Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0346/13.8BESNT
Data do Acordão:01/26/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
ADMISSÃO
Sumário:Justifica-se a admissão da revista, dada a importância jurídica fundamental da questão decidenda decorrente da sua (pelo menos aparente) complexidade, num caso, como o dos autos, em que, perante um quadro factual que envolve negócios jurídicos atípicos, as instâncias decidiram em termos opostos, justificando-se a intervenção deste STA para dissipar dúvidas quanto a saber se o Tribunal Central Administrativo, ao limitar a questão decidenda nos termos em que o fez, terá simplificado demasiadamente a questão a decidir, desatendendo ao contexto negocial fixado no probatório, ou se, pelo contrário, ao assim simplificar, reconduziu a questão que importava resolver aos seus devidos termos.
Nº Convencional:JSTA000P28840
Nº do Documento:SA2202201260346/13
Data de Entrada:10/26/2021
Recorrente:A……….. E OUTROS
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório -

1 – A............ e B…………, ambos com os sinais dos autos, vêm, ao abrigo do disposto no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excepcional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 13 de maio de 2021, que concedeu provimento ao recurso da AT da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgara procedente a impugnação judicial por eles deduzida contra liquidações de IRS e juros compensatórios, revogando a sentença recorrida e julgando improcedente a impugnação.

Os recorrentes terminam as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

A - Aqueles que têm como função (e querem) buscar e administrar a justiça nos casos concretos, devem/têm de ter sempre em conta a natureza das coisas, porquanto "a realidade das coisas" (ou seja, a realidade material da vida quotidiana tal como ela verdadeiramente é), não pode ser ignorada ou desprezada, já que essa materialidade objetiva acaba sempre por se impor a todos, mesmo aqueles que fingem que ela não existe, sendo que, quando uma tal descuidada e desadequada visão/representação dos factos prevalece ou se torna preponderante é a tutela da certeza e da segurança jurídicas que é posta em perigo e, no final, é a proteção dos direitos de todos aqueles que interagem no comércio jurídico que está a ser desconsiderada. Ou seja, exige-se ao concreto julgador que escalpelize muito cuidadosamente as várias condutas em causa nos autos através dos diversos contratos e que o faça (para usar um conceito originário da cultura jurídica francesa) sem paixão, ódio ou rancor e também (para usar novamente uma expressão muito querida da cultura jurídica anglo saxónica) sem preconceitos ou ideias pré-concebidas.

B - Estando provado, para além de qualquer dúvida razoável, que o Impugnante não recebeu o rendimento em causa nos autos, nem o poderia ter recebido, face à matéria de facto provada, não é lícito ao julgador ignorar, completamente, os efeitos jurídicos que decorrem dos contratos dados como provados para ficcionar uma realidade diferente da que verdadeiramente é.

C - O objeto do presente recurso é o excerto decisório do Acórdão recorrido, nomeadamente, a sua apreciação de direito que ora se transcreve abaixo:

"Em face da matéria de facto relevante, suscita-se a questão de saber se os rendimentos pagos ao impugnante, como contrapartida pela prestação de serviços com vista à instalação dos parques eólicos em presença integraram ou não a sua esfera jurídica, no exercício de 2008, na parte que lhe é imputável, devendo ser tributados como rendimentos da categoria B.

Nos termos do artigo 3.º/1, do CIRS, «Consideram-se rendimentos empresariais e profissionais:

b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior». N.º 6 - «Os rendimentos referidos neste artigo ficam sujeitos a tributação desde o momento em que para efeitos de IVA seja obrigatória a emissão de fatura ou documento equivalente ou, não sendo obrigatória a sua emissão, desde o momento do pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares».

«Os rendimentos que pertençam em comum a várias pessoas são imputados a estas na proporção das respetivas quotas, que se presumem iguais quando indeterminadas» [Artigo 19.º do CIRS].

Na tese do impugnante, a cessão da posição contratual por si detida, no âmbito do contrato referido em A), outorgado com a sociedade C………… (Portugal) à sociedade D…………, SA, mediante a contrapartida de um direito de aquisição de acções na sociedade E………… SA, teria o efeito de precludir o ingresso do rendimento obtido no âmbito daquele contrato na esfera jurídica do impugnante. Estavam em causa os honorários pagos ao impugnante pela prestação de serviços com vista à instalação dos parques eólicos do …………. e de …………. Uma vez realizada a prestação de serviços em apreço, com o licenciamento dos parques eólicos em causa (alíneas /) e M), foram pagas as remunerações devidas, desta feita ao cessionário do crédito (alíneas J) e K).

No caso em exame, a cessão do crédito emergente do contrato de prestação de serviços recenseado nos autos, cujo pagamento ocorreu no exercício de 2008, pese embora ter sido recebido por terceiro, corresponde a rendimento auferido pelos sujeitos prestadores dos serviços, ou seja, o impugnante e co-prestador.

O facto gerador do imposto corresponde à data dos pagamentos dos rendimentos em apreço, os quais, pese embora terem sido pagos à sociedade cessionária, não deixam de ser a contrapartida devida aos cedentes pela prestação de serviços relacionada com a instalação dos parques eólicos mencionados.

A cessão do crédito não obliterou a natureza da percepção de rendimento, como contrapartida da prestação de serviços, associada, de resto à obtenção dos resultados da mesma (o licenciamento dos parques eólicos). A cessão do crédito só operou e apenas se consumou, com a investidura do recorrido na titularidade das acções, após a realização da prestação e da contraprestação, no âmbito do contrato de prestação de serviços.

A referência à tributação das acções que, entretanto, ingressaram na esfera jurídica do recorrido nada tem que ver com a percepção do rendimento, associada à prestação de serviços, a qual é tributada em sede de categoria B do IRS.

Sendo esta a fundamentação do acto tributário, não se vê como acompanhar a tese dos alegados erros ou vícios em que mesmo teria incorrido. O rendimento é pago ao cessionário, mas é imputado ao cedente, ingressando na sua esfera jurídica, no momento em que é disponibilizado, sendo, depois, convertido na contrapartida da cessão de créditos. Pelo que é na esfera do segundo que deve ser tributado, como foi, no caso."

D - Constitui ainda objeto do presente recurso de revista o excerto do Acórdão que se debruça sobre a matéria de facto que considerou relevante para a subsequente apreciação de direito, que se transcreve: "c) Em 30.11.2007, o impugnante e F............ indicaram a sociedade D…………, SA como beneficiária dos direitos emergentes do contrato referido em a)"

E - As instâncias adotaram posições absolutamente contrárias com base nos mesmos factos e abriram questões de direito de importância fulcral sobre as quais o Supremo Tribunal Administrativo (STA) tem, necessariamente, que tomar posição.

