Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01343/18.2BEBRG 0787/18
Data do Acordão:05/29/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24609
Nº do Documento:SA22019052901343/18
Data de Entrada:09/05/2018
Recorrente:A...........
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
*
1. A Fazenda Publica, notificada do Acórdão de 19-09-2018, fls. 62 a 70, vem arguir nulidade processual nos termos do artigo 195º do CPC, aplicável ex vi art. 2º do CPPT, bem como interpor recurso por oposição de acórdãos, cf. art. 284º do CPPT, nos seguintes termos:
A) Da nulidade processual
1.
No âmbito dos presentes autos foi emitido parecer pelo Ministério Publico, não notificado à Fazendo Pública, onde consta nomeadamente que:
“III. Revertendo ao caso em presença, constata-se que a Reclamante veio invocar a prescrição da dívida exequendo, questão que nem sequer foi debatida pelo competente órgão de execução fiscal, sob a invocação da respetiva falta de legitimidade para deduzir essa pretensão.
Na esteira das considerações aduzidas supra, tratou-se aqui de uma “abstenção vinculada de agir”, atendendo a que, nos termos do artigo 175.º do CPPT, a prescrição é de conhecimento oficioso, cumprindo, pois, ao órgão de execução fiscal e/ou ao tribunal, a obrigação de a declarar, independentemente da sua invocação pelo contribuinte.”
2.
Sucede que, sobre a questão de a “prescrição ser ou não de conhecimento oficioso” não foi dada oportunidade às partes de se pronunciarem.
3.
Ora, foi entendido no douto acórdão sobre esta questão nova que o Ministério Publico suscita:
“De todo o modo nem esta decisão nem a sentença recorrida se pronunciaram sobre a questão de saber se é oficioso o conhecimento da invocada prescrição.
Com efeito dispõe o artigo 175º do CPPT que a prescrição será conhecida “oficiosamente pelo juiz se o órgão de execução fiscal que anteriormente tenha intervindo o não tiver feito”.
Entende-se, contudo, na situação concreta e para a economia dos presentes autos, desnecessário apreciar esta questão.”.
4.
Ou seja, sobre aquela questão nova foi efectivamente tomada posição no douto Acórdão, quanto à desnecessidade da sua apreciação (sem referir explicitamente porque razão na situação concreta tal apreciação seria desnecessária). Isto é, decidiu o Douto Acórdão uma questão de direito sem que as partes tivessem tido possibilidade de sobre ela se pronunciarem.
5.
No entanto, como postula o artigo 3º n.º 3 do Código de Processo Civil, salvo caso de manifesto desnecessidade, não é lícito ao Juiz decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso sem que as partes tenham tido oportunidade de sobre elas se pronunciarem.
6.
Assim, ao não ser dada oportunidade as partes de se pronunciarem sobre a questão, verifica-se que ocorre a violação de um dos princípios fundamentais do processo (na expressão escolhida no Titulo I em que se enquadra o referido artigo 3º do CPC).
7.
Com efeito, como consta de fls. 1 do PEF apenso, no caso dos autos, estamos perante a execução de uma dívida da Caixa Geral de Depósitos, sendo que como decidido no Acórdão do STA proferido no processo n.º 0114/12 de 14/03/2012, que se refere à Caixa Geral de Depósitos, o referido conhecimento da prescrição não é oficioso.
8.
No referido acórdão do STA processo n.º 0114/12, consultável em www.dgsi.pt, pode ler-se:
“O nº 1 do art. 61º do DL n°48953, de 5/4/1969 (redação do DL nº 693/70, de 31/12), dispunha o seguinte: «1- A cobrança coerciva de todas as dívidas de que seja credora a A… e as suas instituições anexas é da competência dos tribunais de 1ª instancia das contribuições e impostos de Lisboa, servindo de títulos executivos as escrituras, títulos particulares, letras, livranças, ou qualquer outro documento apresentado pela instituição exequente incluindo as certidões ou fotocópias autenticadas extraídas dos livros da sua escrita.».
4.2. É jurisprudência assente a de que a A… até à transformação operada pelo DL nº 287/93, de 20/7, enquanto instituto de crédito do Estado e por reconhecidas razões de celeridade processual, tinha a faculdade de cobrar as suas dívidas através do processo de execução fiscal - cfr. o supra transcrito art. 61º do DL nº 48.953, na redacção do art. 17º do DL 693/70 (sobre este ponto, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, VoI. III, 6ª edição, Áreas Editora, 2011, comentário 3 ao art. 14º, pp. 28 a 30, bem como o comentário 5 b) ao art. 175º, pp. 282/284).
