Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01119/17.4BALSB
Data do Acordão:12/13/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA BENEDITA URBANO
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL
INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23963
Nº do Documento:SA12018121301119/17
Data de Entrada:12/04/2017
Recorrente:A..., LDA E INAC, IP
Recorrido 1:OS MESMOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1. A…………., Lda (A………..), e ANAC (Autoridade Nacional da Aviação Civil – outrora INAC: Instituto Nacional da Aviação Civil), devidamente identificadas nos autos, recorrem ambas para este Supremo Tribunal do Acórdão do TCAS, de 20.04.17, que decidiu “conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo INAC e em negar provimento ao recurso interposto pela A…………., Lda.; em revogar a sentença recorrida na parte em que condenou o réu na indemnização por danos no valor de € 618.052,69, sendo devido apenas a tal título a quantia de € 104.875, mantendo-se a condenação de € 66.524,58, a título de indemnização pelo relançamento da empresa, a tais montantes acrescem juros de mora à taxa legal contados desde a data da notificação deste acórdão” (cfr. fls. 754 e ss.).

1.1. Por despacho do relator do TCAS, de fls. 1005, foi considerado o seguinte:

Recursos de revista: lido o acórdão recorrido e compulsadas as alegações produzidas pelas partes, afigura-se que as nulidades aí invocadas constituem erros de julgamento, pelo que subam os autos ao Venerando Supremo Tribunal Administrativo para apreciação da viabilidade … dos recursos de revista (cf. artº 150º/5 do CPTA)”.

1.2. Na origem do recurso interposto para o TCAS esteve uma decisão do TAC de Lisboa, de 17.07.13, que assim decidiu “Em face do exposto, julgo parcialmente procedente a acção, pelo que:

a) Condeno parcialmente o Réu ao pagamento à Autora a título de indemnização por danos no valor de 618.052,69 €;

b) Condeno o Réu a pagar à Autora o valor de 66.524,58€ a título de indemnização pelo relançamento da actividade;

c) Condeno o Réu a pagar à Autora juros de mora sobre os montantes apurados em a) e b), a contar da presente sentença”.

Ainda antes desta decisão, em 16.10.12, o TAC de Lisboa tinha proferido despacho interlocutório em que apreciou e decidiu a excepção invocada pelo executado relativamente à inadequação do meio processual de que lançou mão a exequente. Aí, em síntese, se disse e decidiu:

O executado na oposição deduzida veio invocar que não tendo sido condenado ao pagamento de quantia certa não podia cumprir nos termos pretendidos pela exequente, ou seja, nos 30 dias após o trânsito em julgado dos acórdãos, e nesta parte tem razão.

Com efeito, se é certo que em sentença de 1ª instância fora o ora exequente condenado ao pagamento de uma quantia certa relegando para execução de sentença o demais, por acórdãos do STA, já transitados em julgado a parte da sentença que condenava-o ao pagamento da quantia de € 925.000.00 foi revogada pelo STA que ordenou que a fixação dos danos e apuramento dos danos sofridos em virtude de factos ilícitos sejam relegados para execução de sentença.

Pelo que a quantia eventualmente a pagar ao ora exequente, por efeito de indemnização não se encontra certa e líquida.

Porém, o exequente não tem razão quando invoca que o meio processual utilizado – o processo executivo – é meio impróprio. Sendo nesta forma processual que será enxertada acção declarativa para apuramento dos danos sofridos pela prática dos actos ilícitos. Improcedendo esta questão”.

2. Quanto ao recurso de revista interposto pela A., ora recorrente, A…………, esta mesma apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (cfr. fls. 833 a 844):

“1º - Decorre da Doutrina e Jurisprudência citada, que se pronunciaram sobre a interpretação do nº 3º do Artº 566º do Código Civil e a aplicação do juízo de equidade nele previsto, na determinação exacta dos danos a indemnizar, que existem dois pressupostos materiais de aplicação desta norma e que a violação de qualquer destes pressupostos legais implica violação de lei, ou seja, do próprio preceito citado, sendo sindicáveis como matéria de direito, por este Tribunal Superior, que julga o recurso de revista, ainda que excepcional;

2º - A aplicação do princípio da equidade previsto no nº 3 do citado Artº 566º requer uma apreciação prévia de toda a matéria provada relativamente aos danos sofridos pelo lesado, quer quanto aos danos emergentes, quer quanto aos lucros cessantes, e uma decisão fundamentada do tribunal considerando que lhe faltam tais ou tais elementos para avaliar em concreto os danos, de um e outro tipo, e que só os pode determinar com recurso ao princípio da equidade;

3º - Logo, para que o Tribunal determine validamente que pode recorrer à equidade, torna-se necessário realizar uma apreciação e ponderação individualizada e separada dos danos emergentes e dos lucros cessantes e determinar previamente em relação a cada um destes tipos de danos, porque se considera ser impossível avaliar os danos exactos com fundamento na prova pertinente produzida nos autos;

4º - Só depois de ter sido feita tal apreciação e considerada a falta de elementos de avaliação do dano, é que o Tribunal pode recorrer à aplicação do nº 3 do Artº 566 do Código Civil e decidir com base num critério de equidade, ou seja um critério considerado justo, atentas as circunstâncias concretas do caso, como já o Sábio Aristóteles considerava;

5º- Por outro lado, caso se considere fundadamente, que por exemplo, no caso da avaliação dos lucros cessantes, por faltarem elementos necessários para o apuramento exacto dos danos, se justifica a aplicação do princípio da equidade, então na aplicação deste princípio, previsto no Artº 566º nº 3º, do Código Civil devem ser considerados todos os factos pertinentes constantes dos autos, e nomeadamente aqueles que o Tribunal de 1ª instância considerou determinantes para a avaliação dos danos, apreciando-os e ponderando-os criticamente.

6º - Só actuando dessa forma o Tribunal cumpre o disposto no nº 3 do Artº 566 do Código Civil, e se pode evitar o arbítrio das decisões que determinem uma indemnização, desconsiderando por completo os factos provados e relevantes que determinaram a decisão da 1ª Instância e que tinham enquadrado a aplicação do princípio da equidade, quanto à avaliação dos danos.

7º - E foi exactamente o que se fez no Acórdão recorrido, onde não se apreciou separadamente os danos emergentes e os lucros cessantes, não se tomou em consideração nem ponderou todos os factos relevantes provados para a determinação de uns e outros, não se ponderou nem afirmou quais os elementos que faltavam para avaliar exactamente os danos e a razão porque se deveria aplicar o princípio da equidade.

8º - Actuando deste modo, o Tribunal a quo desrespeitou os pressupostos materiais de aplicação do princípio de equidade, exigidos no Artº 566º nº 3, violando-o, e proferiu uma decisão arbitrária, que põe em causa a segurança jurídica, o princípio da igualdade e o direito a uma decisão justa, todos de assento Constitucional e também a confiança que os cidadãos devem ter nas decisões dos Tribunais.

9º - Além disso, no Acórdão recorrido não se fez uma apreciação autónoma dos danos emergentes, baseada nos factos provados na sentença, questão que tinha sido apresentada e requerida pela recorrente, e muito menos se ponderou se esses danos se achavam integralmente demonstrados;

10º - Ao não apreciar esta questão que lhe tinha sido colocada, como estava obrigado a fazer, não apreciando se a matéria de facto provada nos autos era suficiente para permitir a completa avaliação dos danos emergentes sofridos pela recorrente, com a paralisação da sua actividade, mas mantendo a maioria dos seus custos fixos, o Acórdão recorrido incorreu no vício previsto no Artº 615º nº 1º alínea d) do CPC, encontrando-se eivado de nulidade, o que dsve determinar a sua revogação.

11º - O Acórdão recorrido violou ainda o disposto no nº 3 do Artº 566º do Código Civil, disposição que não podia, no caso concreto, ser aplicada à determinação dos danos emergentes sofridos pela empresa A……….., na medida em que o Tribunal nem sequer apreciou criticamente nem ponderou os factos provados, e muito menos decidiu com base neles que era impossível com os elementos de que dispunha determinar os danos emergentes.

12º - O Tribunal a quo não analisou nem ponderou os factos provados relativos aos danos emergentes sofridos pela lesada, todos eles demonstrados detalhadamente, como estava legalmente obrigado a fazer, tendo apenas aposto a fórmula protocolar, mas obviamente vazia, "de que dava por reproduzida toda a prova feita" (página 11 do Acórdão).

13º - E sem analisar os factos provados relativos aos danos sofridos pela A……….. e obviamente sem se pronunciar sobre os fundamentos pelos quais considerava ser impossível extrair deles o valor dos danos emergentes sofridos pela empresa, aplicou ilegalmente o princípio da equidade à avaliação dos danos emergentes, a que não podia recorrer porque lhe faltava o pressuposto previsto no nº 3 do Artº 566 do Código Civil.

Por todo o exposto, deverá ser revogado o Acórdão recorrido e proferido outro por este Venerando Tribunal que condene o INAC a indemnizar a recorrente nos seguintes valores:

14º - Nos custos e encargos que teve para manter a empresa aberta, lutando denodadamente extra-judicial e judicialmente, para reaver o certificado JAR 145, que lhe foi ilegal e culposamente retirado pelo INAC IP, factos inteiramente comprovados nomeadamente nos Artigos v), w), x), y), z), ccc), bbb), ccc), ddd), eee), fff), ggg), hhh) e kkk) da matéria de facto provada, bem como nas declarações de IRC modelo 22 juntas aos autos, desde 1993 até ao ano 2000, no montante de € 107 764.61, o que foi erradamente desconsiderado no Acórdão recorrido.

15º - Estes danos emergentes ficaram provados, também nos balancetes da recorrente de 1994 a 1999, onde se demonstra que a empresa passou de um volume de negócios de 20 230 987$00, nos 10 meses de 1994, para 1 247 000$00, em 1995, para o ano inteiro, o que significa pouco mais de cem contos, ou quinhentos euros, por mês.

16º - No que respeita aos danos sofridos com a cessação do contrato da recorrente com a "B…………..", empresa americana produtora de aviões agrícolas, ficou provado contrariamente ao que se afirmou, no Acórdão recorrido, que o contrato com a "B………….." foi celebrado em 1994, e duraria originariamente por três anos, de 1994 a 1996, propiciando à recorrente um rendimento diário de 100.00 dólares americanos pela disponibilidade para a reparação de aviões em toda a África e sua representação neste continente;

17º - Ficou igualmente provado que dadas as excelentes ligações profissionais existentes entre a "B…………." e os sócios da recorrente, que lhe prestaram serviços individualmente mesmo após a cessação do contrato, em 1996, numa situação de normalidade e com total verosimilhança, se deveria presumir e considerar que o contrato de assistência técnica e representação para toda a África, que foi celebrado originariamente por três anos, entre 1994 e Dezembro 1996, tinha todas as condições para continuar por mais três anos até final de 1999;

18º - Os termos e condições do contrato e o prejuízo que a recorrente teve a partir de Janeiro de 1995, com a cessação deste contrato, por lhe ter sido retirado ilegalmente o certificado JAR 145 pelo INAC IP devem assim considerar-se provados, contrariamente ao que por erro, se decidiu no Acórdão recorrido, não havendo qualquer motivo para recorrer a juízos de equidade para os avaliar.

19º - Ficou assim cabalmente demonstrado que a recorrente perdeu 73 000,00 dólares americanos em 1995 e 1996, e mais 109 500 dólares americanos entre Janeiro de 1997 e Dezembro de 1999, com a cessação do contrato de assistência técnica e representação da "B……………" em toda a África, que devem ser integralmente indemnizados, ao contrário do que se decidiu por erro no Acórdão recorrido;

20º - Pelo exposto e considerando a totalidade dos prejuízos resultantes da cessação do contrato celebrado com a "B……………", o INAC IP deve ser condenado a indemnizar a recorrente no montante de 182.500,00 dólares americanos, equivalente a 163.123,00 Euros, ao câmbio actual;

21º - O Acórdão recorrido ao liquidar todos os danos sofridos pela recorrente nos 62,5 meses que os Tribunais Administrativos entenderam ser de indemnizar, no valor de € 104.875,00 Euros, com recurso à equidade, violou como já se deixou dito o disposto no nº 3 do Artº 566º do Código Civil, na medida em que não tomou em consideração e muito menos ponderou criticamente, como estava obrigada a fazer, nos termos do Artº 607º nº 2º do C.P.C, e nº 3 do Artº 566º do Código Civil, todos os factos provados e nomeadamente aqueles em que a sentença de 2013 tinha assentado a determinação do dano indemnizável, recorrendo ao mesmo princípio de equidade, e chegando ao valor de 618.052,69 Euros;

22º - Na verdade, no Acórdão recorrido desconsideraram-se todos os fundamentos que tinham sido aduzidos e descritos na sentença de 2013 e em que tinha fundamentado a sua decisão, de acordo com a equidade, nomeadamente todos os factos provados em julgamento, e o próprio reconhecimento confessório do Réu, feito nos articulados, e com efeito de prova plena, nos termos do Artº 358º nº 1º do Código Civil, quanto aos rendimentos da recorrente no 4º trimestre de 1994, feito pelo INAC, no valor de 2.967.133$00 mensais, bem como a tendência de crescimento de, pelo menos, 3.5% que a empresa apresentava e que ficou inteiramente provada nos autos.

23º - Nenhum destes factos e fundamentos expressos detalhadamente na página 39 da sentença de 2013, nomeadamente a expressa recepção dos termos da sentença de 2008, foram considerados e muito menos fundadamente e racionalmente ponderados no Acórdão recorrido, como deveriam ter sido e é legalmente imposto pelo Artº 607º nº 3 do Código de Processo Civil, cometendo-se também a nulidade prevista no Artº 615º nº 1°alínea d) do CPC;

24º - Mais do que isso, no Acórdão recorrido reduziu-se, sem o menor fundamento, o rendimento mensal que o recorrido reconhecera, com efeitos confessórios, que a A………. teria tido no último trimestre de 1994 - no valor de 2.967.133$00 mensais (equivalente a 3.000,00 Euros) - por um valor de 1.678,00 Euros mensais, sem qualquer justificação e inclusivé com base num flagrante erro.

25º O referido erro manifesto cometido no Acórdão recorrido consistiu ainda em ter-se encontrado o valor de 1.678,00 Euros mensais, correspondente a um rendimento mensal da recorrente, dividindo por 12 meses a sua receita de 1994 quando ela só pode funcionar durante 10 meses nesse ano!;

22º - Deve ser corrigido o lapso manifesto que a sentença de 2013 cometeu, na página 39, na fixação do valor mensal da receita previsível da exequente no 4º trimestre de 1994, na medida em que o avaliou em 1.978.088$60, (dividindo por três o valor da indemnização reconhecida pelo Réu (5.934.266$00 : 3 = 1.978.088$ 60) quando o valor mensal da perda de receitas no último trimestre de 1994, reconhecido pelo Réu na sua contestação e na sentença de 2/9/2008, era de 2.967.133$00 por mês, calculado com base em dois meses e não em três.

23º - Corrigido esse lapso, com a recorrente atempadamente pediu, o que não foi mais uma vez apreciado, o valor da indemnização pelos lucros cessantes a pagar à recorrente, com recurso à equidade, de acordo com o exacto fundamento contido nas sentenças de 2008 e 2013, é de 14.800,00 Euros/mensais, devendo a indemnização a atribuir à exequente pelos lucros cessantes ser fixada em € 925.000,00 (62,5 meses de perda de receita a indemnizar x 14 800,00/mês = 925 000,00 Euros).

24º - Além disso, o Acórdão recorrido cometeu um outro evidente erro de direito e um desrespeito pelo caso julgado constante dos títulos executivos que são a sentença do TACL de 2/9/2008 e o Acórdão do STA, de 6 de Outubro de 2010, ao desconsiderar os termos destas decisões quanto ao início da contagem dos juros de mora legalmente devidos;

25º - Nessas decisões judiciais, já transitadas em julgado e que devem ser integralmente respeitadas, refere-se o seguinte: "o Réu foi condenado em juros de mora à taxa legal civil sobre o montante apurado em b) (o relativo à indemnização por todos danos emergentes e lucros cessantes, exceptuados os necessários para recolocar a empresa a funcionar) a contar da data desta sentença", ou seja, a contar de 2/9/2008 e ainda na alínea c) do referido acórdão, estabelece-se o seguinte: "Manter em tudo o mais a sentença recorrida";

26º - Do exposto resulta que, a data do início da contagem dos juros de mora legais sobre a quantia a indemnizar pelos danos emergentes e lucros cessantes, se encontra fixada, por decisão transitada em julgado, que este Acórdão devia respeitar, sob pena de violação do caso julgado, em 2 de Setembro de 2008, pelo que não tendo decidido deste modo, por erro de direito, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão deste Tribunal Superior que respeite estas decisões já transitadas em julgado;

27º - Em conclusão, deve o Recorrido, de acordo com toda a prova abundantemente apresentada nos autos, ser condenado a pagar à Recorrente a quantia de 1 195 887,61 Euros, a título de indemnização pelos danos emergentes e lucros cessantes sofridos, bem como os juros civis de mora legal que se venceram desde 2 de Setembro de 2008 até à actualidade (30 de Maio de 2017), no valor de € 414 574,50 Euros, bem como os que se vencerem até integral pagamento, para além da verba destinada à recolocação em funcionamento da empresa recorrente, que deverá ser directamente entregue à recorrente, em virtude de por culpa do INAC que não cumpriu nunca as decisões judiciais, se ter tornado praticamente impossível recolocar a empresa em funcionamento, considerada a idade avançada dos respectivos sócios e os 23 anos passados sobre a cessação da sua actividade.