F - A primeira questão que se submete a revista é a seguinte:

As normas do artigo 38º da Lei Geral Tributaria (LGT) permitem à Autoridade Tributária (AT) desconsiderar negócios jurídicos ou considerá-los ineficazes para efeitos tributários, exigindo-se à AT o ónus da fundamentação legal, para que possa proceder à liquidação de impostos, com base numa relação jurídica tributária que assim difere da relação jurídica resultante dos negócios jurídicos desconsiderados ou tornados fiscalmente ineficazes.

No caso da AT não fundamentar a liquidação, nos termos daquela norma do artigo 38º da LGT, e aceitar os negócios jurídicos, não tendo sequer impugnado os atos e contratos que titularam os negócios jurídicos, que passaram a constituir factos provados e assentes, poderá tributar em IRS um sujeito passivo por rendimentos comprovadamente faturados por outra entidade e pagos a esta outra entidade, nos termos contratualizados?

Ou seja,

Cabe ou não à AT o ónus de demonstrar os pressupostos do direito de tributar (Cfr. artigos 1.2 n.2 3 e 74.º n.º 1 da LGT} de forma que, nessa demonstração, se integre a fundamentação do ato de liquidação com anterioridade ou contemporaneidade ao ato de liquidação?

Estão, ou não, a AT e o próprio tribunal vinculados a reconhecerem os efeitos jurídicos dos negócios jurídicos dados como provados caso a AT não se socorra, para a fundamentação da liquidação, da norma do artigo 38.º da LGT?

G - A Segunda questão que se submete a revista é a seguinte:

Um Contrato de Share Option Agreement (com o conteúdo como o que se mostra provado nos autos) é um contrato de Permuta de direitos, através do qual uma das partes transmite, definitivamente, um direito de natureza aleatória e incerta, dependente da verificação de uma condição externa aos contraentes, em troca do direito de opção pela aquisição de uma participação social numa sociedade, sendo que, o direito de opção, poderá, ou não, ser exercido, porque de uma mera Assim, a permuta de um direito a um success fee, por um direito de opção a adquirir uma participação social, torna-se ou não definitiva quanto aos seus efeitos no momento da sua celebração?

H - A Terceira questão que se submete a revista é a seguinte:

Se a permuta de direitos, a que se refere a questão anterior, fosse qualificada como uma cessão de créditos, não se tornaria também definitiva no momento da sua celebração?

1 - A Quarta questão que se submete a revista é a seguinte:

Face a um contrato que constitui matéria assente, e que obriga uma entidade a faturar a outra, é admissível que, com fundamento nos termos do n.º 6 do artigo 3.º do Código de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), se exija, como faz a AT in casu, também a obrigação de emitir fatura, por outro sujeito passivo, relativamente ao mesmo rendimento, já faturado e pago a outra entidade, sem antes desconsiderar, nos termos do artigo 38.2 da LGT, o contrato de onde emerge tal obrigação?

J - A Quinta questão que se submete a revista é a seguinte:

Pode imputar-se, a uma pessoa singular, com fundamento no artigo 3.º, n.º 1 b) e n. 26 do CIRS, um rendimento que não recebeu, nem foi colocado à sua disposição, mas antes foi pago e considerado rendimento de pessoa jurídica, a quem prévia e contratualmente alienou o direito ao potencial, incerto e futuro crédito donde proveio o rendimento?

K - A Sexta questão que se submete a revista é a seguinte:

Pode ao alienante do direito que recebe em permuta um direito de opção (entretanto exercido) cuja declaração fiscal deu já origem a tributação de IRS, no âmbito da legislação RERT II, ser exigida tributação, novamente em IRS, pela imputação de rendimentos, recebidos pelo adquirente, sendo certo que o adquirente foi também objeto de tributação em sede de Imposto sobre rendimento e IVA?

L - O recorrente identifica com clareza as questões sobre as quais pretende que o Supremo Tribunal Administrativo se pronuncie e aduz alegação em ordem à verificação dos requisitos de admissibilidade do presente recurso, como impõem o artigo 285.º do CPPT.

M - Dão-se aqui por integralmente reproduzidos os factos provados com relevância para a apreciação das questões submetidas a revista, que corresponde aliás à matéria de facto provada em 1.ª instância e que consta reproduzida no Acórdão recorrido (fls. 13 a 30).

N - A violação pelo Acórdão recorrido de uma disposição expressa na Lei que fixa a força a determinado meio de prova pode constituir objeto de Recurso de Revista Excepcional, como é aqui também o caso (artigo 285.º n.º 4 do CPPT). Com efeito,

O - Nos termos do disposto no artigo 374.º do Código Civil (CC) consideram-se verdadeiros os documentos particulares quando os mesmos não sejam impugnados pela parte contra quem os mesmos são apresentados.

P - Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 376.º do CC os documentos particulares cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes (leia-se 374.º do CC) fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade dos documentos, o que nos autos não aconteceu.

Q- A sentença considerou provados, como não poderia deixar de fazer, o Contrato de Opção de Compra de Ações de 15 de março de 2006 (al. E) dos factos provados da Sentença) e o Contrato de Opção de Compras de Ações (aditamento de 2009 - al. O) dos factos provados da Sentença).

R - O Acórdão recorrido foi chamado a apreciar uma impugnação sobre a matéria de facto assente na Sentença que consistia na eliminação do quesito das alíneas B) e G) as quais dispõem o seguinte:

"B) O Impugnante, A…………, e o co-outorgante do contrato descrito na alínea anterior, F…………, acordaram verbalmente entre si que o valor da remuneração prevista no artigo 2.1. do referido contrato, seria devido a A…………, na parte referente aos resultados obtidos pela empresa portuguesa, e a F………… na parte referente aos resultados obtidos pela empresa brasileira. - cf. declarações de parte e depoimento da testemunha F............, e ponto 2) do acordo que veio a ser celebrado em Abril de 2009, e se encontra vertido adiante, nas alíneas O) e N)

G). Em 30 de Novembro de 2007, por indicação de G…………, o Impugnante A………… e F………..., indicaram a sociedade D…………, S.A., como beneficiária do "sucess fee", previsto no contrato descrito na alínea A) supra. - depoimento de parte e das testemunhas e "Contrat de Prestation de Services", de fls. 134 a 136 do PAT apenso"

Sob o aludido requerimento da Recorrente decidiu o Acórdão recorrido que:

"Compulsados os autos e ouvida a prova testemunhal, não se vê como corroborar o enunciando da alínea B). Dado que, para além do depoimento dos interessados não existem outros elementos, designadamente documentais ou testemunhais, que confirmem ou infirmem o enunciado em apreço. A omissão declarativa dos interessados também não permite configurar com segurança os termos do negócio. Pelo que se impõe eliminar o enunciado fáctico em apreço.