E, no caso, tendo a execução sido instaurada em 9/11/92 (cfr. fls. 1 do processo de execução), antes da entrada em vigor do DL nº 287/93, aplica-se aquele regime (aliás, a partir da entrada em vigor do DL nº 241/93 de 8/7, apenas as dívidas situadas no âmbito das relações administrativas e fiscais podem ser cobradas em processo de execução fiscal - de acordo com o disposto no art. 3º desse diploma o processo de execução fiscal passa a aplicar-se exclusivamente à cobrança coerciva das dívidas ao Estado e a outras pessoas de direito público, não se aplicando, porém, esse regime aos processos pendentes a data da entrada em vigor deste DL - cfr. o nº 2 do seu art. 3°).
Porém, o facto de as dívidas desta natureza (civil) poderem ser cobradas coercivamente através do processo de execução fiscal não implica que fiquem sujeitas ao prazo ou ao regime de prescrição da dívida tributária.
Com efeito, como se exarou no acórdão desta Secção do STA, de 1/3/2000, proc. n° 024545, «Com a possibilidade de cobrança dos créditos através do processo de execução fiscal, pretendeu-se dar à A… um meio mais expedito de cobrança dos seus créditos, em atenção às suas funções de interesse público, e não alterar a natureza dos seus créditos nem o regime substantivo que os regula.
Por outro lado, a atribuição deste regime especial de cobrança, presumivelmente mais célere, visou privilegiar a A… em relação às outras entidades com intervenção no comércio bancário, atento o interesse público subjacente a essa cobrança.
Sendo essa a finalidade dessa atribuição, seria incongruente que, concomitante e contraditoriamente, se fosse atribuir-lhe um estatuto diminuído a nível do direito substantivo (...)
Por isso, em face da finalidade prosseguida legislativamente ao atribuir-se à A… a possibilidade de utilização do processo de execução fiscal para cobrança das dívidas originadas na sua actividade comercial, a retirada desse direito atribuído pela lei civil, seria uma solução manifestamente desacertada que, por o ser, tem de presumir-se não ter sido pretendida pelo legislador (art. 9º, nº 3, do Código Civil).
Para além disso, tal diminuição de estatuto, não baseada em qualquer circunstância que justifique uma discriminação negativa da A… em relação as outras, entidades bancárias, teria de considerar-se ofensiva do princípio constitucional da igualdade, consagrado no art. 13º da CRP.»
E embora no art. 175º do CPPT se estabeleça que a prescrição será conhecida oficiosamente pelo juiz se o órgão de execução fiscal que anteriormente tenha intervindo o não tiver feito, esta disposição legal não é aplicável, todavia, à dívida em execução nos presentes autos, dada a respectiva natureza de dívida não fiscal.
Na verdade, como igualmente se refere no citado acórdão (a propósito da aplicação da norma do art. 259º do CPT – em que, igualmente, se previa o conhecimento oficioso da prescrição, sem qualquer restrição relativa a qualquer tipo de dívidas cobradas no processo de execução fiscal), o STA tem vindo a entender «que tal norma não é de aplicar às dívidas de natureza comercial da A… por, essencialmente, a utilização do processo de execução fiscal para cobrança destas dividas ter em vista obter uma maior celeridade na sua cobrança e não modificar o seu regime substantivo» (cfr. os acórdãos indicados no aresto).
É que, como acentua o Cons. Lopes de Sousa ( ) (In CPPT, Anotado e comentado, Vol. III, 6ª ed., 2011, anotação 5 b) ao art. 175º - Não conhecimento oficioso da prescrição de dividas de direito privado A… -, pp. 282 a 284). ) «tendo a prescrição natureza substantiva, modificando a natureza da dívida, o regime de conhecimento oficioso da prescrição previsto no art. 175º deve limitar-se às dívidas de natureza pública que são cobradas em processo de execução fiscal, não se estendendo às dívidas reguladas substantivamente pelo direito que, anómala e excepcionalmente, podem ser cobradas através de processo de execução fiscal, como é o caso das dívidas comerciais de que é credora a A… em processos instaurados antes da sua transformação em sociedade anónima.
