Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01439/22.6BEPRT
Data do Acordão:11/09/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL
PENHORA
CITAÇÃO
NOTIFICAÇÃO
PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO
DÉFICE INSTRUTÓRIO
Sumário:I - Ao processo de execução das dívidas à Segurança Social aplica-se, subsidiariamente e em tudo o que não estiver regulado na legislação específica da segurança social, a Lei Geral Tributária e o Código de Procedimento e Processo Tributário (cfr.artº.6, do dec.lei 42/2001, de 9/02).
II - A penhora consiste numa apreensão de bens e sua afectação aos fins do processo de execução fiscal. Realizada a penhora, o executado continua a poder dispor e onerar os bens penhorados, mas os actos que pratique são ineficazes em relação ao exequente (cfr.artº.819, do C.Civil). A maior parte da doutrina nacional atribui à penhora a natureza de garantia real (cfr.artº.822, nº.1, do C.Civil).
III - A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº.219, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário).
IV - À data da apresentação da oposição à execução fiscal por parte da ora recorrente e no caso dos autos (em 3/01/2012), na nova redacção introduzida pela Lei 64-B/2011, de 30/12, ao artº.169, do C.P.P.T., não se prevê a necessidade de notificação com vista à apresentação de garantia e visando a suspensão da execução fiscal.
V - Recaindo embora sobre as partes o ónus da prova dos factos constitutivos, modificativos e/ou extintivos de direitos, a actividade instrutória pertinente para apurar a veracidade de tais factos compete também ao Tribunal, o qual, atento o disposto nos artºs.13, do C.P.P.Tributário, e 99, da L.G.Tributária, deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, assim se afirmando, sem margem para dúvidas, o princípio da investigação do Tribunal Tributário no domínio do processo judicial tributário.
VI - Nos presentes autos, verifica-se uma situação de défice instrutório que demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos dos artºs.682, nº.3, e 683, nº.1, ambos do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário, devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja produzida a ampliação da matéria de facto pelo Tribunal de 1ª. Instância de acordo com os trâmites identificados neste acórdão.
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P30192
Nº do Documento:SA22022110901439/22
Data de Entrada:10/17/2022
Recorrente:A……………………….
Recorrido 1:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, IP –
SEC. PROC. EXEC. PORTO II
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A…………………………, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. do Porto, constante a fls.50 a 59 do processo físico, que julgou improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal, deduzida pelo ora apelante, no âmbito do processo de execução fiscal nº.1301-2008/128923.3 e apensos, contra a ora recorrente revertidos e instaurados para a cobrança de dívidas à Segurança Social, correndo seus termos na Secção de Processo Executivo do Porto II.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.60 a 72-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-Independentemente do altíssimo e devido respeito à mesma devida, a mui douta sentença recorrida está manifestamente viciada de incorreta e inadequada interpretação e aplicação dos factos e do direito, no que tange à declarada legalidade das penhoras em crise nos autos realizadas pela Recorrida;
2-Nos presentes autos, injustificada, abusivamente e de forma ilegal, a Recorrida procedeu à penhora do vencimento auferido pela Recorrente junto da sociedade “B………………. Portugal Unipessoal Lda.” e, ainda, de diversos saldos bancários pela mesma titulados junto de diferentes “Banco C…………….” e do “D……………….”.
3-Em 22/11/2011, na qualidade de Executada por reversão, a Recorrente foi citada “na qualidade de Responsável Subsidiário, para”: “no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda de € 43.494,50”; “requerer pagamento em regime prestacional (…) e/ou a dação em pagamento (…) ou então deduzir oposição judicial”; “apresentar reclamação graciosa ou deduzir impugnação judicial” e, ainda, que “decorrido aquele prazo sem que tenha sido efetuado o pagamento da dívida exequenda, para além de perder o benefício da dispensa de pagamento de juros de mora e acrescido, e sem que exista, nos termos do Art.º 169º do C.P.P.T, motivo para suspender a execução, a mesma prosseguirá a tramitação legal, designadamente para efeitos da PENHORA DE BENS e demais diligências prescritas no Código de Procedimento e Processo Tributário”;
4-No dia 03 de Janeiro de 2012, a Recorrente deduziu oposição à execução fiscal, concretizando sua intenção de contestar o aludido ato de reversão, fundando a sua defesa em argumentos que contendem com a ilegalidade e com a inexigibilidade da dívida exequenda e cuja cobrança coerciva.