Só actuando desta forma, como se requer a este Tribunal Superior, se poderá agir em conformidade com o Direito e se mitigará, um pouco, os gravíssimos danos provocados por uma actuação ilegal, culposa e injustificável mesmo, do Poder Executivo sobre a actividade económica privada, esmagada pelo abuso de poder da burocracia e a lentidão insuportável da realização de alguma Justiça!”

3. A R., ora recorrida, ANAC, apresentou contra-alegações que assim conclui (cfr. fls. 940 a 950):

“I. Veio a Recorrente A………….., Lda, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 150.º do (CPTA), interpor Recurso de Revista para o Supremo Tribunal Administrativo (STA) do douto Acórdão de fls., proferido, em 20/04/2017, pelos Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Sul, no âmbito do Processo n.º 10849/14, que, concedeu parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo INAC, I.P. (atualmente designado por ANAC - Autoridade Nacional da Aviação Civil) da decisão final proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, de 17/07/2013, no âmbito do processo n.º 479/00/A, a qual foi revogada na parte em que condenou o réu na indemnização por danos no valor de € 618.052,69, tendo sido decidido ser apenas devido a tal título a quantia de € 104.875,00, e mantendo a condenação do réu ao pagamento de € 66.525,58, a título de indemnização pelo relançamento da empresa, montantes sobre os quais, foi igualmente decidido que acrescem juros de mora à taxa legal contados desde a data da notificação desse acórdão.

II. A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual...", sendo que a jurisprudência dominante deste Venerando Tribunal Administrativo, perante o disposto no n.º 1 daquele preceito da lei adjetiva vem acentuando repetida, uniforme e pacificamente o carácter estritamente excecional deste recurso jurisdicional de revista.

III. E, no preenchimento dos conceitos indeterminados acolhidos pelo legislador – relevância jurídica ou social de importância fundamental da questão suscitada e a clara necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito –, a jurisprudência desse Venerando Supremo Tribunal vem doutrinando e sublinhando que apenas se verifica ocorrer aquela relevância jurídica ou social quando a questão a apreciar seja de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efetuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis.

IV. No que concerne à necessidade da admissão deste tipo de recurso para a melhor aplicação do direito a jurisprudência sublinha, concordante e uniformemente, que há-de resultar da capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular, ou quando suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios, (neste sentido, os acórdãos de 31.03.2011 processos n.° 232/11, da 1ª Secção e de 30.12.2012, e processo n.º 182/12, da Secção de Contencioso Tributário).

V. Ora, neste domínio e no caso presente, não pode acolher-se o entendimento sufragado pela Recorrente, porquanto no requerimento de interposição deste recurso, esta se limita a afirmar, sem minimamente intentar demonstrar, que as identificadas questões assumem particular relevância jurídica e social e que têm virtualidade de expansão para além dos limites da situação singular, em termos de, assim, tornar a admissão deste especial recurso de revista como claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

VI. Neste preciso e decisivo ponto bastou-se a Recorrente com a invocação/alegação sobre as matérias, divergentes as posições assumidas pelo Tribunal recorrido, por recurso ao princípio da equidade, pretendendo apenas ver agora reapreciada a matéria de facto já assente e transitada e julgado, situação que a Lei impede.

VII. A invocada divergência de posições, só por si e tal como vem alegada, traduz apenas e só a declarada discordância da Recorrente com o sentido do decidido pelo Tribuna! Central Administrativo do Sul (TCASul), já em sede de recurso jurisdicional, sendo que esta discordância com o sentido do decidido, por si só, embora suscetível de legitimar/motivar recurso jurisdicional ordinário, se e quando admissível, revela-se para o efeito manifesta e processualmente ineficaz.

VIII. Ainda assim, e designadamente quanto à referida capacidade de expansão da controvérsia porventura legitimadora da admissão da requerida revista excecional, importa referir, que estamos perante uma situação pontual em que, não é, seguramente, particularmente complexa ou melindrosa do ponto de vista jurídico, nem revestindo uma importância fundamental do ponto de vista social.

IX. Ao que acresce, que a Recorrente nem sequer invoca que doutrina e/ou jurisprudência se tenham vindo a pronunciar em sentido contrário sobre a questão da equidade, tornando, desse modo, necessária a sua clarificação para se obter uma melhor aplicação do direito.

X. Aliás, nem a Recorrente alega nem o sindicado aresto evidencia, sobre os controvertidos pontos apontados, decisão ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, em termos de poder qualificar-se como suscetível de integrar "erro grosseiro ou decisão descabidamente ilógica e infundada ...".

XI. A decisão do TCASul por recurso à equidade, ainda que se admita atacável para o efeito ora pretendido, por violação de lei substantiva ou processual nos termos do artigo 152.º n.º 2 do CPTA, fundamentação que não logrou a Recorrente invocar no seu requerimento, teve por base a matéria assente nos autos, pese embora a discordância manifestada pela Recorrente na apreciação da mesma.

XII. É certo que as questões suscitadas conheceram decisão diversa das instâncias chamadas a decidir – o Tribunal de 1ª Instância, STA e TCASul, em sede de recurso jurisdicional ordinário, mas em nenhuma dessas instâncias anteriores a Recorrente colocou em causa o recurso ao princípio da equidade.

XIII. O Tribunal ora recorrido – o TCASul – decidiu com base nos factos materiais da causa fixados, sendo certo que, nos termos do n.º 4 do artigo 150.º do CPTA "O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista...".

XIV. Na verdade, para se aferir da violação das alegadas disposições legais nos termos em que o Recorrente o invoca, sempre se teria que apreciar previamente a matéria de facto já que a questão de direito que se suscita não é definível em abstrato, variando caso a caso, com a questão concreta apresentada no processo e com a interpretação do julgador na situação específica, radicando o Acórdão recorrido num quadro factual determinado.

XV. Daí que, e sempre com o douto suprimento de V. Exas., se considera não ser aqui manifestamente o caso de lançar mão da "válvula de segurança do sistema" que o legislador cuidou de apontar na Exposição dos Motivos das Propostas de Lei n.º 92A/II e 93A/III e que precederam a consagração deste recurso excecional de revista.

XVI. Acresce que, ao contrário do alegado pela Recorrente, as questões colocadas e a solução encontrada pelas instâncias, já sindicada em sede de recurso ordinário, repita-se, não revela, como cumpriria, para este efeito particular – admissão do recurso especial de revista –, qualquer capacidade de expansão para além dos limites da situação particular em que se verificou, pois se ateve aos estreitos limites da particular factualidade subjacente.

XVII. Termos em que, se requer a V. Exas. a não admissão do recurso de revista nos termos em que o mesmo foi apresentado pela Recorrente A…………, Lda., atentos os fundamentos invocados, por não se verificarem preenchidos os pressupostos de admissão estabelecidos nos n.ºs. 1 e 2 do artigo 150.º do CPTA.

XVIII. Para o caso de assim não se considerar e o recurso ser conhecido, entendemos então que esse Venerando Tribunal deverá proceder à correta aplicação do direito e dissipar quaisquer dúvidas sobre o quadro legal que regula as situações ora em crise nos termos e com os fundamentos seguintes:

XIX. Quanto à questão da Liquidação judicial da indemnização devida há 18 anos, importa desde logo referir e clarificar que, ao contrário do que a Recorrente alega, não existiu ainda qualquer sentença ou acórdão, transitados em julgado que condenassem a ANAC ao pagamento de qualquer quantia, pelo que não impende sobre a ora Recorrida a obrigação de liquidação das decisões invocadas.

XX. No que respeita à sentença de 2/09/2008, proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, invocada pela Recorrente nas suas alegações de recurso, foi a ANAC condenada, entre outros, ao pagamento de indemnização pelos danos que advirão para a autora com o relançamento da sua atividade, em montante a liquidar em execução de sentença, tendo como limite máximo 29.868 euros.

XXI. Posteriormente, pelos mui doutos acórdãos proferidos na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 2 de Junho e de 6 de Outubro de 2010, juntos como Docs. 1 e 2 da Execução, já transitados em julgado, foram considerados completamente arbitrários os cálculos utilizados pelo Tribunal "a quo" para quantificação dos danos sofridos pela A. ora Recorrida, pelo que, foi decidido, no que à presente questão importa, conceder parcial provimento ao recurso do Réu INAC e, consequentemente, ordenar que a fixação e apuramento dos danos sofridos com o facto ilícito, acima delimitados, sejam relegados para execução de sentença e manter em tudo o mais a sentença recorrida...".

XXII. Ficou assim assente que, por acórdão do STA, tanto o apuramento dos danos sofridos com o facto ilícito, como os danos que advirão para a Recorrida A……….. com o relançamento da sua atividade, foram deixados para liquidação em execução de sentença, sendo que quanto ao apuramento destes últimos danos (relançamento da atividade) o Tribunal Administrativo de Círculo, na sua sentença referida supra limitou esta indemnização ao valor máximo de 29.868,00 €, sendo que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, quanto a este ponto manteve a sentença recorrida.

XXIII. Resulta assim claro e inequívoco que relativamente ao apuramento dos sofridos com o facto ilícito, bem assim como os danos que advirão para a Recorrente, com o relançamento da sua atividade, os mesmos seriam apurados em sede de liquidação em execução de sentença, mas tendo sempre como limite máximo o valor de 29.868,00 Euros, no que aos últimos danos se refere.

XXIV. Não é assim correto o alegado pela Recorrente quando refere que foi "liquidada a indeminização a pagar pelo INAC", e que a ANAC não procedeu "à execução voluntária dos Acórdãos do STA, no ano de 2010, não obstante a ora Recorrente lho ter solicitado....", pois como é do conhecimento da Recorrente, a Recorrida nunca poderia proceder à execução voluntária das mencionadas decisões, na medida em que nunca foram efetivamente liquidadas quaisquer quantias a título de indeminização.

XXV. Não se concorda assim que a Recorrente A…………., face aos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo supra referenciado, tenha intentado uma ação executiva para pagamento de quantia certa, junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, nos termos do disposto no artigo 170.º do CPTA.

XXVI. E quanto a este ponto foi oportunamente invocado pela ora Recorrida ANAC que a ora Recorrente A……….. se socorreu de um meio processualmente inadequado para executar os referidos Acórdãos, devendo a ação executiva apresentada pela A………… ter sido, logo, em 1ª primeira instância, indeferida liminarmente, tal como requerido pela ora Recorrida ANAC, aquando da oposição à execução, isto porque, os referidos Acórdãos não condenaram a ora Recorrida ao pagamento de qualquer quantia certa, líquida e exigível, pelo que, desde logo, não se verificaram os requisitos legalmente previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 170.º CPTA.

XXVII. Concluindo-se assim, que não podia vir a ora Recorrida, ao abrigo do n.º 2 do mesmo artigo, requerer a respetiva execução, tal como o fez, socorrendo-se de um meio processualmente inadequado, razão pela qual deveria ter sido, logo na primeira instância a ação executiva intentada indeferida liminarmente.

XXVIII. Acresce que a Recorrente alega que a Recorrida foi condenada ao pagamento de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo relançamento da atividade, sendo certo que, como já anteriormente referido, foi fixado como limite máximo indemnizatório para o relançamento da atividade Recorrente a quantia de 29.868,00 € (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros).

XXIX. Sendo que a este respeito o tribunal "a quo" entendeu não dar razão à ora Recorrida pois que segundo o TCASul "resulta do acórdão preferido pelo STA em 6/10/2010, que o limite mínimo dessa indeminização é de €29.868....".

XXX. Ora, não pode a ora Recorrida concordar com a posição do Tribunal "a quo" porquanto nos autos e nos acórdãos proferidos anteriormente, quer pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, quer pelo Supremo Tribunal Administrativo, facilmente se verifica que a decisão proferida enferma de erro, bastando para tal ler a fundamentação inserida no ponto 2.2.2. do acórdão para se extrair facilmente esta conclusão.

XXXI. Aliás, este é um ponto que merecer inclusive a concordância da ora Recorrente, porquanto a mesma quando intentou a ação executiva alega que, relativamente à indemnização para o relançamento da atividade, embora preveja gastar o montante de €66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), requer expressamente, apenas, o pagamento de €29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros), considerando, naturalmente, o limite máximo que já se encontrava fixado quer pela sentença de 1.ª instância, quer depois confirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo.

XXXII. Conclui-se assim inexistir qualquer dever de liquidação da indeminização nos termos alegados pela Recorrente, sendo certo que o decurso de tempo entretanto ocorrido (18 anos) não se pode imputar à ora Recorrida.

XXXIII. Quanto ao alegado valor dos danos emergentes sofridos pela A………… Lda., cumpre referir que, expressamente a Sentença do Tribunal de Círculo de Lisboa o seguinte, que se transcreve por comodidade de leitura:

"...Danos emergentes (...)

Para prova dos danos identificados em a) a Autora apresenta as declarações de modelo 22, relativas aos anos de 1993 a 2000 sendo certo que para determinação do tipo de danos que invoca não podem ser exclusivamente considerados os custos ou despesas que teve durante esses períodos como deveriam ter sido considerados os proveitos que auferiu sendo certo que atenta a fundamentação do acórdão do STA em que se funda a execução da sentença, no âmbito desta execução deveria ter feito prova da impossibilidade de exercer a parte da sua actividade que só a posse o certificado JAR permitiria.!...)

Os custos peticionados coincidem com a totalidade dos custos dos exercícios, mas tais custos não podem ser imputados na totalidade à Ré, e, desde logo, porque, embora com pouca repercussão houve prestação de serviços, nos exercícios de 1995 a 1998.

Por outro lado, os custos do exercício engloba, custos com pessoal, custos com mercadorias vendidas e das matérias consumidas, fornecimentos externos, impostos, amortizações, e não apenas com pessoal, rendas e encargos financeiros com a aquisição de equipamento e matérias primas, pelo que haveria sempre que determinar a proporção dos custos que seriam imputados aos proveitos obtidos nesses períodos.

Entendeu o STA que seria necessário determinar a proporção da actividade exercida sob o certificado suspenso para fixar uma base sólida de determinação dos prejuízos sofridos.(...)

Ao que acresce que e no que respeita aos proveitos evidenciados nas declarações de rendimentos veio agora a Autora alegar que os mesmos respeitam a venda de stocks. Porém, é possível verificar que, embora em menor volume, 1995 a 1997 a Autora realizou prestações de serviços. A alusão nas declarações de rendimentos no que respeita a vendas pode eventualmente respeitar a venda de stocks/inventário, como alegado, ou até imobilizado, porém, não é confirmada pela declaração de rendimentos respeitante de 1995 a 2000 a existência nem de stocks, nem de venda de imobilizado, nesses períodos.(...)

Apesar da evidência de factos que permitem dizer que a exequente deve ser indemnizada não se nos afigura que, com a prova produzida nesta sede que se tenha efectuado prova da totalidade dos prejuízos que a exequente peticiona em concreto.(...)

Como se verifica da prova, não ficámos elucidados porque razão quer a autora fazer crer ao Tribunal que o contrato com esta empresa iria durar para além dos três anos.

Temos certo que o contrato tinha a duração de 3 anos sendo que em Janeiro de 1995 cessou. Desconhece-se, porém o início desse contrato e os termos do mesmo.

Ao contrário do que a autora referiu no seu requerimento executivo, no requerimento de fls 338 a 340 (na pág. 2) limita esse contrato entre 1995 a 1998, e na mesma página faz referência à sua vigência entre Janeiro de 1995 e 15 de Janeiro de 2000.

Se as aeronaves da B………….. já constavam da lista do Certificado JAR em Dezembro de 1993 quando a Autora foi certificada é-nos permitido concluir que, pelo menos em 1994, a Autora prestaria serviços a essa empresa.

Pelo que, seria indemnizável este dano em concreto nos anos de 1995 e 1996.

Porém, não resultam provados termos e valores do contrato: se 100 dólares americanos ao dia (3.100 dólares ao mês) quer se fizesse ou não a manutenção, como é alegado. Nem na acção principal nem nesta foi junto o contrato e a prova testemunhal é vaga (…).