Relativamente às dívidas de natureza comercial, o regime da prescrição aplicável é o da lei civil, dependendo o conhecimento da prescrição de invocação do interessado (art. 303º da CC). (Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do STA: de 22/10/92 proferido no recurso nº 21811; de 22/10/97, processo nº 21746; de 29/10/97, processos n.ºs 21725 e 20790: de 10/12/97, processo nº 21290: de 8/6/98, processo nº 21724: de 17/6/98, processo nº 22394: de 21/4/1999, processo nº 23240: de 31/1/2001, processo nº 25236.)
Na verdade, é seguro que pelo facto de os créditos da A… originados pela sua actividade comercial, antes da entrada em vigor do DL nº 287193, de 20/8, poderem ser cobrados em processo de execução fiscal, eles não passavam a ser créditos tributários, mantendo-se a sua natureza de contratos de natureza civil (art. 1142º do CC) ou, eventualmente, comercial (art. 394º do Código Comercial). (...)
O facto de nos processos tributários os executados poderem ter intervenção nos processos de execução fiscal sem representação por advogado, que, obviamente, não altera a natureza das dívidas referidas, não pode explicar a possibilidade de conhecimento oficioso da prescrição, que não é permitido pela lei civil. Na verdade, desde logo, a ser a falta de preparação jurídica dos executados a justificar o conhecimento oficioso da prescrição, decerto que se deveria entender que tal possibilidade não existiria quando a representação por
advogado se verifica e, consequentemente, seria de restringir em consonância com esta razão de ser o campo de aplicação da norma que prevê o conhecimento oficioso (cessante ratione legis cessat eius dispositio).
Por outro lado, a constituição de advogado, para quem intervém no lado passivo, tanto nas execuções fiscais como nas execuções comuns, é sempre facultativa, pois em nenhum deles se impõe aos demandados a obrigação de se defender. Em qualquer destes tipos de processo, os executados podem optar por constituir ou não advogado, sendo certo que em nenhum desses tipos de processo a carência de meios económicos pode ser obstáculo a tal constituição, como assegura a lei de apoio judiciário. Por isso, também nas execuções comuns pode ocorrer a falta de representação dos executados por advogado e nem por isso se afasta, nesses casos, a regra da impossibilidade de conhecimento oficioso da prescrição. Perante esta constatação se verifica que, não é, decerto, a falta de preparação jurídica dos executados que justifica que se preveja no processo de execução fiscal a possibilidade de conhecimento oficioso da prescrição que não se reconhece no domínio do processo de execução comum. (Neste sentido, pode ver-se o acórdão do STA de 21/4/1999, processo nº 23240, de que o Autor foi relator).
Por isso, a norma do art. 175° do CPPT (como, anteriormente, a do art. 259º do CPT), em que se prevê a possibilidade de conhecimento oficioso da prescrição das dívidas exequendas, deve entender-se como reportando-se apenas a dívidas de natureza pública, já que são essas e não as comerciais aquelas cujo regime substantivo vem parcialmente regulado neste diploma.»
Em concordância com este entendimento, concluímos, portanto, que apesar de cobradas por via do processo de execução fiscal, tal circunstância não altera a natureza das dívidas aqui em questão, nem o regime substantivo que as regula, pelo que a eventual prescrição dos juros aqui em questão só por via da respectiva invocação, por parte do executado, podia ser apreciada.”
(sublinhado nosso)
9.
Isto é, não sendo a prescrição de conhecimento oficioso, não se verifica a alegada, pelo Ministério Público, “abstenção vinculada de agir” por parte do órgão de execução fiscal, que poderia ser justificativa da intervenção do terceiro.
10.
In casu, perante a natureza específica das dívidas em presença, inexistia a obrigação por parte do órgão de execução fiscal de apreciar a prescrição, inclusivamente encontrando-se vedada ao órgão de Execução Fiscal a possibilidade de por sua iniciativa declarar a prescrição.
11.
Nesta medida, uma vez que se trata da preterição de uma formalidade (audição das partes sobre aquela questão, cuja desnecessidade manifesta da sua apreciação não foi justificada) que pode influir no exame ou decisão da causa, entende a Fazenda Pública que se verifica a nulidade prevista no art. 195º n.º 1 e 2 do CPC, por violação do princípio do contraditório, considerado na formulação de que às partes deve ser dada a possibilidade de influir activamente no desenvolvimento e êxito do processo, constituindo ainda a violação do princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20º da CRP).