5-Sucede, no entanto, que, contrariamente ao legalmente estatuído e decorridos quase 10 (dez) anos sobre a data da citação por reversão e da oposição à execução fiscal, na data da realização das penhoras e da interposição da reclamação em apreço nestes autos, de forma ilegítima, injustificada e - quiçá - abusiva, a Recorrida (SPE do Porto II) ainda não tinha procedido ao envio da referida oposição para o tribunal competente, in casu o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto;
6-E, sem que a Exequente tivesse sido dado cumprimento à notificação a que aludia o Nº 6 do artigo 169º do CPPT, na redação que lhe foi dada pela Lei Nº 3- B/2010, de 28 de Abril, e aplicável a estes autos atenta a data (22/11/2011) da citação da Recorrente, que legalmente determinava que, no caso concreto, se não houvesse garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantissem a dívida exequenda e acrescido, tinha de ser ordenada a notificação da executada por reversão para prestar a garantia referida no n.º 1 dentro do prazo de 15 dias;
7-A mui douta sentença recorrida considera que atenta a concreta data da dedução pela Recorrente da oposição à execução fiscal, ou seja, 03/01/2012, a redação da supra referida norma já não seria aplicável, uma vez que no dia 01/01/2012 entrou em vigor as alterações introduzidas aos artigos 169º e 199º do CPPT por via da Lei Nº 64-B/2011, de 30/12, e a nova redação do Nº 7 do citado artigo 169º do CPPT ser imediatamente aplicável aos processos pendentes.
8-No entanto, não se pode considerar, por um lado, que tais alterações têm aplicação retroativa, isto é, que os respetivos efeitos possam operar e retroagirem à citação efetuada à Recorrente em 22/11/2011;
9-Com a citação realizada em 22/11/2011 e até ao trânsito em julgado que vier a ser proferida no âmbito dos autos de oposição à execução (atualmente em curso no TAF sob o Nº 342/22.4BEPNF), a posição jurídica e processual da Recorrente ficou cristalizada no que tange aos autos de execução fiscal 1301200801289233 e apensos e, bem assim, a sua responsabilização pela Exequente, por via do instituto da reversão, no que tange ao pagamento e cobrança coerciva dos tributos, juros e acrescidos;
10-A citação da Recorrente foi efetuada de acordo com as normas legais em vigor naquela data (22/11/2011) e vertidas nos artigos 70º; 99º; 102º; 160º, 169º, 196º, 201º, 204º todos do CPPT, e, por via disso, não era legalmente obrigatório, em 22/11/2011 que a citação da Recorrente contivesse, para além do mais, a indicação de que, nos casos referidos no artigo 169º e no artigo 52º da Lei Geral Tributária (doravante designada por LGT), a suspensão da execução e a regularização da situação tributária dependem da efetiva existência de garantia idónea, do concreto valor da garantia a prestar e da alternativa da obtenção de autorização da sua dispensa;
11-Pese embora a atual redação do Nº 2 do artigo 190º do CPPT, em 21 de novembro de 2011, atenta a redação introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30/12, então em vigor, a mesma norma apenas referia que a citação é sempre acompanhada da nota indicativa do prazo para oposição, para pagamento em prestações ou dação em pagamento, sendo completamente omissa no que tange à indicação do valor da garantia a prestar e, sobretudo, no que tange à possibilidade de, em alternativa, a suspensão da execução ser obtida através de dispensa de garantia;
12-Pois, na verdade, atento os procedimentos legais em vigor em 21 de novembro de 2011, nomeadamente o estatuído no nº 6 do artigo 169º do CPPT, se não houvesse garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no nº 1 dentro do prazo de 15 dias:
13-Prazo em que, caso lhe tivesse sido efetuada a legalmente devida notificação, tendo todos os elementos em sua posse, nomeadamente os valores globais necessários a garantir, a Recorrente poderia apreciar as possibilidades de, como intentava, de modo fundado e justificado, requerer a suspensão da execução fiscal em curso mediante a prestação de garantia ou requerer a dispensa de garantia;
14-Contudo, a citação por reversão efetuada nestes autos contra a ora Recorrente não continha, ainda como não contém, todos os elementos necessários para que pudesse requerer, nos termos legais, a suspensão da execução mediante prestação de garantia ou solicitasse a sua dispensa, nomeadamente os valores a garantir por via da prestação de garantia idónea;
15-Determinava, o nº 1 do artigo 169º do CPPT na redação aplicável, que “a execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o ato, bem como a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda”;
16-Sendo que acrescentava o nº 6 seguinte que, se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no n.º 1 dentro do prazo de 15 dias;