No que respeita ao enunciado da alínea G), o mesmo é redundante, em face da matéria de facto assente. Por esta razão, o mesmo deve ser eliminado da matéria de facto assente."

S - Ora, a decisão do Acórdão recorrido em eliminar o enunciado fático das alíneas B) e G) da matéria de facto assente, viola disposição expressa da Lei que fixa a força de determinado meio de prova, além de constituir, em si mesmo, uma contradição insanável face ao que dispõem as próprias alíneas B) e G) quanto à motivação que levou o tribunal de 1.ª instância a dar como assente tais factos.

T - Efetivamente, só por descuido, o Acórdão recorrido pode afirmar que não existem outros elementos documentais que confirmem o enunciado em B) e que o enunciado da alínea G é redundante em face da matéria de facto assente, sem que fundamente ou justifique em que consistiria tal redundância, quando consta das alíneas B) e G) que:

"B (...) - cf declarações de parte e depoimento da testemunha F…………., e ponto 2) do acordo que veio a ser celebrado em Abril de 2009, e se encontra vertido adiante, nas alíneas O) e N);

G (...) depoimento de parte e das testemunhas e "Contrat de Prestation de Services", de fls. 134 a 136 do PAT apenso"

U - A eliminação dos factos B) e G) da matéria assente serve apenas o propósito de permitir que conste do probatório considerado relevante para apreciação pelo TCA a alínea C) que dispõem o seguinte: "Em 30.11.2007, o Impugnante e F………... indicaram a sociedade D………… SA como beneficiária dos direitos emergentes do contrato referido em A) - Cfr. alínea linha H) do probatório".

V - O Acórdão recorrido julgou contra factos que assentaram também em documentos, que fizeram prova plena quanto ao seu conteúdo, com a incorreta afirmação de que não existiam provas documentais que suportassem a prova dos aludidos factos, quando essas referências documentais estão expressamente referidas nas próprias alíneas B) e G),

Quando ignora, nomeadamente, que:

a) Não foi o Impugnante e F…………. que indicaram a sociedade D………… SA como beneficiária dos Success Fee. Tal decorre, provado, na alínea G) da matéria assente quando expressamente se refere que "G) Em 30 de Novembro de 2007, por indicação de G…………, o Impugnante A………… e F…………, indicaram a sociedade D……….., S.A., como beneficiária do "success fee", previsto no contrato descrito na alínea A} supra. - depoimento de parte e das testemunhas e "Contrat de Prestation de Services11 de fIs. 134 a 136 do PAT apenso";

b) Também não é indicada, pelo Impugnante e F………… a D………… SA como beneficiária de direitos emergentes do contrato de 1 de julho de 2003, pois decorre da própria alínea H) da matéria assente conjugada com a alínea G) anterior, que a Indicação de G………… foi formalizada mediante a assinatura do Impugnante e F…………. no contrato de 30 de novembro de 2007.

W - Caberá, assim, que, neste particular, se voltem a considerar os quesitos das alíneas B) e G) nos exatos termos que constam da sentença da 1.ª instância.

X - As normas do artigo 38º da LGT permitem à AT desconsiderar negócios jurídicos ou considerá-los ineficazes para efeitos tributários, exigindo-se, contudo, à AT, o ónus da fundamentação legal para que possa proceder à liquidação de impostos com base numa relação jurídica tributária que assim difere da relação jurídica resultante dos negócios jurídicos desconsiderados ou tornados fiscalmente ineficazes.

V - No caso da AT não fundamentar a liquidação nos termos daquelas normas do artigo 38º da LGT e aceitar os negócios jurídicos, não tendo sequer impugnado os atos e contratos que titularam os negócios jurídicos que passaram a constituir factos provados e assentes, não poderá tributar em IRS um sujeito passivo por rendimentos comprovadamente faturados por outra entidade e pagos a esta outra entidade, nos termos contratualizados.

Ou seja,

Cabia à AT o ónus de demonstrar os pressupostos do direito de tributar (Cfr. artigos 12 n.º 3 e 74.º n.º 1 da LGT) de forma que, nessa demonstração, se integre a fundamentação do ato de liquidação com anterioridade ou contemporaneidade ao ato de liquidação.

Z -Tanto a AT, como o próprio tribunal, estão vinculados a reconhecerem os efeitos jurídicos dos negócios jurídicos dados como provados uma vez que a AT não fundamentou a liquidação, na ineficácia ou desconsideração dos negócios jurídicos seguindo o inter previsto no artigo 38.2 da LGT.

AA - Ora, no caso concreto dos presentes autos os efeitos jurídicos dos contratos, dados como provados, com relevância para a apreciação desta questão, são, designadamente, os seguintes:

a) Contrato de prestação de serviços datado de 1 de julho 2003;

b) Contrato (Share option agreement ) de 15 de março de 2006, nos termos do qual, o Impugnante, permuta o potencial direito a um success fee (de natureza incerta e aleatória), emergente do Contrato de 1 de julho de 2003, por um direito de opção de aquisição de ações da E............ SA;

c) Revogação do contrato de prestação de serviços de 1 de julho 2003, operada por virtude da cláusula primeira do Contrato de 30 de novembro de 2007;

d) Designação, por G…………, nos temos do contrato referido em b), da sociedade D………… SA como beneficiária do direito, por ele adquirido, à sombra do contrato referido em b) e para os efeitos do Contrato de 30 de novembro de 2007;

E) Contrato de 30 de novembro de 2007 que constitui as sociedades Eólica da ………. e ……, EN Portugal na obrigação de pagar à D……….., SA se, e quando, forem emitidas as licenças de exploração dos parques Eólicos em questão;

F) Faturação emitida pela D……….., SA às sociedades Eólica da ………. e ……, EN Portugal em execução do Contrato de 30 de novembro de 2007;

G) Pagamento das Faturas pela Eólica da …… e …….., EN Portugal à D…………, SA, em cumprimento das obrigações estabelecidas no Contrato de 30 de novembro de 2007;

H) Aquisição, pelo Impugnante, de 4.660 ações da sociedade E………… em execução do direito de opção de aquisição de ações, adquirido pelo Contrato de 15 de março de 2006 (SHARE OPTION AGREEMENT), através do "Contrato de Opção de Compra de Ações (Aditamento de 2009)".

1) Declaração de Regularização Tributária do Impugnante entregue, em 22 de junho de 2010, junto do Banco de Portugal ao abrigo do RERT II onde se declarou a aquisição de 4.660 ações da sociedade E………… SA;

J) Liquidação de IRS ao Impugnante do valor de € 382.096,32, pago em 1de julho de 2010, na sequência da declaração referida na alínea anterior.