B) Da oposição de acórdãos
Por outro lado, o entendimento expresso no douto Acórdão, de que: “pretenderá a reclamante exercitar um eventual direito de retenção que visará garantir créditos, podendo ser entendido o pedido neste âmbito e com vista a acautelar tal direito”, ou seja de que existe por parte do reclamante um interesse que decorre do seu direito de retenção, nos termos do art. 755° do CC, na extinção do processo, porque desta decorre a extinção da penhora, encontra-se em contradição com o decidido no acórdão 01117/09 de 10/02/2010, interpondo-se pois recurso por oposição de acórdãos entre o presente acórdão e este acórdão 01117/09 de 10/02/2010, disponível para consulta em www.dgsi.pt.

C) Da legitimidade da Caixa Geral de Depósitos
Constatando-se, no entanto (não obstante a condenação em custas pela Fazenda Pública, e nessa medida sendo a decisão nos autos desfavorável para a Fazenda Pública), que:
13.
No processo de execução fiscal subjacente à presente reclamação de actos do órgão de execução fiscal o exequente não é a Fazenda Pública, mas sim a Caixa Geral de Depósitos, sendo que tem vindo a ser decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo (vide exemplificativamente o ac. de 05/12/2012, no processo 0914/12, consultável em www.dgsi.pt) que:
“A cobrança de dívidas à CGD através de execução fiscal não conferia à Fazenda Publica qualquer direito relacionado com as mesmas dívidas, limitando-se a tramitação do processo de execução a correr pelos respetivos serviços de finanças.”
14.
Acrescendo que, como se refere no citado Acórdão: “a Fazenda Pública é totalmente desinteressada da execução, cabendo às partes – exequente e executados – o exercício dos respetivos direitos, nomeadamente o de recurso. (No sentido exposto v. os Acordos deste Supremo Tribunal de 28.06.1989 - Processo n°004958 e de 20.05.1986 -Processo n° 004166)”
15.
Sendo, designadamente, esta circunstância de a Fazenda Pública ser parte desinteressada nos presentes autos, o que justifica o facto de não ter ocorrido qualquer intervenção da Fazenda Pública no âmbito do processo 1117/12.4TJVNF (em que se discutia, além do mais, a penhora em causa no âmbito do processo de execução fiscal subjacente a estes autos, vide artigo 2° al. h) da contestação da Fazenda Pública e fls. 11 a 20 do processo de execução fiscal apenso.
Diga-se que, nesta sentença, a fls. 11 a 20 do PEF apenso - a que se refere a Fazenda Pública na sua contestação referindo-se “aos factos dados como provados na decisão proferida no processo 1117/12.4TJVNF” se explicita que não foi dado como provado que a ali Autora tenha tido intervenção no contrato promessa de 1988, cf. m) a fls. 15 do PEF apenso, contrato que dúvidas não restam não é o mesmo, de 2009, em que a reclamante sustentou o seu pedido de fls. 21 do PEF, cf. fls. 22 verso do PEF, sobre o qual recaiu o despacho do órgão de execução fiscal reclamado e a que se refere a sentença proferida na presente acção no ponto 4. da matéria de facto - contrato onde, aliás, também a autora nos presentes autos não surge como “promitente comprador”, mas sim o seu filho, naquele contrato representado pela autora).
Solicita-se que,
16.
caso seja considerado por este Venerando Supremo Tribunal Administrativo que a Fazenda Pública, nomeadamente ao abrigo das considerações tecidas naquele acórdão do STA (no processo 914/12), é parte não interessada no âmbito dos presentes autos, devendo em consequência ficar sem efeito a intervenção da Fazenda Pública nos autos, e bem assim a sua condenação em custas, seja a exequente Caixa Geral de Depósitos, SA notificada para os termos dos mesmos e designadamente para o exercício dos seus direitos de defesa (sob pena aliás de, a assim não suceder, se vir a verificar também aqui a nulidade processual prevista no artigo 195° do CPC).».