17-Admitindo o nº 7 do referido artigo 169º do CPPT, na redação em vigor em 22/11/2011, a realização imediata de diligências de penhora “se a garantia não for prestada nos termos do número anterior”;
18-No entanto, é manifesto que tal não sucedeu, uma vez que faltou, como ainda falta, a notificação da Recorrente para, no prazo de quinze dias, proceder à prestação de garantia para efeitos de suspensão, assim faltava, como também falta, a informação dos valores globais que a oferecida garantia bancária deveria acautelar e, sobretudo, a possibilidade legal da requerer, para a suspensão da execução, da dispensa de garantia;
19-A citação também não consta a advertência que passou a ser obrigatória, na sequência a alteração legislativa efetuada ao citado artigo 169º do CPPT pela Lei nº 64-B/2011, de 30/11, e que acabou com a notificação autónoma a que aludia o nº 6 do mesmo artigo, pois, em sua substituição e por força do nº 2 do artigo 190º do CPPT, passou a ser obrigatório incluir tal informação na citação para a execução, a qual, atualmente, tem de ser sempre acompanhada da indicação de que, nos casos referidos no artigo 169º do CPPT e no artigo 52º da LGT, a suspensão da execução e a regularização da situação tributária dependem da efetiva existência de garantia idónea e cujo valor deve constar da citação, ou, em alternativa, da obtenção de autorização da sua dispensa;
20-A Lei nº 66-B/2012, de 31/12, veio igualmente aditar o nº 13 ao artigo 169º do CPPT estabelecendo que o valor da garantia é o que consta da citação, nos casos em que seja apresentada nos 30 dias posteriores à citação e, ainda, em alternativa, requerer a dispensa de garantia, uma vez que tal menção não consta da referida citação;
21-Assim se postergou o direito que legalmente assistia à Recorrente de requerer e, seja mediante a prestação de garantia ou solicitando a sua dispensa, obter a suspensão dos autos executivos determinando a penhora da sua retribuição e de dois saldos bancários, numa altura em que ainda não estavam determinados os termos em que devia ser prestada a garantia pela Revertida, ora Recorrente;
22-Omissões que, no respeitoso entendimento da recorrente viciam de nulidade quer a citação em crise quer os atos de penhora que se lhe seguiram quase 10 anos depois;
23-Acolhendo a douta jurisprudência plasmada no Acórdão prolatado pelo STA em 06/06/2018, no âmbito do Proc. Nº 0486/18, e relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Ascensão Lopes, a mui douta decisão considerou que “tal omissão não configura nulidade mas sim mera irregularidade, que não contende com a defesa da Reclamante, que nem sequer demonstrou que pretendia prestar garantia, nem interpelou a Autoridade Tributária para dar conta do montante da garantia”;
24-Contudo, na esteira do voto de vencida da Ex.ma Senhora Juiz Conselheira Ana Paula Lobo, “Não é possível considerar sanada pelo decurso do tempo esta omissão que permanece (…) porque as irregularidades processuais, quando não estejam feridas de nulidade, mas afectem directamente os direitos de defesa do contribuinte - de se defender contra o prosseguimento da execução -produzem nulidade quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa, como aqui ocorre, nos termos do disposto no art.º 195.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário. Não está em causa repetir a citação, está em causa facultar ao executado os elementos que deveriam ter acompanhado a citação e foram omitidos e, continuam omitidos. A Administração Tributária está adstrita ao cumprimento da lei e a possibilidade que o executado tenha de lhe solicitar elementos ou informações não dilui o dever daquela de organizar o processo nos termos legais. (…) O processo de execução não pode afastar-se do formalismo para ele previsto na lei com atropelo dos direitos de defesa do executado, sendo que a interpretação dada ao art.º 190.º, n.º 2 do Código de Processo e Procedimento Tributário no sentido professado no acórdão denega, em concreto, e, em meu entender, a tutela jurisdicional efectiva imposta pela Constituição da República Portuguesa”;
25-A aplicação imediata da nova redação das normas dos artigos 169º e 199º do CPPT pela Lei nº 64-B/2011, de 30/12, ao caso vertido nos autos, para além de violadora do disposto no artigo 12º do Código Civil, também é inconstitucional por violação explícita de dois princípios basilares do nosso sistema constitucional;
26-Designadamente o princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal a que alude nº 3 do artigo 103º da CRP e artigo 12º da LGT;
27-E os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, ínsitos no princípio do Estado de Direito e decorrente do artigo 2º da CRP.