Lucros cessantes

Entende a Autora que considerando a receita mensal auferida no terceiro trimestre de 1994, no valor de €7.579,71 (1.515.942$00) será este o valor mínimo que a empresa deixou de auferir nos 62,5 meses em que não pode exercer a sua actividade, valor que deverá ser acrescido a partir de 1995 de uma taxa de crescimento de 25%.

A Autora aplica aqui o critério que foi aplicado pelo tribunal de primeira instância a que acresce uma taxa de 25%, pelo crescimento da actividade (algo diferente da taxa que peticiona na acção principal de 20%.

Porém não se provou que o crescimento de uma actividade como a que a Autora exercia tinha um crescimento de 25% (ou de 20%).(...)

Como se sabe o lucro cessante, no caso, corresponde aos prejuízos causados pela interrupção da actividade da empresa, por não poder inspeccionar, manter ou reparar as aeronaves considerando que a Autora viu suspenso o único certificado de que dispunha.

Para haver prejuízo decorrente de lucros cessantes (frustração de ganhos), a Autora teria de ter provado que a paralisação da sua actividade decorrente da suspensão do certificado fez diminuir a sua actividade o que efectivamente provou e designadamente se verifica através declaração de rendimentos, uma vez que a prestação de serviços diminuíram consideravelmente e, daí resultando perda de receitas com a consequente perda de lucros.

De tudo o que se disse verifica-se, pois, que com a prova ora produzida não é possível reconhecer que a exequente deverá ser indemnizada pelos danos peticionados, sendo que o recurso à equidade é o único possível..."(realce e sublinhado nossos)

XXXIV. E sob a égide do princípio da equidade, entendeu, também, o Tribunal "a quo", que "Decorre das declarações de IRC apresentadas pela exequente, levadas ao quadro constante de fls. 2 a 30 da sentença recorrida que a exequente em 1994, ano em que terá laborado em pleno por ser detentora do certificado JAR 145, apresentou um resultado líquido de 4.028.088$00, ou seja, cerca de € 20.140, o que é um dado objetivo, a que correspondem cerca de € 1.678 mensais e que se não tivesse pedido o referido certificado nos 62,5 meses seguintes, teria obtido no mínimo o mesmo resultado, a que corresponderá a quantia total de €104,875, valor que temos por suficiente para indemnizar os danos sofridos, considerando também que em 1995, 1998 e 1999 foram apresentados resultados líquidos negativos."

XXXV. Resulta assim que ambos os Tribunais recorreram à equidade, pese embora tenham tido entendimentos diferentes no que respeita à fixação do quantum indemnizatório.

XXXVI. Porém, e ainda que não se discorde da base de cálculo que esteve subjacente à determinação do valor a indemnizar – Declaração do IRC relativa ao ano de 1994, o mesmo enferma de erro ao basear-se no resultado líquido mensal de 1.678,00 €, considerando como um dado objetivo e certo que, se não tivesse perdido o referido certificado, teria obtido no mínimo esse mesmo resultado nos 62,5 meses seguintes.

XXXVII. Ora, este raciocínio para além de não ser verosímil, não é correto, porquanto no resultado líquido apresentado já se encontra refletido o valor do alegado contrato de assistência técnica celebrado com a empresa B…………..

XXXVIII. A este propósito ter-se-á que atender à matéria dada como provada nas alíneas o) e p) da sentença do TACL, transitada em julgado, a qual não foi suficiente para dar como provado a existência de um contrato que iria durar para além dos 3 anos, visto nunca terem sido provados o início desse contrato e os termos do mesmo, conforme resulta de fls. 571 e 572 da referida sentença, não tendo conseguido a Recorrente provar a data do início, os termos, nem tão pouco os valores do contrato.

XXXIX. Neste sentido, o valor líquido considerado de 20.140,00 €, que corresponderia ao resultado líquido apurado na declaração do IRC relativamente ao ano de 1994, teria também nele incluído os montantes recebidos da B……………… nesse ano à ora Recorrente, no ano de 1994 o contrato com a B…………… já estaria a vigorar.

XL. Pelo que, ao valor ora considerado pelo Tribunal "a quo", para base de cálculo - resultado líquido do exercício do ano de 1994 (20.140,00 €), sempre teria que ser subtraída a fatia correspondente ao fornecedor/cliente, B…………. e a mesma não ser contabilizada para efeitos de quantum indemnizatório nos 62.5 meses considerados.

XLI. Nem na ação principal nem na execução a ora Recorrente fez prova concreta dos danos e respetivo montante quando tal se lhe impunha, pelo que toda a argumentação aduzida pela Recorrente no ponto IV das suas alegações relativamente ao valor dos danos emergentes não pode proceder por não provada, não podendo, nesta sede, ser reapreciada a matéria de facto já amplamente discutida e assente nos autos, pelo simples facto do acórdão do Tribunal "a quo" ter decidido em sentido diverso, situação como se viu está vedada nos termos da lei.

XLII. Por último e relativamente ao erro na determinação dos juros de mora devidos e do desrespeito do caso julgado alegado pela Recorrente importa referir que não tem, mais uma vez, razão, atenta à sentença recorrida proferida pelo Tribunal Administrativo de Lisboa de 17/07/2013, de onde resulta que os juros não são devidos desde 02/09/2008, não existindo qualquer erro nesta sede.

XLIII. Mais uma vez e em conclusão, reitera-se o já anteriormente alegado que não existiu, até à presente data, qualquer condenação em quantia certa, líquida e exigível que imponha o pagamento de juros.

TERMOS EM QUE, e nos melhores de direito, sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, se requer a este Supremo Tribunal, que o presente recurso de revista não seja admitido por falta de fundamentos legais de admissão.

Caso assim não se considere e o recurso seja conhecido por este Venerando Tribunal, requer-se a V. Exas que procedam à correta aplicação do direito no sentido de dissipar quaisquer dúvidas sobre o quadro legal que regula as situações ora em crise, fazendo-se desta forma inteira

JUSTIÇA”.

4. Quanto ao recurso de revista apresentado pela R, ora recorrente, ANAC, esta mesma apresentou alegações, concluindo deste modo:

“I. Vem o presente recurso de direito interposto do douto Acórdão de fls., proferido pelos Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Sul, no âmbito do Processo n.º 10849/14, que, concedeu parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo INAC, IP. (atualmente designado por ANAC - Autoridade Nacional da Aviação Civil) da decisão final proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, de 17/07/2013, no âmbito do processo nº. 479/00/A, a qual foi revogada na parte em que condenou o réu na indemnização por danos no valor de € 618.052,69, tendo sido decidido ser apenas devido a tal título a quantia de € 104.875,00, mantendo-se a condenação do réu ao pagamento de € 66.525,58, a título de indemnização pelo relançamento da empresa. Ficou ainda decidido que a tais montantes acrescem juros de mora à taxa legal contados desde a data da notificação deste acórdão.

II. Nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 150.º do CPTA o recurso de revista tem natureza excecional e é somente admitido quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma fundamental importância ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito,

III. Com efeito, não pretendendo o ora recorrente socorrer-se deste meio processual para, por si só, apontar a sua discordância com o decidido pelo tribunal a quo, atenta a excecional admissibilidade da revista – art. 150º n.º 1 e 5 do CPTA, ainda assim, considera a admissão do presente recurso crucial para uma melhor aplicação do direito, atenta a forma pouco consistente ou até mesmo contraditória com que algumas questões relevantes foram tratadas pelos tribunais ‘a quo’, bem como não se pronunciou sobre questões que devia ter apreciado o que levou à existência da condenação em quantidade superior, concluindo-se pela manifesta necessidade de intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para se proceder à correta aplicação do direito e dissipar quaisquer dúvidas sobre o quadro legal que regula as situações ora em crise.

IV. A recorrida A……….. intentou uma ação executiva para pagamento de quantia certa junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa nos termos do disposto no artigo 170.º do CPTA.

V. Por sentença de fls., proferida pela Meritíssima Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no âmbito do Processo n.º 479-A/2000, que, com recurso à equidade, julgou parcialmente procedente a presente ação, tendo:

a) Condenado parcialmente o R. INAC, I.P. no pagamento à A. a título de indemnização por danos o valor de 618.052,69 Euros;

b) Condenado parcialmente o R. INAC, I.P., no pagamento à A, a título de indemnização pelo relançamento da atividade, o valor de 66.524,58 Euros;

c) Condenado ainda o R. INAC, I.P. ao pagamento à A. de juros de mora sobre os montantes apurados em a) e b), a contar da presente sentença;

VI. A R. ANAC, ora Recorrente, não se conformou com a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, tendo apresentado recurso da decisão proferida com base fundamentalmente nas seguintes questões:

I - Da impugnação do despacho proferido pelo Tribunal de Círculo de Lisboa a fls. 307, relativo ao meio processual inadequado nos termos do n.º 5 do artigo 142.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos;

VII. Nesta sede foi alegado pela Recorrente que a ora Recorrida se socorreu de um meio processualmente inadequado para executar os referidos Acórdãos, devendo a ação executiva apresentada pela ora Recorrida ter sido, logo na primeira instância, indeferida liminarmente, tal como requerido pelo ora Recorrente, aquando da oposição à execução;

VIII. Ora o tribunal "a quo" relativamente a esta matéria, no acórdão proferido limita-se a referir que a Recorrente "em rigor apenas se impugna a sentença final proferida nos autos, conforme decorrer do requerimento de interposição, a folhas 583 dos autos e não também o despacho interlocutório proferido a fls. 307 e 308 dos autos, que considerou não ocorrer erro na forma de processo por se no processo executivo «enxertada ação declarativa para apuramento dos danos sofridos pela prática dos atos ilícitos», não obstante o referido nas conclusões V e XIV, verificando-se em qualquer caso que a ocorrer erro na forma do processo, a executada não viu prejudicado o seu direito de defesa, conforme decorre da oposição apresentada a fls. 248 e segs e destas próprias alegações jurisdicionais, pelo que a questão suscitada é neste momento inócua";

IX. Salvo o devido respeito mal andou o Tribunal "a quo" quando, em vez de analisar a questão apresentada e respetiva argumentação limitou-se a referir que a questão suscitada é inócua não se pronunciando sobre se o meio processual utilizado pela recorrida foi o adequado ou não;

X. Por outro lado, não se entende a afirmação constante do acórdão de que a Recorrente em bom rigor não recorreu do despacho interlocutório proferido a fls. 307 e 308 dos autos, na medida em que o requerimento de recurso foi tempestivamente interposto na altura devida e seguido todos os trâmites legais;

XI. Era dever do tribunal "a quo" analisar esta questão de primordial importância, na medida em que se verifica que efetivamente a Recorrida quando intentou a ação executiva utilizou um meio processual impróprio;

Senão vejamos:

XII. A Recorrida, face ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que relegou para liquidação em execução de sentença, o apuramento dos danos sofridos com o facto ilícito, bem como o apuramento dos danos que adviriam para a Recorrida A……….. com o relançamento da sua atividade, requereu perante o Tribunal de Círculo de Lisboa ".., ao abrigo do disposto nos Artºs 157º nº1 e 170 nº 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável a este processo executivo, "ex vi" do disposto no Art. 5º nº 4º da Lei nº 15/2002, de 22 de Fevereiro…" a execução dos doutos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo;

XIII. Sucede porém que, os referidos Acórdãos não condenaram o ora Recorrente ao pagamento de qualquer quantia certa, líquida e exigível, pelo que, desde logo, não se verificaram os requisitos legalmente previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 170º CPTA

XIV. Isto porque o apuramento quer dos montantes referentes aos danos sofridos, quer os considerados necessários para o relançamento da atividade nunca foram fixados nem apurados na ação principal, não tendo sido possível fixar qualquer quantia certa, que obrigasse ao seu pagamento em sede de execução espontânea, no prazo de 30 dias após o seu trânsito em julgado conforme dispõe o n.º 1 do artigo 170.º do CPTA;

XV. Pelo que a ora Recorrida se socorreu de um meio processualmente inadequado para executar os referidos Acórdãos, devendo ter sido, logo na primeira instância a ação executiva apresentada pela ora Recorrida indeferida liminarmente, tal como requerido pelo ora Recorrente, aquando da oposição à execução;

XVI. Sem conceder, e a admitir-se que a Recorrida deduziu o incidente de liquidação de sentença na execução intentada, para além de terem sido violados os trâmites legalmente estabelecidos para deduzir o referido incidente de liquidação em execução de sentença, estar-se-ia a coartar o direito ao contraditório, pondo em causa os direitos de defesa do ora Recorrente, porquanto, o disposto no artigo 171º do CPTA apenas lhe permite deduzir oposição fundada na invocação de facto superveniente, modificativo ou extintivo da obrigação;

XVII. Assim, e salvo melhor e mui douto entendimento existiu um erro na forma de processo, porquanto a ora Recorrida usou uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, consubstanciando este erro uma exceção dilatória, devendo a Recorrente ter sido absolvida da instância com as demais consequências, absolvição que desde já se requer;

XVIII. Em cumprimento dos acórdãos da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, podia e devia a ora Recorrida ter lançado mão dos meios legalmente colocados ao seu dispor nos termos do artigo 661.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, – incidente de liquidação de sentença – (por referência ao disposto nº 6 do artigo 95.º do CPTA), em vez que de requerer a execução para pagamento de quantia certa prevista no artigo 170.º do CPTA.

XIX. Acolhendo-se a jurisprudência dominante a respeito desta matéria aplicável à data ao presente processo, tendo em conta as alterações legislativas ocorridas e data da propositura da presente ação executiva, (vide entre outros Ac. do STJ, de 03-02-2009, no âmbito do processo n.º 08A3942) "…se apesar de provado o dano, não foi possível atingir-se na fase que vai até à Sentença um valor exato para a sua quantificação, mas seja admissível que ainda é possível atingi-lo com recurso a prova complementar sobre o montante exato ou muito próximo dos danos reais, não deve passar-se para a fase executiva na parte em que a condenação ainda não esteja líquida, sendo o instrumento adequado o incidente de liquidação previsto nos arts. 378º n.° 2 e 47.º n.º 5º na redação que lhes foi dada pelo DL n.º 38/2003, de 8 da Março…" e que quando "...não seja possível a determinação do quantum indemnizatório por meras operações aritméticas, a ter de haver liquidação prévia, insere-se ela hoje ainda na fase declarativa da ação, atento o disposto nos arts. 47.º n.º 5 e 378.º n.º 2 do CPC, na redação emergente do DL 38/2003, de 08/03…";

XX. Sendo que em sede de execução de sentença o CPTA dispõe de outros meios processuais, como sejam a Execução da sentença da anulação de atos administrativos que no entendimento do ora Recorrente seria o meio processual próprio para a ora recorrida fazer valer a sua pretensão, atento o disposto no artigo 173.º e ss. do CPTA, pelo que e também por esta via estaríamos perante um erro na forma do processo, que consubstancia à semelhança do acima já sufragado uma exceção dilatória.

XXI. Pelo exposto considera-se que o Tribunal "a quo" não se pronunciou relativamente a esta matéria, ou seja, se o meio processual utilizado pela recorrida foi ou não o correto. Ou então, a considerar-se que se pronunciou, tal pronúncia não se encontra fundamentada de facto e de direito, existindo, desde logo, uma violação das alíneas b) e d) do n.º1 do artigo 665.º do CPC aplicável por força do artigo 666.º do CCP;

XXII. Tendo como consequência a nulidade da sentença, que se requer desde já;

II - A condenação do Recorrente ao pagamento da € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo relançamento da atividade em violação, consecutiva, do limite máximo indemnizatório fixado para o relançamento da atividade da Autora enferma de nulidade a sentença por excesso de pronúncia nos termos da alínea e) do artigo 615º do CPC e violação do caso julgado.

XXIII. Nesta sede foi invocado pela recorrente, em sede recurso, que a sua condenação ao pagamento de €66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros a cinquenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo relançamento da atividade era nula, por violação da alínea e) do nº 1 do artigo 615.º do CPC, bem como existe a violação do caso julgado, na medida em que foi fixado como limite máximo indemnizatório para a relançamento da atividade da Autora a quantia de 29.868,00 € (vinte e novo mil, oitocentos e sessenta e oito euros);

XXIV. Sendo que a este respeito tribunal "a quo" entendeu não dar razão à Recorrente "pois que resulta do acórdão proferido pelo STA em 6/10/2010, que o limite mínimo dessa indemnização é de € 29.868…";

XXV. Também aqui não se pode concordar nem se alcança a posição do Tribunal "a quo" na medida em que bastava verificar os autos e os acórdãos proferidos anteriormente, quer pelo Tribunal administrativo de círculo de Lisboa, quer pelo Supremo Tribunal Administrativo, para facilmente se perceber que a decisão proferida enferma de erro;

XXVI. Foi a ora Recorrente condenada por sentença de 2/09/2008, proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ao "…pagamento da indemnização pelos danos que advirão para a autora com o relançamento da sua atividade, em montante a liquidar em execução de sentença, tendo como limite máximo 29.868 Euros.''

