de as importâncias sujeitas a tributação serem inferiores à importância de € 100.000,00 em cada um dos anos corrigidos não permite a avaliação indirecta da matéria colectável por não estarem reunidos os pressupostos daquele normativo legal.

c) A AT, por sua vez, entende que os pressupostos da alínea f) do nº 1 do art. 87º da LGT estão reunidos e que a aplicação da avaliação indirecta não é afastada pela justificação parcial do acréscimo de património ainda no decurso do procedimento.

d) Tal como se disse em sede de Relatório Final, e consta como matéria de facto assente, os acréscimos de património ocorridos nas esferas jurídicos dos ora Recorrentes, referentes a disponibilidades financeiras creditadas em contas bancárias de que são titulares, são, em cada um dos anos em causa, superiores a € 100.000,00,

e) Sendo que em todos esses anos existia uma divergência entre o acréscimo de património apurado e o rendimento declarado.

f) Resulta do disposto no normativo em apreciação que o montante cujo valor terá de ser superior a € 100.000,00 para efeitos de aplicação da avaliação indirecta respeita, no caso dos autos, ao acréscimo de património apurado e não à divergência não justificada entre o acréscimo de património e os rendimentos declarados.

g) Não constitui matéria de facto controvertida que os valores movimentados a crédito nas contas bancárias tituladas pelos SP’s, nos anos de 2011 a 2016, são valores superiores a € 100.000,00,

h) Logo, resulta pacífica a aplicação da alínea f) do nº 1 do art. 87º da LGT para efeitos da avaliação indirecta ora controvertida.

i) De acordo com o entendimento dos Recorrentes, aquele limite de € 100.000,00, enquanto pressuposto para a avaliação indirecta da matéria colectável, respeitaria à divergência não justificada, o que permitiria aos sujeitos passivos ponderar da oportunidade em justificar parcialmente o acréscimo de património por forma a que o remanescente não atingisse aquele limiar de € 100.000,00.

j) O legislador não pretendeu, todavia, criar a possibilidade de o sujeito passivo poder, através de uma justificação parcial, afastar a aplicação do método indirecto na determinação do seu rendimento colectável.

k) Pelo seu enquadramento legal, importa trazer à colação a jurisprudência sobre a justificação parcial das manifestações de fortuna previstas no nº 4 do art. 89º A da LGT.

l) Assim, e relativamente a esta matéria, remete-se para o Acórdão do Pleno do STA da Secção de Contencioso Tributário, de 19/05/2010, no processo 734/09.

m) De acordo com a jurisprudência assente do STA, a justificação parcial da manifestação de fortuna não afasta a aplicabilidade do método indirecto, apenas se refectindo na quantificação do incremento patrimonial não justificado.

n) Em suma, verificados os pressupostos que legitimam o recurso à avaliação indirecta prevista na alínea f) do nº 1 do art. 87º da LGT, a AT está legitimada a tributar o rendimento com recurso a esse método, independentemente de o sujeito passivo lograr uma justificação parcial que reduza os montantes ainda por justificar para importâncias que não ultrapassem o limiar dos € 100.000,00.

Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente com as devidas e legais consequências. »


*

O Exmo. magistrado do Ministério Público emitiu parecer, no sentido de se julgar improcedente o recurso, suportado, em síntese, no seguinte: «

(…).

Como referem os Recorrentes, na sentença recorrida o tribunal “a quo” considerou que os valores a atender para efeitos de aplicação do disposto na alínea f) do nº 1 do artigo 87º da LGT, se deveria atender aos valores relativamente aos quais se verificava a divergência com os rendimentos declarados e que no caso concreto ultrapassava em cada ano o montante de € 100.000 euros. Mais se entendeu que como os Recorrentes não comprovaram que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que era outra a fonte do acréscimo de património evidenciado nos referidos anos, mostram-se verificados os pressupostos para a avaliação indireta prevista no citado normativo legal.