28-Pelo que a execução não podia prosseguir, imediatamente, para penhora, sem previamente dar cumprimento às legais notificações, estando os atos de penhora em crise feridos de ilegalidade;
29-Tendo sido violados direitos elementares da ora Recorrente que determinam necessariamente a nulidade e consequente anulação dos atos de penhora ora em crise;
30-Pelo que deve ser revogada a mui douta decisão recorrida, já que naquela não foram, de forma sábia e prudente, corretamente apreciados, interpretados, respeitados e aplicados os preceitos legais previstos nos artigos 12º do Código Civil; 195º do Código de Processo Civil; 154º da Lei nº 64-B/2011, de 30/12; 52º da Lei Geral Tributária e 169º, 190º e 199º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
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Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância de recurso.
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Remetidos os autos a este Tribunal, o Digno Magistrado do M. P. emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo não provimento do recurso (cfr.fls.76 a 77-verso do processo físico).
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.51-verso a 53 do processo físico):
1-O "Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.", em 2008, instaurou contra a sociedade comercial “E…………………, Unipessoal, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº …………………, o Processo de Execução nº 1301200801289233 e apensos, com vista à cobrança de Contribuições para a Segurança Social, referentes a 2007/12 a 2009/09, no montante global de € 58.559,60, sendo € 43.494,50 a título de quantia exequenda, e € 15.065,10 de acrescido.
2-No Processo de Execução nº 1301200801289233 e apensos, em 28/10/2011, foi determinada a reversão da execução em relação à ora Reclamante, e a correspondente citação, na qualidade de responsável subsidiária, pelo montante global de € 58.559,60, conforme documentação de fls. 43 sitaf que se dá por reproduzida.
3-A Reclamante foi citada, em 22/11/2011, nos processos de execução mencionados em 1/2, e do documento remetido para citação, na qualidade de revertida, de fls. 43 sitaf, consta:
“OBJECTO E FUNÇÃO DA CITAÇÃO
Pelo presente fica citado(a) de que é executado por reversão nos termos do Art. ° 160 do C. P. P. T., na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda de 43.494,50 EUR de que era devedor(a)o(a) executado(a) infra indicado(a), ficando ciente de que se o pagamento se verificar no prazo acima referido, não lhe serão exigidos juros de mora nem custas. Mais fica citado de que poderá requerer o pagamento em regime prestacional nos termos do Art.° 196° do C. P. P. T. e Art. 13° do Decreto-Lei n° 42/2001 de 9 de Fevereiro, e/ou a dação em pagamento nos termos do Art.° 201° do mesmo código ou então deduzir oposição judicial com base nos fundamentos previstos no Art.° 204° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Informa-se ainda que, nos termos do n° 4 do artigo 22° da Lei Geral Tributária a contar da data da citação, poderá apresentar reclamação graciosa ou deduzir impugnação judicial com base nos fundamentos previstos no Art° 99° e prazos estabelecidos nos artigos 70° e 102° do C.P.P.T. .
Decorrido aquele prazo sem que tenha sido efectuado o pagamento da dívida exequenda, para além de perder o beneficio da dispensa de pagamento dos juros de mora e acrescido, e sem que exista, nos termos do Art.° 169 ° do C. P. P. T., motivo para suspender a execução, a mesma prosseguirá a tramitação legal, designadamente para efeitos da PENHORA DE BENS e demais diligências prescritas no Código de Procedimento e de Processo Tributário.
IDENTIFICAÇÃO DA DÍVIDA EM REVERSÃO
QUANTIA EXEQUENDA: 43.494,50 € ACRESCIDOS: 15.065,10 € TOTAL: 58.559,60 €
O Total de Acrescidos é constituído por juros de mora e custas processuais. Os juros de mora estão calculados com referência ao mês de Novembro de 2011, continuando-se a vencer juros por cada mês de calendário ou fracção. As custas são actualizadas em função da fase processual e encargos. Sobre as coimas e multas não incidem juros de mora.”.
4-A Reclamante, em 3/1/2012, deduziu oposição judicial em relação ao processo de execução mencionado em 1, na qual invocou a nulidade do despacho de reversão por falta de audição prévia e falta de fundamentação, a ilegalidade da reversão, “ilegitimidade substantiva”, não exercício da gerência, falta de verificação dos pressupostos da reversão, e falta de notificação no prazo de caducidade, nos termos exarados no documento de fls. 55 sitaf que se dá por reproduzido.
5-No recibo de vencimento da Reclamante que se encontra a fls. 38 sitaf e se dá por reproduzido, referente ao mês de Julho de 2021, relativo ao trabalho prestado à sociedade comercial “B………………… Portugal, Unipessoal, Lda.”, consta um desconto decorrente de penhora salarial no montante de € 351,75.
6-O "Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P." remeteu à sociedade comercial “B…………… Portugal, Unipessoal, Lda.”, mediante registo postal RG827822188PT, a “solicitação de penhora” de 1/3 do vencimento da Reclamante, datada de 10/7/2021, que se encontra a fls. 39 sitaf e se dá por reproduzida.
7-O “Banco C…………..” remeteu à Reclamante a “Declaração de Penhora” efectuada no Processo nº 1301200801289233, no montante de € 657,74, datada de 12 de Julho de 2021, que se encontra a fls. 40 sitaf e se dá por reproduzida.
8-O “Banco C………………”, em 11/8/2021, transferiu para a Segurança Social o montante mencionado em 7, conforme documento que se encontra a fls. 41 sitaf que se dá por reproduzido.
9-O “D………………” remeteu à Reclamante a notificação da penhora efectuada no processo nº 1301200801289233, no montante de € 707,50 (D…………….. Poupança), e € 3.683,41 (Depósito à ordem), datada de 22 de Julho de 2021, que se encontra a fls. 42 sitaf e se dá por reproduzida.
10-A presente reclamação foi apresentada em 17/8/2021.
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito…".
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "…A factualidade provada, suficiente para conhecimento da questão prévia suscitada, bem como do mérito dos autos, resultou da matéria alegada e não contestada comprovada pela análise crítica da prova documental junta aos autos referida no probatório em relação a cada facto, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º Código de Processo Civil…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a decisão recorrida julgou totalmente improcedente a presente reclamação de acto do órgão de execução fiscal, com as legais consequências, assim mantendo na ordem jurídica os actos de penhora de vencimento e saldos bancários objecto do processo (cfr.nºs.5 a 9 do probatório).
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Relembre-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e em síntese, que, em sede de citação e após a dedução da sua oposição, se postergou o direito que legalmente lhe assistia de requerer, seja mediante a prestação de garantia ou solicitando a sua dispensa, e obter a suspensão dos autos executivos nos quais viria a ser ordenada a penhora da sua retribuição e de dois saldos bancários, numa altura em que ainda não estavam determinados os termos em que devia ser prestada a garantia pela revertida, ora recorrente. Que as citadas omissões viciam de nulidade, quer a citação da apelante para a execução e enquanto revertida, quer os actos de penhora que se lhe seguiram quase 10 anos depois. Que a sentença recorrida violou os artºs.12, do C.Civil, 195, do C.P.Civil, 154, da Lei 64-B/2011, de 30/12, 52, da L.G.Tributária, e 169, 190 e 199, do C.P.P.Tributário (cfr.conclusões 1 a 22 e 30 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Deve relembrar-se, antes de mais, que ao processo de execução das dívidas à Segurança Social se aplica, subsidiariamente e em tudo o que não estiver regulado na legislação específica da segurança social, a Lei Geral Tributária e o Código de Procedimento e Processo Tributário (cfr.artº.6, do dec.lei 42/2001, de 9/02; Alcides Martins, Código dos Regimes Contributivos e Legislação Complementar Anotados, Almedina, 2021, pág.325 e seg., em anotação ao citado artº.6).
A penhora consiste numa apreensão de bens e sua afectação aos fins do processo de execução fiscal. Realizada a penhora, o executado continua a poder dispor e onerar os bens penhorados, mas os actos que pratique são ineficazes em relação ao exequente (cfr.artº.819, do C.Civil). A maior parte da doutrina nacional atribui à penhora a natureza de garantia real (cfr.artº.822, nº.1, do C.Civil; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/01/2020, rec. 893/19.8BEBRG; José Alberto dos Reis, Processo de Execução, vol.II, Coimbra Editora, 1985, pág.106; Salvador da Costa, O Concurso de Credores, Almedina, 1998, pág.29; José Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 5ª. Edição, Coimbra Editora, 2011, pág.205 e seg.; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, II, 3ª. Edição, Coimbra Editora, 1986, pág.97; Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. Edição, III Volume, Áreas Editora, 2011, pág.581).
Revertendo ao caso dos autos, deve examinar-se, em primeiro lugar, se existe a alegada omissão, na citação efectuada à recorrente e enquanto revertida no âmbito do processo de execução fiscal nº.1301-2008/128923.3 e apensos, dos elementos necessários para requerer a suspensão da execução mediante prestação de garantia ou solicitar a sua dispensa, tal como a informação do valor da garantia a prestar.
A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº.219, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário).
Recorde-se que a citação da reclamante, e ora recorrente, se verificou em 22/11/2011 (cfr.nº.3 do probatório supra).
Nesta data, vigorava o regime constante do artº.190, do C.P.P.T., com a redacção da Lei 55-B/2004, de 30/12, no que diz respeito às formalidades da citação em processo de execução fiscal. Por sua vez, quanto aos requisitos de suspensão da execução e garantias a prestar para o efeito, vigorava o artº.169, do mesmo diploma, com a redacção da Lei 3-B/2010, de 18/04, tal como o artº.52, da L.G.T., na redacção da Lei 67-A/2007, de 31/12.
Ora, de acordo com o regime legal acabado de identificar quanto às formalidades da citação efectuada no âmbito da execução fiscal nº.1301-2008/128923.3 e apensos, deve concluir-se, com o Tribunal "a quo", que não se verificou a preterição de qualquer formalidade legal na concreta citação sob exame, antes se tendo cumprido as exigências legais previstas nos artºs.169 e 190, do C.P.P.T. (cfr.nº.3 do probatório supra). Concretizando, da citação efectuada consta a possibilidade de pagamento da quantia exequenda em prestações e os correspondentes meios de defesa (oposição, reclamação graciosa e impugnação), com menção aos correspondentes preceitos legais, bem como a possibilidade de suspensão da execução ao abrigo do disposto no artº.169, do C.P.P.T. O documento remetido para citação alude expressamente à possibilidade de suspensão da execução e menciona o correspondente normativo, cuja leitura tudo esclarece. Aliás, embora a recorrente nunca tenha alegado ter sido impedida de prestar garantia para suspender a execução, ou que solicitou à exequente informação sobre o valor desta, alegou que deduziu oposição e que desde essa data nunca foi notificada para a prestar ou qual o montante que seria devido para tal efeito.
Importará, por isso, avançando, examinar se após a dedução da oposição por parte da reclamante/recorrente, se postergou o direito que legalmente lhe assistia de prestar garantia ou solicitar a sua dispensa e obter a suspensão dos autos executivos, nos quais viriam a ser ordenadas as penhoras objecto da presente reclamação, cerca de dez anos mais tarde.
Da matéria de facto provada somente se retira que a apelante deduz oposição aos processos de execução em 3/01/2012 (cfr.nº.4 do probatório).
Nessa data já se encontravam em vigor as alterações introduzidas nos artºs.169 e 199, do C.P.P.T., pela Lei 64-B/2011, de 30/12 (OE 2012), tudo conforme a norma de direito transitório constante do artº.154, da mesma lei, normativo que consagrava a aplicação imediata em todos os processos de execução fiscal que se encontrassem pendentes a partir da sua entrada em vigor, das mencionadas alterações. Por outro lado, recorde-se que a Lei 64-B/2011, de 30/12, entrou em vigor no dia 1/01/2012 (cfr.artº.215, do mesmo diploma).
Avancemos.