XXVII. Recorrendo-se dessa sentença para o Supremo Tribunal de Justiça, foi proferido o acórdão em 02/06/2010. E desse acórdão a Recorrida através da apresentação de um requerimento em 22/06/2010, suscitou a nulidade do mesmo por omissão de pronúncia, considerando que o mesmo, não apreciou a questão da fixação do limite, e que em seu entender, devia ter sido fixado como limite mínimo e não como limite máximo;

XXVIII. Em resposta a esse requerimento o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido em 06/10/2010, decidiu que efetivamente a recorrida tinha razão relativamente à omissão de pronúncia, existindo um deferimento relativamente a esta parte - ponto i), mas julgando improcedente a pretensão da Recorrida relativamente ao facto de a mesma querer que o valor fixado de 29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros) fosse considerado como valor mínimo e não como máximo (sublinhado nosso);

XXIX. Aliás, basta ler a fundamentação inserida no ponto 2.2.2, do acórdão para se extrair facilmente esta conclusão, ou seja, o Supremo Tribunal de Justiça, repete-se, embora julgado procedente a arguida omissão de pronúncia relativamente a esta questão, julgou improcedente a pretensão da Recorrida relativamente a considerar-se o valor de € 29,868 como valor mínimo e não máximo;

XXX. Mantendo, nesta parte, a sentença recorrida (alínea c) do acórdão) que condenou a Recorrente ao "...pagamento da indemnização pelos danos que advirão para a autora com o relançamento da sua atividade, em montante a liquidar em execução de sentença, tendo como limite máximo 29.868 Euros" (sublinhado e negrito nossos);

XXXI. Aliás, este é um ponto que merece inclusive a concordância da Recorrida, porquanto a mesma quando intentou a ação executiva alega que, relativamente à indemnização para o relançamento da atividade, embora preveja gastar o montante de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), requer apenas o pagamento de € 29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e oito euros);

XXXII. Sucede, porém, que, em sede de processo executivo, inexplicavelmente a ora recorrente, foi condenada pelo Tribunal de Círculo de Lisboa ao pagamento da quantia de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo relançamento da atividade, tendo aquele tribunal cometido um erro grosseiro ao ter excedido os seus poderes de cognição quanto ao pedido e à causa da pedir, em violação da regra da identidade de causa de pedir e de causa de julgar;

XXXIII. Erro grosseiro esse que, surpreendentemente, veio o Tribunal "a quo" também cometer, na medida em que mantêm a decisão anterior, que como se viu estava eivada de nulidade;

XXXIV. Ora, estabelece a alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC que é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior à do pedido, verificando-se esta nulidade, relativamente à condenação do Recorrente no pagamento de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos a vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), a título de indemnização pelo relançamento da atividade, quando o limite máximo peticionado pela Recorrida A…………., decidido e confirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo foi de €29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros);

XXXV. Por outro lado, além de o acórdão ser nulo por violação da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC e uma vez que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, quanto a este ponto em concreto, transitou em julgado em novembro de 2010, não podia vir posteriormente o Tribunal de Círculo de Lisboa e o Tribunal Central Administrativo pronunciarem-se sobre a mesma questão e em sentido contrário, consubstanciando uma violação clara do caso julgado, considerando-se que a decisão do tribunal "a quo" nula no ponto em que condena o Réu no pagamento de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), a título de indemnização pelo relançamento da atividade, também por violação de caso julgado;

III - Da Falta de Fundamentação para a condenação da Recorrente ao pagamento de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo relançamento da atividade - Nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito nos termos da alínea a) do artigo 615.º do CPC.

XXXVI. Não obstante o limite máximo estabelecido pelo Supremo Tribunal Administrativo para o relançamento da atividade ter sido de €28.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros), o que é facto é que a Recorrida não logrou provar, sequer, que pretende relançar a sua atividade, nem tão pouco, que as faturas pró-forma apresentadas, sejam efetivamente para relançamento da mesma, tendo a Recorrente em sede de recurso alegado que não foi efetuada nenhuma prova de que efetivamente a Recorrente iria relançar a sua atividade e quais os custos desse relançamento, alegando nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito nos termos da alínea a) do artigo 615.º do CPC;

XXXVII. E nesta sede o Tribunal "a quo" limitou-se a referir que "…ficou reconhecido o direito de indemnização a tal título, não podendo haver lugar à pretendida prova do efetivo relançamento da actividade exequente.

XXXVIII. Ora tal argumento não pode nunca proceder, nem tão pouco se percebe o sentido e alcance de tal afirmação, na medida em que se assim fosse não teríamos os tribunais superiores anteriores (no âmbito do processo n.º 200/09) a decidir e a acordar que o apuramento e quantificação desses custos para o relançamento da atividade seriam relegados para liquidação de sentença;

XXXIX. E, efetivamente, a Recorrida, não fez qualquer prova desses danos ou custos para o relançamento da atividade, tão somente juntou fatura pró-forma de um veículo automóvel e equipamento, tendo a Recorrente conhecimento, porque é a entidade que licencia esta atividade, que Recorrida não irá nunca relançar a sua atividade;

XL. Note-se que estamos perante uma atividade que necessita de licenciamento e de uma certificação específica, cujos requisitos para se obter o licenciamento são muitos diferentes e mais exigentes do que à data de 1993/1994. Ademais, e relativamente a esta matéria chama-se à colação os seguintes factos da matéria dada como provada e já transitada em julgado:

(...)

b) A sociedade autora foi constituída por decisão, esforço e com o capital dos seus dois sócios e únicos técnicos; (…)

d) O exercício da atividade da autora dependia dos conhecimentos especializados dos referidos dois sócios; (…)

g) A autora assentava a sua capacidade técnica em dois elementos especializados, no exercício da sua actividade especializada com elevado grau de tecnicidade e um curriculum profissional extenso e larga experiência no exercício de funções de chefia;

XLI. Resultou, assim provado que o exercício da atividade dependia da capacidade técnica dos seus dois sócios à altura, sócios que à data já se encontravam reformados, não parecendo plausível que à data de hoje – junho de 2017, venham a proceder ao relançamento da atividade. Aliás, nunca em tal período de tempo (17 anos desde a propositura da ação e quase 23 anos após a retirada do certificado), a Recorrida apresentou qualquer requerimento junto do departamento da Recorrente no sentido de relançar a sua atividade ou requerer o que quer que fosse;

XLII. Pelo que, o valor a pagar a título de indemnização pelo relançamento da atividade só poderá ser tido em conta após a recorrida efetuar prova que de facto irá relançar a sua atividade, sob pena de enriquecimento ilícito, sendo que o Tribunal "a quo" nesta sede também mal andou quando não fundamentou, nem de facto, nem de direito a sua posição de manter a sentença recorrida, limitando-se a erradamente dizer que não pode haver lugar à pretendida prova do efetivo relançamento da atividade;

XLIII. Pelo que também nesta sede, a sentença também é nula, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, uma vez que nem o tribunal de Círculo de Lisboa, nem o tribunal "a quo" fundamentaram nem de facto, nem de direito, a condenação da recorrente a título de indemnização pelo relançamento da atividade, nulidade esta que se invoca;

III - Da condenação do Recorrente ao pagamento de € 104.875,00 (cento e quatro mil, oitocentos e setenta e cinco euros) a título de indemnização por danos – Recurso à equidade.

XLIV. Em relação a esta parte, entendeu a sentença do Tribunal de Círculo de Lisboa recorrer à equidade porquanto, tal como resulta da mesma sentença "…no caso sub Júdice efectivamente apesar da alegação dos factos no requerimento executivo, ser parca e já lá vão alguns anos, o que torna difícil a prova dos mesmos mas, os autos não deixam de estar informados de elementos fácticos suficientes para permitir o recurso à equidade…";

XLV. E sob a égide do princípio da equidade decidiu o Tribunal "a quo", o seguinte: "Decorre das declarações de IRC apresentadas pela exequente, levadas ao quadro constante de fls. 2 a 30 da sentença recorrida que o exequente em 1994, ano em que terá laborado em pleno por ser detentora do certificado JAR 145, apresentou um resultado líquido de 4028.088$00, ou seja, cerca de € 20,140, o que é um dado objetivo, a que correspondem cerca de € 1678 mensais e que se não tivesse pedido o referido certificado nos 62,5 meses seguintes, teria obtido no mínimo o mesmo resultado, a que corresponderá a quantia total de € 104,875, valor que temos por suficiente para indemnizar os danos sofridos, considerando também que em 1995, 1998 e 1999 foram apresentados resultados líquidos negativos.";

XLVI. Resulta assim que o Tribunal "a quo", embora decidindo à mesma, por recurso à equidade, fixou a indemnização em 104.875,00 €, em vez do valor de 618.052,58 € fixado pelo Tribunal de Círculo de Lisboa;

XLVII. É certo que a Recorrente, em sede de recurso apresentado para o Tribunal de Central Administrativo alegou a existência da nulidade da sentença por recurso à equidade nos termos em que aquele Tribunal o fez, na medida em que se entende que o recurso à equidade tem um vasto campo de aplicação na determinação do montante dos danos de natureza não patrimonial, adquirindo um valor residual ou subsidiário, como último recurso, quando se trate de fixar o montante de danos de natureza patrimonial, na hipótese de nem mesmo com recurso à liquidação dos danos genéricos da condenação tenha sido possível a determinação exata do montante do dano, em termos reais e concretos, não obstando, no entanto, que seja utilizada como último critério para determinação do quantitativo indemnizatório que deve corresponder ao dano, se nem em fase incidental de liquidação se conseguir um resultado concreto;

XLVIII. Porém, e ainda que não se discorde da base de cálculo que esteve subjacente à determinação do valor a indemnizar – Declaração do IRC relativa ao ano de 1994, o mesmo enferma de erro quando refere um resultado líquido mensal de 1.678,00 € e dá como dado objetivo e certo que, se não tivesse perdido o referido certificado, teria obtido no mínimo e mesmo resultado nos 62,5 meses seguintes;

XLIX. Contudo, tal afirmação não corresponde à verdade. Note-se que no resultado líquido apresentado já se encontra refletido o valor do alegado contrato de assistência técnica celebrado com a empresa B……………, sendo que a este propósito ter-se-á que atender à matéria dada como provada nas alíneas o) e p) e já transitada em julgado que se reproduz:

o) Tinha celebrado com a B……………, americana, uma fábrica de produção de aviões para aviação agrícola, um contrato de assistência técnica, internacional, assegurando a assistência a aeronaves por ela fabricadas, quando tal serviço fosse solicitado pela clientela;

L. p) Em 1994, primeiro ano de vigência do contrato, a Autora procedeu à assistência técnica de 10 aviões em Marrocos, e dois na Guiné-Bissau, fabricados pela "B………….";

LI. Matéria esta que não foi suficiente para dar como provado a existência de um contrato que iria durar para além dos 3 anos visto nunca terem sido provados o início desse contrato e os termos do mesmo, conforme resulta de fls 571 e 572 da sentença proferida pelo Tribunal de Círculo de Lisboa;

LII. A este propósito o tribunal "a quo" refere que a "argumentação tecida pela recorrente a propósito do contrato celebrado com a B………… também se mostra inócua, na medida em que decorre de fls. 35 da sentença recorrida que «não resultaram provados os termos e valores do contrato», pelo que os prejuízos ocorridos com a cessação do mesmo contrato não foram objeto de qualquer valoração para o cálculo da indemnização em que a recorrente foi condenada".

LIII. Porém, mais uma vez incorreu o Tribunal "a quo" em erro no seu raciocínio, na medida em que para o cálculo da indemnização que fixou (montante mensal de 1.678,00 € x 62,5 meses), considerou que seria esse o valor que no mínimo à Recorrida teria obtido caso não tivesse perdido o certificado;

LIV. Sucede, porém, que, o valor líquido considerado de 20.140,00 €, que correspondente ao resultado líquido apurado na declaração do IRC relativamente ao ano de 1984, terá em conta os montantes recebidos da B…………… nesse ano à Recorrida, na medida em que e conforme resultados factos provados e acima: elencados, no ano de 1994 o contrato com a B……………. já estaria a vigorar e inclusive a Recorrida prestou assistência a 12 aviões deles;

LV. Conclui-se assim que os valores apurados já refletiam os valores auferidos pela Recorrida com o contrato vigente com a B………….., pelo que ao multiplicarmos esse valor por 62,5 meses, estamos, na prática, a proceder ao pagamento desse contrato por esse período de tempo, situação que contraria o já anteriormente decidido e que consubstancia um enriquecimento indevido para a Recorrida na medida em que esta não logrou provar na ação principal os termos, a validade, bem como os valores do contrato;

LVI. Pelo que, ao valor ora considerado, para base de cálculo pelo Tribunal "a quo" - resultado líquido do exercício; do ano de 1994 (20.140,00 €), sempre teria que ser subtraída a fatia correspondente ao fornecedor/cliente, B…………… e a mesma não ser contabilizada para efeitos de quantum indemnizatório nos 62,5 meses considerados;

LVII. É esse o sentido do n.º 3 do artigo 566.º n.º 3 do CC, onde se lê, "Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados”, devendo interpretar-se com o seguinte sentido; "Se não puder ser averiguado o valor exato dos danos até à sentença e também não seja possível ou previsível determiná-lo em incidente posterior de liquidação, o tribunal julgará segundo a equidade dentro dos limites que tiver por provados";

LVIII. Importa não esquecer que essa é tarefa de quem tem o ónus da prova, de nada lhe valendo conseguir provar que teve um dano se não fornecer ao Tribunal elementos mínimos que permitam partir para a aplicação de um juízo equitativo, sendo que este juízo prossupõe, por isso uma colaboração ativa do autor, que tem o ónus da prova concreta dos danos e respetivo montante, e que não pode esperar obter vantagem com a falta de colaboração, a sua inércia ou a oposição a um maior aprofundamento da sua determinação;

LIX. Acontece que, nem na ação principal nem na presente execução a ora Recorrida fez prova concreta dos danos e respetivo montante quando tal se lhe impunha, como se viu, razão pela qual, também por esta via, o acórdão do Tribunal "a quo" é nulo, por violação da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º, na medida em que ao considerar o valor de 1.678 € mensais (ano em que o contrato com a empresa B…………… já estava em vigor) e multiplicá-lo por 62,5 meses, implica que os montantes resultantes desse contrato fossem pagos até ao ano de 2000, entrando em clara contradição com o anteriormente decidido, por falta de prova;

LX. Nulidade esta que também se invoca;

LXI. Por todo o supra exposto e em conclusão, se requer a V.ªs Ex.ªs, sempre com o mui douto suprimento, que se revogue o acórdão proferido pelo Tribunal "a quo" que se encontra viciado de vários erros de direito e de desrespeito pelo caso julgado, e se substitua por outro, dando provimento a este recurso.

TERMOS EM QUE, e nos melhores de direito, sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso, devendo a Recorrente ser absolvida, revogando-se o douto acórdão, como, aliás, é de Lei e de inteira

JUSTIÇA”.