BB - Todos os factos enunciados, na conclusão anterior, constituem factos plenamente provados cujos efeitos jurídicos só poderiam deixar de ser reconhecidos, para efeitos fiscais, se tivessem sido objeto de desconsideração jurídica, por parte da AT, na fundamentação da liquidação operada no Relatório de Inspeção Tributária e/ou em sede Contestação da Impugnação em 1.ª instância,

CC - O que não aconteceu, justificando a seguinte afirmação da Sentença na motivação da decisão de facto, "Ora, dos autos resulta que a Autoridade Tributária apreendeu o conteúdo dos referidos documentos, desde logo porquanto os mesmos lhe foram apresentados no procedimento de inspeção tributária, tendo o seu conteúdo sido apreciado e valorado, na versão original. De igual modo, a Fazenda Pública, nas suas intervenções processuais nos presentes autos, não suscitou qualquer obstáculo à apreciação do conteúdo dos referidos documentos. "

DD - Constitui matéria de facto provada e não impugnada, que em 15 de março de 2006, o Impugnante A………… e F………… e G………… no exercício da sua liberdade contratual, que lhes é conferida pelo artigo 405.2 do Código Civil, alienaram de forma definitiva e incondicional um direito (de natureza incerta e aleatória) em troca de um direito de optar por adquirir (ou não) uma participação social numa sociedade (E………… SA).

EE - A partir do momento da alienação, mencionada na conclusão anterior, a verificar-se o direito ao Success fee, ele já não pertencia, naturalmente, aos alienantes, como resulta do próprio texto do documento provado (Share option agreement de 15 de março de 2006).

FF - Como resulta do conteúdo do Contrato de 30 de novembro de 2007 o Impugnante e F………… intervêm nele para:

a) Revogarem definitivamente o contrato de prestação de serviços de 2003 e aí declararem (Cláusula Primeira) que formalmente renunciam a prevalecer-se sobre qualquer das suas disposições;

b) Na qualidade de meros núncios, e em cumprimento do Contrato de Share Option Agreement de 15 de março de 2006, indicarem, em nome G…………, a sociedade, por este designada (conforme previsto naquele contrato), do grupo E…………

GG - Em consequência dos direitos e obrigações estabelecidos no contrato mencionado na conclusão anterior, considerado provado, provou-se que os referidos rendimentos em questão foram objeto de faturação pela D……… às sociedades Eólica da …….. e …. EN, PORTUGAL, foram pagos à D………… e, consequentemente, não foram pagos ao Impugnante nem colocados à sua disposição, nem o poderiam ter sido, de acordo com os contratos dados como provados.

HH - Fora do âmbito da norma do artigo 20.2 do CIRS, não é possível imputar a sujeito passivo rendimentos pagos a outro sujeito passivo, a não ser por via da desconsideração e da ineficácia de negócios jurídicos, devidamente fundamentada, no âmbito do artigo 38.2 da LGT, o que não aconteceu.

II - O Acórdão recorrido erra, grosseiramente, na qualificação jurídica do Share Option Agreement de 15 de março de 2006, cuja natureza jurídica não alcançou, limitando-se a assumi-la como uma mera cessão ordinária de créditos. Ora, o Share Option Agreement de 15 de março de 2006, é um Contrato de Permuta de Direitos, através do qual o Impugnante e F………… transmitem, definitiva e incondicionalmente, um direito de natureza aleatória e incerta, dependente apenas da verificação de uma condição externa (a emissão de licença pelo organismo competente), em troca do direito a optarem pela aquisição de uma participação social na empresa E………… sendo que, esse direito de opção, poderia, ou não, ser exercido, porque de uma mera opção se trata.

JJ - A afirmação constante do Acórdão recorrido, a fls. 45, de que a "cessão do crédito só operou e apenas se consumou, com a investidura do recorrido na titularidade das ações, após a realização da prestação e da contraprestação (...)" não faz sentido no âmbito do contrato Share Option Agreement de 15 de março de 2006, o qual é de consumação imediata, na data da sua celebração, com a atribuição de um simples direito de opção (a ser exercido ou não pelo seu titular) em troca do direito de designar uma sociedade controlada pela E............, a indicar por G…………, como beneficiária de qualquer e todos os futuros e incertos direitos a success fee's derivados dos contratos a que aludem os considerandos do Share Option Agreement de 15 de março de 2006.

KK - Erra, grosseiramente, o Acórdão recorrido quando, em continuação daquela afirmação, refere que: "acessão de créditos operou e apenas se consumou com a investidura do Recorrido na titularidade das ações, após a realização da prestação e da contraprestação, no âmbito do Contrato de Prestação de Serviços", porquanto uma tal afirmação faz "tábua rasa" de um facto provado de onde decorrem efeitos jurídicos contrários, ou seja, ignora por completo que o Contrato de prestação de serviços de 1 julho de 2003 foi revogado em 30 de novembro de 2007 pelo que, não pode, naturalmente, produzir efeitos jurídicos na esfera jurídica do Impugnante após a sua revogação. Ou seja, após a revogação não poderia existir, ao abrigo daquele contrato, qualquer prestação ou contra prestação.

LL - Ainda que se qualificasse tal contrato como Cessão de Créditos (o que apenas se admite para efeitos de raciocínio), o cedente despojou-se, definitivamente, do seu direito a qualquer Success Fee na data da cessão (15 de março de 2006), uma vez que esta é efetuada de forma definitiva e incondicional. É assim, da mais pura e cristalina evidência, caso se qualificasse o Share Option Agreement como uma cessão de créditos, o momento da cessão definitiva teria ocorrido em 15 de março de 2006, pois foi nessa data que o Impugnante perdeu, definitivamente, qualquer direito sobre o success fee, passando esse direito a estar na esfera jurídica de G…………., ou seja, de quem, contratualmente, tinha o direito de designar uma sociedade do grupo E………… como beneficiária do eventual success fee.

MM - Sendo factos provados que:

- O Contrato de Prestação de Serviços de 1 de julho 2003 foi revogado pelo Contrato de 30 de novembro de 2007.

- O Contrato de 30 de novembro de 2007 estabeleceu obrigações de pagamento entre Eólica da …….. e …… EN, Portugal, por um lado e D…………, por outro, uma vez verificada a condição de pagamento.

- Verificada as condições de pagamento a D………… emitiu às obrigadas, Eólica da ……. e …. EN, Portugal, as faturas dos montantes contratualizados.

- Estas empresas efetuaram os pagamentos à D………….

Está reconhecido que o Impugnante não recebeu, nem contratualmente poderia receber, pelo que, não está obrigado, nem poderia estar, a faturar montantes que não recebeu, nem foram colocados à sua disposição, nem o poderiam ser.