Como decorre do disposto no artº.52, da L.G.T., em caso de dedução de oposição, a execução fiscal fica suspensa se for constituída ou prestada garantia idónea ou, ainda, se o executado for dispensado dessa prestação.
Releve-se que a suspensão da execução se enquadra no direito constitucionalmente garantido à efectividade da tutela judicial (cfr.artºs.20, nº.1, e 268, nº.4, da C.R. Portuguesa), o qual também se encontra reconhecido no artº.9, nº.1, da L.G.Tributária (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. Edição, 2012, Editora Encontro de Escrita, pág.423).
O efeito suspensivo provisório atribuído ao recebimento da oposição à execução fiscal, por força do determinado no nº.5 do artº.169, do C.P.P.Tributário, na redacção da Lei 64-B/2011, de 30/12, não deriva da mera dedução da oposição, sendo necessário a existência de despacho liminar que a não rejeite (cfr.artºs.209 e 212, do C.P.P.T.; artº.52, da L.G.T.). Por sua vez, a sedimentação de tal efeito suspensivo deriva da prestação de garantia (ou incidente de dispensa da mesma) no prazo de quinze dias computados desde o momento da dedução da oposição, atento o disposto nos nºs.6 e 7, do mesmo preceito.
Revertendo ao caso dos autos, não se alcança da matéria de facto assente quaisquer elementos que permitam esclarecer qual o destino da oposição a execução fiscal que foi deduzida em 3/01/2012 (cfr.nº.4 do probatório), nem que actos foram, ou não, praticados após essa dedução, quer pela entidade Exequente (cfr.artº.208, do C.P.P.T.) quer em Tribunal. Haverá, pois, que saber se tal peça processual já foi remetida a Tribunal, e quando, e se já existe, ou não, despacho liminar que a não rejeite, tudo conforme supra mencionado.
Por outro lado, a eventual existência do despacho liminar de admissão do mesmo articulado de oposição pode contender com a legalidade das penhoras objecto da presente reclamação, tudo factualidade não apurada pela sentença recorrida.
A falta de apuramento de tais factos resulta da omissão de diligências que se impunha realizar por parte do Tribunal "a quo", pelo que a sentença sindicada padece de défice instrutório, sendo que o S.T.A. é um Tribunal de revista (cfr.artº.12, nº.5, do E.T.A.F.), com exclusiva competência em matéria de direito, em regra (cfr.artº.26, al.b), do E.T.A.F.).
Por outro lado, mencione-se que, recaindo embora sobre as partes o ónus da prova dos factos constitutivos, modificativos e/ou extintivos de direitos, a actividade instrutória pertinente para apurar a veracidade de tais factos compete também ao Tribunal, o qual, atento o disposto nos artºs.13, do C.P.P.Tributário, e 99, da L.G.Tributária, deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, assim se afirmando, sem margem para dúvidas, o princípio da investigação do Tribunal Tributário no domínio do processo judicial tributário (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/12/2019, rec. 1555/08.5BEBRG; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 20/04/2020, rec.2145/12.5BEPRT; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/03/2021, rec.570/15.9BEMDL; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. Edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.859; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.173 e seg.).
Arrematando, verifica-se uma situação de défice instrutório que demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos dos artºs.682, nº.3, e 683, nº.1, ambos do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 21/11/2019, rec.670/15.5BEAVR; ac.S.T.A-2ª.Secção, 6/05/2020, rec.7/18.1BEPDL; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Novo Regime, 4ª. Edição, 2017, Almedina, pág.430 e seg.; José Lebre de Freitas e Outros, Código de Processo Civil Anotado, III Vol., 3ª. Edição, Almedina, 2022, pág.257 e seg.), devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja produzida a ampliação da matéria de facto pelo Tribunal de 1ª. Instância de acordo com os trâmites identificados supra, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO EM CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, ANULAR A SENTENÇA RECORRIDA e ordenar que os autos regressem à 1.ª Instância (TAF do Porto), a fim de aí, após fixação da pertinente matéria de facto, se proferir nova sentença que leve em consideração a factualidade entretanto apurada.
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Condena-se a entidade recorrida em custas, mais se dispensando do pagamento da taxa de justiça, nesta instância de recurso, dado não ter produzido contra-alegações.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 9 de Novembro de 2022. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (relator) - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Anabela Ferreira Alves e Russo.