5. A A., ora recorrida, A………… apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 993 a 1002):

“Por todo o exposto e em conclusão, não deve ser admitido o presente recurso de revista, por não se verificarem os pressupostos de admissão que o Artº 150º n° 1 do C.P.T.A. enuncia, pelas razões abaixo aduzidas:

1º - A Recorrente fundamenta o seu recurso de revista no segmento da norma do Artº 150º, nº 1º do C.P.T.A. que consagra a intervenção deste Supremo Tribunal para "uma melhor aplicação do direito", considerando que a lei foi mal aplicada pelo TCA Sul, no acórdão recorrido;

2º - Concretizando essa má aplicação do direito limita-se a invocar algumas "inconsistências no tratamento de certas questões" e "eventuais nulidades" por o TCA Sul não ter decidido questões que devia ter apreciado;

3º - Mas basta atentar na alegação do recurso de apelação apresentado pela actual A.N.A.C. para o TCA Sul, em 7 de Outubro de 2013, para se constatar que esse mesmo fundamento já tinha sido invocado, nos mesmíssimos termos, naquele recurso de apelação;

4º - Fundamento, que diga-se em abono da verdade foi apreciado e declarado improcedente no acórdão recorrido, como decorre do exposto na página 22, 6º parágrafo da sentença;

5º - Em concreto, pretende a A.N.A.C. que o processo contém um erro de forma, por segundo ela, não ser o processo executivo o indicado para decidir da liquidação da indemnização devida à Recorrida, repetindo no actual recurso o mesmo fundamento, sem acrescentar nada de novo, pretendendo tão só a reapreciação da mesma questão, que já foi apreciada e julgada pelo TCA Sul;

6º - Ora, não existe qualquer razão para esta questão, já apreciada em recurso, que só diz respeito à situação concreta deste caso e que não tem qualquer novidade, complexidade ou capacidade expansiva, se caracterizar como uma situação carecida de necessária reapreciação por este Tribunal ao abrigo do nº 1º do Artº 150º do C.P.T.A.;

7º - Não se verifica neste particular ponto, qualquer erro ou incongruência de natureza fundamental no acórdão recorrido, que determine necessariamente a reapreciação do caso por este Tribunal, ou a sua intervenção como válvula de segurança do sistema, o que deve acontecer quando tenha sido cometido um erro flagrante, clamoroso e inaceitável por parte do Tribunal a quo, para ser melhorada a aplicação do direito no caso sub judice e noutros semelhantes;

8º - Insurge-se ainda a A.N.A.C. por ter sido condenada no acórdão recorrido a indemnizar a Recorrida no valor de 66.524,58 Euros, a título de indemnização pelo relançamento da actividade, considerando que tal condenação não deveria ir além do valor de 29.868,00 Euros, e que o Tribunal a condenou em quantidade superior à do pedido (designadamente nºs nos nºs 39 a 42º da sua alegação);

9º - Relativamente a esta questão convém sublinhar que se trata novamente de questão já levantada no recurso de apelação apresentado pela Recorrente em 7 de Outubro de 2013, que foi devidamente apreciada pelo TCA Sul, a páginas 22 e 23 do acórdão e que a Recorrente se limita a repetir aqui;

10º - Além disso, insurge-se a Recorrente até com qualquer condenação em indemnização pelo relançamento da actividade da empresa, considerando que ela não poderá acontecer porque "a entidade que licencia esta actividade (a ANAC), não irá relançar a sua actividade" "porque os dois sócios da Recorrida já se encontram reformados" (números 50, 53 e 54 da alegação);

11º - Ora, a este respeito, cabe afirmar que na matéria de facto provada nos autos não consta em lado algum que os sócios da Recorrida estejam reformados;

12º - Ora, sendo este um dos fundamentos da alegação de recurso, é manifesto que este Tribunal Superior o não pode apreciar, porque a isso se opõe o disposto no nº 4º do Artº 150º do C.P.T.A., que dispõe "que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista", ainda que existisse, o que não se concede;

13º - Por último, considera-se no número 86 da alegação que o Tribunal ao condenar a A.N.A.C. a indemnizar a Recorrida no valor de 104.875,00 Euros, o fez com falta de provas e em contradição com as provas existentes nos autos, apodando o acórdão de nulo;

14º - Ora, este argumento choca frontalmente também com o disposto no nº 4º do Artº 150º do C.P.T.A. porque o recurso de revista consagrado nesta disposição não pode basear-se em qualquer erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais provados no processo, como a recorrente aqui pretende;

15º - Pode assim concluir-se que o que a Recorrente pretende com o recurso de revista é tão só uma reapreciação de questões já apreciadas e decididas pelo TCA Sul, como acontece com os alegados "erro na forma de processo" ou a "falta de fundamentação da condenação em indemnização por relançamento da actividade" ou a reapreciação da matéria de facto considerada provada, o que este Tribunal Superior está legalmente impedido de realizar;

16º - Em consequência, não se verificam no caso sub judice os pressupostos que possibilitam a admissão do recurso de revista, como a Recorrente pretende, o qual não deverá ser admitido, de acordo com o disposto nos números 1 e 3º do Artº 150º do C.P.T.A..;

Todavia, para o caso de tal não suceder, o que se alega por dever de patrocínio e sem conceder, deverá ser negado provimento ao alegado e pedido pela Recorrente na sua alegação pelas seguintes razões e fundamentos:

17º - Contrariamente ao que a Recorrente alega, não há qualquer erro na forma processual utilizada pela recorrida na liquidação da indemnização, como foi já decidido na sentença do TACL de 2013 e no acórdão recorrido;

18º - Efectivamente, tendo sido proferido o despacho judicial de 16/10/2012 considerando adequado o processo executivo seguido pela recorrida para liquidar a indemnização devida, e não tendo o I.N.A.C. IP. feito, no seu requerimento da interposição deste recurso para o TCA SUL, a menor referência expressa, directa ou indirecta, de que pretendia impugnar o despacho judicial interlocutório de 16/10/2012, este despacho já transitou em julgado, como se considerou e bem no acórdão recorrido do TCA Sul;

19º - Ainda que assim não se entendesse, o que só por mera cautela de patrocínio e sem conceder se refere, sempre seria de manter o douto despacho interlocutório referido, que fez uma correcta interpretação e aplicação do direito, ao considerar que o processo executivo para pagamento de quantia certa era o processo devido e adequado para executar a sentença e o acórdão supra-referidos, que condenaram o I.N.A.C. I.P. a pagar uma indemnização à Recorrida pelos prejuízos que lhe causou com o acto ilícito e culposo, que praticamente determinou a liquidação de uma empresa saudável e em crescimento, em Outubro de 1994, tudo ao abrigo do disposto no Artº 170º e seguintes do C.P.T.A;

20º - Esta decisão de condenação da actual A.N.A..C. foi-lhe notificada pelo Supremo Tribunal, em 11 de Outubro de 2010, não tendo o I.N.A.C. dado qualquer passo para executar os referidos sentença e Acórdão, com ilegal, sobranceiro e arrogante desrespeito pelo que lhe é imposto constitucionalmente no Artº 205º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, que dispõe que: "As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades".

21º - Não tendo o I.N.A.C, actual A.N.A.C, executado espontaneamente o acórdão deste Supremo Tribunal, no prazo de 30 dias após o seu trânsito em julgado, como lhe impunha o Arts 170º, n° 1º do C.P.T.A., abria-se à exequente a via processual para obter a indemnização devida, iniciando o processo de execução da sentença e acórdão referidos para pagamento de quantia certa, ao abrigo do disposto no Artº 170º, nº 2º do C.P.T.A. e liquidando o valor devido da indemnização;

22º - Foi a executada, ora Recorrente, notificada do requerimento executivo com a liquidação da obrigação realizada pela exequente, tendo apresentado a sua oposição e junto todos os documentos e a prova testemunhal que entendeu necessários, como se demonstra no processo, motivo pelo qual não tem qualquer motivo para se queixar de que não se pode defender, afirmação que é em absoluto infundada;

23º - Ao contrário do que a Recorrente afirma, apresentou na sua oposição à execução, incluindo a liquidação nela feita, a defesa com a maior amplitude, procurando mesmo reabrir a discussão da matéria de facto já decidida, com trânsito em julgado, na sentença e acórdão citados, tendo apresentado 3 testemunhas e variadíssimos documentos e os requerimentos de 8/4/2013 e 16/5/2013;

24º - Donde resulta que deverá ser integralmente mantido o decidido a este respeito sobre a adequação formal do processo executivo, no acórdão recorrido, que se limitou a confirmar a sentença anterior do TACL e a legalidade manifesta do despacho judicial interlocutório de 16/10/2012;

25º - No que respeita à condenação da ANAC a pagar à Recorrida os danos em que tem necessariamente de incorrer para retomar a sua actividade, ao contrário do que a Recorrente invoca, encontra-se provado nos autos que a A…………, Lda. pretende retomar a sua actividade normal, logo que tenha disponibilidades financeiras para tanto, ou seja, quando lhe for paga a indemnização a que tem direito;

26º - É falso e não ficou provado em lado algum, que os técnicos em que a A…………. sempre assentou a sua capacidade técnica se encontrem reformados da sua actividade de reparação de aviões, como a Recorrente refere no ponto 54 da sua Alegação;

27º - Por outro lado, seria inadmissível e totalmente ilegal que a A.N.A.C., quando solicitada para o efeito, negasse à A…………, Lda. a licença para reparação e manutenção de aviões, desde que esta empresa tivesse todos os equipamentos, meios e a capacidade técnica necessária para o efeito, como aliás ameaça ilegalmente fazer nos números 50 e 51 da sua alegação;

28º - Não pode admitir-se sequer num Estado de Direito que alguém na Administração Pública possa pensar em termos diversos, como acontece no que se refere, ilegal e discriminatoriamente, nos nºs 50 a 55 da sua alegação;

29º - Ficou igualmente demonstrado que para reiniciar a sua actividade a empresa Recorrida vai precisar de adquirir uma série de bens e equipamentos indispensáveis, a que se referem as facturas referidas na alínea E) da matéria de facto, referindo-se a compras fundamentais e indispensáveis, e cujo valor ascende a €66.524,58, pelo que é justíssimo tal como se decidiu no acórdão recorrido que seja esse o valor a indemnizar à recorrida, para retomar a sua actividade;

30º - Acresce que, neste particular o acórdão recorrido não está eivado de qualquer nulidade, como a recorrente alega no nº 60 da sua alegação, na medida em que fundamentou suficientemente porque mantinha a decisão proferida pela sentença do TACL, como consta de fls 22 do acórdão;

31º - Contrariamente ao que é alegado pela Recorrente, que pretende que não seja arbitrada qualquer indemnização à Recorrida, a qualquer título, está provado nos autos que a recorrida, desde 4/11/1994 até 15 de Janeiro de 2000, ficou aberta, manteve as instalações, pagou rendas relativas às instalações e salários a empregados, segurança social, custos fixos de electricidade, água e telefone, e impostos, mantendo uma luta extra-judicial e judicial, de há 23 anos para cá, para que lhe fosse restituída a licença, como se provou, nomeadamente nos Artigos v), w), x), y), z), ii), bbb), ccc), ddd), eee), fff), ggg), hhh) da matéria de facto provada na sentença de 2013 e formalmente reconhecida no acórdão recorrido;

32º - No período de Novembro de 1994 a 15 de Janeiro de 2000, período de 62,5 meses que este Supremo Tribunal considerou dever ser indemnizado à Recorrida, a mesma comprovou todos os custos e encargos que teve para manter a empresa aberta, ainda que prestando serviços absolutamente residuais e vendendo stocks e peças que tinha em armazém, os quais se encontram descritos e provados na posição 225 do modelo 22 de IRC dos anos de 1994 a 15 de Janeiro de 2000, conforme provado nas alíneas hhh) e kkk) da Alínea C) da matéria de facto, e nas declarações modelo 22 de IRC da empresa até ao ano 2000, juntas aos autos, nomeadamente com o requerimento executivo, e que não sofreram impugnação (Docs. nºs 4 a 11 juntos com o requerimento executivo);

33º - Estão assim provados os prejuízos, a título de danos emergentes, que suportou e que devem ser totalmente indemnizados, não por recurso à equidade, mas de acordo com os factos provados nos autos:

Novembro e Dezembro de 1994………€ 13 357,90

No ano de 1995………………………..€ 29 599,27

No ano de 1996………………………..€ 19 255,49

No ano de 1997………………………..€ 20 202,72

No ano de 1998………………………...€ 19 227,00

No ano de 1999………………………...€ 5 877,35

No Ano de 2000 -15 dias de Janeiro…….€ 244,88

Sub - Total €107 764,61

34º - Por outro lado, a Recorrente e o acórdão recorrido desconsideraram os factos considerados provados na sentença de 2013, e provenientes mesmo do acórdão deste Supremo Tribunal de 2008 e da sentença do TACL de 2010, e provados em julgamento;

35º - Acima de tudo, foi desconsiderado, de modo gravemente ilegal o reconhecimento confessório do Réu, aqui Recorrente, feito na sua contestação, a fls 934 e 935 dos autos, com efeito de prova plena, nos termos do Arts 358º nº 1º do Código Civil, quanto aos rendimentos auferidos pela recorrida no 4º trimestre de 1994 e perdidos em virtude do cancelamento ilegal da licença JAR 145;

36º - Efectivamente o actual A.N.A.C. reconheceu na sua contestação, que no 4º trimestre de 1994, a A…………. tinha tido uma receita mensal de 2 967 133$00 (equivalente a 14.800,00 Euros), tendo ficado também provada a tendência de crescimento da actividade da empresa que o TACL considerou ser de mais 3,5% ao ano, na sentença de 2013 (págª 39);

37º - Ora, nenhum destes factos provados e referidos expressamente na página 39 da sentença do TACL de 2013, nomeadamente a expressa recepção dos termos da sentença de 2008, foram considerados pela Recorrente e ponderados no Acórdão recorrido, como deviam ser e é legalmente imposto pelo Artº 607º nº 3 do Código de Processo Civil;

38º - Considerando todos estes factos provados, e referidos expressamente como tal na sentença do TACL de 2013, e tendo presente que no acórdão recorrido se afirmou que os factos provados são os mesmos que considerou a sentença de 2013, então o valor da indemnização pelos lucros cessantes não pode ser inferior a 925.000,00 Euros, valor que a Recorrente deve ser condenada a indemnizar à Recorrida.

Só assim se agirá em conformidade com Alguma Justiça, que tanto tarda e por isso se desfigura, e o Direito”.

6. Por acórdão deste Supremo Tribunal [na sua formação de apreciação preliminar prevista no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA], de 09.11.17 (fls. 1010 a 1011), veio a ser admitida a revista, na parte que agora mais interessa, nos seguintes termos:

“(…)

Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA's não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150°, n.º 1, do CPTA).

O processo dos autos tem natureza executiva e persegue, primacialmente, a determinação do «quantum» indemnizatório que, na sequência de um acto ilegal, a executada ANAC deve à exequente. As instâncias recorreram à equidade para calcular a indemnização. E, todavia, a identidade do método trouxe resultados assinalavelmente diferentes, pois o TAC computou os danos a ressarcir (excepto os ligados ao «relançamento da actividade») em 618.052,69 € e o TCA fixou-os em 104.875,00 €.

Uma tal discrepância – questionada com veemência pela exequente na sua revista, onde acusa o aresto de arbitrariedade – apontaria, só por si, para a necessidade do STA rever o assunto. Até porque se mostra conveniente uma pronúncia do Supremo acerca do modo como, «in casu», se activou o art. 566°, n.º 3, do Código Civil.

Acresce que, a propósito dos custos daquele «relançamento da actividade», ambas as instâncias definiram um valor que não parece ajustado ao título executivo. Este é um assunto em que a recorrente ANAC muito insiste e que – mesmo que não constitua, em absoluto rigor, a decisão «ultra petitum» a que ela alude – merece reapreciação.

Para além das «quaestiones juris» atrás referidas, as revistas tratam também de outros assuntos, substantivos ou processuais. E, embora nenhum deles, encarado «a se», motivasse o recebimento dos recursos, não deixa de se mostrar útil que o STA tome posição a seu respeito.

Nestes termos, acordam em admitir as revistas”.

7. O Digno Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu qualquer parecer.

8. Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decidir.

II – Fundamentação

1. De facto:

O acórdão recorrido manteve os factos provados na 1.ª instância, dando-os como integralmente reproduzidos. Nos termos e para os efeitos do artigo 663.º, n.º 6, do CPC, dá-se por integralmente reproduzida a matéria de facto provada nas instâncias.

2. De direito:

2.1. Cumpre apreciar as questões suscitadas pelas ora recorrentes – delimitado que está o objecto dos respectivos recursos pelas conclusões das correspondentes alegações –, relacionadas com a alegada verificação de nulidades e erros de julgamento por violação da lei substantiva e por errada interpretação e avaliação dos factos. Vejamos.

2.2. Da alegada nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia pelo facto de não se ter pronunciado sobre a questão relativa à adequação, ou não, do meio processual utilizado pela A., ora recorrida – ou “então, a considerar-se que se pronunciou”, por “tal pronúncia não se encontra[r] fundamentada de facto e de direito” (cfr. conclusão XXI e XXII das alegações de recurso da ANAC).

Uma tal nulidade é invocada pela recorrente ANAC no âmbito do recurso de revista que interpôs. Na conclusão VIII.ª das suas conclusões pode ler-se o seguinte: “Ora o tribunal "a quo" relativamente a esta matéria, no acórdão proferido limita-se a referir que a Recorrente "em rigor apenas se impugna a sentença final proferida nos autos, conforme decorre do requerimento de interposição, a folhas 583 dos autos e não também o despacho interlocutório proferido a fls. 307 e 308 dos autos, que considerou não ocorrer erro na forma de processo por se no processo executivo «enxertada ação declarativa para apuramento dos danos sofridos pela prática dos atos ilícitos», não obstante o referido nas conclusões V e XIV, verificando-se em qualquer caso que a ocorrer erro na forma do processo, a executada não viu prejudicado o seu direito de defesa, conforme decorre da oposição apresentada a fls. 248 e segs e destas próprias alegações jurisdicionais, pelo que a questão suscitada é neste momento inócua"”.