NN - Sem destruir a eficácia jurídica dos contratos dados como provados, o que não foi feito (nem em sede de inspeção, nem em sede de contestação da Impugnação e/ou julgamento na 1.ª instância) e já não pode ser, não é possível imputar ao Impugnante qualquer rendimento não só pelo facto de o seu potencial direito ter sido definitivamente alienado em 15 de março de 2006, como pelo facto de o originário contrato de prestação de serviços de 1 de julho de 2003 ter sido revogado em 30 de novembro de 2007.

OO - Foi apurado, conforme a matéria de facto provado, que o lote de 4.660 acções da E………… S.A. adquirido pelo Impugnante A………… tem a sua origem no direito ao "success fee" consagrado no contrato descrito na alínea A) da factualidade assente (cf. alíneas E) e O) da factualidade assente), impunha-se à Administração Tributária proceder ao enquadramento tributário deste rendimento e, subsequentemente, à sua tributação.

PP - Pelo que, no contexto factual provado é, no mínimo, absurda, a afirmação do Acórdão recorrido de que: "A referência à tributação das acções que, entretanto, ingressaram na esfera jurídica do recorrido nada tem que ver com a percepção do rendimento, associada à prestação de serviços, a qual é tributada em sede de categoria B do IRS."

QQ - Como resulta da Sentença, "(...) a detenção de tais acções, ou seja, o lote de 4.660 acções na E............, S.A. - que consubstanciariam um rendimento em espécie proveniente da cedência do "success fee" previsto no contrato de prestação de serviços celebrado em 2003 - já se encontra tributada, porquanto o Impugnante aderiu, em 2010 ao regime excepcional de regularização tributária de elementos patrimoniais que não se encontrem no território português, em 31 de Dezembro de 2009 (RERT II), criado pelo artigo 131.º da lei n.º 3-B/2010, que aprovou o Orçamento do Estado para 2010, e pagou o IRS apurado em conformidade. (cf. alíneas O), T), U) e V) da factualidade assente)"

RR - Nos termos do artigo 4º do RERT II, a declaração e pagamento do imposto previsto neste regime tem como efeito, consagrado no n.º 1 alínea a), "relativamente aos elementos patrimoniais constantes da declaração e respectivos rendimentos", entre outros, a extinção "das obrigações tributárias exigíveis em relação àqueles elementos e rendimentos, respeitantes aos períodos de tributação que tenham terminado até 31 de dezembro de 2009".

SS - Resultando dos autos que o lote de 4.660 acções na E…………. S.A. detidas e declaradas ao abrigo do RERT II pelo Impugnante A…………, consubstancia o rendimento por este obtido na sequência da verificação da condição que determinou o pagamento de uma quantia pecuniária, a título de "success fee", (cf. alíneas A), E), G), H), N) e O) da factualidade assente). E que este rendimento foi tributado nos termos do RERT II (cf. alíneas O), T), U) e V) da factualidade assente), haverá que concluir que, por força do disposto no artigo 4º n.º 1 alínea a} do RERT II, seria ilegal qualquer tributação adicional sobre este rendimento.

TT - Acresce que a adesão ao RERT II ocorreu em 2010 e o procedimento de inspecção tributária apenas se iniciou em 2012 (cf. alíneas T) e W) da factualidade assente), pela que, e tendo presente o disposto no n.º 2 do citado artigo 4º do RERT II, o enquadramento deste rendimento no âmbito do procedimento de inspeção tributária seria inútil, par conduzir a uma situação de dupla tributação que não poderia manter-se.

UU - Haverá que concluir que a realidade tributada pela Autoridade Tributária e que deu origem à liquidação impugnada, não existe nos termos em que foi descrita e tributada, ou seja, incide sobre um facto que não é tributável na esfera do Impugnante, enfermando assim de erro sobre os pressupostos de facto e de errónea qualificação e quantificação. "

VV - Por se tratar de uma participação social de uma empresa sediada fora do território português o Impugnante, tomou a iniciativa, em 2010, de declarar a sua aquisição ao abrigo do RERT II e pagou a título de IRS, como provado nos autos, a quantia de €382.096, 32 (factos U) e V) dos factos provados na Sentença). E, como resulta diretamente do Regime do RERT II, extinguem-se as obrigações tributárias exigíveis em relação aos elementos e rendimentos declarados.

WW - Na perspetiva do Acórdão recorrido não só se legitimaria uma Dupla tributação, como uma, inconcebível e ilegal, Tripla Tributação, uma vez que, com a mesma origem, se teria gerado:

- Uma tributação em Imposto sobre o rendimento da D…………, SA e liquidação em IVA,

- Uma tributação do Impugnante, em IRS, sobre o rendimento, que não recebeu, e respetiva liquidação em IVA,

- Tributação do Impugnante em IRS (RERT II) em função das ações adquiridas em virtude do exercício do direito de opção (2009), que adquiriu em contrapartida da alienação do eventual direito a um Success Fee (2006).

XX - O Recurso de Revista Excepcional, cuja admissibilidade se requer, tem por base as questões que, com clareza, o Recorrente, identificou e reproduziu nas conclusões F, G, H, I, J e K.

YY - No caso dos autos, verificam-se todos os requisitos de admissibilidade de Recurso Revista Excepcional, tal como enunciados no n.º 1 do artigo 285.º do CPPT.

ZZ - Mostra-se preenchido o critério qualitativo da relevância jurídica fundamental. Considera o Recorrente que estamos perante questões de complexidade jurídica superior ao comum uma vez que, dos factos provados, fazem parte um conjunto de contratos cuja qualificação, natureza e efeitos jurídicos obriga o julgador a uma hermenêutica complexa e à concatenação de diversos institutos jurídicos, alguns deles de natureza atípica.

É de uma relevância jurídica fundamental saber se, ao abrigo da norma de incidência do n.º 6 do artigo 3.º do CIRS, pode ou não, a AT ou o julgador, ficcionar a obtenção de um rendimento por um sujeito passivo, quando está provado que a outro sujeito passivo era devido e foi pago esse mesmo rendimento nos termos contratualizados.

Mais se complexifica a questão quando o julgador ficciona a obtenção do rendimento sem que tenham sido desconsiderados, na fundamentação da liquidação, os contratos em que assenta a matéria provada. Ou seja, sem que antes a AT percorra o iter de fundamentação a que o artigo 38.º da LGT a obriga, necessariamente.

O Tribunal está vinculado aos efeitos jurídicos que decorrem dos contratos provados sendo­lhe, absolutamente, vedado proferir uma decisão que contrarie os efeitos jurídicos dos mesmos, por se encontrar limitado pelo princípio da legalidade, da oficiosidade e da justa composição do litígio, que se impõem ao Tribunal, face à matéria de facto assente.