Ora, afigura-se-nos que tal entendimento está correto. Com efeito, independentemente da justificação parcial do sujeito passivo ou do enquadramento dos rendimentos não declarados nas diversas categorias de IRS, para efeitos de verificação dos pressupostos da avaliação indireta ao abrigo da alínea f) do nº 1 do artigo 87º da LGT, há que atender à totalidade dos rendimentos não declarados e relativamente aos quais se verifica a divergência não justificada. E só numa segunda fase, perante os elementos de prova carreados para o procedimento, há lugar à tributação ao abrigo do disposto no artigo 89º-A, nº 5, alínea a), da LGT, dos acréscimos patrimoniais não justificados. E aqui sim, não são integrados nesses acréscimos os rendimentos que sejam qualificados e integrados em qualquer das categorias de rendimentos de acordo com a sua demonstrada ou presumível proveniência, como sucedeu no caso concreto (entendimento este que se nos afigura estar em consonância com o entendimento adotado no acórdão do Pleno de 19/05/2010, proferido no processo nº 0734/09). »


*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

*******

# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, encontra-se exarado: «

A) Os Recorrentes foram alvo de um procedimento de inspeção externo, de âmbito parcial (IRS) e com incidência sobre os anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, efetuado pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto a coberto das ordens de serviço n.ºs OI201503987, OI201503988, OI201503989, OI201503990, OI201801594 e OI201801595 - cfr. fls. 132 e 133 do processo administrativo (PA) apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

B) Em 10/09/2019, os Recorrentes foram notificados pela Direção de Finanças do Porto, ao abrigo do art.º 89º-A, n.º 3, da LGT, para, no prazo de 30 dias, justificarem a origem dos depósitos e outros movimentos de entrada (refletidos no mapa anexo à notificação) nas contas por si tituladas nos anos de 2011 a 2016, no montante global de € 3 083 579,32, face à incoerência daqueles com os rendimentos declarados nos anos em causa - cfr. fls. 25 e 26 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

C) Em 30/10/2019, os Recorrentes apresentaram justificações para os acréscimos de património, insertas a fls. 33 a 46 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

D) Em 12/10/2020, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto elaboraram o projeto de relatório de inspeção tributária de fls. 79 a 109 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

E) Em 19/10/2020, os Recorrentes foram notificados para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projeto de relatório mencionado na alínea antecedente, não o tendo feito - cfr. fls. 131 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

F) Em 17/11/2020, foi elaborado o relatório final de inspeção tributária, donde resultaram, para os anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, correções de natureza meramente aritmética às categorias A, E, F e G do IRS, assim como correções por métodos indiretos no âmbito da categoria G do IRS (através da aplicação do regime das manifestações de fortuna), nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 159 a 191 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

G) Em 26/11/2020, a Diretora de Finanças Adjunta do Porto fixou aos Recorrentes, nos termos dos art.os 87º, n.º 1, alínea f) e 89º-A da LGT, com referência aos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, um rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, no montante de € 92 497,02, € 46 669,73, € 36 328,39, € 37 003,30, € 41 507,32 e € 9 703,36, respetivamente, tendo por base a fundamentação constante do relatório de inspeção tributária mencionado na alínea antecedente - cfr. fls. 214 a 216 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

H) Em 07/12/2020, os Recorrentes foram notificados do relatório de inspeção tributária e da fixação do rendimento coletável de IRS por métodos indiretos - cfr. fls. 217 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

I) O presente recurso foi interposto em 16/12/2020 - cfr. fls. 2 e 5 a 13 do suporte físico do processo. »


***


A apreciação do mérito deste recurso (Que passa, sobretudo, pela resposta à “questão decidenda”, inscrita, pelos rtes, na conclusão 06)., impõe, liminarmente que, presente a formulação, remissiva, para o conteúdo, em especial, do relatório final de inspeção tributária, dos factos provados, vindos de transcrever, da visada sentença (e respetiva fundamentação de direito), se extrate, por revestir, determinante, interesse na indicação e identificação da realidade/factualidade considerada e valorada, pelo julgador, o seguinte (Sombreados, autoria nossa).: «

(…).

…, conforme se extrai do relatório de inspeção tributária, que serviu de fundamento às correções ao rendimento tributável dos Recorrentes, nos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 estes declararam rendimentos (líquidos), respeitantes às categorias B, F e H, nos montantes de € 84 963,78, € 72 655,76, € 88 876,44, € 112 467,42, € 120 850,82 e € 110 701,68, respetivamente.