Da leitura deste excerto decorre que o acórdão recorrido, mal ou bem, se pronunciou sobre a questão da inadequação processual suscitada pela ora recorrente. Assim, não obstante admitir que nas conclusões de recurso de apelação a ora recorrente referiu a questão da desadequação formal do meio processual utilizado, entendeu que “em rigor apenas se impugna a sentença final proferida nos autos, conforme decorre do requerimento de interposição, a folhas 583 dos autos e não também o despacho interlocutório proferido a fls. 307 e 308 dos autos”. Além disso, considerou que ainda que se admitisse colocada a questão em apreço, “a executada não viu prejudicado o seu direito de defesa, conforme decorre da oposição apresentada a fls. 248 e segs e destas próprias alegações jurisdicionais, pelo que a questão suscitada é neste momento inócua"”. Ou seja, o acórdão recorrido justificou (e, portanto, fundamentou) por que razão não haveria qualquer nulidade da decisão recorrida – sendo sabido que apenas a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade das decisões judiciais, nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC. Não nos pronunciaremos sobre a bondade material desta decisão, pois não foi isso que nos foi demandado. Pelo que nos resta concluir que não se verifica nulidade do acórdão recorrido, quer por alegada omissão de pronúncia, quer por alegada falta de fundamentação. Improcede, deste modo, este fundamento do recurso apresentado pela recorrente ANAC.

2.3. Da alegada nulidade por omissão de pronúncia por a decisão recorrida não ter feito uma apreciação autónoma dos danos emergentes

Trata-se de nulidade invocada pela recorrente A………… no âmbito do recurso de revista que interpôs. Em síntese, afirma a recorrente que “Além disso, no Acórdão recorrido não se fez uma apreciação autónoma dos danos emergentes, baseada nos factos provados na sentença (…). Ao não apreciar esta questão que lhe tinha sido colocada, como estava obrigado a fazer, não apreciando se a matéria de facto provada nos autos era suficiente para permitir a completa avaliação dos danos emergentes sofridos pela recorrente, com a paralisação da sua actividade, mas mantendo a maioria dos seus custos fixos, o Acórdão recorrido incorreu no vício previsto no Artº 615º nº 1º alínea d) do CPC, encontrando-se eivado de nulidade, o que deve determinar a sua revogação” (conclusões 9.º e 10.º das alegações).

Como se pode constatar, a recorrente invoca uma nulidade por omissão de pronúncia nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC. No entanto, saber se o acórdão recorrido deveria, ou não, ter apreciado autonomamente os danos emergentes de acordo com os factos provados é questão que poderá configurar um erro de julgamento e não uma nulidade por omissão de pronúncia. Efectivamente, o acórdão recorrido não deixou de apreciar e determinar quais os danos indemnizáveis, apenas não terá autonomizado, na perspectiva da recorrente, a avaliação dos danos emergentes. Uma vez mais, se fez mal ou bem, do ponto de vista jurídico, é problema que recair na figura do erro de julgamento. Improcede, deste modo, este fundamento do recurso de revista.

2.4. Da alegada nulidade por omissão de pronúncia em virtude da não apreciação dos “factos e fundamentos expressos detalhadamente na página 39 da sentença de 2013”, os quais não “foram considerados e muito menos fundadamente e racionalmente ponderados no Acórdão recorrido, como deveriam ter sido e é legalmente imposto pelo Artº 607º nº 3 do Código de Processo Civil, cometendo-se também a nulidade prevista no Artº 615º nº 1°alínea d) do CPC” (conclusão 23.º das alegações).

Uma vez mais, e sem necessidade de grandes considerações, conclui-se dever improceder este fundamento de recurso invocado pela recorrente A………... Efectivamente, também agora se confundem as figuras da nulidade por omissão de pronúncia, convocada pela recorrente, e a de erro de julgamento, que, in casu, e tendo em conta a argumentação da recorrente, seria a mais adequada. Para que se possa sustentar padecer a decisão recorrida de nulidade por omissão de pronúncia, seria necessário que o julgador não se tivesse pronunciado sobre uma questão submetida pelas partes, e, ainda assim, “exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela decisão dada a outras” (art. 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi dos arts. 1.º e 140.º, n.º 3, do CPTA). Ora, não devem confundir-se as questões que as partes submetem à apreciação e decisão do juiz com aquilo que são as razões de facto e de direito, os argumentos e/ou fundamentos utilizados pelas partes para sustentar a sua posição quanto às questões efectivamente objecto de litígio. Deste modo, não se verificará omissão de pronúncia se se constatar que o julgador, tendo apreciado todas as questões fundamentais objecto do litígio, não se pronunciou, porém, sobre a bondade de todos os fundamentos, argumentos e considerações apresentados pelas partes. Em consequência, deve improceder esta alegada nulidade por omissão de pronúncia.

2.5. Da alegada nulidade por excesso de pronúncia nos termos da al. e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC

Estamos agora perante uma alegada nulidade do acórdão recorrido invocada pela recorrente ANAC. A sua argumentação é, em suma, a seguinte: o TAC Lisboa e o STA, nos seus arestos de 2010 em sede declarativa, fixaram “como limite máximo indemnizatório para a relançamento da atividade da Autora a quantia de 29.868,00 € (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros)”; “Aliás, este é um ponto que merece inclusive a concordância da Recorrida, porquanto a mesma quando intentou a ação executiva alega que, relativamente à indemnização para o relançamento da atividade, embora preveja gastar o montante de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos e vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), requer apenas o pagamento de € 29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e oito euros)”; “Ora, estabelece a alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC que é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior à do pedido, verificando-se esta nulidade, relativamente à condenação do Recorrente no pagamento de € 66.524,58 (sessenta e seis mil, quinhentos a vinte euros e cinquenta e oito cêntimos), a título de indemnização pelo relançamento da atividade, quando o limite máximo peticionado pela Recorrida A…………, decidido e confirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo foi de €29.868,00 (vinte e nove mil, oitocentos e sessenta e oito euros)” (cfr. conclusões XXIII., XXXI. e XXXIV. das alegações).

Vejamos.

Acórdão do STA, de 06.10.10:

2.2.2. Conhecimento da questão dos danos com o relançamento da actividade da autora - (conclusão 7ª das suas contra-alegações).

A sentença recorrida quanto a estes danos, em concreto disse o seguinte: “(…) Quanto a este concreto dano, provado ele nos termos acima expostos em 3.3.2.1, i ) c), como ali se refere não resultou provado o montante dos danos a este título nem se provaram elementos que permitam com a dita segurança fixar o seu montante.
Por isso que quanto a ele se deva relegar a fixação do seu quantum para liquidação em execução de sentença nos termos expostos, tendo em atenção o que a propósito se provou e acima se referiu e tendo sempre como limite o montante pedido pela autora em sede de alegações, ou seja, 29.868€ (montante inferior ao que pedira inicialmente)”.

Como facilmente se vê da parte transcrita da sentença o montante máximo do dano em causa foi delimitado por ter sido este o montante do pedido.

No ponto 7 das contra-alegações, a autora pedia que esse montante fosse um “limite mínimo” de 29.869 € e não um limite “máximo”, coisa diferente do que agora pede, isto é, que não exista qualquer limite – nem máximo, nem mínimo.

A sentença recorrida considerou provado ter havido danos com o relançamento da empresa, mas não provada a sua extensão, e portanto condenou no que viesse a liquidar-se, dentro do montante pedido pela autora.

Deste modo, o argumento da autora, segundo o qual o montante de € 29.869 deveria ser um limite mínimo (que foi o argumento usado nas contra-alegações) não pode proceder. Não pode proceder, em primeiro lugar, porque não existe qualquer base factual para estabelecer um limite mínimo dos danos “futuros” com o relançamento da empresa. A sentença justificou cabalmente a sua tese quanto a este ponto (folhas 1003): “A este propósito, tendo-se provado que a autora teve de deixar as instalações por não poder pagar a renda, os equipamentos e produtos que ali restavam em 1999/2000 não estavam capazes de servir para o exercício da actividade, tendo que ser adquiridos novos equipamentos e produtos, provando-se assim que a autora terá gastos com o relançamento da sua actividade, entre os quais, despesas com fornecimento de bens e serviços por terceiros, despesas com pessoal, amortizações e recuperações de clientela (supra jjj), mas não resultou provado que esses gastos sejam daquele montante calculado pela autora (resposta parcial ao quesito 53).

Mas não pode proceder, também, porque o fundamento legal do limite máximo, referido na sentença resulta tão só de ter sido esse o montante do pedido formulado pela autora – nada tendo a ver com qualquer facto dado como provado ou não provado. Recorde-se o que foi decidido, neste ponto: (….) tendo sempre como limite o montante pedido pela autora em sede de alegações, ou seja, 29.868€ (montante inferior ao que pedira inicialmente)”.

Assim, não tendo a autora, nas contra-alegações onde requereu a ampliação do objecto do recurso, posto em causa o verdadeiro fundamento invocado na sentença para o limite máximo deste concreto dano, a liquidar em execução da sentença, ou seja, que esse dano deveria ter como limite o montante do pedido (inferior o que pedira inicialmente), é manifestamente improcedente a sua pretensão de modificar a sentença recorrida nesta parte”.

Vejamos agora o que foi peticionado pela A. na acção de execução:

“II – Da liquidação dos prejuízos a indemnizar


Artº 4

Dos acórdãos supra-referidos, conjugados com a douta sentença deste Tribunal de 1ª Instância, proferida em 2 de Setembro de 2008 (Doc. 3), decorre que o INAC deve indemnizar os prejuízos decorrentes do encerramento ilegal e culposo da empresa ‘A…………, LDA’, que provocou com o seu acto ilícito e culposo ao suspender-lhe o certificado JAR 145, de que a empresa dependia para o exercício da sua actividade, nos seguintes termos:

a) – (…)

b) – Todos os prejuízos que advirão para a Autora com o relançamento da sua actividade, com o limite máximo de € 29.868;

c) (…)” – cfr. fls. 6 e 7 dos autos.

Temos, pois, que já em sede de acção de execução, a 1.ª instância, indo além do que foi peticionado pela A. – de acordo, aliás, e como se viu, com o decidido pelo STA em sede de acção declarativa –, entendeu fixar em € 66.524,58 o montante a pagar à A. a título de indemnização pelo relançamento da actividade, em virtude de ter considerado que “resultou provado que a empresa necessitará de cerca de 66.524,58€” (cfr. fls. 576 e 577 dos autos). A ora recorrente ANAC reagiu a esta decisão, invocando a nulidade da sentença por excesso de pronúncia nos termos da al. e) do artigo 615.º do CPC – e ainda, como se verá adiante, em sede própria, invoca a violação do caso julgado pela sentença recorrida.

Atentemos no que foi dito pelo acórdão recorrido:

Pretende a mesma recorrente nas conclusões 37.ª e 44.ª que a sentença recorrida é nula por haver condenado para além do pedido e por padecer de falta de fundamentação de facto e de direito, quanto à indemnização pelo relançamento da actividade. Entendemos que não, pois que resulta do acórdão proferido pelo STA em 6/10/2010, que o limite mínimo dessa indemnização é de € 29.868, sendo certo que quer nessa decisão quer no anterior acórdão desse Tribunal de 2/6/2010, ficou reconhecido o direito de indemnização a tal título, não podendo haver lugar à pretendida prova do efectivo relançamento da actividade da exequente” (cfr. fls. 789).

Conforme se pode constatar, o acórdão recorrido interpretou mal o decidido pelo STA quanto a esta questão da indemnização por relançamento da actividade. Ou seja, ele manteve a decisão da primeira instância, sendo certo que para justificar a manutenção do quantum indemnizatório fixado na sentença incorreu numa errada interpretação do acórdão do STA prolatado em sede de acção declarativa. Ora, deveria ter sido este o fundamento utilizado pela ora recorrente para pôr em causa o segmento decisório do acórdão recorrido em que mantém o montante da indemnização decretada pela 1.ª instância no que respeita aos danos ocasionados pelo relançamento da actividade. A recorrente, como visto, limitou-se a convocar o mesmo argumento que tinha utilizado nas suas alegações de recurso de apelação quando devia ter optado pela via da reforma da decisão ou da rectificação de erro material. Improcede, deste modo, a alegada nulidade do acórdão recorrido por violação da al. e), do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

2.6. Das alegadas nulidades por contradição entre a decisão e os fundamentos

Sustenta a recorrente ANAC que existe uma contradição entre a decisão e os fundamentos na parte relativa à indemnização devida a título de relançamento da actividade. Em síntese, alega que “Pelo que também nesta sede, a sentença também é nula, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, uma vez que nem o tribunal de Círculo de Lisboa, nem o tribunal "a quo" fundamentaram nem de facto, nem de direito, a condenação da recorrente a título de indemnização pelo relançamento da atividade, nulidade esta que se invoca” (cfr. conclusão XLIII. das alegações). Basicamente, o que se afirma é que não havendo sequer prova de que haveria relançamento da actividade não poderia ser fixada uma qualquer quantia indemnizatória a esse título. Interessa-nos aqui, obviamente, e sobretudo, a decisão recorrida. Vejamos.

No acórdão recorrido diz-se o seguinte: “Pretende a mesma recorrente nas conclusões 37ª e 44ª que a sentença recorrida é nula por haver condenado para além do pedido e por padecer de falta de fundamentação de facto e de direito, quanto à indemnização pelo relançamento da actividade. Entendemos que não, pois que resulta do acórdão proferido pelo STA em 6/10/10, que o limite mínimo dessa indemnização é de € 29.868, sendo certo que quer nessa decisão quer no anterior acórdão desse Tribunal de 2/6/2010, ficou reconhecido o direito à indemnização a tal título, não podendo haver lugar à pretendida prova do efectivo relançamento da actividade da exequente”. Daqui decorre que na decisão recorrida se conclui no sentido do necessário pagamento de uma indemnização a título de relançamento da actividade, na medida em que tal foi determinado pelo STA na acção declarativa. Ora, assim sendo, não se vislumbra qualquer contradição entre o fundamento e a decisão.
Mais problemática se nos afigura a asserção final segundo a qual “não pode[ndo] haver lugar à pretendida prova do efectivo relançamento da actividade da exequente”. A ideia que lhe subjaz será a de que apenas se pode atribuir uma quantia a este título com recurso à equidade. Sucede que, mesmo nestes casos de recurso à equidade, os correspondentes juízos não podem suprir a inexistência de factos que revelem a ocorrência do dano ou danos resultantes do facto ilícito. Efectivamente, um tal suprimento apenas vale em relação ao cálculo do respectivo valor monetário. Mas, ainda que assim seja, não estamos aqui perante uma nulidade por oposição entre fundamentos e decisão, antes se tratando de erro de julgamento. Improcede, deste modo, a alegada nulidade.

A mesma ANAC sustenta que existe contradição entre a decisão e os fundamentos uma vez que, não tendo sido dado como provada a alegada quase certa renovação do contrato com a B…………., não poderia o acórdão recorrido reflectir no valor da indemnização fixada valores reportados aos anos em que, a ter existido, teria vigorado esse hipotético contrato (“LIX. Acontece que, nem na ação principal nem na presente execução a ora Recorrida fez prova concreta dos danos e respetivo montante quando tal se lhe impunha, como se viu, razão pela qual, também por esta via, o acórdão do Tribunal "a quo" é nulo, por violação da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º, na medida em que ao considerar o valor de 1.678 € mensais (ano em que o contrato com a empresa B…………. já estava em vigor) e multiplicá-lo por 62,5 meses, implica que os montantes resultantes desse contrato fossem pagos até ao ano de 2000, entrando em clara contradição com o anteriormente decidido, por falta de prova; LX. Nulidade esta que também se invoca”).
Mas não assiste razão à ANAC, pois, se não se deu como provado o facto em questão ele não existe, e, sendo assim, não é fundamento de nada. Não há, deste modo, como sustentar, quanto a este específico aspecto, a existência de uma nulidade por alegada contradição entre a decisão e os fundamentos nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ex vi dos artigos 1.º e 140.º, n.º 3, do CPC.

2.7. Do alegado erro de julgamento por errada aplicação de meio processual inadequado

Insurge-se a ANAC pelo facto de a determinação do montante da indemnização estar a ser levado a cabo em sede de acção executiva e sem sequer haver recurso a um prévio incidente de liquidação de sentença. Sucede que foi o próprio STA que em sede de acção declarativa – nas suas decisões de 2010 – relegou para execução de sentença a fixação do quantum indemnizatório. Estão-se, pois, a cumprir decisões deste Supremo Tribunal há muito transitadas em julgada. Improcede, deste modo, este alegado erro de julgamento em que teria incorrido o acórdão recorrido.