O Acórdão recorrido viola, frontalmente, o artigo 38.º da LGT. Efetivamente, as normas do aludido artigo 38.º da LGT apenas permitem à AT desconsiderar negócios jurídicos nos termos dele constantes, exigindo-se à AT o ónus de alegação e prova no sentido da fundamentação legal para que possa proceder à liquidação de impostos com base numa relação jurídica tributária diferente daquela que resulta dos negócios jurídicos desconsiderados ou tornados fiscalmente ineficazes.

O Acórdão recorrido viola também o artigo 3.º n.º 1, ai. b) e n.º 6 do CIRS, uma vez que, ao seu abrigo, mantém na ordem jurídica uma tributação em IRS a um sujeito passivo por rendimentos que, comprovadamente, foram faturados e pagos a outra entidade, sendo certo que a AT não alegou, nem provou qualquer facto onde pudesse fundamentar a desconsideração dos negócios jurídicos dados por assentes nos presentes autos.

O STA, colocado perante questão idêntica, pronunciou-se no sentido de entender que a questão é relevante dado que se prende com os poderes de cognição do próprio tribunal face a determinada matéria de facto dada por assente e a possibilidade, ou não, de fundamentar uma decisão de forma contrária à matéria assente, sem que antes se tenham desconsiderado os negócios jurídicos dados por provados.

A AT não demonstrou os pressupostos do direito de tributar (cfr. artigos 1.º, n.º 3 e 74.º, n.º 1 da LGT) o que lhe competia, como bem se entende, entre outros, nos Acórdãos do STA n.º 60/13, de 3 de abril de 2013 e do TCA Norte n.º 911/07.2BEPRT, de 23 de novembro de 2017.

A demonstração devia integrar a fundamentação do ato de liquidação, algo que in casu manifestamente não sucedeu (cf. artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), artigos 36.º, n.º 1, e 77.º, n.ºs 1e 2, da LGT, bem como a vasta jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo acerca da necessária anterioridade ou contemporaneidade da fundamentação em relação ao ato ou decisão a que diz respeito).

Está em causa a (não) aplicação de uma regra de distribuição do ónus da prova que tem caráter geral e que, nas palavras do Tribunal Central Administrativo Sul no Acórdão n.º 1095/12.0BEALM, de 31 de outubro de 2019, constitui "um princípio estruturante e inovador no direito tributário" com caráter vinculativo para a Administração Tributária e para os tribunais administrativos e fiscais.

Por dizer respeito a um princípio geral e estruturante, a questão pode ser repetida numa multiplicidade de situações e extrapola das particularidades do caso concreto (cf. Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo n.º 0760/17, de 27 de setembro de 2017, n.º01460/10.7BELRA, de 1 de julho de 2020, e n.º0614/16.7BEAVR, de 3 de junho de 2020).

Este Supremo Tribunal Administrativo já admitiu, por meio do Acórdão da Secção de Contencioso Tributário n.º0614/16.7BEAVR, de 3 de junho de 2020, um recurso de revista numa situação em que foi suscitada a interpretação de uma regra de distribuição do ónus da prova - no caso, a do artigo 74.º, n.º 2, da LGT - "atento o interesse social fundamental da questão".

AAA - Adensa-se a elevada complexidade, a justificar o recurso de revista, a questão, factualmente provada, de o Impugnante ter sido efetivamente tributado em IRS, em 2010,no âmbito da legislação RERT II, em virtude de ter entrado no seu património 4.660 ações de uma sociedade sediada fora do território nacional, sendo certo que, as ações, constituíram, a final, a única contrapartida que o Impugnante obteve em virtude de ter permutado, em 2006, o potencial direito a um Success fee por um direito de opção de aquisição de ações na E............ SA.

Perante a mesma prova de facto, as instâncias decidem de forma radicalmente diferente. Efetivamente, se a sentença é clara em atribuir relevância jurídica à tributação das ações recebidas pelo Impugnante e que deram origem a tributação em IRS ao abrigo do RERT II, já o Acórdão recorrido passa por cima desta questão apenas com a leveza da afirmação "A Referência à tributação das ações que, entretanto, ingressaram na esfera jurídica do recorrido, nada tem que ver com a percepção do rendimento, associada à prestação de serviços, a qual é tributada em sede de categoria B do CIRS.".

É de uma relevância jurídica fundamental que os contribuintes que recorreram a RERT II possam confiar no que estabelece o artigo 4.º n.º 1 al.a) do Regime quando dispõem que, relativamente aos elementos patrimoniais constantes da declaração e respetivos rendimentos, se extinguem as obrigações tributáveis exigíveis em relação aos mesmos.

O Impugnante recorre ao RERT II em 2010 e, nesse momento, é tributado em IRS e o procedimento inspetivo iniciou-se apenas em 2012. Assim, como bem refere a Sentença, o enquadramento do rendimento no âmbito da inspeção não pode ser mantido perante a evidência da tributação anterior em RERT II, pois de contrário daria azo a uma evidente dupla tributação.

BBB - Mostra-se preenchido o critério qualitativo da Relevância social fundamental

A construção de uma relação jurídico-tributária diversa da relação jurídica que decorre dos contratos dados como provados, não é legitima. Só o seria se a AT tivesse fundamentado a ineficácia dos negócios jurídicos, nos termos previstos no artigo 38.º da LGT.

A ficção do rendimento nos termos atrás expostos, feita pelo Acórdão recorrido, viola frontalmente os princípios da legalidade, da confiança, da segurança jurídica e da boa-fé que deve reger a relação entre o sujeito passivo e a AT.

Mais ainda, quando o sujeito passivo em causa, ainda antes de ser alvo dessa ficção de rendimento havia utilizado o instrumento legal RERT II para declarar o único património que adquiriu, na sua esfera jurídica, em virtude do cumprimento do complexo de contratos dados como provados.

É manifesto que as questões que o presente caso suscita extravasam os limites do caso concreto e das partes envolvidas no litígio.

Pelo que, a situação clama uma orientação proferida pelo STA de forma a corrigir uma decisão ostensivamente errada e juridicamente insustentável.

O Acórdão recorrido incorreu em erro grosseiro que justifica a admissão da revista em ordem à melhoria da aplicação do direito. Efetivamente, o Acórdão recorrido não justifica a sua decisão de forma clara e convincente com um discurso lógico e coerente de acordo com a matéria levada ao probatória e a sua subsunção às normas jurídicas aplicáveis. Ao invés, erra grosseiramente ao ignorar prova plena documental e ao retirar efeitos jurídicos de contratos revogados pelas partes quando o não pode fazer, como acima se deixou demonstrado. Nem sequer refere o artigo 38.º da LGT, única disposição legal que permitiria, acaso a fundamentação legal da liquidação nela se tivesse baseado, desconsiderar efeitos jurídicos de contratos celebrados pelas partes para delas retirar a fundamentação que procurou defender na sua decisão. Assim, é da mais cristalina evidência que o Acórdão recorrido padece de erros lógicos e jurídicos graves que reclamam a necessidade de admissão de revista para melhor aplicação do direito, impondo-se a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas sobre o quadro legal que regula a situação em apreço.

Este Supremo Tribunal Administrativo, admitiu muito recentemente, com base neste fundamento, o recurso de revista numa situação em que o TCA Norte julgou em sentido oposto à 1.ª Instância, no que respeita à e interpretação do direito e quadro principiológico face a uma mesma matéria de facto provada em matéria jurídica relevante e complexa, no Acórdão do STA de 25.03.2021, Processo 32/09.3BEPNF, disponível em www.dgsi.pt.

CCC - Mostra-se preenchido o critério qualitativo da necessidade da Revista para melhor aplicação do direito:

As questões submetidas à presente revista colocadas em abstrato, como o foram, são suscetíveis de se repetirem num indeterminado número de casos futuros.

Afigura-se fulcral garantir uma uniformização do direito nas matérias suscitadas nestes autos e que foram tratadas pelas instâncias de forma absolutamente contraditória, gerando incerteza, instabilidade jurídica e potencial arbitrariedade na administração da justiça.

O presente caso é paradigmático quando se afirma que o STA é a "válvula de segurança" do sistema que garante que não exista arbitrariedade na administração da justiça e é o pilar da segurança e confiança jurídicas de que todos os cidadãos são credores.

Impõem-se assim, a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária para corrigir a forma, ostensivamente errada, como o Acórdão recorrido decidiu e que é juridicamente insustentável face ao direito constituído.

Este Supremo Tribunal Administrativo, como desenvolvido em sede de motivações do presente recurso, admitiu muito recentemente, com base neste fundamento, o recurso de revista numa situação em que o TCA Sul julgou em sentido diametralmente oposto à 1ª Instância, e se justifica a intervenção do STA no sentido de sobre a questão colocada se firmar jurisprudência num caso, como o dos autos, que pode ser tratado como caso-tipo, replicável num número indeterminado de casos futuros - Cfr. Acórdão do STA de 24.03.2021, Processo 752/07.7BELSB, disponível em www.dgsi.pt.

No mesmo sentido vejam-se os Acórdãos do STA de 13.05.2021, Processo 123/17.7BELRS e de 08.04.2021, Processo 387/15.0BEBJA, e disponíveis em www.dgsi.pt.

DDD - Mostra-se preenchido o critério qualitativo da necessidade da presente revista em face de erro na fixação de facto material da causa por existência de disposição da lei que fixa a força de determinado meio de prova:

Apenas é possível admitir um Recurso de Revista, já de si excepcional, para este Supremo Tribunal Administrativo, com base neste fundamento, quando exista uma ofensa a uma disposição expressa da Lei que fixa a força a determinado meio de prova. Ora, é isso mesmo que ocorre nos presentes autos, como já demonstrado nas conclusões N) a W), supra, e que ora se procurará sintetizar.

Nos termos do disposto no artigo 374.º do CC consideram-se verdadeiros os documentos particulares quando não sejam impugnados pela parte contra quem são apresentados e nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 376.º do CC os documentos particulares cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes (leia-se 374.º do CC) fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade dos documentos, o que nos autos não aconteceu.

A sentença considerou provados, como não poderia deixar de fazer, o Contrato de Opção de Compra de Ações de 15 de março de 2006 (al. E) dos factos provados da Sentença) e o Contrato de Opção de Compras de Ações (aditamento de 2009 - al. O) dos factos provados da Sentença).

O Acórdão recorrido foi chamado a apreciar uma impugnação sobre a matéria de facto assente na Sentença que consistia na eliminação do quesito das alíneas B) e G) as quais dispõem o seguinte: "B) O Impugnante, A…………., e o co-outorgante do contrato descrito na alínea anterior, F…………, acordaram verbalmente entre si que o valor da remuneração prevista no artigo 2.1. do referido contrato, seria devido a A………., na parte referente aos resultados obtidos pela empresa portuguesa, e a F………… na parte referente aos resultados obtidos pela empresa brasileira. - cf declarações de parte e depoimento da testemunha F............, e ponto 2) do acordo que veio a ser celebrado em Abril de 2009, e se encontra vertido adiante, nas alíneas O) e N}

G). Em 30 de Novembro de 2007, por indicação de G……….., o Impugnante A.......... e F…………, indicaram a sociedade D…………, S.A., como beneficiária do "success fee", previsto no contrato descrito na alínea A) supra. - depoimento de parte e das testemunhas e "Contract de Prestation de Services", de fls. 134 a 136 do PAT apenso"

Sob o aludido requerimento da Recorrente decidiu o Acórdão recorrido que:

"Compulsados os autos e ouvida a prova testemunhal, não se vê como corroborar o enunciando da alínea B). Dado que, para além do depoimento dos interessados não existem outros elementos, designadamente documentais ou testemunhais, que confirmem ou infirmem o enunciado em apreço. A omissão declarativa dos interessados também não permite configurar com segurança os termos do negócio. Pelo que se impõe eliminar o enunciado fáctico em apreço.

No que respeita ao enunciado da alínea G), o mesmo é redundante, em face da matéria de facto assente. Por esta razão, o mesmo deve ser eliminado da matéria de facto assente."

A decisão do Acórdão recorrido em eliminar o enunciado fático das alíneas B) e G) da matéria de facto assente, viola disposição expressa da Lei que fixa a força de determinado meio de prova, além de constituir, em si mesmo, uma contradição insanável face ao que dispõem as próprias alíneas B) e G) quanto à motivação que levou o tribunal de 1.ª instância a dar como assente tais factos.

Efetivamente, só por descuido, o Acórdão recorrido pode afirmar que não existem outros elementos documentais que confirmem o enunciado em B) e que o enunciado da alínea G é redundante em face da matéria de facto assente, sem que fundamente ou justifique em que consistiria tal redundância, quando consta das alíneas B) e G) que:

"B (...) - cf declarações de parte e depoimento da testemunha F………… e ponto 2) do acordo que veio a ser celebrado em Abril de 2009, e se encontra vertido adiante, nas alíneas O) e N);

G (...) depoimento de parte e das testemunhas e "Contrat de Prestation de Services", de fIs. 134 a 136 do PAT apenso"

A eliminação dos factos B) e G) da matéria assente serve apenas o propósito de permitir que conste do probatório considerado relevante para apreciação pelo TCA a alínea C) que dispõem o seguinte: "Em 30.11.2007, o Impugnante e F………… indicaram a sociedade D………… SA como beneficiária dos direitos emergentes do contrato referido em A) - Cfr. alínea linha H) do probatório".

O Acórdão recorrido julgou contra factos que assentaram (também) em documentos, que fizeram prova plena quanto ao seu conteúdo, com a incorreta (falsa) afirmação de que não existiam provas documentais que suportassem a prova dos aludidos factos, quando essas referências documentais estão expressamente referidas nas próprias alíneas B) e G),

Ignorando que:

a) Não foram, o Impugnante e F………… que indicaram a sociedade D………… SA como beneficiária dos Success Fee. Tal decorre, provado, na alínea G) da matéria assente quando expressamente se refere que "G) Em 30 de Novembro de 2007, por indicação de G…………, o Impugnante A……….. e F…………, indicaram a sociedade D…………, S.A., como beneficiária do "success fee", previsto no contrato descrito na alínea A) supra. - depoimento de parte e das testemunhas e "Contract de Prestation de Services", de fIs. 134 a 136 do PAT apenso";

b) Também não é indicada, pelo Impugnante e F………… a D………… SA como beneficiária de direitos emergentes do contrato de 1 de julho de 2003, pois decorre da própria alínea H) da matéria assente conjugada com a alínea G) anterior, que a Indicação de G………… foi formalizada mediante a assinatura do Impugnante e F………… no contrato de 30 de novembro de 2007.

Caberá, assim, que, neste particular, se voltem a considerar os quesitos das alíneas B) e G) nos exatos termos que constam da sentença da 1.ªinstância

EEE - Entende o Recorrente que se mostra plenamente justificada a admissibilidade do presente Recurso de Revista Excepcional atento o preenchimento dos requisitos de admissibilidade previsto no n.2 1 e 4 do artigo 285.º do CPPT.

FFF - Sendo a Revista configurada como um Recurso de reexame ou substitutivo a sua procedência implicará a revogação do Acórdão recorrido e a sua substituição por outro que julge a impugnação judicial procedente e, em conformidade, anule a liquidação de IRS objeto dos presentes autos.

Termos em que se requer a V. Exas. que admitam o presente Recurso de Revista e que o julguem totalmente procedente assim se revogando o Acórdão Recorrido, proferindo-se novo Acórdão que, nos termos e com os fundamentos acima invocados, venha a julgar totalmente procedente a impugnação judicial, anulando-se, em consequência, o ato de liquidação de IRS objeto dos presentes autos.

Mais se requer a dispensa integral do remanescente da taxa de justiça nos termos previstos no artigo 6.2, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal não emitiu parecer sobre a admissão da revista.

4 – Dá-se por reproduzido, para todos os legais efeitos, o probatório fixado no acórdão recorrido e respectiva motivação (folhas 13 a 40 da respectiva numeração autónoma)

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir da admissibilidade do recurso.


- Fundamentação -

5 – Apreciando.

5.1 Dos pressupostos legais do recurso de revista.

O presente recurso foi interposto e admitido como recurso de revista excepcional, havendo, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 4 do artigo 150.º do CPTA (porquanto está em causa recurso de decisão proferida em acção administrativa especial, regulado pela Lei processual Administrativa).

Dispõe o artigo 150.º do CPTA, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:

1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.

4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.

5 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.

E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

Vejamos, pois.

O acórdão do TCA-Sul sob escrutínio concedeu provimento ao recurso da AT da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgara procedente a impugnação judicial deduzida contra Liquidações adicionais de IRS e juros compensatórios relativos ao ano de 2008, revogando a sentença e julgando improcedente a impugnação, depois de prover parcialmente o recurso interposto quanto à matéria de facto e aceitar a qualificação do rendimento tributável feita pela AT, rejeitando a qualificação efectuada pela 1.ª instância.

Do assim decidido pretendem os recorrentes revista, designadamente quanto ao julgamento de facto efectuado pelo TCA, alegando, quanto a este, estar em causa a violação pelo Acórdão recorrido de uma disposição expressa na Lei que fixa a força a determinado meio de prova - artigo 285.º n.º 4 do CPPT -, porquanto nos termos do disposto no artigo 374.º do Código Civil consideram-se verdadeiros os documentos particulares quando os mesmos não sejam impugnados pela parte contra quem os mesmos são apresentados e nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 376.º do CC os documentos particulares cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes (leia-se 374.º do CC) fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade dos documentos, o que nos autos não aconteceu.

Os recorrentes requerem revista relativamente a seis questões, que enunciam claramente nas conclusões F) a K) das respectivas alegações de recurso, questões essas que não foram como tal tratadas pelo TCA – que apenas curou da questão de saber se os rendimentos pagos ao impugnante, como contrapartida pela prestação de serviços com vista à instalação dos parques eólicos em presença integraram ou não a sua esfera jurídica, no exercício de 2008, na parte que lhe é imputável, devendo ser tributados como rendimentos da categoria B -, mas que podem ser tidas como instrumentais para a decisão do recurso, necessariamente incidente sobre o que o TCA decidiu. Os recorrentes fundamentam a necessidade da admissão da revista pelo relevo jurídico e social fundamental das questões colocadas e pela clara necessidade da revista para melhor aplicação do Direito (conclusões YY a EEE das alegações de recurso)

Ora, analisando o que o TCA decidiu e a respectiva fundamentação da decisão, em contraste com o que decidira a 1.ª instância, suscitam-se-nos dúvidas sérias, que apenas a admissão e julgamento do recurso permitirá dissipar, sobre se o Tribunal Central Administrativo, ao limitar a questão decidenda nos termos em que o fez, terá simplificado demasiadamente a questão a decidir, desatendendo ao contexto negocial fixado no probatório, ou se, pelo contrário, ao assim simplificar, reconduziu a questão que importava resolver aos seus devidos termos.

Em qualquer dos casos, é convicção desta formação que, como bem alegado e numa análise necessariamente perfunctória - mesmo apenas em relação à questão decidenda recortada pelo TCA-Sul, a única que pode ser revista - estamos perante questão que, atenta a sua (pelo menos aparente) complexidade jurídica, justifica a admissão da revista dado o relevo jurídico fundamental da questão decidenda.

Justifica-se, pois, a admissão do recurso dada a relevância jurídica da questão, pelo que esta será admitida.


- Decisão -

6 - Termos em que, face ao exposto, acorda-se em admitir o recurso.

Custas a final.

Lisboa, 26 de Janeiro de 2022. - Isabel Marques da Silva (Relatora) - Francisco Rothes - Aragão Seia.