Por outro lado, a inspeção tributária detetou, no período em causa, a existência de depósitos e outros movimentos de entrada nas contas bancárias de que os Recorrentes eram titulares, no montante global € 3 083 579,32 (deste montante já haviam sido expurgados os movimentos intercontas, outros movimentos relacionados com os rendimentos declarados para efeitos de IRS e já sujeitos a tributação ou sujeitos a retenção a título definitivo, reembolso de suprimentos e financiamentos efetuados a empresas do grupo “………..” detetados em ações inspetivas, reembolso de impostos e depósitos em numerário e transferências de valores inferiores a € 200,00), sendo € 669 334,74 de 2011, € 483 368,86 de 2012, € 586 073,89 de 2013, € 442 554,66 de 2014, € 660 201,65 de 2015 e € 242 045,52 de 2016.

Os Recorrentes foram notificados pelos serviços de inspeção tributária para justificar a origem destes depósitos e movimentos de entrada no valor global € 3 083 579,32, sendo que apenas lograram justificar o montante de € 256 778,78, não apresentando qualquer justificação para as entradas que totalizam o montante de € 2 672 127,79 e apresentando justificações que não foram aceites pela inspeção tributária para as entradas no valor de € 154 672,75.

Assim sendo, os movimentos bancários a crédito não justificados pelos Recorrentes totalizavam € 2 826 800,54, sendo € 606 913,93 de 2011, € 447 742,99 de 2012, € 529 051,64 de 2013, € 427 930,33 de 2014, € 645 387,18 de 2015 e € 169 774,47 de 2016.

Dos movimentos bancários a crédito não justificados, a quantia de € 2 154 308,20 correspondia a valores depositados nas contas que a inspeção tributária denominou de contas do “paralelo” (contas domiciliadas no banco “Montepio Geral”, que a inspeção tributária considerou que serviram para ocultar valores, não faturados, recebidos por vendas e serviços prestados pelas sociedades de que o Recorrente era gerente e, bem assim, para distribuir pelos gerentes os rendimentos ocultados nessas sociedades) e a quantia de € 598 953,59 correspondia a valores depositados em contas de caráter particular / privado dos Recorrentes.

A inspeção tributária entendeu que as entradas não justificadas nas contas bancárias do “paralelo” e as entradas não justificadas nas contas bancárias de caráter particular (entradas com origem nas sociedades onde o Recorrente exerceu funções de gerente), consubstanciavam rendimentos de trabalho dependente (categoria A) do Recorrente marido, no montante de € € 878 588,75 (esta quantia resulta, além do mais, da divisão do valor depositado nas contas do “paralelo” pelo número de titulares dessas mesmas contas), sendo € 167 887,90 de 2011, € 137 055,23 de 2012, € 136 972,53 de 2013, € 139 542,46 de 2014, € 233 414,46 de 2015 e € 63 716,17 de 2016.

Entendeu também a inspeção tributária que outra parte das entradas não justificadas nas contas bancárias de caráter particular constituíam rendimentos da categoria E do ano 2013 (€ 16 007,01, respeitantes a juros pela mora no pagamento de uma prestação), rendimentos da categoria F dos anos de 2011 e 2012 (€ 2 100,00 e € 800,00, respetivamente, correspondentes a entradas nas contas bancárias relacionadas com o recebimento de rendas, cujos valores não foram declarados nas declarações de rendimentos daqueles anos) e rendimentos da categoria G do ano 2013 (€ 3 913,28, correspondentes a uma mais-valia imobiliária).

Assim sendo, constata-se que a inspeção tributária efetuou, nos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, correções meramente aritméticas em sede de IRS, nos montantes de € 165 883,90, € 133 751,23, € 152 788,82, € 135 438,46 € 229 310,46 e € 59 612,17, respetivamente.

Em relação às restantes entradas não justificadas nas contas bancárias dos Recorrentes, que perfaziam € 531 282,32, a inspeção tributária considerou que se tratavam de acréscimos patrimoniais não justificados, enquadráveis na categoria G do IRS, sendo € 92 497,02 de 2011, € 46 669,73 de 2012, € 36 328,39 de 2013, € 37 003,30 de 2014, € 41 507,32 de 2015 e € 9 703,36 de 2016 (estes montantes imputados aos Recorrentes resultaram da divisão dos movimentos bancários em causa pelo número de titulares das contas).