2.8. Do alegado erro de julgamento por violação do caso julgado relativamente ao montante da indemnização respeitante aos danos com o relançamento da actividade

Antes de proceder à apreciação deste alegado erro de julgamento invocado pela ANAC, é conveniente salientar que, conforme se diz no Acórdão deste STA de 10.07.13, Proc. n.º 1176/12 – que retoma uma orientação fixada no mesmo STA em sede de uniformização de jurisprudência (cfr. Acórdão do Pleno do STA de 11.10.06, Proc. n.º 35319A) –, a errada interpretação de uma sentença pelo julgador deve ser considerada uma questão de direito que cabe no âmbito dos poderes de cognição do STA (“No percurso judicativo para a solução importa, antes de mais, saber se a interpretação da sentença é uma actividade englobada no âmbito dos poderes de cognição deste Supremo Tribunal, tendo em conta os termos em que julga o tribunal de revista (art. 729º do CPC).
A resposta é positiva, de acordo com a jurisprudência do Pleno (acórdão 035319A de 2006.10.11) que entende, citando, "que (i) a sentença judicial, como acto jurídico que é, está sujeita a interpretação, valendo nesse domínio, por força do disposto no art. 295º C. Civil os critérios de interpretação dos negócios jurídicos, que (ii) deve, assim, ser interpretada de acordo com o que dispõe o art. 236º/1 do C. Civil, isto é com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, dela possa deduzir e que (iii) por consequência, sendo o resultado interpretativo sempre impregnado por este critério normativo, a interpretação da sentença é uma questão de direito sindicável em recurso de revista" (1)”).
Feito este esclarecimento, e transportando para aqui o nosso discurso desenvolvido em 2.5., chega-se à conclusão que, com efeito, o acórdão recorrido não andou bem (e decidiu mal) na apreciação que fez da questão do montante de indemnização devida pelo relançamento da actividade, uma vez que o seu raciocínio lógico foi toldado pela errada interpretação que fez da decisão do STA prolatada em sede acção declarativa. Com isto, e porque a situação de caso julgado tem natureza objectiva, pode concluir-se que, ao manter o montante fixado pela 1.ª instância, embora com justificação distinta, também ele ofende o caso julgado no processo declarativo e, com isto, viola os limites e fins do título executivo.
Em face do exposto, procede o erro de julgamento em apreço, invocado pela recorrente ANAC, devendo entender-se que o montante de € 29.868,00 constitui um limite indemnizatório máximo.

2.9. Do alegado erro de julgamento por errada aplicação do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil (CC)

Afirma a recorrente A…………, em síntese, que “A aplicação do princípio da equidade previsto no nº 3 do citado Artº 566º requer uma apreciação prévia de toda a matéria provada relativamente aos danos sofridos pelo lesado, quer quanto aos danos emergentes, quer quanto aos lucros cessantes, e uma decisão fundamentada do tribunal considerando que lhe faltam tais ou tais elementos para avaliar em concreto os danos, de um e outro tipo, e que só os pode determinar com recurso ao princípio da equidade”; “Logo, para que o Tribunal determine validamente que pode recorrer à equidade, torna-se necessário realizar uma apreciação e ponderação individualizada e separada dos danos emergentes e dos lucros cessantes e determinar previamente em relação a cada um destes tipos de danos, porque se considera ser impossível avaliar os danos exactos com fundamento na prova pertinente produzida nos autos”; “Só depois de ter sido feita tal apreciação e considerada a falta de elementos de avaliação do dano, é que o Tribunal pode recorrer à aplicação do nº 3 do Artº 566 do Código Civil e decidir com base num critério de equidade, ou seja um critério considerado justo, atentas as circunstâncias concretas do caso, como já o Sábio Aristóteles considerava”; “Por outro lado, caso se considere fundadamente, que por exemplo, no caso da avaliação dos lucros cessantes, por faltarem elementos necessários para o apuramento exacto dos danos, se justifica a aplicação do princípio da equidade, então na aplicação deste princípio, previsto no Artº 566º nº 3º, do Código Civil devem ser considerados todos os factos pertinentes constantes dos autos, e nomeadamente aqueles que o Tribunal de 1ª instância considerou determinantes para a avaliação dos danos, apreciando-os e ponderando-os criticamente”; “Só actuando dessa forma o Tribunal cumpre o disposto no nº 3 do Artº 566 do Código Civil, e se pode evitar o arbítrio das decisões que determinem uma indemnização, desconsiderando por completo os factos provados e relevantes que determinaram a decisão da 1ª Instância e que tinham enquadrado a aplicação do princípio da equidade, quanto à avaliação dos danos”; “E foi exactamente o que se fez no Acórdão recorrido, onde não se apreciou separadamente os danos emergentes e os lucros cessantes, não se tomou em consideração nem ponderou todos os factos relevantes provados para a determinação de uns e outros, não se ponderou nem afirmou quais os elementos que faltavam para avaliar exactamente os danos e a razão porque se deveria aplicar o princípio da equidade”; “Actuando deste modo, o Tribunal a quo desrespeitou os pressupostos materiais de aplicação do princípio de equidade, exigidos no Artº 566º nº 3, violando-o, e proferiu uma decisão arbitrária, que põe em causa a segurança jurídica, o princípio da igualdade e o direito a uma decisão justa, todos de assento Constitucional e também a confiança que os cidadãos devem ter nas decisões dos Tribunais” (cfr. conclusões 2.º a 8.º das alegações de recurso).

Diga-se, desde já, que não nos parece que, a partir da leitura do acórdão recorrido, se possa dar razão à recorrente A…………. Dessa leitura podemos extrair o seguinte. Em primeiro lugar, o acórdão recorrido aderiu ao que foi decidido na 1.ª instância relativamente ao recurso à equidade, “solução que não repugna considerado o tempo decorrido e a impossibilidade de determinar com rigor os danos sofridos pela exequente”. Em segundo lugar, apreciou de forma autónoma os lucros cessantes e os danos emergentes. No que se refere a estes últimos, e quanto aos alegados montantes gastos com a manutenção das instalações, materiais, vencimentos, etc., o acórdão recorrido considerou que os danos invocados não estavam comprovados na matéria de facto; quanto aos alegados gastos com o relançamento da actividade, o acórdão recorrido não questionou o valor fixado pela 1.ª instância, não obstante ter partido da errada interpretação dos arestos do STA quanto à questão do valor máximo da indemnização a atribuir a este título (“Pretende a mesma recorrente nas conclusões 37ª e 44ª que a sentença recorrida é nula por haver condenado para além do pedido e por padecer de falta de fundamentação de facto e de direito, quanto à indemnização pelo relançamento da actividade. Entendemos que não, pois que resulta do acórdão proferido pelo STA em 6/10/10, que o limite mínimo dessa indemnização é de € 29.868, sendo certo que quer nessa decisão quer no anterior acórdão desse Tribunal de 2/6/2010, ficou reconhecido o direito à indemnização a tal título, não podendo haver lugar à pretendida prova do efectivo relançamento da actividade da exequente”). No que se refere aos lucros cessantes, e, mais especificamente, aos ganhos frustrados relativos a 62,5 meses, o acórdão recorrido divergiu do montante fixado pela 1.ª instância, fazendo ele próprio um cálculo, que agora se expõe: “Decorre das declarações de IRC apresentadas pela exequente, levadas ao quadro constante de fls. 2 a 30 da sentença recorrida que a exequente, em 1994, ano em que terá laborado em pleno por ser detentora do certificado JAR 145, apresentou um resultado líquido de 4028.088$00, ou seja, cerca de € 20.140, o que é um dado objectivo, a que correspondem cerca de € 1678 mensais e que se não tivesse perdido o referido certificado JAR 145 nos 62,5 meses seguintes, teria obtido no mínimo o mesmo resultado, a que corresponderá a quantia total de € 104.875, valor que temos por suficiente para indemnizar os danos sofridos, considerando também que em 1995, 1998 e 1999 foram apresentados resultados líquidos negativos”. “Decorre do acima referido que tendo os danos emergentes e os lucros cessantes sido calculados com recurso à equidade, por aplicação do disposto no art.º 566.º/3 do Código Civil, não sendo possível ir mais além no cálculo dessa indemnização, naufraga por completo a argumentação contida das conclusões do recurso apresentado pela A…………., não se descortinando qualquer erro na apreciação da matéria de facto, não sendo devidas as quantias referidas nas conclusões 1ª, 3ª e 8ª, por não se mostrarem demonstradas, nem o pretendido ‘erro de cálculo’ referido nomeadamente, nas conclusões 11ª e 12ª, a propósito do cálculo do valor da receita mensal a fixar para o cálculo da indemnização, critério não seguido por este Tribunal de recurso, nem se mostra defensável que os pretendidos juros de mora sejam devidos a contar da sentença proferida em 2/9/2008, o que ficou afastado pela sentença recorrida proferida em 17/7/2013, conforme decorre de fls. 40 dessa peça processual, e pelo acima decidido neste acórdão”. No respeitante ao contrato celebrado com a B…………, diz-se no acórdão recorrido que “decorre de fls. 35 da sentença recorrida que «não resultaram provados os termos e valores do contrato», pelo que os prejuízos ocorridos com a cessação do mesmo contrato não foram objecto de qualquer valoração para o cálculo da indemnização em que a recorrente foi condenada”. Em face de todo o exposto, não deve proceder, com o fundamentos acabado de analisar, o alegado erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do n.º 3 do artigo 566.º do CC. De igual forma, não se devem considerar violados os princípios da segurança, da igualdade, e da confiança nas decisões dos tribunais, e nem o direito a uma decisão justa.

Mas a recorrente A………… ainda vai mais longe. Defende a mesma A………… que “O Acórdão recorrido violou ainda o disposto no nº 3 do Artº 566º do Código Civil, disposição que não podia, no caso concreto, ser aplicada à determinação dos danos emergentes sofridos pela empresa A…………, na medida em que o Tribunal nem sequer apreciou criticamente nem ponderou os factos provados, e muito menos decidiu com base neles que era impossível com os elementos de que dispunha determinar os danos emergentes”; “O Tribunal a quo não analisou nem ponderou os factos provados relativos aos danos emergentes sofridos pela lesada, todos eles demonstrados detalhadamente, como estava legalmente obrigado a fazer, tendo apenas aposto a fórmula protocolar, mas obviamente vazia, "de que dava por reproduzida toda a prova feita" (página 11 do Acórdão)”. Ora, “sem analisar os factos provados relativos aos danos sofridos pela A………… e obviamente sem se pronunciar sobre os fundamentos pelos quais considerava ser impossível extrair deles o valor dos danos emergentes sofridos pela empresa, aplicou ilegalmente o princípio da equidade à avaliação dos danos emergentes, a que não podia recorrer porque lhe faltava o pressuposto previsto no nº 3 do Artº 566 do Código Civil” (cfr. conclusões 11.º, 12.º e 13.º das alegações de recurso). Vejamos.

No tocante aos valores a indemnizar a título de danos emergentes, a recorrente A………… faz a seguinte contabilização: “Nos custos e encargos que teve para manter a empresa aberta, lutando denodadamente extra-judicial e judicialmente, para reaver o certificado JAR 145, que lhe foi ilegal e culposamente retirado pelo INAC IP, factos inteiramente comprovados nomeadamente nos Artigos v), w), x), y), z), ccc), bbb), ccc), ddd), eee), fff), ggg), hhh) e kkk) da matéria de facto provada, bem como nas declarações de IRC modelo 22 juntas aos autos, desde 1993 até ao ano 2000, no montante de € 107 764.61, o que foi erradamente desconsiderado no Acórdão recorrido” (conclusão 14.º das alegações de recurso).

Já no acórdão recorrido pode ler-se: “Decorre do acima referido que tendo os danos emergentes e os lucros cessantes sido calculados com recurso à equidade, por aplicação do disposto no art.º 566.º/3 do Código Civil, não sendo possível ir mais além no cálculo dessa indemnização, naufraga por completo a argumentação contida nas conclusões do recurso apresentado pela A…………., não se descortinando qualquer erro na apreciação da matéria de facto, não sendo devidas as quantias referidas nas conclusões 1ª (…), por não se mostrarem demonstradas”. Atente-se no teor da mencionada conclusão 1.ª: “Contrariamente ao que se decidiu por erro na apreciação da prova e sem fundamento válido na sentença recorrida, ficou provado nos autos, que a recorrente incorreu em custos e encargos que teve para manter a empresa aberta, lutando denodadamente extra-judicial e judicialmente, para reaver o certificado JAR 145, que lhe foi ilegal e culposamente retirado pelo INAC IP, factos comprovados nomeadamente nos Artigos v), w), x), y), z), ccc), ii), ww), xx), vv), zz), bbb), ccc), ddd), eee), fff), ggg), hhh) e kkk) da matéria de facto provada e descrita na alínea B da Secção II desta alegação, bem como nas declarações de IRC modelo 22 juntas aos autos, desde 1993 até ao ano 2000, no montante de € 107.764.61, que deve ser indemnizado e que foi totalmente desconsiderado na sentença recorrida” (cfr. fl. 666 dos autos).

Conforme se extrai da argumentação da recorrente A…………, o acórdão recorrido desconsiderou o montante de € 107.764.61 relativo aos danos emergentes, sendo que o acórdão recorrido, relativamente a estes danos, concluiu que os mesmos não estavam demonstrados. Sucede que na matéria de facto fixada na acção declarativa que o acórdão do TAC de Lisboa transcreve e com base na qual funda a sua decisão (juntamente com outros factos que dá como provados) constam os mencionados custos associados ao pagamento de rendas, ao pagamento de ordenados aos sócios trabalhadores e a um empregado, às tentativas no sentido do levantamento da suspensão, ao abandono das instalações por incapacidade de pagamento das rendas, à deterioração de materiais que estavam nos armazéns, etc. – a sentença da 1.ª instância estimou, no entanto, que havia que refazer os cálculos apresentados pela recorrente A………… porque, por exemplo, nem todos os custos com a manutenção da actividade podem ser imputados à ANAC.
Errou, pois, o acórdão recorrido ao afirmar que não estavam demonstrados os factos relativos à conclusão 1.ª – que se reporta aos danos emergentes.
Em suma, devem ser dados como provados os factos relativos a danos resultantes da manutenção da actividade, embora em menor escala, da A…………, até ao ano 2000.



Também no que toca aos lucros cessantes a recorrente A……….. contesta a decisão que consta do acórdão recorrido. E fá-lo nestes termos:

i) Quanto à cessação do contrato da recorrente com a B…………, afirma fundamentalmente que “No que respeita aos danos sofridos com a cessação do contrato da recorrente com a "B………….", empresa americana produtora de aviões agrícolas, ficou provado contrariamente ao que se afirmou, no Acórdão recorrido, que o contrato com a "B………….." foi celebrado em 1994, e duraria originariamente por três anos, de 1994 a 1996, propiciando à recorrente um rendimento diário de 100.00 dólares americanos pela disponibilidade para a reparação de aviões em toda a África e sua representação neste continente”; “Ficou igualmente provado que dadas as excelentes ligações profissionais existentes entre a "B……………" e os sócios da recorrente, que lhe prestaram serviços individualmente mesmo após a cessação do contrato, em 1996, numa situação de normalidade e com total verosimilhança, se deveria presumir e considerar que o contrato de assistência técnica e representação para toda a África, que foi celebrado originariamente por três anos, entre 1994 e Dezembro 1996, tinha todas as condições para continuar por mais três anos até final de 1999”; “Os termos e condições do contrato e o prejuízo que a recorrente teve a partir de Janeiro de 1995, com a cessação deste contrato, por lhe ter sido retirado ilegalmente o certificado JAR 145 pelo INAC IP devem assim considerar-se provados, contrariamente ao que por erro, se decidiu no Acórdão recorrido, não havendo qualquer motivo para recorrer a juízos de equidade para os avaliar”; “Ficou assim cabalmente demonstrado que a recorrente perdeu 73 000,00 dólares americanos em 1995 e 1996, e mais 109 500 dólares americanos entre Janeiro de 1997 e Dezembro de 1999, com a cessação do contrato de assistência técnica e representação da "B…………." em toda a África, que devem ser integralmente indemnizados, ao contrário do que se decidiu por erro no Acórdão recorrido”; “Pelo exposto e considerando a totalidade dos prejuízos resultantes da cessação do contrato celebrado com a "B………….", o INAC IP deve ser condenado a indemnizar a recorrente no montante de 182.500,00 dólares americanos, equivalente a 163.123,00 Euros, ao câmbio actual” (conclusões 16.º a 20.º das alegações de recurso).

No acórdão recorrido disse-se o seguinte: “A argumentação tecida pela recorrente a propósito do contrato celebrado com a B………….. também se mostra inócua, na medida em que decorre de fls. 35 da sentença recorrida que «não resultaram provados os termos e valores do contrato», pelo que os prejuízos ocorridos com a cessação do mesmo contrato não foram objecto de qualquer valoração para o cálculo da indemnização em que a recorrente foi condenada”.
Vejamos.