*
2. Em resposta à reclamação sustenta a reclamada A…………….. o seguinte:
«1 - À NULIDADE
Salvo o devido respeito, a nulidade em causa não determinará qualquer alteração nos termos do processo, na medida em que, a falta de notificação do parecer do MP não influencia, nem afecta, nem tal resulta da alegacão da Recorrente Fazenda Nacional, o seu direito de defesa, nem se vê em que medida este poderá ser afectado. Nem em que medida, a notificação do referido parecer poderia influir no exame da causa.
Razão pela qual, e por força da aplicação subsidiária do regime do CPC ao Procedimento em causa, tem aplicação o disposto no Art.º 195º do CPC, e na medida em que forçosamente se terá que concluir, até por falta de alegacão, que a omissão não influiu no exame da causa.
II- Da Oposição de acórdãos
Salvo o devido respeito, em concreto, não se verifica qualquer oposição de julgados, pelo facto de que a decisão que foi sujeita a exame, e colocada em apreciação em sede de recurso nada teve a ver com a questão concreta da CGA, mas antes com a omissão de apreciação do pedido por parte do órgão de execução fiscal.
A questão que agora foi suscitada pela Fazenda não chegou sequer a ser suscitada nos presentes autos, pela simples razão de que o órgão de execução fiscal nada fez a não ser proferir a decisão de que não tinha que apreciar a questão por falta de legitimidade.
A eventual intervenção da CGD teria que ter lugar e poderia ser suscitada se o órgão de execução fiscal assim tivesse procedido, o que não sucedeu, atenta a completa omissão do mesmo.
Acresce que, aquando da notificação para os termos do Recurso, a Fazenda nada veio dizer aos autos, nem em sede de resposta a reclamação, sendo que, o tempo e lugar para suscitar a questão era nessa sede, ou seja, em primeira instância.
ACRESCE QUE,
A decisão não versou sobre esta questão concreta, mas apenas sobre a questão da legitimidade para a intervenção da Recorrente. Não se logra assim vislumbrar a questão atinente a oposição de julgados que em concreto não se verifica.
Termos em que deve a pretensão da Fazenda ser desatendida.».
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3.1. Sustenta, em síntese, a reclamante FP que ocorreu preterição de uma formalidade, audição das partes sobre a questão suscitada pelo MP, de a prescrição ser ou não de conhecimento oficioso.
Acrescenta que a desnecessidade manifesta da sua apreciação não foi justificada e que, podendo influir no exame ou decisão da causa, geraria a nulidade prevista no artigo 195º n.º 1 e 2 do CPC, por violação do princípio do contraditório pois que às partes deve ser dada a possibilidade de influir ativamente no desenvolvimento e êxito do processo o que constituiria, ainda, violação do princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, nos termos do artigo 20º da CRP.
Refere, ainda, que o exequente não é a Fazenda Pública, mas sim a Caixa Geral de Depósitos.
Acrescentou que tratando-se de dívida à CGD não é a prescrição de conhecimento oficioso pelo que não se verificaria a alegada, pelo Ministério Público, abstenção vinculada de agir” por parte do órgão de execução fiscal, que poderia ser justificativa da intervenção do terceiro.
Sustenta a reclamada que a falta de notificação do parecer do MP não influencia, nem afeta o direito de defesa da FP, nem se vê em que medida este poderá ser afetado, nem em que medida poderia influir no exame da causa.
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3.2. A reclamante pediu a extinção do PEF invocando a prescrição o que foi desatendido em 26.04.2018, por despacho do Chefe do Serviço de Finanças que entendeu que, não sendo a reclamante parte na execução, não tinha legitimidade para invocar a prescrição.
No mesmo sentido se pronunciou a decisão recorrida.
No recurso interposto para este STA continuou a sustentar a reclamante e recorrente que é parte legítima para intervir na execução por ser beneficiária do contrato promessa de compra e venda e ser detentora do imóvel penhorado e que assim viu ofendida a sua posse.
O acórdão agora em apreciação afirmou que a questão controvertida implica que se responda à questão de saber se tem a reclamante legitimidade para requerer, no processo executivo, que se declare a extinção deste, por prescrição da dívida exequenda.
É que sustentava a reclamante ser promitente compradora do imóvel penhorado na execução, o qual constituiria a casa de morada de família, onde tem centrada a sua vida familiar e que a executada lho havia prometido vender.
Afirmou o acórdão, agora em apreciação, que nem a decisão do Chefe de Serviços de Finanças nem a sentença recorrida se pronunciaram sobre a questão da prescrição e de saber se é oficioso o conhecimento da invocada prescrição acrescentando que se limitaram a afirmar que não tinha a recorrente legitimidade para intervir no processo de execução.
Entendeu, por isso, o acórdão em apreciação que, na situação concreta e para a economia dos presentes autos, se tornava desnecessário apreciar a questão da prescrição.
É que, apesar de a sentença recorrida se referir à alegada existência de um contrato-promessa não afirmou, expressamente, a data do mesmo nem se ocorreu a tradição e, por isso, a data desta.
De todo o modo a recorrente alegou e fundamentou o seu pedido na existência de um contrato-promessa, com tradição da coisa.
É claro que o acórdão recorrido não apreciou a questão da prescrição tendo afirmado expressamente que na situação concreta se tornava desnecessário apreciá-la pois que o presente recurso apenas tinha como objeto a questão da legitimidade da reclamante no processo executivo, única questão apreciada pela decisão recorrida e objeto de recurso.
O acórdão, agora em apreciação, entendeu que a reclamante tinha legitimidade no presente processo executivo e foi esta a única questão que apreciou pois que era a única questão suscitada no recurso.
Não tendo o acórdão recorrido apreciado a questão da prescrição nem se a mesma é ou não de conhecimento oficioso não ocorre, por isso, a invocada pela FP nulidade por não ter sido notificada para se pronunciar sobre a desnecessidade de apreciar a questão da prescrição e de saber se a mesma é ou não de conhecimento oficioso.
De todo o modo nunca seria questão nova a necessitar de notificação à FP pois que a questão da prescrição havia sido suscitada desde início pela reclamante na execução e posteriormente junto do tribunal.
Improcede, por isso, a invocada preterição de formalidade e a consequente nulidade.
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3.3. Afirma a reclamante FP, sob a designação de “oposição de acórdãos” o seguinte:
“… o entendimento expresso no douto Acórdão, de que: “pretenderá a reclamante exercitar um eventual direito de retenção que visará garantir créditos, podendo ser entendido o pedido neste âmbito e com vista a acautelar tal direito”, ou seja de que existe por parte do reclamante um interesse que decorre do seu direito de retenção, nos termos do art. 755° do CC, na extinção do processo, porque desta decorre a extinção da penhora, encontra-se em contradição com o decidido no acórdão 01117/09 de 10/02/2010, interpondo-se pois recurso por oposição de acórdãos entre o presente acórdão e este acórdão 01117/09 de 10/02/2010 …”.
No acórdão em apreciação apenas se apreciou, como já se referiu, a questão da legitimidade da reclamante como eventual beneficiária de um contrato promessa, em processo de execução.
Afirmou-se é certo que pretenderá a reclamante exercitar um eventual direito de retenção que visará garantir créditos, podendo ser entendido o pedido neste âmbito e com vista a acautelar tal direito.
Não se tratou, contudo a questão apreciada no acórdão referido de 10-02-2010, Proc. 01117/09, em que estava em causa um processo de embargos de terceiro, e relativa ao direito de retenção.
Daí que este acórdão tenha o sumário seguinte:
“I - O promitente-comprador, uma vez obtida a traditio do bem, apenas frui, em regra, um direito de gozo, autorizado pelo promitente-vendedor e mediante tolerância deste, daí resultando que, nessa perspectiva, seja um mero detentor precário (artigo 1253.º, n.º 3 do Código Civil), posto que não age como com animus possidendi, praticando apenas meros actos materiais dessa posse (corpus).
II - Daí que, não se mostrando estabelecido no probatório que tenham agido convictos de lhes assistir o pertinente direito de propriedade, os promitentes-compradores não detêm o direito de embargar a penhora efectuada na execução.
III - O direito de retenção, enquanto direito real de garantia, não é ofendido por penhora em processo executivo, sendo, pelo contrário, o caminho para a reclamação do crédito respetivo no desenvolvimento desse processo, garantindo a penhora todos os créditos exequendos, a graduar oportunamente tendo em vista o seu pagamento.”.
Não se descortina como possam tais acórdãos estar em oposição se apreciaram e decidiram questões totalmente diversas.
Como refere a reclamada a decisão não versou sobre esta questão concreta, mas apenas sobre a questão da legitimidade para a intervenção da Recorrente pelo que não se vislumbra a questão atinente à oposição de julgados que em concreto não se verifica.
Entende-se, por isso e desde já que não ocorre tal denominada oposição.
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3.4. Sustenta, ainda, a reclamante FP, sob a designação da legitimidade da Caixa Geral de Depósitos, ponto 16 da reclamação, que “caso seja considerado por este … Supremo Tribunal Administrativo que a Fazenda Pública, nomeadamente ao abrigo das considerações tecidas naquele acórdão do STA (no processo 914/12), é parte não interessada no âmbito dos presentes autos, devendo em consequência ficar sem efeito a intervenção da Fazenda Pública nos autos, e bem assim a sua condenação em custas, seja a exequente Caixa Geral de Depósitos, SA notificada para os termos dos mesmos e designadamente para o exercício dos seus direitos de defesa (sob pena aliás de, a assim não suceder, se vir a verificar também aqui a nulidade processual prevista no artigo 195° do CPC).”.
Acrescenta que o exequente não é a Fazenda Pública, mas sim a Caixa Geral de Depósitos, pois que a cobrança de dívidas à CGD, através de execução fiscal, não confere à Fazenda Pública qualquer direito relacionado com as mesmas dívidas, limitando-se a tramitação do processo de execução a correr pelos respetivos serviços de finanças.
Conclui que cabe às partes – exequente e executados – o exercício dos respetivos direitos, nomeadamente o de recurso.
Sobre esta questão sustenta a reclamada que a eventual intervenção da CGD teria que ter lugar e poderia ser suscitada se o órgão de execução fiscal assim tivesse procedido, o que não sucedeu ao que acresce que a Fazenda nada veio dizer aos autos, nem em sede de resposta a reclamação, sendo que, o tempo e lugar para suscitar a questão era nessa sede, ou seja, em primeira instância.
Escreveu-se no sumário do citado acórdão deste STA de 5-12-2012, proc. 0914/12, o seguinte:
“I - A cobrança de dívidas à CGD através de execução fiscal não conferia à Fazenda Pública qualquer direito relacionado com as mesmas dívidas, limitando-se a tramitação do processo de execução a correr pelos respetivos serviços de finanças.
II - Deste modo, decidindo o órgão da execução fiscal que a dívida estava prescrita, não tem a FP legitimidade para interpor recurso da decisão judicial que revogou a decisão do órgão da execução fiscal, uma vez que não é parte no processo de execução, nem da decisão lhe resulta qualquer prejuízo, tal como o exige o artº 680º do CPC.”.
Podia e, eventualmente deveria, a FP suscitar a intervenção da CGD, nos presentes autos, o que não fez apesar de a fls. 9 da cópia do processo de execução se encontrar identificado o mandatário subscritor.
De todo o modo é questão que não pode ser suscitada em reclamação do acórdão quando a FP a podia ter suscitado em momento anterior.
Entende-se, contudo, que deve a 1ª instância notificar o identificado mandatário subscritor de fls. 9 para se pronunciar nos presentes autos sobre tudo o que tiver por conveniente.
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3.5. Acrescenta a FP que no processo de execução fiscal subjacente à presente reclamação de ato do órgão de execução fiscal o exequente não é a FP mas a CGD pois que a FP é totalmente desinteressada da execução, cabendo às partes – exequente e executados – o exercício dos respetivos direitos, nomeadamente o de recurso.
Conclui que, caso seja considerado que a Fazenda Pública é parte não interessada, no âmbito dos presentes autos, deve em consequência ficar sem efeito a intervenção da Fazenda Pública nos autos, e bem assim a sua condenação em custas.
Concorda-se face ao exposto que a FP não devia ter sido condenada em custas.
E nesta parte merece acolhimento a reclamação.
Contudo uma vez que a decisão em apreciação entendeu anular a decisão recorrida, por haver entendido ser necessário que se ampliasse a matéria de fato, deverá ser condenada em custas a parte que ficar vencida a final.
Nesta parte merece, por isso, atendimento a reclamação da FP.
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4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em deferir parcialmente a presente reclamação alterando a condenação em custas de fls. 70 que passará a ser do seguinte teor:
“Custas pela parte que ficar vencida a final”.
Sem custas a presente reclamação.

Lisboa, 29 de Maio de 2019. – António Pimpão (relator) – Francisco Rothes – Isabel Marques da Silva.