(…). »

Foi, a partir deste prévio apontamento de cariz factual, em nenhuma medida objetado, pelos rtes, que, na sentença recorrida, se acabou, por decidir julgar improcedente o recurso das decisões de avaliação indireta da matéria tributável de IRS, fundamentalmente, com este conjunto de argumentos: «

(…).

…, fica demonstrado que o património dos Recorrentes, nos anos de 2011 a 2016, foi alvo de um acréscimo de valor superior a € 100 000,00 em cada ano, resultante de disponibilidades financeiras que foram creditadas nas suas contas bancárias, ocorrendo, simultaneamente, uma divergência manifesta com os rendimentos declarados nesses mesmos anos.

Com efeito, nos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, os Recorrentes declararam rendimentos (líquidos) nos montantes de € 84 963,78, € 72 655,76, € 88 876,44, € 112 467,42, € 120 850,82 e € 110 701,68, tendo sido beneficiários, em contas bancárias de que eram titulares (ou cotitulares), de depósitos e outros movimentos de entrada nos montantes de € 669 334,74, € 483 368,86, € 586 073,89, € 442 554,66, € 660 201,65 e € 242 045,52, respetivamente (no apuramento destes montantes de depósitos foram expurgados pela inspeção tributária, além do mais, os movimentos relacionados com os rendimentos declarados para efeitos de IRS e já sujeitos a tributação ou sujeitos a retenção a título definitivo).

Pelo que não assiste razão aos Recorrentes quando alegam que em nenhum dos anos em causa os acréscimos patrimoniais ultrapassaram o limiar dos € 100 000,00, previsto na alínea f) do n.º 1 do art.º 87º da LGT. É que, como vimos, os valores depositados nas contas bancárias dos Recorrentes excederam largamente, em cada ano, € 100 000,00, sendo certo que estes montantes depositados não se podem confundir com o rendimento tributável que foi apurado em sede de IRS (categoria G), no montante de € 92 497,02 em 2011, € 46 669,73 em 2012, € 36 328,39 em 2013, € 37 003,30 em 2014, € 41 507,32 em 2015 e € 9 703,36 em 2016.

Acresce que os Recorrentes não lograram justificar a divergência detetada entre o acréscimo de património evidenciado nos anos de 2011 a 2016 e os rendimentos declarados nesses mesmos anos, divergência que é ostensiva.

De facto, os Recorrentes apenas conseguiram justificar a origem dos depósitos no montante de € 256 778,78, não apresentando qualquer justificação para entradas no montante de € 2 672 127,79 e apresentando justificações que não foram aceites pela inspeção tributária para entradas no valor de € 154 672,75. E é consabido que a justificação meramente parcial da fonte dos acréscimos de património, como foi o caso, não afasta a aplicabilidade da determinação indireta dos rendimentos que permitiram tal manifestação de fortuna (neste sentido, veja-se o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 19/05/2010, processo 0734/09).

Por conseguinte, os Recorrentes não comprovaram que os rendimentos declarados nos anos de 2011 a 2016 correspondiam à realidade e que era outra a fonte do acréscimo de património evidenciado nos referidos anos, pelo que estavam verificados os pressupostos para a avaliação indireta prevista no art.º 87º, n.º 1, alínea f), da LGT.

Sendo certo que a tributação por métodos indiretos destes acréscimos patrimoniais não justificados, não é posta em causa pelo facto de a inspeção tributária também ter efetuado, nos anos em apreço, correções de natureza meramente aritmética em sede de IRS. Na verdade, através da informação bancária carreada para o procedimento de inspeção, a Autoridade Tributária constatou que parte dos depósitos bancários provinham de sociedades nas quais o Recorrente era gerente, sendo tais quantias passíveis de enquadramento na categoria A do IRS e, bem assim, que outra parte dos referidos depósitos respeitava a juros de mora enquadráveis na categoria E, a rendimentos prediais subsumíveis na categoria F e a rendimentos provenientes de uma mais-valia imobiliária enquadrável na categoria G.

Na sequência das referidas correções aritméticas, ficou apenas por identificar a proveniência da quantia de € 531 282,32 (entrada nas contas bancárias dos Recorrentes), quantia essa que foi considerada um acréscimo patrimonial não justificado, enquadrável na categoria G do IRS (sendo certo que esta quantia não provém dos rendimentos declarados pelos Recorrentes em sede de IRS, já que estes foram expurgados das quantias depositadas, cuja proveniência devia ser justificada pelos Recorrentes).

Por conseguinte, ao invés do sustentado pelos Recorrentes, as referidas correções de natureza meramente aritmética não servem para justificar a diferença detetada entre os rendimentos declarados e o património amealhado.

Assim, não tendo os Recorrentes comprovado a origem da quantia de € 531 282,32, a mesma foi devidamente enquadrada como um acréscimo patrimonial não justificado, tendo sido imputada ao Recorrente marido a parte que lhe pertencia no valor depositado (€ 263 709,12).

Finalmente, importa ainda referir que também não assiste razão aos Recorrentes quando alegam que os rendimentos declarados nos anos em causa eram compatíveis com o montante de € 263 709,12 de entradas nas suas contas bancárias, que restou por justificar, uma vez que, como vimos, a justificação parcial não afasta a avaliação indireta da matéria tributável, pelo que os rendimentos declarados pelos Recorrentes não se podem considerar compatíveis com o acréscimo de património evidenciado no período em causa.

Ante o exposto, estamos em condições de concluir que se devem manter na ordem jurídica as decisões que fixaram como rendimento tributável dos Recorrentes, a enquadrar na categoria G do IRS dos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, os montantes de € 92 497,02, € 46 669,73, € 36 328,39, € 37 003,30, € 41 507,32 e € 9 703,36, respetivamente.

(…). »

Posto isto, a insurgência, dos rtes, reconduz-se ao apontamento de erro a este julgamento, fundamentalmente (Cf., conclusões 01. A 17.), porque o tribunal recorrido não assumiu a inaplicabilidade, in casu, do disposto nos arts. 87.º n.º 1 alínea (al.) f) e 89.º-A da Lei Geral Tributária (LGT); especificamente, na sua ótica, após os intervenientes serviços da AT, no âmbito de procedimento inspetivo, terem enquadrado alguns dos valores, depositados nas contas bancárias, particulares, em diversas categorias de rendimentos do IRS (até, então, não declarados) e efetivado as correspondentes correções aritméticas, a divergência não justificada, em cada um dos seis anos envolvidos (2011 a 2016), nunca atingiu cifra superior a € 100.000/ano. Reconduzindo e precisando, esta forma de entender com a factualidade disponível, os rtes visam fazer passar e retirar consequências (jurídicas) do seguinte cenário aritmético: tendo a AT, a final, em setembro de 2019, conferido e apurado a existência de depósitos e outros movimentos de entrada, em contas bancárias, por si tituladas, no período compreendido entre 2011 e 2016, no montante global de € 3.083.579,32, totalmente incoerente com os rendimentos declarados (IRS) nos mesmos anos, embora, só tendo justificado (no exercício do seu, indiscutível, ónus da prova) o valor total de € 256.778,78, permanecendo, portanto, injustificada a importância de € 2.826.800,54 (além do mais, € 2.154.308,20 correspondia a valores depositados nas contas que a inspeção tributária denominou de contas do “paralelo” e a quantia de € 598.953,59 correspondia a valores depositados em contas de caráter particular/privado dos Recorrentes), porque a AT veio, sequentemente, a, do injustificado, enquadrar diversas verbas em categorias de rendimentos, do IRS (de alguns dos anos em causa), com destaque para € 878.588,75, a título de rendimentos de trabalho dependente (categoria A) do recorrente-marido, então, as restantes entradas não justificadas, nas esquadrinhadas contas bancárias, que perfaziam € 531.282,32, divididas pelos seis anos sob investigação, em nenhum deles excedeu o limite, legal, intocável, de € 100.000 (Para os rtes, esta evidência é maior, porque, reputam como “divergência não justificada” o valor total de € 263.709,12 (conclusão 17.), o qual, contudo, corresponde, sim, à soma do rendimento tributável a enquadrar na categoria G, do IRS, dos anos de 2011 a 2016 (alínea G) dos factos provados), que, necessariamente, traduz a diferença entre o acréscimo de património e os rendimentos declarados, em cada um dos anos.).

Na ausência de controvérsia quanto ao enquadramento normativo pertinente, da situação julganda, nos termos do art. 87.º n.º 1 al. f) da LGT (Na redação, aqui, aplicável, da Lei n.º 94/2009 de 1 de setembro.), pode ter lugar (é legal) a avaliação indireta da matéria tributável/coletável, desde logo, em cédula de IRS, nos casos de deteção de um acréscimo de património ou despesa efectuada, pelos sujeitos passivos, incluindo liberalidades, “de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”. Complementarmente, por força do estatuído no art. 89.º-A, do mesmo compêndio (Redações das Lei n.º 94/2009 de 1 de setembro e Lei n.º 55-A/2012 de 29 de outubro.), impõe-se ter presente que:

- verificada a situação prevista no art. 87.º n.º 1 al. f), mediante notificação para o efeito, “cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada” - n.º 3;

- quando o sujeito passivo não faça a prova dessa correspondência, regra geral, considera-se “rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, …, a diferença entre o acréscimo de património ou a despesa efectuada, e os rendimentos declarados (os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos) pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação” . n.º 5 als. a) e d).

Operando o seu múnus de compreensão e operação das leis, o STA, em matéria de avaliação indireta da matéria tributável, nas hipóteses, específicas, das manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados, tem, ao longo dos tempos, emitido pronúncias, circunstanciais, sobre vários aspetos do respetivo regime legal, por isso, com um espectro, muitas vezes, limitado, mas, em todo caso, com a assunção de algumas ideias-força, transversais a diversas situações concretas.

Entre estas últimas, merece destaque a defesa, pretérita (Ver, entre outros, acórdãos, do STA, de 19 de maio de 2010 (0734/09) e de 15 de maio de 2013 (0664/13).), e, para nós, a manter, contemporaneamente, do princípio, disciplinador e orientador, de que a comprovação/justificação exigida ao sujeito passivo, nos termos e para os efeitos do art. 89.º-A n.º 3 da LGT, só é relevante, no que tange à capacidade/virtualidade de afastar a operação de avaliação indireta da (sua) matéria tributável, se for total, isto é, se o montante apontado como manifestação de fortuna e/ou incremento patrimonial, corresponder, na íntegra, à realidade e de que é outra (não sujeita a declaração) a respetiva fonte geradora. Reflexa e obviamente, a comprovação/justificação parcial, no primeiro momento, não afasta, em qualquer caso, a aplicação do método de avaliação indireta, positivado no art. 89.º-A da LGT (sem prejuízo de, num segundo ato, a mesma ter de ser traduzida na quantificação da disputada matéria tributável).

Evitando o fastio de coligir uma variedade de razões abonatórias desta assunção jurisprudencial, diremos, apenas, que ela se coaduna e compatibiliza, com os propósitos, confessados, do legislador, aquando da instituição (e aperfeiçoamentos) do regime em apreço, de combate à evasão fiscal (Na Lei n.º 30-G/2000 de 29 de dezembro, é apontado, explicitamente, tratar-se da implementação de “Medidas de administração tributária e de combate à evasão e fraude fiscais”.), bem como, respeita e dá profundidade à repartição do ónus da prova, entre a AT e o sujeito passivo, envolvido, no pressuposto de que à primeira, apenas, cumpre provar, objetiva e diretamente (no sentido, de aritmeticamente), que o rendimento líquido, declarado pelo segundo, entre outras, apresenta uma desproporção superior a …%, para menos, em relação ao rendimento padrão fixado na tabela do n.º 4 do art. 89.º-A da LGT ou patenteia uma divergência, não justificada, quanto a acréscimos de património ou despesa efetuada, de valor superior a € 100.000.

Assim, com estes ditames, na situação julganda, assumido que os rtes de um, problemático, questionável, montante global de € 3.083.579,32, somente, justificaram, por sua iniciativa, atuação direta, a importância de € 256.778,78, à partida, sem mais delongas, estaria, enormemente, justificada a ocorrida operação de avaliação indireta da matéria tributável, dos anos de 2011 a 2016, para efeitos de IRS.

Sendo esta a consequência normal, inevitável, remanesce a possibilidade de tal desfecho (poder) ser afastado, pela defesa de que, quando “a AT conhece a fonte do rendimento e o submete ao tratamento tributário que tem por adequado (no caso enquadrando-o e liquidando, por métodos directos, em diversas categorias de imputação de rendimento, com especial significado na categoria A) tais valores não podem ser tidos como acréscimos carecidos de justificação”, porquanto esta “implica, pela teleologia do instituto das “manifestações de fortuna”, que os mesmos não tenham sido objecto de enquadramento tributário” - conclusões 03. e 04. Em suma, para os rtes, é diferente (e, por isso, necessariamente, com consequências diversas) o “enquadramento de rendimentos tributados por métodos directos” e a “justificação parcial de acréscimos patrimoniais”.

Não obstante a, nítida, diferença decorrente da enunciação, nada mais, em termos objetivos e práticos, separa as duas situações e, implicantemente, o respetivo tratamento, para o efeito em discussão (legalidade da avaliação indireta da matéria tributável).

Assim:

- nos casos em que, por intervenção dos serviços da AT, é operada uma correção aritmética, tendente a tributar alguns rendimentos não declarados (em parte), pelo sujeito passivo, assiste-se a um procedimento equivalente à justificação parcial, levada a cabo por este, com o gravame, no primeiro caso, de o contribuinte não só não ter declarado os rendimentos, no momento oportuno, como, também, não o haver feito no exercício do ónus probatório, imposto pelo art. 89.º-A n.º 3 da LGT; ou seja, de um ponto de vista ético, em comparação, a justificação parcial, até, sempre, merecia (se possível) melhor tratamento (Ao invés, de beneficiar um sujeito passivo que ocultou rendimentos até não poder mais e, quando descoberto, obteria um tratamento como se nada se tivesse passado (não se olvide que estamos a laborar em terrenos de fraude e evasão fiscal).);

- em ambas as hipóteses, similarmente, o sujeito passivo não comprova a correspondência com a realidade dos rendimentos declarados, sendo que, no caso da correção aritmética (pela AT), sempre esteve em condições de o fazer, dada a indiscutibilidade do seu enquadramento, por exemplo, em IRS, nas concretas categorias de rendimentos elencadas pela lei;

- na justificação parcial, o sujeito passivo comprova a fonte (de parte da manifestação de fortuna ou do acréscimo de património…), a qual, atesta e assegura, que os valores disputados (na parte justificada) não tinham (têm) de ser declarados (na declaração anual de rendimentos), enquanto, na correção aritmética, ao invés, o resultado, inevitável, é a declaração (periódica) dos rendimentos ocultados, descobertos e enquadrados pela AT;

- finalmente, nas duas situações colocadas a par, na origem, num momento inicial, genético, o que conta, releva, para legalizar a operação de uma avaliação indireta da matéria tributável, é a constatação de uma objetiva (quantificada) divergência entre valores declarados e manifestações de fortuna e/ou acréscimos de património ou despesa, independentemente, das justificações e/ou correções posteriores (Que, como vimos, nas hipóteses da justificação parcial, a jurisprudência salvaguarda através da imposição da respetiva operância no momento da quantificação da matéria tributável final e que, em situações como a dos autos, também, é relevada nesta última sede, permitindo a redução, significativa, dos montantes encontrados para determinação do rendimento tributável.).

Concluindo, para determinar, em primeira linha, se, casuisticamente, pode (ou não) efetuar-se avaliação indireta, por ação do disposto no art. 89.º-A da LGT, só é relevante, para o respetivo afastamento, a comprovação/justificação, exigida ao sujeito passivo, nos termos e para os efeitos do seu n.º 3, se for total, isto é, de que o montante apontado como manifestação de fortuna e/ou incremento patrimonial, corresponde, na íntegra, à realidade e de que é outra (não sujeita a declaração) a respetiva fonte geradora. Não produz nesse quadrante qualquer efeito excludente, quer a justificação parcial, quer, entre outras, com a mesma matriz, um, eventual, ocorrido achamento e enquadramento, pela AT, de rendimentos não declarados e suscetíveis de avaliação por métodos diretos (desde logo, mediante correções aritméticas/técnicas).


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# III.


Pelo expendido, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento a este recurso jurisdicional.

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Custas pelos recorrentes, em partes iguais.

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[texto redigido em meio informático e revisto]

Lisboa, 26 de maio de 2021


Pela (o) Exma. (o.) Senhora/Senhor Conselheira (o) Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro e Francisco António Pedrosa de Areal Rothes, na condição de adjuntos, foi transmitido, enquanto relator, a mim, Aníbal Augusto Ruivo Ferraz, voto de conformidade, com os fundamentos e a decisão supra - artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020 de 13 de março.