Não será muito correcto afirmar que a argumentação da recorrente foi inócua, mas entende-se o raciocínio subjacente ao acórdão recorrido. Na sentença da primeira instância realmente foi afirmado que «não resultaram provados os termos e valores do contrato», mas foi admitida a existência de danos. Simplesmente, o seu cálculo foi diluído num apuramento genérico de uma quantia indemnizatória, que foi calculada com recurso a juízos de equidade, e que teve como referente o valor da receita mensal do último trimestre de 1994 globalmente considerado (“Assim temos que para o cálculo dos danos emergentes (com excepção da indemnização pelo relançamento da actividade e de dívidas a terceiros) e dos lucros cessantes que chegar à conclusão a que se chegou na sentença em primeira instância e fazer apelo ao exercício de 1994, por ser este o ano em que a Autora exerceu em pleno a sua actividade, para determinar o rendimento mensal previsível para os anos seguintes e, que no caso se cinge aos 62,5 meses (de 03-11-1994 a 15-01-2000)” (cfr. fl. 576). Pode, deste modo, afirmar-se que não assiste razão à recorrente A………… quando esta pretende que é possível apurar um montante de 109.500 dólares americanos que corresponderiam a esse período de três anos relativos à pretensa renovação do contrato, pois não está provado que o contrato com a B………….. iria ser renovado.

ii) Quanto ao cálculo do valor dos danos sofridos nos 62,5 meses que os tribunais administrativos entenderam ser de contabilizar para efeitos indemnizatórios (“os 62,5 meses decorridos entre a notificação do despacho que suspendeu o certificado JAR 145 e a data do trânsito em julgado do Acórdão do Pleno deste STA que anulou tal acto” – cfr. Ac. de 02.06.10), a recorrente A…………. expõe da seguinte forma os seus argumentos: “O Acórdão recorrido ao liquidar todos os danos sofridos pela recorrente nos 62,5 meses que os Tribunais Administrativos entenderam ser de indemnizar, no valor de € 104.875,00 Euros, com recurso à equidade, violou como já se deixou dito o disposto no nº 3 do Artº 566º do Código Civil, na medida em que não tomou em consideração e muito menos ponderou criticamente, como estava obrigada a fazer, nos termos do Artº 607º nº 2º do C.P.C, e nº 3 do Artº 566º do Código Civil, todos os factos provados e nomeadamente aqueles em que a sentença de 2013 tinha assentado a determinação do dano indemnizável, recorrendo ao mesmo princípio de equidade, e chegando ao valor de 618.052,69 Euros”; “Na verdade, no Acórdão recorrido desconsideraram-se todos os fundamentos que tinham sido aduzidos e descritos na sentença de 2013 e em que tinha fundamentado a sua decisão, de acordo com a equidade, nomeadamente todos os factos provados em julgamento, e o próprio reconhecimento confessório do Réu, feito nos articulados, e com efeito de prova plena, nos termos do Artº 358º nº 1º do Código Civil, quanto aos rendimentos da recorrente no 4º trimestre de 1994, feito pelo INAC, no valor de 2.967.133$00 mensais, bem como a tendência de crescimento de, pelo menos, 3.5% que a empresa apresentava e que ficou inteiramente provada nos autos”; “Mais do que isso, no Acórdão recorrido reduziu-se, sem o menor fundamento, o rendimento mensal que o recorrido reconhecera, com efeitos confessórios, que a A…………. teria tido no último trimestre de 1994 - no valor de 2.967.133$00 mensais (equivalente a 3.000,00 Euros) - por um valor de 1.678,00 Euros mensais, sem qualquer justificação e inclusivé com base num flagrante erro”; “O referido erro manifesto cometido no Acórdão recorrido consistiu ainda em ter-se encontrado o valor de 1.678,00 Euros mensais, correspondente a um rendimento mensal da recorrente, dividindo por 12 meses a sua receita de 1994 quando ela só pode funcionar durante 10 meses nesse ano!”; “Deve ser corrigido o lapso manifesto que a sentença de 2013 cometeu, na página 39, na fixação do valor mensal da receita previsível da exequente no 4º trimestre de 1994, na medida em que o avaliou em 1.978.088$60, (dividindo por três o valor da indemnização reconhecida pelo Réu (5.934.266$00 : 3 = 1.978.088$ 60) quando o valor mensal da perda de receitas no último trimestre de 1994, reconhecido pelo Réu na sua contestação e na sentença de 2/9/2008, era de 2.967.133$00 por mês, calculado com base em dois meses e não em três”; “Corrigido esse lapso, com a recorrente atempadamente pediu, o que não foi mais uma vez apreciado, o valor da indemnização pelos lucros cessantes a pagar à recorrente, com recurso à equidade, de acordo com o exacto fundamento contido nas sentenças de 2008 e 2013, é de 14.800,00 Euros/mensais, devendo a indemnização a atribuir à exequente pelos lucros cessantes ser fixada em € 925.000,00 (62,5 meses de perda de receita a indemnizar x 14 800,00/mês = 925 000,00 Euros)” (cfr. conclusões 21.º e ss. das alegações de recurso).

Atente-se, agora, no que foi dito no acórdão recorrido: “Decorre das declarações de IRC apresentadas pela exequente, levadas ao quadro constante de fls. 2 a 30 da sentença recorrida que a exequente em 1994, ano em que terá laborado em pleno por ser detentora do certificado JAR 145, apresentou um resultado líquido de 4.028.088$00, ou seja, cerca de € 20.140, o que é um dado objectivo, a que correspondem cerca de € 1678 mensais e que se não tivesse perdido o referido certificado nos 62,5 meses seguintes, teria obtido no mínimo o mesmo resultado, a que corresponderá a quantia total de € 104.875, valor que temos por suficiente para indemnizar os danos sofridos, considerando também que em 1995, 1998 e 1999 foram apresentados resultados líquidos negativos”.

Esta decisão do TCAS vai ao encontro do que foi decidido no acórdão do STA de 02.06.10, prolatado no âmbito da acção declarativa. Aí se disse: “Quanto à quantificação dos danos sofridos durante a suspensão do certificado JAR 145, até à sua anulação pelo STA, a sentença fez o seguinte raciocínio. «…Da análise dos balancetes facultados … resulta que a Autora, no segundo trimestre de 1994, teve uma receita média mensal de PTE 1.575.942$00. E, no terceiro trimestre em que ocorreu a suspensão do certificado, uma receita média mensal de PTE 2.162.413$00. … No quarto trimestre, a existência previsível de uma receita mensal de cerca de PTE 2.967.133$00, o que remete para cerca de PTE 5.934.266$ (2.967.133$00 x 2) de receitas no último trimestre do ano. Sendo este o valor que o INAC aceita pagar a título de indemnização pelos prejuízos decorrentes do acto de suspensão».
Partiu a sentença, como se viu, dos valores aceites pelo réu na sua contestação, para encontrar uma receita média mensal, que multiplicou por 62,5, encontrando um valor de 925.000,00 € (novecentos e vinte e cinco mil euros).
Ora, estes cálculos são completamente arbitrários.

É apenas objectivo o período de tempo durante o qual se não pode imputar à autora “culpa” na produção ou dimensão do dano, ou sejam, os 62,5 meses decorridos entre a notificação do despacho que suspendeu o certificado JAR 145 e a data do trânsito em julgado Acórdão do Pleno deste STA que anulou tal acto.

Tudo mais é demasiado vago para suportar um cálculo sobre o prejuízo da autora. Apurar um dano correspondente à media das receitas, é arbitrário, na medida em que não toma em consideração os custos necessários para suportar essas receitas e que não foram efectuados com a cessação de parte importante da actividade exercida”.

Já a sentença do TAC de Lisboa, alheando-se do que foi decidido no acórdão do STA de 02.06.10 – acórdão já transitado em julgado –, partiu do tal valor de 5.934.266$00 (2.967.133$00 x 2) correspondente ao último trimestre de 1994, dividiu-o por três (apurando uma média mensal de 1.978.088$6), converteu-o em Euros (€ 9.890,45) e multiplicou-o por 62,5, chegando ao valor de € 618.052. Não atendeu, portanto, às considerações tecidas no supra citado aresto do STA, e, de igual forma, pela recorrente/recorrida ANAC. Designadamente quando esta última se refere à circunstância de nas contas de 1994 estarem contabilizados os ganhos provenientes do contrato celebrado com a B…………., sendo certo que não ficou provado que o contrato iria ser renovado para além de 1996. Assim sendo, não se poderia ter em consideração os mesmos pretensos ganhos nos 62,5 meses. Efectivamente, e quanto a este específico aspecto, diz-se na sentença do TAC de Lisboa, a fls. 563, “que não se provou que a B…………. iria manter o contrato para além dos 3 anos contratados, que a taxa de crescimento no tipo de empresas da Autora fosse de 25%”. Acresce a isto que não constam dos factos elencados no probatório os termos do contrato com a B…………. no que se refere ao pagamento dos serviços prestados pela A……….. (eram 100 dólares? Era um pagamento diário ou dependia do trabalho prestado pela A………..?). Curiosamente, a sentença da 1.ª instância não se ‘lembrou’ deste importante pormenor quando multiplicou uma determinada quantia fixa por 62,5 meses.

Como se viu, a recorrente A………… defende que o acórdão recorrido andou mal ao não ter considerado todos os factos provados na 1.ª instância e ao não os ter ponderado. Como também se viu, foi a sentença da 1.ª instância que andou mal ao ter feito tábua rasa do que foi decidido em sede de acção declarativa. E, na realidade, as duas decisões – da 1.ª e da 2.ª instância – partem de valores diferentes para fazer os seus cálculos: a da 1.ª instância tomando como ponto de referência o último trimestre de 1994; a da 2.ª instância tomando como ponto de referência um valor que corresponde à declaração do IRC relativo ao ano de 1994 conforme consta da matéria de facto provada. Em suma, não assiste razão à recorrente A……….., pois, verdadeiramente, o que esta questiona é a apreciação dos factos provados que foi feita pelo acórdão recorrido e, com isto, tal como sustenta a recorrente/recorrida ANAC, apenas pretende que seja reapreciada a matéria de facto já assente, o que, in casu, não é possível (cfr. art. 150.º, n.º 4, do CPTA).

Mas a recorrente/recorrida ANAC também não aceita as ‘contas’ feitas pelo acórdão recorrido. Efectivamente, nas conclusões XXXVI. E XXXVII. das suas contra-alegações afirma o seguinte: “Porém, e ainda que não se discorde da base de cálculo que esteve subjacente à determinação do valor a indemnizar – Declaração do IRC relativa ao ano de 1994, o mesmo enferma de erro ao basear-se no resultado líquido mensal de 1.678,00 €, considerando como um dado objetivo e certo que, se não tivesse perdido o referido certificado, teria obtido no mínimo esse mesmo resultado nos 62,5 meses seguintes”. “Ora, este raciocínio para além de não ser verosímil, não é correto, porquanto no resultado líquido apresentado já se encontra refletido o valor do alegado contrato de assistência técnica celebrado com a empresa B…………..”.

Quid juris?

Como se viu há pouco (cfr. ponto 2.6.), a ANAC também colocou esta questão como tratando-se de nulidade por contradição entre a decisão e os fundamentos, tendo-se concluído pela procedência da invocada nulidade, razão pela qual nos dispensamos de apreciar o alegado erro de julgamento em apreço ao abrigo do n.º 2 do artigo 608.º do CPC (aplicável ex vi dos artigos 1.º e 140.º, n.º 3, do CPTA). Apenas cabe relembrar que, estando demonstrado com certeza suficiente que o contrato com a A…………. começou a produzir efeitos logo no início de 1994 e que deveria manter-se durante 3 anos, até 1996, o cálculo da indemnização, que deverá obedecer a um juízo de equidade, não poderá ter em consideração o período que intercorre entre Janeiro de 1997 e Dezembro de 1999 e nem também os pretendidos 109.500 dólares americanos que corresponderiam a esse período. Em suma, no cálculo da quantia devida a título de lucros cessantes respeitantes aos 62,5 meses em que a A………… não pôde laborar em pleno em virtude da suspensão do certificado JAR 145 há que ter em atenção que não se deu como provada a renovação do contrato com a B…………...

2.10. Do alegado erro de julgamento relativamente o momento do início da contagem dos juros de mora

No que respeita a esta específica questão, alega a recorrente/recorrida A…………. que os juros se devem contar desde a sentença da 1.ª instância prolatada em sede de acção declarativa, apoiando-se no que é dito na própria sentença e nos acórdãos do STA de 2010 que mantiveram esta parte da sentença. A recorrente/recorrida ANAC sustenta que os juros são devidos desde a sentença da 1.ª instância prolatada em sede de acção executiva, apoiando-se no que é dito na sentença em apreço. Na verdade, as duas sentenças mencionadas decidem de modo diverso e o que dizem ambas as partes corresponde à verdade. Já o acórdão recorrido enveredou por uma outra solução: “Às referidas quantias de € 66.524,58 e de € 104.875, no total de € 171.399,58, acrescem juros de mora à taxa legal, a contar da notificação do presente acórdão, por só agora se tornarem quantias líquidas, merecendo, nestes termos, parcial provimento o recurso jurisdicional interposto pelo INAC”.

Vejamos qual é a solução jurídica correcta, para isso tendo em consideração o disposto no artigo 805.º do Código Civil (CC), em particular, o seu n.º 3.


Artigo 805.º
Momento da constituição em mora

“1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver prazo certo;
b) Se a obrigação provier de facto ilícito;
c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido.
3 - Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número”.

Tratando-se, no caso vertente, de uma situação de responsabilidade extracontratual por acto ilícito, dúvidas não existem de que se deve aplicar ao caso dos autos a 2.ª parte do n.º 3 do artigo 805.º do CC, na qual foi estabelecida uma excepção à regra “in illiquidis non fit mora”, nos termos da qual os juros de mora se devem contar desde a citação do lesante-devedor e não desde a sentença (do trânsito em julgado da mesma). Mas, poderia surgir a dúvida se a citação se reporta à acção declarativa (como pretende a recorrente/recorrida A…………..), ou à acção executiva. Tendo em conta a motivação do legislador subjacente à introdução deste n.º 3, há que entender que a citação se reporta à acção declarativa.
Resta lembrar que deverá ser tida em conta a orientação contida no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ, de 09.05.02, Proc. n.º 01A1508, sistematizada no seu sumário: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação” (orientação jurisprudencial citada no Acórdão do STA de 15.01.13, Proc. n.º 610/12).
Em suma, os juros de mora devem ser contabilizados desde a citação da executada – em sede, pois, de acção executiva –, sem embargo de se poder atender à orientação jurisprudencial contida no Acórdão do STJ de 09.05.02, Proc. n.º 01A1508, citada no ponto 2.9.


III – Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em conceder parcial provimento aos recursos, devendo os autos baixar ao TCA para o apuramento, com recurso a juízos de equidade, do quantum indemnizatório, e no respeito dos comandos contidos neste acórdão.

Custas pelas partes, na medida do seu decaimento.

Lisboa, 13 de Dezembro de 2018. – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano (relatora) – Jorge Artur Madeira dos Santos – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa.

Segue acórdão de 14 de Fevereiro de 2019:

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1. A…………, Lda (A……….), notificada do acórdão desta Secção de Contencioso Administrativo de 13.12.18, “vem ao abrigo do disposto nos artigos 613 nº 2 e 614 nº 1 do Código de Processo Civil aplicável ao processo administrativo ‘ex vi’ do disposto no artigo 1º do Código de Processo Administrativo, requerer a V. Exas. a correcção do erro de escrita ou lapso manifesto, que no seu entender, se contem na última página do Acórdão (…)”.

Assim, na p. 44 do aresto em causa afirma-se o seguinte:

“Tratando-se, no caso vertente, de uma situação de responsabilidade extracontratual por acto ilícito, dúvidas não existem de que se deve aplicar ao caso dos autos a 2.ª parte do n.º 3 do artigo 805.º do CC, na qual foi estabelecida uma excepção à regra “in illiquidis non fit mora”, nos termos da qual os juros de mora se devem contar desde a citação do lesante-devedor e não desde a sentença (do trânsito em julgado da mesma). Mas, poderia surgir a dúvida se a citação se reporta à acção declarativa (como pretende a recorrente/recorrida A………..), ou à acção executiva. Tendo em conta a motivação do legislador subjacente à introdução deste n.º 3, há que entender que a citação se reporta à acção declarativa” [negrito nosso].

Na p. 45 do mesmo aresto, e sobre a mesma questão, afirma-se:

“Em suma, os juros de mora devem ser contabilizados desde a citação da executada – em sede, pois, de acção executiva –, sem embargo de se poder atender à orientação jurisprudencial contida no Acórdão do STJ de 09.05.02, Proc. n.º 01A1508, citada no ponto 2.9.” [negrito nosso].

2. Notificada para se pronunciar, a ANAC (Autoridade Nacional da Aviação Civil) nada disse.

3. Os autos vêm à conferência sem vistos, dada a simplicidade da questão a resolver.

II – Apreciação e Decisão


4. Sem necessidade de especiais desenvolvimentos, uma vez que é patente o invocado e assinalado erro de escrita, impõe-se a sua rectificação nos termos do artigo 614.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º do CPTA. Resulta de forma límpida do raciocínio do julgador desenvolvido na p. 44 que a citação se reporta à acção declarativa e não como, por manifesto lapso se disse, à acção executiva.

5. Nesta conformidade, acorda-se em deferir o pedido de rectificação do invocado erro de escrita, passando, consequentemente, a constar da linha 9 da p. 45 do acórdão em causa a expressão “acção declarativa” em vez de “acção executiva”.


Sem custas.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2019. – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano (relatora) – Jorge Artur Madeira dos Santos – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa.